Livro Virtual



 Pedagogia em Debate:
Desafios contemporâneos



Evelcy Monteiro Machado 
Iolanda Bueno de Camargo Cortelazzo
(Organizadoras)




UTP
Curitiba PR
2003
 




Ficha Técnica


Organização
 Evelcy Monteiro Machado e
Iolanda Bueno de Camargo Cortelazzo

Edição Técnica
  Iolanda Bueno de Camargo Cortelazzo
e Evelcy Monteiro Machado

Livro Digital

Meio de Publicação: digital  página
http://www.utp.br/mestradoemeducacao/peddc.html
Disponibilizado em  novembro de 2003






Catalogação na fonte:
Biblioteca “Sydnei Antonio Rangel Santos”
Universidade Tuiuti do Paraná


ficha catalográfica

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SUMÁRIO



Ficha Técnica

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Apresentação

04
rochacar@milenio.com.br Carlos Alves Rocha As novas tecnologias na formação do pedagogo: contingência de uma nova era ou modismo?
05
dani_lisboa222@hotmail.com Daniella Lisboa Alfabetização de Jovens e Adultos através de software: um estudo do Projeto Luz das Letras
22
emonteiro@onda.com.br  Evelcy Monteiro Machado e
iolanda@boaaula.com.br  
Iolanda B. C. Cortelazzo
Formação Continuada da Educação Superior: desafios do Livro Virtual
34
emonteiro@onda.com.br  Evelcy Monteiro Machado  e
laricuritiba@onda.com.br  
Larissa Monteiro Machado
Gestão Educacional: discutindo inveja nas organizações
48
prof.fabiana@cursopromaster.com.br  Fabiana Andrea Barbosa  Formação de professores: uma história de descaso e dificuldades
61
gilmar.dias@utp.br Gilmar Dias          A dimensão política do projeto político-pedagógico: rumo à autonomia política e pedagógica da escola pública
74
iolanda@boaaula.com.br  Iolanda B. C. Cortelazzo Formação de Professores em Didática para a Educação a Distância na Educação Superior
86
joelma.estevam@utp.br Joelma Zambão Estevam  e
joselia.salome@utp.br
Josélia Schwanka Salomé      
O ensino da arte e a superação do apartheid cultural
97
josigonsantos@bol.com.br Josiane  Gonçalves Santos          Ciclos de Aprendizagem: As duas faces da política educacional municipal
107
josimoat@ig.com.br Josimary Morastoni
marleimalinoski@hotmail.com  
Marlei  G. da Silva Malinoski 
Do projeto político pedagógico para um projeto político e pedagógico: um contrato entre gestores, professores e aluno
117
marciadipalma@yahoo.com.br  Márcia Silva Di Palma             O Uso das Tecnologias da Informação e da Comunicação na Formação Inicial do Pedagogo
128
masouza@uol.com.br Maria Antonia de Souza   Pedagogia e Pesquisa: experiências e inquietações
138
gilmar.dias@utp.br Maria Auxiliadora Cavazotti  Alfabetização: Da Cartilha de Comênio ao letramento
151
gilmar.dias@utp.br  Maria de Lourdes  de Almeida Universidade Pública e Iniciativa Privada: uma discussão para além do Mercado
159
mleticiavianna@zipmail.com.br Maria Leticia Vianna Que cores as crianças usam em seus desenhos, quando e por quê? um estudo teórico-prático-poético da teoria Luquet
171
mcort@ig.com.br Maristela Sobral Cortinhas  Inclusão/Exclusão na Infância
207
paulop@copel.com Paulo Roberto Neves Pereira A reeducação do adulto no trabalho
222
mavil2@uol.com.br Vilma Fernandes Neves        Aprender, ensinar segundo os fundamentos pedagógicos dos Parâmetros Curriculares Nacionais: uma proposta aplicável?
244


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APRESENTAÇÃO
    Os trabalhos que compõe o livro Pedagogia em Debate: desafios contemporâneos, resultam do ciclo de palestras do programa permanente de extensão IV Pedagogia em debate, desenvolvido na Universidade Tuiuti do Paraná, desde 2000, em uma promoção conjunta do Programa de Pós-Graduação, Mestrado em Educação, e do Curso de Pedagogia.
    O evento organizado em 2003, concomitante com a Semana de Pedagogia da UTP, integra pesquisadores, docentes e discentes da graduação com os alunos da Pós-Graduação, além de ser aberto à comunidade com interesses afins.
    Nesta quarta edição o evento avançou no sentido de extensão à comunidade sendo significativo o aumento da participação externa tanto de palestrantes como de ouvintes.
   Consolidando a experiência bem sucedida da divulgação do evento ocorrido em 2002, por meio do livro virtual intitulado “Pedagogia em Debate”, nesta edição são publicados trabalhos apresentados e debatidos, cujos resumos e textos completos foram encaminhados para divulgação. Permanece como desafio em relação ao evento e ao livro virtual, superar  barreiras dos participantes em relação ao registro escrito de suas palestras.
  O livro virtual Pedagogia em Debate: Desafios Contemporâneos disponibiliza resumos e textos completos apresentados no evento, acrescidos de uma bibliografia sobre cada tema, sugerida pelos autores das palestras.
   Os textos estão organizados em dois eixos atendendo as linhas de Pesquisa do programa de Pós-Graduação, Mestrado em educação da UTP: Políticas Públicas e Gestão da Educação e, Práticas Pedagógicas e Elementos Articuladores.
    Espera-se que o livro virtual contribua como um novo recurso de pesquisa e como um referencial para as permanentes discussões sobre a Pedagogia.
Evelcy Monteiro Machado
Iolanda Bueno Camargo Cortelazzo
(organizadoras)


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AS NOVAS TECNOLOGIAS NA FORMAÇÃO DO PEDAGOGO:
CONTINGÊNCIA DE UMA ÉPOCA OU MODISMO?


