CAPÍTULO 4
Melhor Apropriação pelos Professores
dos Projetos Pedagógicos Telemáticos como Prática
Comunicacional Educativa
O objetivo desta pesquisa foi o de descrever e analisar algumas atuações de professores apropriando-se de tecnologias de comunicação novíssimas, novas e tradicionais, a partir das suas perspectivas (individual e coletiva) integradas e melhorando a sua prática comunicacional educativa em escolas. Decorrentes deste estudo são os que se voltam para ações formadoras de professores, procurando fazer uso das mais diversas tecnologias comunicacionais de tal modo que eles passem a refletir sobre elas e a integrá-las (ou não) na sua atividade comunicacional educativa em sala de aula e na sua capacitação contínua na busca de realizar ações formadoras de professores que aperfeiçoem suas práticas comunicacionais telemáticas pedagógicas; são necessárias, então, ampliações de pesquisas nessa área, mobilizadas por questões como as que explicito a seguir e sobre as quais desenvolvo algumas reflexões.
Não se pode projetar a informatização educativa de uma escola ou a implantação de um programa pedagógico telemático sem integrá-lo em uma política educacional mais ampla que parta de programas de capacitação e atualização de todo o corpo pedagógico-administrativo escolar. Como pedir a um coordenador pedagógico, por exemplo, que acompanhe e oriente seus professores num projeto pedagógico telemático em que se discute cidadania, se esse educador não tem claro para si os problemas de cidadania da comunidade em que sua escola se encontra e que ignora o significado da palavra telemática, ou ainda mais grave, não sabe o que é um projeto pedagógico? Como o professor de Matemática poderá orientar seus alunos para organizar planilhas eletrônicas com este ou aquele software, se não está bem claro para ele o significado da palavra planilha e que ela não existe a partir do computador, mas muito antes deste. Como envolver o professor de Inglês numa projeto pedagógico telemático com professores de Inglês de outros países, se o que ele sabe fazer nas aulas de Inglês se refere apenas a "ensinar gramática" e não tem proficiência na língua viva, dinâmica, usada na comunicação internacional? Os projetos de redes telemáticas que algumas Secretarias de Educação de vários Municípios e Estados estão se propondo a implantar nas escolas públicas brasileiras, parecem começar a se preocupar com esta questão. Listas de discussão como a EDUCA-L, tem trazido muitas análises a esse respeito. Educadores em geral, legisladores e representantes do executivo têm discutido a necessidade de se desenhar um projeto de preparação mais consistente do corpo pedagógico escolar para a implantação das redes comunicacionais telemáticas nas escolas, não como um modismo como outras tecnologias foram introduzidas, mas preocupados com a diminuição do fosso que se estabelece entre os estudantes das escolas públicas de Educação Infantil, de Ensino Fundamental, Médio e Superior e das escolas particulares e as questões de melhoria da qualidade da vida de todos nas cidades, no país.
Não é suficiente a colocação dos equipamentos (hardware e software) nas unidades escolares, não é suficiente chamar profissionais de informática para ministrar "cursinhos" de informática para os professores. Há que se realizar um trabalho de médio e longo prazo para que os professores descubram e incorporem o novo papel do professor comunicador para ser uma das forças transformadoras desta sociedade tecnocrática em busca da diminuição das diferenças e das injustiças sociais e compromissado com a na revalorização do ser humano, que segundo GARZÓN (1994:55), se conceitualiza como "um ser que conhece", e que se comunica.
Depois de quatro anos de contatos com professores do Ensino Fundamental, Médio e Superior através de apresentações dos projetos pedagógicos telemáticos descritos no capítulo 3 e em outros (em que estive participando), de palestras, oficinas pedagógicas, entrevistas e questionários, pude constatar, com relação aos professores, alguns tipos de posturas, de resistências, de informações insuficientes sobre comunicação e mídias nas escolas o que requer pesquisas semelhantes e mais reflexões sobre a função do professor comunicador com mídias na escola atual, colocando-nos, entretanto, na perspectiva e na história desses professores.
H algum tempo, professor é pressionado a realizar um fazer, um ensinar segundo alguma metodologia ou abordagem da moda ou em oposição a essa abordagem. Os cursos de capacitação dos professores vem aumentando, mas muitos deles vinculam uma enorme quantidade de novos dogmas, substituindo os até então indiscutíveis, e apresentando novas receitas para serem seguidas. Os professores acomodam-se nestes procedimentos e quanto mais seguros ficam com uma nova abordagem mais acomodados e resistentes a um outro novo se tornam. Constatamos, muitas vezes, que tudo funciona, bem ou mal, dentro de uma normalidade inquestionável. Naquelas escolas onde há questionamentos, respostas bem elaboradas, as "alternativas de programas " já formuladas em consenso é importante estarmos atentos para não entrarmos em comodismo, mas sim darmos continuidade ao trabalho, ao pensar e a novos fazeres.
