Este trabalho trata do tema de educação, sociedade
e meio ambiente. O problema abordado busca refletir sobre a constituição
da educação ambiental como prática social na dimensão
da sustentabilidade e da cidadania no contexto brasileiro na última
década? Assim, coloca-se como objetivos conhecer e analisar os aspectos
constituidores da educação ambiental enquanto prática
social de sustentabilidade no âmbito da cidadania.
A reflexão em torno dessa temática, passa inicialmente por
considerar os elementos explicativos da relação sociedade/educação/meio
ambiente, no sentido da educação ambiental, da cidadania
e da sustentabilidade. Assim, nesse contexto de educação
o conteúdo educativo resulta da construção do conhecimento
da relação homem-natureza a partir de sua prática
social revestida por valores - históricos, políticos, sociais,
econômicos, éticos e culturais entre outras -, constituindo-se
como processo de aprendizado na dimensão da sustentabilidade individual
e coletiva.
A década de 70 marca o surgimento da educação ambiental
como tema a ser considerado e como objeto de estudo a ser desenvolvido.
Assim, como o conceito de meio ambiente, o conceito de educação
ambiental é caracterizado pela escassez de trabalhos que aprofundem
a compreensão dessa temática, em especial, no meio acadêmico.
Trabalhos como o de DIAS(1992), REIGOTA(1995) e SORRENTINO(1995) são
referências significativas, tendo em vista que contribuem para a
compreensão das determinações, num sentido amplo,
da educação ambiental. Estes estudos tratam de aspectos gerais
da educação ambiental, na medida que buscam analisar determinados
programas de educação ambiental formal ou institucional.
Destaca-se o enfoque de SORRENTINO(1995) ao classificar a educação
ambiental em quatro grandes correntes: conservacionista - presente nos
países mais desenvolvidos, no Brasil sua penetração
se dá a partir da atuação de entidades conservacionistas;
educação ao ar livre - adeptos de modalidades de esporte
e lazer junto à natureza, como: os antigos naturalistas, escoteiros
e participantes de grupos de espeleologia, caminhadas, montanhismo, acampamentos.
Na dimensão de educação ambiental inclui grupos de
“caminhadas ecológicas“ , “trilhas de interpretação
da natureza”, “turismo ecológico” e outros; gestão
ambiental - impulsionada no período militar, expressa-se pelos movimentos
contra a poluição das empresas e as conseqüências
do sistema predador do ambiente e do ser humano e pelos movimentos por
liberdades democráticas, com profundas raízes nos movimentos
sociais da América Latina; economia ecológica - baseada no
conceito do ecodesenvolvimento de Sachs. Ganhou impulso na metade
da década de 80 a partir do documento “Nosso Futuro Comum” (Comissão
Brundtland,1987); “Nossa própria agenda” (1989) e a “Estratégia
Mundial para a Conservação” - “ Cuidando do Planeta Terra”
(IUCN/PNUMA/WWF, 1980 e 1991) e com as diretrizes de atuação
dos bancos mundiais e documentos da FAO,UNESCO e outros órgãos
internacionais. Aglutinadora por um lado de empresários, governantes
e uma parcela das organizações não governamentais
e por outro lado daqueles que sempre estiveram na oposição
ao atual modelo de desenvolvimento e que acreditam que a primeira vertente
é só uma nova roupagem para a manutenção do
estado de coisas
Ainda, a educação
ambiental pode ser tratada a partir de dois enfoques. Primeiro, aquela
educação realizada por instituições e órgãos
públicos, através da formalização de programas
de educação ambiental. Nesse enfoque, também se considera
a educação ambiental realizada por organizações
não governamentais, através de ações ambientais
educativas, em que o aprendizado de conteúdo ambiental é
preestabelecido, constituindo-se como um curso ou programa de educação
ambiental.
O segundo enfoque
considera a abordagem de educação ambiental, enquanto educação
para a cidadania na dimensão ambiental, constituída a partir
do contexto das relações produzidas no bojo da sociedade
civil, diante do impacto gerado pela ação do poder público
e as decorrentes políticas públicas.
A educação
ambiental nesta abordagem considera a prática social como elemento
determinante do aprendizado autoconstruído no processo de participação.
