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PEDAGOGIA, ESCOLA e FAMÍLIA: ALGUMAS REFLEXÕES
Iolanda Maria Pierin de Barros (Mestre pela USP)
iolanda.barros@utp.br
Maria Antonieta Meneghini Martins (Mestre pela UFPR)
Maristela Heidemann Iarozinski (Mestre pelo CEFET-PR)
Neyre Correia da Silva (Mestranda pela UFPR)
Neusa Maria Gomide Baptista (Mestre pela UFPR)
Renato Gross (Mestre pela PUC-PR)
Rosangela Cristina Guidelli (Mestre pela UFSCar)
Pedagogia, FCHLA
Universidade Tuiuti do Paraná – UTP
Olhem para o céu, há um desejo premente
pela manhã que nasce diante de vocês. A história, apesar de sua dor lancinante, jamais pode deixar de ser vivida; se enfrentada com coragem, dispensa ser revivida. Olhem para o dia que irrompe diante de vocês. Façam com que o sonho renasça. ( (MAYA ANGELOU[1]) O
olhar que lançamos sobre o tema “Pedagogia,Escola
e Família: algumas reflexões” pretende abordar os “Fundamentos
da Educação”[2]
no Curso de Pedagogia daUTP como
pressupostos que direcionam nossa maneira de ver, refletir e pesquisar
os desafios educacionais que irrompem diante de nós, repercutindo
no entendimento de “nosso mundo, nossa vida” ou seja, de nosso mundo natural
e social.
O
tema “Pedagogia, Escola e Família: algumas reflexões”,exige
tambéma observação
dos educadores sobre o como a Escola vem desempenhando suas responsabilidades
do “ensino educativo”, não como substituta da Família, mas,
antes como sua aliada.
Analisando
a Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança
e do Adolescente (ECA) de 1990, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB) de 1996, examinamos nessa seqüência como o “Estado
do Brasil” trata a questão “Escola e Família”. Com o focono
currículo do Curso de Pedagogia, principalmente nas disciplinasenglobadas
no corpo dos Fundamentos da Educação, a questão que
se coloca é:
-como
desenvolverprojetos interdisciplinares
de pesquisa e prática pedagógica, articulando os direitos
e os deveres dos cidadãos contidos no “espírito” e na “letra”da
legislação básica do Estado do Brasil, com os estudos
propostos nos Fundamentos da Educação, que abram caminhos
para o estabelecimento de fecundas articulações entre a “Escola
e a Família” frente aos desafios da Educação atual? O
Estado do Brasil vem propondo, a partir de 1988, uma“Doutrina
Jurídica de Proteção Integral à Infância
e à Adolescência”. A lei nº 8.069/90 (ECA) representa
uma nova concepção e transformação na prática
social ao mudar a consideração que se fazia sobre as crianças
e os adolescentes que dacondição
de menores, objeto da compaixão-repressão,passam
à condição de sujeitos plenos de direitos: direito
à vida, à saúde, à educação,
à convivência familiar, ao lazer, entre um elenco de outros
atributos que lhe são normativamente assegurados como cidadãos.
A nova Doutrina Jurídica configurou-se como uma mudança de
paradigma, isto é, uma mudança na forma de pensar a questão,
cujo inteiro teor o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) incorporou.
Entende-se paradigma, conforme Kuhn, como um conjunto de conceitos que
determina a legitimação, do ponto de vista científico,
de determinadas questões teóricas formuladas no seio da sociedade [grifo
nosso] (GOMES DA COSTA; SAMPAIO OLIVEIRA LIMA, 2.000, p. 290-291). OsFundamentos
da Educação estruturam o saber pedagógico nos “clássicos”
e nas posturas transdisciplinares. Provavelmente, há várias razões
para explicar por que esse sentido dos “clássicos” tem uma força
específica nas ciênciassociais
[e humanas]. Uma delas é metodológica. Existe um hiato
lógico entre as ciências naturais e sociais;não
há, nas ciências sociais,a
mesma forma de conhecimento cumulativo que pode caracterizar as ciências
naturais. Em segundo lugar, há (...) um engajamento reflexivo
inevitável (...) das ciências sociais com o tema –
ações humanas historicamente constituídas – que
elas buscam analisar e explicar [
grifo nosso] (GIDDENS,1998,
p. 15).