Praticar e pesquisar comunicação com mídias na escola , dentre elas a telemática, requer tomar como ponto de partida a perspectiva e a história dos professores. Ao trabalharmos com eles um questionário, uma entrevista, uma posição, um conceito, requer a parceria de professores comunicadores com o pesquisador. A reflexão, persuasão, convencimento, transformação devem ser obtidas através de um trabalho de cumplicidade, de entusiasmo, de redescoberta da paixão de ajudar as crianças, os adolescentes e jovens a aprenderem e a se comunicarem com mídias com a mesma curiosidade de seu tempo anterior à escola.
Talvez, essa empreitada seja árdua, mas deve ser enfrentada tanto com professores já em serviço nas escolas quanto com professores iniciantes, alunos de cursos formadores de professores. O contato com jovens alunos e alunas da Escola Média de Magistério nos leva a crer que é através deles que poderemos também ajudar seus próprios professores na transformação comunicacional e midiática..
Outra oportunidade para trabalharmos o novo paradigma de Comunicação e Educação é a possibilidade que professores de Didática e Prática de Ensino das Faculdades de Educação podem criar para que seus alunos , futuros professores conheçam, discutam e passem a atuar (ou não) com esse novo paradigma.
Para dar continuidade, então, a esses estudos, acredito ser importante constatar o que os professores pensam e fazem com as redes comunicacionais midiáticas, como pensam outros conceitos relativos à educação e ao seu trabalho na Escola, e como podem conseguir maior profundidade conceitual. Refletir sobre esses e outros conceitos fundamentais para a sua atuação profissional pode ajudá-los a melhor nortear seu trabalho. Alguns professores como sabemos já constatam e assumem a necessidade de resgatar esse tempo de reflexão. Outros ainda ignoram essa constatação e posicionam-se, frontalmente, contra qualquer atividades que os coloquem novamente diante dessa situação Há ainda aqueles que não só resistem, mas se transformam em obstáculo principal à transformações, dificultando qualquer atitude, posicionamento ou questionamento que possamos apresentar para abalar a sua posição de poder e decisão dentro da hierarquia administrativo-pedagógica da escola.
O trabalho de repensar e reestruturar a educação escolar exige o passar pelo caminho da sensibilização e conscientização dos professores em relação às constantes e rápidas transformações de ordem político, sócio, econômica, cultural comunicacional e educacional que as novas tecnologias de comunicação vem acelerando a velocidades nunca antes pensadas. O ser humano tem que reencontrar seu equilíbrio e o papel do professor é fundamental. O conceito de rede como uma ligação mas voltada às transformações sócio-culturais deve se espalhar e se expandir para todos os lados. Compartilhar as experiências bem-sucedidas pode tornar a vida humana, neste planeta Terra, mais saudável, aproveitável tanto para o corpo quanto para o espírito. Os professores de todos os níveis não podem furtar-se a esta função, pincipalmente hoje, no mundo em que a escola precisa ajudar a preencher as lacunas deixadas pela falta de orientação de crianças, adolescentes e jovens quanto aos valores morais, aos princípios éticos, à atuação política no sentido puro dessa palavra e ao exercício de uma cidadania questionadora e modificadora.
A utilização da comunicação escrita impressa, das tecnologias do correio regular, do fax, da rede de computadores, por exemplo, conforme a necessidade e a disponibilidade desses meios, pode tornar-se mais habitual entre os. Para essa incorporação, faz-se necessário o uso constante não só de atividades desempenhadas através dessas mídias , através de consultas constantes ao correio eletrônico e o uso da comunicação oral, isto é, lembretes através do telefone, para que acessem as mensagens que foram enviadas via fax ou via correio eletrônico e para que eles procurem respondê-las. Para acessá-las e respondê-las é necessário conhecer as mídias que as veiculam. É preciso ir a atrás do conhecimento. É preciso pesquisar!! E, não basta conhecer os modos de funcionamentos dessas mídias. É preciso conhecer, analisar, intervir nos conteúdos que elas veiculam, transformando-os e tornando-os mais significativos em qualidade cultural.