O resultado deste aprendizado verifica-se na dimensão das relações
políticas, configurado pela qualidade da prática social;
pela qualidade das ações políticas produzidas; pela
qualidade da organização social, política e ambiental;
pela qualidade da participação social e política e
pelos resultados adquiridos e conquistados na luta pela cidadania. Trata-se
da educação ambiental como possibilidade de motivar e sensibilizar
o indivíduo a transformar as diferentes formas de participação
em fatores potenciais para dinamizar a sociedade e ampliar o controle social
sobre a coisa pública. Trata-se de construir uma nova proposta de
sociabilidade a partir da educação para a participação
e cidadania (ROSA, 1999).
ALGUNS PRESSUPOSTOS
Os paradigmas de análise
da problemática ambiental fornecem os subsídios explicativos
para se compreender a constituição da educação
ambiental no contexto de tais relações .
Os antecedentes históricos
caracterizam-se como um dos aspectos que contribuem para a compreensão
desta temática. Para CASCINO (2000, p. 36), em 1968, registrou-se
a primeira produção escrita relevante - “Os limites do Crescimento
Econômico” de Dennis L. Meadows - publicada pelo Clube de Roma. Esta
obra tratava de questões ambientais e limites para o desenvolvimento
humano, da relação entre consumo, reservas dos recursos naturais
e minerais e a capacidade e limites do planeta para suportar desgastes
decorrentes do crescimento populacional.
O estudo buscava examinar
a complexidade de problemas que afligiam os povos de todas as nações,
como: pobreza em meio a abundância, deteriorização
do meio ambiente, perda da confiança nas instituições,
expansão urbana descontrolada, insegurança de emprego, alienação
da juventude, rejeição de valores tradicionais, inflação
e outros transtornos econômicos e monetários.
Em 1970, outro
evento relevante foi o Congresso de Niza que tratava da temática
de interdisciplinaridade nas Universidades, cujos resultados foram publicados
em 1972 - Conferência de Estocolmo. Evidenciavam a crise ambiental
gerada em decorrência do crescimento econômico e populacional,
da mudança tecnológica, da exploração dos recursos
e da produção de substâncias contaminadoras(LEFF, 1999,
p. 113).
Em 1971,
marco importante foi o estudo - Manifesto para a Sobrevivência -,
publicado pela revista inglesa The Ecologist, tendo a adesão de
renomados cientistas da época.
Tais eventos
contribuíram para o processo de realização, em 1972,
da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente
Humano, em Estocolmo. Este evento é considerado como marco referencial
na trajetória da relação educação e
meio ambiente.
Em 1977, realiza-se a Conferência de Tbilisi, Geórgia. Esse
evento sendo marco significativo, estabeleceu referenciais conceituais
de meio ambiente, que passou a incorporar os aspectos oriundos das atividades
de âmbito social, econômica e cultural entre outras, ou seja,
considerou os aspectos decorrentes da ação do homem.
Já em 1987, a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
da ONU publicou o documento chamado Relatório Brundtland -“Nosso
Futuro Comum”. Estabelecia o conceito de desenvolvimento sustentável
como sendo aquele que, devia atender às necessidades do presente
sem comprometer as das gerações futuras, numa tentativa de
conciliar o desenvolvimento econômico com a preservação
ambiental
Nos anos 90, a questão do meio ambiente torna-se essencial nas discussões
internacionais, nas preocupações dos Estados – e, principalmente,
dos grandes centros mundiais de poder.
Em 1992, na cidade do Rio de Janeiro, foi realizada a Conferência
das Nações Unidas sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente a
ECO 92, reunindo representantes de 173 países e que, segundo SORRENTINO
(1995, p. 21), foram elaborados dois importantes documentos para a história
da Educação Ambiental: o “Tratado de Educação
Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global
e capítulo 36 da Agenda 21 que tratou do ‘Fomento da Educação,
Capacitação e Conscientização’” .
A partir da
década de 70, o movimento ecológico surge no Brasil, tendo
como influência as intensas manifestações, em torno
da questão ambiental, de forma mais global. O Brasil foi o país
da América Latina, onde esse movimento desenvolve-se mais cedo e
de maneira mais significativa. Tomaram corpo os movimentos ecológicos,
que questionavam o modelo de desenvolvimento dominante e, assim, surgindo
o “paradigma teórico da ecologia política”(VIOLA, 1987,
p. 68-80).