Sabe-se que o Curso de Pedagogia gravita em torno da criança, do jovem ou do adulto que freqüentam a Escola e da formação dos profissionais da Educação para atuarem na Gestão Educacional, nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental e na Educação Infantil. Nesse universo, o acadêmico “aprende a conhecer”
e “aprende a fazer” a escolaridade básica e as formas de socialização,
ou seja, conhece, ensina e aprende como ser um membro da sociedade.
Sendo a educaçãoacima
de tudo um ato social eo trabalho
do professor,principalmente, formular
representações de nós mesmos, dos outros e de nosso
ambiente físico e social,é
praticamente impossível elaborar ou esboçar projetos pedagógicos
sem a compreensão de que a realidade social é uma construção
humana e que as utopias constituem inspirações para projetos.
Esse entendimentoé formado
também pelo estudo do encadeamento das idéias defendidas
pelos“clássicos” e por posturas
transdisciplinares.
Nos Fundamentos da Educação analisa-se
e explica-se, através da “metodologia e do engajamento
reflexivoinevitável das
ciências sociais com o tema -ações
humanas historicamente constituídas -”, a sociedade como práticas
sociais reproduzidas em uma diversidade indefinida de meios.Mas
quais são as práticas sociaisreproduzidas
na Educação pelas políticas educacionais no Brasil?A
Escola e a Família têm consciência da importância
de sua participação na construção da realidade
social através da prática real?Como
a Escola e a Família vão se completar na busca de soluções
para a Vida e para a Educação?
No
Brasil, segundopesquisa recente,
há uma legião de 32 (trinta e dois) milhões de pessoas
famintas que não conseguem assumir o cuidado e a formação
de suas crianças e adolescentes. A crise que o Estado do Brasil
enfrenta como um país com pouca poupança interna e má
administração do dinheiro público, certamenteagrava
os problemas econômicos do universo familiar daqueles que estão
abaixo da linha da pobreza, resultando em maiores dificuldades.
Revela
também que há um total de 9 (nove) milhões de famílias
indigentes.
Portanto,
a condiçãodepobreza
e deindigência enfrentada
pelas Famílias brasileiras merece ser percebida sob novas perspectivas
e considerações;alguns
aspectos devem ser reconhecidos pela Escolasobreo
problema que as criançase
adolescentes enfrentam enquanto pertencerem ao mundo dos excluídos.
Paradoxalmente,encontram-se excluídas
por seu estado de miserabilidade e estão amparadas pela lei como
sujeitos plenos de direitos. Como
as criançase os jovens irão
exercer seus direitos frente a fatos como:a
falta dos “pais físicos”na
renda familiar e na transmissão da identidade[3];
o despreparo dos adolescentes quando prematuramente se tornam “pais físicos”;
o consumo de álcool e outras drogas quetumultuam
as relações de afeto e responsabilidades? Para
os profissionais da educação trabalharem em escolas freqüentadaspor
criançase jovens fragilizados
pelas situações descritas acima e outras tantas,que
“clássicos” direcionam sua maneira de ver, refletir e pesquisar
tais desafios educacionais? Como as instituições “Escola
e Família” eram anteriormente vistas e como estão sendo pensadas
na atualidade? Que experiências feitas no passado devem ser continuadas?