Os professores reconhecem a importância do telefone para as comunicações breves e rápidas; do fax, que pode resolver o problema de envio de imagens e textos de uma escola para outra em um tempo muito curto; da redes de computadores que permite a troca de informações culturais de terras tão distantes e pessoas tão diferentes dinamizando e contextualizando as suas aulas em tempos tão curtos se comparado com o correio regular. Mas, muitos professores aind não praticam mais intencionalmente esses modos comunicacionais por diversas razões (econômicas, habilidaades insuficientes, etc.) que precisam ser superadas.
É fundamental que o professor continue a pesquisar, a se comunicar com diversas mídias, com seus pares e a passar ele próprio pela aventura construtivista e colaborativa da descoberta e da criação para servir de exemplo e motivação aos seus alunos. E nessa comunicação, desenvolva a percepção de si mesmo, percepção de sua relação com as mídias que utiliza, do grau de controle que tem sobre essas mídias e do contexto em que as utiliza, bem como o conteúdo da mensagem e o quanto pode controlá-lo ou mesmo alterá-lo. GARZÓN (1994:56) denomina esta percepção de presencialidade: "O sujeito (receptor, emissor, ou ambos), participa de uma realidade construída pelas características sensoriais da interação, sua capacidade de gerir a interação e de interpretar sensorial e psicologicamente o conjunto. As implicações pedagógicas são muitas e nem todas óbvias".
O professor precisa ter muito clara essa questão da percepção no gerenciamento dos projetos pedagógicos telemáticos que se realizam através de encontros eletrônicos mais ou menos interativos, dependendo das mídias empregadas. Há que estar atento ainda para as amplas possibilidades do desenvolvimento de processos de construção coletiva do conhecimento (GARZÓN, 1994:59).
O professor precisaincorporar cada vez mais que o ensinar não exclui o aprender, muito pelo contrário, ensinar implica em continuar a aprender. Para aprender há que pesquisar e se comunicar com seus pares, com especialistas, com teóricos e com seus alunos. A pesquisa implica em descobertas, em reflexão, em conclusões e tomadas de posição para uma posterior comunicação, para um compartilhar, para o ensinar.
Ao apropriar-se dos modos de funcionamento e de troca, de elaboração de conteúdos significativos redes de comunicação, o professor certamente aprende a se enredar com seus pares e alunos e, dessa forma, compartilha de suas descobertas, provoca dúvidas e engendra novas pesquisas em contínua atualização e permanente crescimento. Um enredar que não se faz só por redes de computadores. Um enredar que começa por enxergar o seu par na sala dos professores , nos corredores da escola , na sala de reuniões. Um enredar que pode fazer uso das mídias nas mais diversas formas Um enredar-se, também, como já citei, anteriormente, neste trabalho com o técnico em audiovisual, com o técnico em informática, ambos fundamentais para um suporte adequado no uso das tecnologias de comunicação. Essa prática leva-o com certeza a um trabalhomais colaborativo.
O trabalho colaborativo tem demonstrado transformar a atividade docente e discente em atividade coletiva construtora, edificante e eficaz, estimulando o gosto pelo estudo, pela pesquisa e pela descoberta. A comunicação entre professores e alunos passa a se processar no nível da criação conjunta de uma realidade que será útil, benéfica e positiva para todos. A comunicação escolar colaborativa ao ser facilitada pelos meios de comunicação eletrônicos diminui as distâncias, apresenta as diversidades como características a serem respeitadas tanto quanto a individualidade de cada um ou a especificidade de cada etnia, de cada cultura, de cada grupo social desde que não haja prejuízo do coletivo e do intrinsicamente individual.