Nas últimas
duas décadas vêm se construindo um novo paradigma cientifico
nas ciências sociais, que considera os recursos naturais do planeta
como finitos e sujeitos a sérias degradações. Isso
significa estudar os processos sociais no contexto maior da biosfera, considerando-se
que as práticas humanas deliberadas afetam o meio ambiente, e têm
provocado efeitos negativos não previstos.
A compreensão
da trajetória de construção dos paradigmas analíticos
das questões ambientais, constituem-se em mais um dos aspectos explicativos
para a constituição da educação ambiental.
Neste sentido, destaca-se o movimento de transformação dos
paradigmas ao longo da história do homem e da sociedade, tendo como
ponto de partida o paradigma dominante do século XVI ao XVII –
paradigma da religião. Tal enfoque legitimou as relações
sociais e culturais européias, modificando-se o paradigma da nação,
baseado no princípio de que cada Rei impõe a sua nação,
chegando no paradigma econômico da sociedade atual, em que os interesses
do mercado globalizado, estão a serviço de um capitalismo
que se tornou um modo de produção globalizado.
SANTOS
(2001, p. 41) considera que “vivemos numa sociedade intervalar, uma sociedade
de transição paradigmática, vivendo simultaneamente
excessos de determinismos e excessos de indeterminismos”. Para o autor,
o paradigma da modernidade está baseado em dois modelos de conhecimento
que devem estar articulados e em equilíbrio dinâmico: o conhecimento
emancipação - a trajetória entre o colonialismo e
a solidariedade - e o conhecimento regulação - a trajetória
entre o caos e a ordem. A realização deste equilíbrio
dinâmico, entre os dois modelos, foi confiada às três
lógicas de racionalidade: a racionalidade moral-prática,
a racionalidade estético-expressiva, e a racionalidade cognitivo-instrumental.
Constata-se
que nos últimos duzentos anos a racionalidade cognitivo-instrumental
da ciência e da tecnologia predominou sobre às demais.
Com isto, o conhecimento-regulação conquistou a primazia
sobre o conhecimento-emancipação: a ordem transformou-se
na forma hegemônica de saber e o caos
na forma hegemônica de ignorância.
Este desequilíbrio a favor do conhecimento-regulação
permitiu a este ultimo recodificar o conhecimento-emancipação(SANTOS,
2001, p. 79).
A forma de uso predatório da natureza pelo homem não é
recente. Para VIOLA “o que é novo na história humana é
a escala dos instrumentos de predação, cujo símbolo
máximo são as armas nucleares”. (1987, p. 67). Exemplo significativo
foi a explosão da bomba atômica em Hiroshima-Nagasaki, sendo
marco de referência da crise ambiental mundial, ao colocar a humanidade
frente à sua capacidade de auto-destruição.
A esse respeito, LEFF(2001) afirma que, a problemática ambiental
é de caráter iminentemente social, gerada e atravessada por
processos sociais surgidos nas ultimas décadas do século
XX - como uma “crise de civilização” -, questionando a racionalidade
econômica e tecnológica dominantes.
Segundo o autor, esta crise tem sido explicada a partir de diversas
perspectivas ideológicas: por um lado, percebida como resultado
da pressão exercida pelo crescimento populacional sobre os recursos
do planeta e por outro, entendida como resultante da acumulação
de capital e maximização da taxa de juro a curto prazo “que
induzem a padrões tecnológicos de uso e ritmos de exploração
da natureza, bem como formas de consumo, que vêm esgotando as reservas
de recursos naturais, degradando a fertilidade dos solos e afetando as
condições de regeneração dos ecossistemas naturais”
(LEFF, 2001, p.59).
A resolução
dos problemas ambientais, de acordo com LEFF, deve considerar a “possibilidade
de incorporar condições ecológicas e bases de sustentabilidade
aos processos econômicos – de internalizar as externalidades ambientais
na racionalidade econômica e os mecanismos de mercado – e construir
uma racionalidade ambiental e um estilo alternativo de desenvolvimento,
implica a ativação e objetivação de um conjunto
de processos sociais”(LEFF, 2001, p. 111).