Como operacioná-las? Os grandes pensadores foram, acima de tudo, “homens do seu tempo” que refletiram sobre situações e conflitos de sua época. Certamente, hoje os desafios se apresentam com faces novas. Enfrentá-los com lucidez – “eis a questão”, ou seja,ter capacidade de contextualizar e englobar os problemas, situando-os cominformaçõesno seu contexto,são e sempre foram os grandes desafios da sociedade humana. “Utopias, projetos, valores constituem ingredientes fundadores da idéia de Educação”,palavra que “sempre teve seu significado associado à ação de conduzir a finalidades socialmente prefiguradas o que pressupõe a existência e a partilha de projetos coletivos”. (MACHADO, 2001, p. 69).Boaventura de Souza Santos propõe as seguintes reflexões para buscarmos respostas: -“como vejo a totalidade, a realidade social, o fenômeno social total?” -“o que eu sei da sociedade e o que espero que ela saiba?” -“quais são nossos horizontes de possibilidades?” “O que é verdadeiramente característico do tempo presente é que, pela primeira vez (...), a crise de regulação social corre de par com a crise de emancipação social” (SANTOS, 2000, p. 35). Juntam-se a essas reflexões as de Edgar Morin quanto à incerteza humana: “A condição humana está marcada por duas grandes incertezas: a incerteza cognitiva e a incerteza histórica.” (MORIN, 2001, p. 59). Mas,
dificilmente,a “prática pela
prática”apresentaránovas
maneiras e novas soluções para os novos desafios da educação
no Século XXI. Principalmente, enquanto visão para análise
das formas diversas que direcionam as propostas políticas de educação
envolvendo o ser humano e a sociedade que constituímos - construímos. Também, entre os desafios para a Escola e a Família, estão o“aprender a ser” e o“aprender a viver juntos”associando-se as noções de cidadania com as desociedade democrática nas quais seja imprescindível pensar no coletivo e no individual. A composição dessa articulaçãopossibilitaráàs pessoas refletirem sobre diferentesmaneiras de assumir responsabilidades e comprometimentos quanto ao destino da coletividade. Os adultos responsáveis pela Escola e pela Família,ao estudarem “aqueles autores que ainda falam para nós com uma voz que é considerada relevante”, mesmo à luz de novos imperativos,e ao produzirem análises inovadoras, fazem o sonho renascerencontrando novoscaminhos, para a
formação da personalidade madura [pois, esta] resulta tanto
do fortalecimento da autonomia pessoal como da construção
de uma alteridade solidária, ou seja, do processo de descoberta
do outro como atitude moral. A humanização concebida como
crescimento interior do indivíduo encontra seu pleno desenvolvimento
no ponto onde se encontram de modo permanente os caminhos da liberdade
e da responsabilidade. Os sistemas educativos são fonte, simultaneamente,
de capital humano(BECKER), capital cultural(BOURDIEU) e capital social(PUTNAM).
Das cinzas do homem lobo do homem – homo
homini lupus - pode nascer o
homem amigo do homem – homo
homini amicus - graças a uma educação pessoal e
social fiel à sua intencionalidade comunitária.A
tarefa é gigantesca e o mandato indeclinável visto que dele
depende a construção da nova ordem social no século
[XXI]. Mas é, sobretudo, pela formação para a justiça
que se pode reconstituir o núcleo de uma educação
moral das consciências que supõem uma cultura cívica
feita
de inconformismo e de recusa perante a injustiça e capacitem para
uma cidadania ativa em que a responsabilidade de intervenção
se substitua a uma mera cidadania por delegação. Na verdade,
é pela apropriação do sentido da justiça
abstrato ( eqüidade, igualdade de oportunidades, liberdade responsável,
respeito pelos outros, defesa dos mais fracos, apreço pela diferença)
que se criam as atitudes psicológicas que predispõem para
agir de maneira concreta pela justiça social em defesa dos valores
da democracia [grifo nosso](CARNEIRO,
2000, p. 222-223). Este pensamento, consolida-se com o de Eugenia Puebla, em seu livro “Educar com o coração”(1997, p. 21) que diz: “só sobreviveremos se aprendermos a elaborar um novo paradigma, no qual cooperar seja mais importante do que competir, a igualdade de oportunidades, uma realidade e não um mero enunciado, e em que construamos pontes de união entre os pensamentos e as ações, sem limitar-nos ao nosso relativo ponto de vista”.A pergunta se repete
e a questão continua:que
noções de saber e que formas de aprender são necessárias
para tal projeto?Como aprender e
ensinar a aceitação do outro para poder cooperar e aceitar
a cooperação? “Cada vez mais os fenômenos mais importantes
são simultaneamente econômicos, políticos e culturais.”
(SANTOS, 2000, p. 39).
O Estado do Brasil, através das suas novas
leis vai traçandonovos paradigmas.
A Escola e a Família vêem como primordialaplicá-las?
Como desenvolver teorias que privilegiem a abertura dos horizontes de possibilidades
e a criatividade da ação?
Este texto
não esgota o assunto, nem é esta sua intenção.
Mas, sim,levantar questões
pertinentes, em cuja busca de respostas e soluções, muito
há que se discutir nas salas de aula do Curso de Pedagogia em particular,
e, por que não, nos cursos de formação de professores
em geral. A procura deuma praxis
consciente,crítica econdizente
com o atual momento histórico e social de nosso país, repensada
sobre o terreno fértil dos “clássicos”,certamente
ajudará a olhar a realidade, a refletir sobre ela, a analisá-la.Partindo-se
daí talvez seja possível situar uma ação política
pedagógica que abra caminhos para o estabelecimento de fecundas
articulações entre a “Escola e a Família”.