As redes comunicacionais, dentre elas, as eletrônicas, permitem uma descentralização, que LÉVY (1994:26), assinala como uma das características das redes cujos nós se associam e se desassociam, conforme seus interesses, formando, ramificações diferentes, umas das outras, com as suas especificidades próprias. Já BARBERO (1996: 15-20) chama a atenção para o descentrismo causado pelo fluxo tecnológico como uma "perda de centro", que valoriza as "rodovias", que desmonta as praças, "a cidade vivida e aproveitada pelos cidadãos se estreita e perde seus costumes". Vejo de outra forma, o fluxo tecnológico pode permitir uma circulação pelas "rodovias" para que se conheça outros lugares, outras realidades e outras culturas para um regresso à sua "praça" para um encontro com os seus iguais e um enriquecimento conjunto. A instalação de redes de mídias nas escolas, não substituirá os encontros folclóricos, as festas Juninas, as reuniões entre pais e professores , mas todos esses encontros enriquecem-se pela navegação dos alunos pela WWW, nos museus da França, da Inglaterra, da Itália, nas exposições de Ciências dos Estados Unidos e da Inglaterra ou Alemanha, pelos campos da Austrália e pelas florestas ou desertos da África, voltando para as nossas regiões e comparando e contrastando-as com as nossas características locais e regionais de modo a fortalecê-las como sua marca registrada genética, étnica e culturalmente ou encontrando soluções e analisando-as e adaptando-as para as questões negativas e indesejáveis de nossa cultura. A responsabilidade do professor como "despertador de espíritos" se faz presente, então. Concordo com BARBERO (1996:15-20) que seus temores podem se tornar realidade, se nós educadores, viramos nossas costas não só para a utilização das tecnologias de comunicação, mas como tratei no capítulo 2, para a leitura crítica das mídias. O projeto "Enlaces", a que me referi no capítulo 3, tem, uma das metáforas para seu trabalho de redes com as escolas públicas em todos os níveis, "La Plaza", que permite como descrevi, justamente que as redes não passem ao largo das cidades, das comunicações humanas individuais ou comunitárias e que como ainda BARBERO afirma, somente as novas "tribos" se encontrem telemáticamente. Em seu curso "Meios de Comunicação e Educação ", na Faculdade de Educação da USP, FUSARI (1990), por exemplo, trabalha com alunos -professores em Pedagogia, exatamente na perspectiva de que as pessoas recebem múltiplas influências das mídias e de seus usuários, mas são, também, capazes de, aí, atuarem e influírem. Os professores podem aprender a ser uma das influências reforçadoras do "status quo", ao contrário, a trabalhar criticamente com seus alunos, para exercerem influências por meio de suas atuações transformadoras a serviço do exercício da cidadania no mundo contempor6aneo.
A comunicação eletrônica, por exemplo, pode abrir portas para a superação de alguns preconceitos ainda existentes nessa área. Quando alunos e/ou o professores usam um computador, um telefone ou um fax trocando idéias e informações com pessoas de outras regiões da cidade, do estado, do país ou do mundo, podem ser estimulados a abrir o coração e a mente à recepção das idéias, sentimentos. apreciações do outro para julgá-las a partir das mesmas e não a partir do preconceito (rejeição) pela aparência física, pela posição social, pela etnia, pela idade, pelo sexo (gordo/magro; rico/pobre, negro/branco; velho/jovem; homem/mulher/homossexual).
A escola pode representar o espaço de resgate da cidadania e da reconstrução social pela convivência pacífica, harmoniosa, mas também contrastante de indivíduos com características, pensamentos, crenças e inquietações, as mais diversas.
O uso de redes de computadores, dentre outras, têm trazido à escola a possibilidade de se recuperar e repensar o passado através de uma espécie de reconstrução a partir da atualidade envolvendo os alunos e professores na utilização dos meios de comunicação para essa reconstrução. Como já descrevi no capítulo 3, em Pernambuco, por exemplo, o projeto "De Olinda a Olanda : o Boi Voador" colocou os alunos das escolas participantes pesquisando sobre a invasão dos holandeses e reconstruindo aquela época a partir da moda, dos usos e costumes, das lendas e da pesquisa histórica sobre o período de Maurício de Nassau. Os alunos usaram o jornal, o rádio, os instrumentos de desenho e pintura tradicionalmente usados na escola para recriar aquele período, além de usarem o computador para ter acesso a Internet e solicitar dos alunos holandeses informações de como eles vêem a vinda dos holandeses para o Brasil e sua expulsão. Os alunos também usaram sucata para reconstruir a história do Boi Voador e o comando de sua animação pelo computador através de robótica pedagógica. Em paralelo, foi criada uma cenografia para que esses alunos pudessem representar, com dança, no Monte Guararapes a batalha de Guararapes que foi significativa para a expulsão dos holandeses. Houve uma verdadeira rede de mídias sendo utilizada de modo que cada aluno pode encontrar exatamente onde expressar a sua habilidade maior.
Observamos aqui a questão que já foi anteriormente discutida neste trabalho, das diversas inteligências e dos estilos de aprendizagem diversos. Quando os professores efetivamente se comunicam e trabalham com seus pares colaborativamente descobrem suas inteligências específicas que lhes permitem também respeitar as diferenças de seus alunos e a ter sensibilidade para as inteligências de primeira e segunda ordem de cada um. Essa comunicação permite-lhe apreender e estimular os pontos fortes; atentar e cuidar dos pontos fracos. Permite-lhe trabalhar com a auto-estima de seus alunos de modo a fazê-los crescer e se desenvolver integralmente. Um outro elemento fundamental de comprometimento de professores e alunos é a pertinência.