Neste
enfoque de meio ambiente a partir da noção de sustentabilidade,
considera-se HOGAN, ao afirmar da necessária inter-relação
entre a capacidade de suporte criada através da luta pela ampla
garantia de qualidade de vida autoconstruída, buscando assegurar
o equilíbrio ambiental do meio urbano, almejando a conquista da
justiça social no atual quadro institucional de capitalismo de mercado(HOGAN:
in CEDEC, 1993, p. 58-70).
Assim, a noção de sustentabilidade implica em considerar
o desenvolvimento sustentável ou economia da sustentabilidade, envolvendo
o conceito econômico global, em que a economia como ciência
estuda e pesquisa o homem em sociedade na busca pela satisfação
de suas ilimitadas necessidades. Sendo as necessidades ilimitadas, o conflito
se estabelece diante da lei da escassez dos bens ofertados pela natureza
na sua condição de limitados e finitos(PINHO;VASCONCELOS,
2001, p.12-13). Portanto, a utilização racional destes recursos
coloca-se como condição vital para a sustentabilidade da
espécie humana, evitando que a natureza e o homem entrem em vias
de colisão.
Conclui-se
que, a noção de economia da sustentabilidade pode parecer
como mais uma adição ao rol de termos inacessíveis
aos leigos; como a expressão do modismo desencadeado pela
ênfase sobre o “verde” e ainda, como uma inovação vocabular.
Talvez
ela seja tudo isso, mas seu sentido é claro “trata-se de uma preocupação
justificada com o processo econômico na sua perspectiva de fenômeno
de dimensão irrecorrivelmente ecológica sujeita a condicionamentos
ditadas pelas leis fixas da natureza, da biosfera” ( CAVALCANTI, 1994,
p.17).
Assim, o debate sobre tais questões no âmbito da pedagogia,
busca subsidiar a compreensão da temática de educação
ambiental, na medida que a educação ambiental esta inserida
como conteúdo curricular no contexto dos temas transversais no Parâmetros
Curriculares Nacionais – PCNs, sendo, portanto, um desafio pedagógico
significativo a ser considerado na gestão da educação.
Bibliografia Recomendada
CASCINO, F.. Educação Ambiental. São Paulo:
Senac,1999.
CAVALCANTI, C.. Desenvolvimento e Natureza. Estudos para uma sociedade
sustentável. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2001.
DIAS, G. F.. Educação Ambiental – princípios
e práticas. São Paulo: Gaia, 1992.
LEFF,E.. Epistemologia ambiental. São Paulo: Cortez,
2001.
______. Educação Ambiental e desenvolvimento Sustentável
. in: REIGOTA, M. (org). Verde Cotidiano e o meio ambiente em discussão.
São Paulo: DP e A, 1999.
PINHO, D. B..; VASCONCELOS, M. A. S..(Org.). Manual de Economia.
São Paulo: Saraiva, 2001
REIGOTA, M.. Verde Cotidiano e o Meio Ambiente em Discussão.
São Paulo: DP e A, 1999.
ROSA, M.A.. Curitiba: um estudo sobre a prática educativa
de sustentabilidade – o caso da Vila Sagrada família. Tese de Doutoramento
em História e Filosofia da Educação da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo,1999.
SANTOS, B. de S.. A transição Paragmática da
regulação á Emancipação. Porto:
Oficina do Centro de Estudos Sociais, 1979.
SORRENTINO,M. Educação Ambiental e Universidade: um
estudo de caso.Tese de Doutorado,Programa de Pós-Graduação
em Educação (Área de Concentração:Didática)
da Faculdade de Educação da USP, São Paulo, 1995.
VIOLA,E. O movimento ecológico no Brasil (1974 –1986).
In: PÁDUA, J.A.. (Org.). Ecologia e Política no Brasil. Rio
de Janeiro: Espaço e Tempo( IUPERJ), 1987.
_____________________
* Professora do PPG-Ed – Mestrado
em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná. Doutora
em Educação pela
PUC- São Paulo. Curitiba pinheiral@uol.com.br
** Mestrando do PPG
– Ed - Mestrado em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná
e Diretor da Faculdade da Lapa/PR
*** Mestranda - Mestrado
em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná. Bolsista
da CAPES. Curitiba/Paraná.
regina.bergamaschi@acad.utp.br
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