Por
certo, os Fundamentos da Educação embasam os profissionais
da educação para “compreender por que as coisas são
como são e como vieram a se tornar assim; [para] tornar o familiar
estranho e o estranho familiar.” (CLIFFORD, 1981;CLIFFORDe
MARCUS, 1986; MCLAREN, 1987, apud GIROUX e SIMON, 1999, p. 99). Vemos,
a exemplo de GIROUX, (1999, p. 97) “a Pedagogia como um esforço
deliberado para influenciar os tipos e os processos de produção
de conhecimentos e identidades em meio a determinados conjuntos de relações
sociais e entre eles”. Necessitamos,
por conseguinte, de muitas discussões e reflexões teórico
– práticas que nos conduzam para uma formação do Pedagogo
da sociedade do conhecimento e da sociedade da consciência. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICACARNEIRO,
R. Educação e Comunidades Humanas Revivificadas: uma visão
da Escola socializadora no novo século. In: EDUCAÇÃO:
um tesouro a descobrir. - 4. ed. – São Paulo: Cortez; Brasília,
DF: MEC: UNESCO, 2000. “Relatório para a UNESCO da Comissão
Internacional sobre educação para o século XXI”.
CASTELLS,
M. O poder da Identidade; trad.Klauss
Brandini Gerhardt. - 2. ed. – São Paulo: Paz e Terra, 1999. (A era
da informação: economia, sociedade e cultura; v. 2).
FORQUIN,
J. Escola e Cultura: as bases sociais e epistemológicas do conhecimento
escolar. – trad. Guacira Lopes Louro. Porto Alegre: Artes Médicas,
1993.
GIDDENS,A.
Política,
Sociologia e Teoria Social: encontros com o pensamento social clássico
e contemporâneo; trad. Cibele Saliba Rizek.São
Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998. GIROUX,
H. A.; SIMON, R. Cultura Popular e Pedagogia crítica: a vida
cotidiana como base para o conhecimento curricular. In:
CURRÍCULO, CULTURA E SOCIEDADE (orgs.) Antonio Flávio Moreira
e Tomaz Tadeu da Silva.trad. Maria
Aparecida Baptista. 3. ed. – São Paulo: Cortez, 1999. GOMES
DA COSTA,A. C.; SAMPAIO OLIVEIRA
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à Educação. Capítulo 8. In: Pela Justiça
na Educação. (coord) de Afonso Armando Konzen ... [et al.].
Brasília: MEC: FUNDESCOLA, 2000. MACHADO,
N. J. Cidadania e Educação. - 3. ed. – São
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E. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Trad.
Eloá Jacobina. - 4. ed. – Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. PRÁTICAS
INTERDISCIPLINARES NA ESCOLA (coord)
Ivani Catarina Arantes Fazenda - 7. ed. – São Paulo: Cortez, 2001. PUEBLA,
E. – Educar com o coração: uma educação
que desenvolve a intuição; Trad. Patrícia
Caffarena Celani Chnee – São Paulo: Peirópolis, 1997. SANTOS,
B. S. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade.
- 7. ed. – São Paulo: Cortez, 2000.
[1]
MAYA ANGELOU. “On the Pulse of Morning”.
[2]
[Os autores deste textodenominam
“Fundamentos da Educação” um conjunto organizado de conhecimentos
de natureza intelectual,que trazem
em si uma “história construída por teóricos”, sendo
alguns deles amplamente pensados como “clássicos”. Ao refletir sobre
a cultura em sentido amplo, estudaros
fundadores da grande área do conhecimento – Educação
–, no curso dePedagogia, é
conhecer o processo epistemológico da produção do
conhecimento, principalmente nas ciências “humanas e sociais”.Poderanalisar
e explicar aqueles autores que ainda falam para nós com uma voz
que é considerada relevante, implica visualizaros
desafios das posturas transdisciplinares no contexto contemporâneo].
Exigeinterpretações
e reinterpretações “à luz de imperativos, modas e
mudanças nos acontecimentos. Wolin afirmou que a legitimação
dos fundadores “tem igualmente uma dimensão política e
de implementação política”. O
ato de fundar é uma “teorização política”,
precisamente porque os princípios inferidos a partir do trabalho
dos fundadores legitimam dimensões básicas da atividade intelectual”
[grifos do autor](GIDDENS, 1998,
p. 14).
[3]
“Entende-se por identidade a fonte de significado e experiência de
um povo”. (CASTELLS, 1999, p. 22)
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