Nesses projetos telemáticos, em que o principal não é o uso da comunicação eletrônica, mas o uso da comunicação social, na conjuntura escolar, os professores podem aprender a descobrir os seus talentos e a usá-los com eficácia, aumentando a sua própria auto-estima e provocando o bom desempenho e entusiasmo de seus alunos, uma vez que a comunicação é um caminho de ida e volta, bidirecional e de construção conjunta envolvendo emissor e receptor.
As novas tecnologias de informação e de comunicação, como me referi no capítulo 2, trazem uma quantidade imensa de informação que vem fragmentada, dispersa, descontextualizada e, como diz HERREROS (1996:7-8), recontextualizada, que adquire uma subdimensão ao se interrelacionar umas com as outras e que manifestadas em som, imagem e textos se associam nas mais complexas formas. Ao mesmo tempo, há um emaranhado, muito maior, de informações ocultas, não visíveis, que "permite mover o "iceberg", a sociedade de um lado para outro", e que se encontra em poder de pequenos grupos. Os sistemas educacionais carecem de preparo tanto para fazer frente a essas avalanches visíveis de informação quanto mais para desvendar a teia invisível. Reitero, pois, a necessidade de se preparar o professor em programas de formação inicial e de formação em serviço para que eles aprendam a desembaraçar "a complexidade, detectar as ligações de uns dados com outros e a reconhecer contextos com suas correspondentes repercussões e fatos informativos" para poder trabalhar comunicacional e educativamente com seus alunos , não, apenas, como um disseminador de informação, mas como educador, como guia, que tem posse de critérios e orientações e saiba analisar e contextualizar a informação para depurá-la, através da seleção, da valorização, do contraste e como diz BARCHECHATH (1988:13), para ser um "despertador de espíritos" que levará seus alunos a "adquirir um domínio de representações e abstrações para transformar conhecimentos adquiridos em saber elaborado".
Para que os projetos ou planos de comunicação escolar telemática possam ser pedagogicamente efetivos é indispensável que sejam acompanhados por processos de planejamento consistente, partindo-se de um embasamento teórico, tendo por consenso a definição dos objetivos gerais e específicos, a escolha dos métodos e procedimentos adequados, a designação de atividades e delegação de responsabilidades, o estabelecimento de um programa e cronograma viáveis e levando-se em consideração as diferenças de calendários escolares das escolas participantes. Conforme MARCHAIM e MERON (s.d: 3) indicam, nesses projetos deve haver lugar para a criatividade e a improvisação, mas ambas devem ser previstas e estabelecidas ainda ano período de planejamento.
O acesso à Internet é, hoje, na cultura ocidental, pelo menos, uma prática comunicativa social cada vez mais presente. Nos Estados Unidos, na Europa, na Ásia, na Austrália, na América Latina, aumenta o número de projetos pedagógicos telemáticos que se utilizam dessa mídia. Entretanto, os indicadores mostrados, em minha análise no capítulo 3, revelam que a maioria dos professores ainda não incorporou essa cultura e, portanto, essa cultura tem se refletido na cultura da sala de aula como atividade extra, como 'perda de tempo' (para alguns pais e professores), como modismo, sem se incorporar como uma prática desveladora de um mundo local se descobrindo, se analisando, se criticando e se alterando mas se afirmando, em suas especificidades, em relação ao transnacional, ao global, ao planetário.
Daí, eu concordar também quando a autora cita SINGH (1988:360) ao se referir à necessidade do currículo escolar e os procedimentos de ensino serem revistas para serem mais consistentes com os estilos de vida e cognitivos culturais dos alunos. A flexibilidade, a diversidade, o equilíbrio se tornam essenciais numa escola cada vez mais multicultural e mais aberta para o mundo.
Tem-se que partir para uma formação do professor com ênfase na competência cultural, o que significa que o professor tem que primeiramente perceber a sua própria cultura, conhecendo-a, compreendendo-a, depois, abrir-se para o conhecimento e a compreensão de outras culturas e aprender a criar ambientes multiculturais que permitirão que seus alunos desenvolvam suas habilidades e seus estilos de aprendizagem. Isso significa que o professor tem que se preparar para ser um pesquisador, um comunicador, mas sobretudo, um aprendiz por toda a sua vida e ajudar seus alunos a desenvolverem a autonomia para também se tornarem eficientes pesquisadores, comunicadores e aprendizes autônomos, não importa qual carreira, profissão ou função optem para a sua vida.
O professor ao se tornar competente em relação à utilização do computador, contribui melhor com seus alunos que já chegam à escola com uma certa competência na utilização dessa tecnologia. Alguns desses alunos se tornam professores de seus professores sobre uso de computadores e, a, o professor tem que estar aberto para ser aprendiz nesse ambiente de aprendizagem multidirecional. Retomando LÉVY (1991:194), "a técnica em geral não é boa, nem má, nem neutra, nem necessária, nem invencível", não podemos reificar o computador e a informática educativa, a telemática, mas conhecê-los, dominá-los, controlá-los para que ajude o aluno atingir os objetivos propostos na sua utilização. Mas é essencial que essa incorporação aconteça integrando-o às mídias já existentes na sala de aula ou na escola
Outros projetos, tanto alguns descritos no capítulo 3, como outros de meu conhecimento pela literatura específica, mas sem detalhes suficientes para serem incorporados neste trabalho, denotavam a realização de uma proposta com objetivos educacionais definidos nos quais a participação do professor era necessária, mas voluntária. Não havia em muitos desses projetos, preocupação com uma inserção sistematizada do professor na realização do projeto. Se o professor se disponibilizava voluntariamente a participar, os coordenadores agradeciam; se, ao contrário, os professores não acreditavam no projeto, ou se mantinham céticos afastados, os coordenadores, em geral, pessoas de fora da escola , levavam o projeto a contento, satisfeitos com os resultados alcançados com os alunos.
Nessa situação, o projeto pedagógico telemático não se incorporava à prática comunicacional educativa da escola, pois estivera restrito à atuação dos alunos.
Quer nas escolas públicas, quer nas escolas particulares, onde desenvolvo este trabalho, essa fase inicial se mostra semelhante.
O que realmente tem diferenciado é o período que se dispõe para trabalhar com os professores em uma e em outra. Na escola pública, em geral, os diretores defrontam-se com as questões burocrático-administrativas e só podem destinar mais horas para atualização dos professores se isso já tiver sido determinado no planejamento do ano anterior (o que, por um lado, dificulta o trabalho de sensibilização e envolvimento do professor ). Nas escolas particulares, por sua vez, o projeto é solicitado pelos diretores, portanto eles disponibilizam tempo para que se possa realizá-lo.
Um dos problemas enfrentados em todas as escolas quer particulares quer públicas, é que esse trabalho com o professor tem que ter acompanhamento ao longo de todo o projeto. Um acompanhamento constante, pois o professor tende a se acomodar e voltar para a sua prática tradicional, quando o agente estimulador não está presente. O que tenho percebido é que se o professor se compromete de forma completa com o projeto, isto é, se ele acredita desde o início e sua prática já está de certa forma voltada para uma postura construtivista, colaborativa e de pesquisa, os resultados são, desde o início, positivos e os alunos estão sempre estimulados e assimilam essa postura. Esse professor pode ser um auxiliar no acompanhamentos dos mais resistentes; entretanto, se o envolvimento é aparente e o professor continua apegado ao curriculum e as atividades tradicionais obsoletas, o acompanhamento dos coordenadores do projeto tem que ser mais constante e efetivo.
Acredito que as atividades propostas para os alunos devem ser desempenhadas e realizadas em primeiro lugar pelos professores; só a partir do momento em que o professor vivencia a proposta que vai ser feita ao aluno é que ele passa a ter mais consciência das possibilidades e limitações que serão enfrentadas pelos mesmos e criam condições de uma melhor orientação para os alunos.
No projeto Educando para a Cidadania, já descrito pude verificar essa necessidade de vivência e experimentação pelos professores. Falamos de comunicação, de redes de comunicação e cada professor continuava tentando resolver a sua parte no projeto sozinho e achando que ele tinha que realizar toda a tarefa não visualizando seu aluno como seu colaborador. Quando eles passaram a resgatar cada um as suas origens, discutir com seus colegas as especificidades de cada um e como isso ia ser trabalhado com os alunos é que o projeto começou a andar. Outra constatação nesse mesmo projeto foi de um certo paternalismo em relação aos alunos por parte de certos professores. Alguns professores substimavam a capacidade criativa e crítica de seus alunos e queriam, eles próprios, desenvolver o projeto, não enquanto realizadores principais, mas entregando tudo pronto para a conclusão dos alunos. Também, depois de muitos encontros, reflexões é que começaram a descobrir que, os alunos são muito criativos nas mais diversas áreas do conhecimento, e se lhes mostrarmos que a disciplina e a organização são necessárias para a realização do trabalho, os alunos tornam-se avaliadores muito eficientes do seu próprio trabalho, pois vai ser divulgado na rede ao invés de ir para o fundo de um armário na sala dos professores.. Na EESG Brasílio Machado, a primeira fase surpreendeu, pois mesmo os professores que não eram da área de humanas, integraram-se descobrindo no que e como as suas disciplinas poderiam colaborar para um conhecimento global dos alunos da segunda série do Ensino Médio. Nas aulas de Biologia, por exemplo, os alunos construíram com o professor seus heredogramas, para entenderem um pouco as diferenças entre genótipos e fenótipos dos diversas origens que formam o povo brasileiro; já o professor de Matemática, aproveitou os dados coletados sobre a origens dos pais desses alunos e construíu gráficos no quadro de giz, que os alunos reconstruíram com software de planilha eletrônica que permitia a construção de gráficos.. Entretanto, outros professores cujas disciplinas, naturalmente contavam com sua participação na pesquisa, mantiveram-se distantes e alheios ao processo.
Há ausência de projetos com professores , os projetos estão sempre, mesmos os que trabalham a formação de professores, como os desenvolvidos no meu grupo, levam a execução como responsabilidade dos alunos e os professores acabam se achando sem função, servindo apenas de coletores de informação, guias de turismo, controladores. As oficinas, os encontros, as conferências são momentos de encontro e reflexão, quebrados por longos períodos de ausência, devido às distâncias. Há que se desenvolver projetos pedagógicos telemáticos com professores, com objetivos, cronograma bem definidos utilizando diversas mídias ao longo do projeto.
No capítulo 2, ao me referir às redes de computadores, exemplifico-as e distingo as redes locais(LANs) das redes remotas (WANs). Quando há referências à Internet e à telemática, fala-se de redes remotas. Os projetos pedagógicos telemáticos implicam, de início, a utilização de redes remotas, mas, se parte dos conceitos explicitados no capítulo 2, sobre as redes, não se pode desvincular o trabalho nas redes locais. Entretanto, em algumas escolas o que há, não é uma rede local e sim um sistema de distribuição. Conforme LÉVY (1991) caracteriza as redes, os nós são autônomos, cada um deve ter atuação independente do todo, quando necessário, mas os laboratório de computação nessas escolas são exemplos claros de uma situação oposta. Existe, em geral, um servidor onde tudo se armazena, daí, tem-se a distribuição para os terminais "burros", como são chamados, já que só são terminais, todos concentrados em um só laboratório na mesma área, usados segundo o paradigma educacional e comunicacional unidirecional de distribuição de informações. Nesse paradigma "não se espera que alunos (ou professores ) desenvolvam suas próprias perguntas, colaborem uns com os outros, produzam relatórios ou comuniquem os resultados de suas pesquisas" (NEWMAN, 1993, 50). Há pois, em geral, como descrito no capítulo 3, uma ausência de uma política maior de implantação de tecnologias de comunicação nas escolas conectada com o que se entende por ensinar e aprender, com os objetivos da educação escolar. Para NEWMAN, esse tipo de investimento, dificilmente possibilitará alguma mudança significativa na educação. Há escolas que têm o laboratório, tem computadores na secretaria, na administração, alguns até na sala dos professores, mas a rede é utilizada para se "fiscalizar" o que as pessoas estão ou não estão fazendo.
Há momentos em que se têm a necessidade de distribuir informação, então, também não se pode descartar esse tipo de sistema, que é mais próprio para a administração tradicional. Mas professores, alunos, profissionais de informação (bibliotecários, por exemplo) precisam contar com um sistema de acesso mais disponibilizado.
Outra ausência, percebida nos trabalhos analisados, contra o que o grupo que aqui denominamos de "Ciências Sócio-Culturais", em que atua a equipe do Ensino de Humanidades via Telemática, da "Escola do Futuro"- USP tem lutado muito há já algum tempo, é a ausência de desenvolvimento de projetos colaborativos na rede local da escola. No caso de comunicação entre professores de disciplinas afins, de uma mesma área de conhecimento, trabalhando software distintos, com abordagens distintas sobre uma mesma temática, de forma tão fragmentada que os alunos não conseguem sozinhos fazer as conexões existentes na vida real., mas como esperar isso dos alunos se os professores não fazem essas conexões no seu planejamento escolar? Com essa intenção, NEWMAN (1993:50) destaca a possibilidade de se utilizar a LAN para a distribuição de vídeo de uma para várias áreas da escola. Outro exemplo, a utilização dos recursos da rede local no ensino e aprendizagem de língua (nativa ou estrangeira) para a criação de textos coletivos, elaborados por alunos de mesma classe, ou elaborados por alunos de períodos diferentes; criação de boletins informativos e relatórios de professores. Uma vez que essa rede local tenha uma conexão com uma rede remota ( e geralmente, não existe essa conexão), o trabalho elaborado individual ou coletiva e colaborativamente pode ser distribuído a outras redes. Por outro lado, essa conexão LAN e WAN permite o acesso de trabalhos produzidos em outras escolas, a banco de dados, à produtores de software, etc... permitindo-se o desenvolvimento do paradigma comunicacional educativo interativo de um modo mais completo.
Concluindo, as indicações para atuações mais significativas de professores e alunos nos projetos comunicacionais educativos, de acordo com as categorias de análise sobre as quais me detive neste estudo se resumem a:
a) quando, onde, com quem de onde para quem: os projetos comunicacionais educativos devem estar presentes ao longo de toda a vida escolar, desde os cursos de Educação Infantil, entre os professores do mesmo nível de mesma área, entre os professores do mesmo nível, mas de áreas diferentes, entre professores de períodos diferente, entre professores de mesma comunidade ou de comunidades-irmãs em outros países, entre os alunos do mesmo nível de mesma escola , entre os alunos do mesmo nível mas de escolas diferentes, entre professores de períodos diferente, entre professores de mesma comunidade ou de comunidades-irmãs em outros países;
b) sobre o o que, para quê e por quê, os trabalhos comunicacionais educativos escolares devem ter as mais diferentes temáticas, pois vão levar o professor e o aluno a aprender de um modo mais complexo, mais dinâmico, ; recomendo que haja mais temas ligados também às Ciências Sócio-Culturais, como as Artes, Matemática, Comunicação a despertar interesses por pesquisa e desenvolvimento de saberes em sala de aula.; devem ser interdisciplinares, para viabilizarem a construção um ambiente de apoio a professores e alunos em seus projetos comunicacionais educativos. "A organização da informática e da comunidade de professores na escolas deve seu uma extensão da comunidade disponível em toda a rede remota"(NEWMAN, 1993, 50);
c)materiais e linguagens e textos informáticos: as linguagens empregadas com os alunos não devem ser apenas a textual informática, mas as diversas linguagens de comunicação, cada uma com um objetivo específico. A linguagem textual é a utilizada para as trocas por correio eletrônico, fax, correio regular, para os relatórios dos pesquisadores, dos professores ou dos alunos. Ainda na comunicação telemática, pode se utilizar, também, a linguagem sonora, visual e audiovisual, através de desenhos, gráficos, trilhas sonoras, fotografias, vídeo. Como parte do desenvolvimento do projeto telemático, naturalmente há representações locais, através de drama, dança, jornal falado. Portanto os materiais e as linguagens utilizadas pelos alunos orientados por seus professores, não devem se restringir ao uso do computador. Os professores devem ser estimulados pelos coordenadores, responsáveis pelos projetos, a se utilizarem de uma rede de mídias para que o conhecimento possa ser construído de forma integral, utilizando-se também os sentidos.
Outra linguagem utilizada por pesquisadores, professores , alunos , deve ser a linguagem afetiva. A realização dos projetos pedagógicos telemáticos nas suas diversas fases não desenvolvem apenas as capacidades cognitivas; ao contrário, pode ter um alto grau de desenvolvimento afetivo entre os participantes, localmente. Se os projetos forem longos o suficiente, podem desenvolver uma afetividade maior à distância e em presença.
d) quanto aos professores atuantes, alunos atuantes, modos educativos e comunicacionais de atuação: Os projetos pedagógicos comunicacionais devem envolver toda um planejamento cuidadoso para que sejam factíveis; corresponder à filosofia da escola em que se desenvolvem; envolver atuações de professores e alunos em todas as suas fases para que suas ações não sejam apenas um cumprir de prescrições ordenados pelos seus superiores na hierarquia escolar. As atuações dos professores devem incorporar as características de liderança, firmeza, decisão, orientação, respeito, cobrança, compreensão, trabalho. As atuações dos alunos, também, devem incluir as mesmas características, pois cada um poderá ter que se valer de uma dessas características ao longo do projeto nas atividades comunicacionais que desenvolver no seu grupo, na comunidade escolar ou na comunidade social em que vive. Para o exercício da ação comunicacional educativa ou da ação educativa comunicacional essas características são fundamentais e é praticando-as que elas serão desenvolvidas e aperfeiçoadas para que num futuro breve se tenha uma sociedade mais solidária, colaborativa, valorativa do ser humano e com menos injustiça sociais. Todo futuro, como sabemos, se constrói nas atuações realizadas no hoje também frente aos traços do passado, mas transformando-os e retecendo-os nas ações presentes.
"Se a sua opção política é
uma opção transformadora e você é coerente com
sua opção -...- se é substantivamente democrática,
você não renuncia a seu trabalho de educador, você se
afirma nele e desafia o educando a assumir-se como sujeito do processo
de conhecer"
Paulo Freire