Carlos Alves Rocha   *
Universidade Tuiuti do Paraná
Usar as tecnologias da informação e da comunicação (TIC) em cursos de formação de professores, principalmente na formação de pedagogos, parece ser uma conseqüência natural daquilo que se vive hoje na sociedade. O contexto social apresenta uma variedade de possibilidades tecnológicas, que leva as pessoas a modificarem constantemente os seus conceitos, tendo em vista a velocidade em que se dão as mudanças. O presente artigo pretende apresentar elementos para uma discussão sobre o papel dessas tecnologias na formação do pedagogo, mostrando a importância que elas têm em participar desse processo, não somente na perspectiva da preparação profissional, mas também em vista da incorporação das mesmas no seu dia-a-dia e em suas lides pedagógicas. A sociedade já utiliza com facilidade e familiaridade os mais variados equipamentos tecnológicos, mostrando que este uso já é feito por pessoas em idades as mais tenras. O avanço tecnológico tem feito com que a sociedade dê grandes saltos em muitas direções, fazendo com que ela tenha na informação e no conhecimento os seus elementos articuladores, diferenciadores e agregadores de valor. Os mesmos se tornaram pontos relevantes que sustentam qualquer discussão, principalmente aquelas ligadas à educação. Em tal trabalho apresenta-se algumas posições a respeito do assunto, na tentativa de mostrar o que pensam alguns autores sobre essas tecnologias na formação do pedagogo. Alguns advogam irrestritamente o uso, outros fazem algumas restrições, mas todos demonstram que nenhum processo de formação de professores pode prescindir de tais componentes. O que não se concebe é que os profissionais envolvidos em tais processos desconheçam a utilidade e as possibilidades de tais ferramentas em qualquer atividade educacional. Pretende-se mostrar que o uso das TIC não é só um modismo que se acompanha, nem uma contingência da sociedade ou do mercado, mas um meio eficiente, e quiçá eficaz, de se fazer educação.

Palavras-chave: comunicação, educação, informação, tecnologia.
    As Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC), também chamadas de Novas Tecnologias, têm hoje um papel preponderante em todos os ramos de atividades. Elas possuem normas, sistematização e arcabouço teórico que as tornam específicas no meio técnico e acadêmico, mas, por sua natureza, têm uma constituição eminentemente interdisciplinar.
Este caráter dá a elas muitas possibilidades de interações e as fazem cúmplices dos mais variados processos de formação humanística, social e profissional, que, no dizer de WINCK, ao se referir sobre a interdisciplinaridade como um método “próprio da natureza da comunicação e, neste caso, especificamente, da comunicação eletrônica, é a alternativa para a formação de profissionais de comunicação capazes de compreender os processos técnicos, ideológicos e estéticos da mídia, que possam não só reproduzir com novos conteúdos, mas também produzir novas formas”. (WINCK, 1999, p. 103)
    Esta afirmação se dá num contexto de cursos de Comunicação, mas pode muito bem ser ampliada para a formação de pedagogos, uma vez que estes também são profissionais que têm na comunicação um dos veículos de sua prática profissional. Ao mesmo tempo, as TIC são instrumentos de comunicação versáteis, gozando, portanto, do caráter interdisciplinar abordado pelo autor anteriormente citado.
    Na formação do profissional da pedagogia essa compreensão dos processos técnicos, ideológicos e estéticos da mídia se faz necessária, tendo em vista a amplitude de sua área de atuação, que vai da docência à gestão educacional em vários níveis. Neste âmbito de atuação ele lida com pessoas oriundas de diversos meios e que têm os mais variados interesses, sofrendo influências significativas de outros agentes formadores. Isto se dá porque o grande avanço das tecnologias de informação e comunicação tem propiciado o surgimento de ambientes os mais variados para a prática educacional e formativa.
    Os elementos que buscam hoje o espaço formativo da escola trazem uma bagagem de informações e conhecimentos que não pode ser desprezada por qualquer pessoa responsável por sua formação profissional. As várias mídias complementam, ou até substituem, a necessidade informacional e comunicativa dos formandos em suas atividades de estudos e pesquisas, que muitas vezes o ambiente escolar, carente de recursos ou ineficiente no seu uso, não pode atender.
“O uso de produtos da mídia como material pedagógico em sala de aula é tema da moda nos círculos da educação e da comunicação”. (BARROS FILHO, 1999, p. 09) Isto é uma verdade quando se vê alguns profissionais da educação usando tais recursos sem nenhum critério de escolha, desconhecendo totalmente as potencialidades dos instrumentos, subutilizando-os e fazendo deles apenas um recurso a mais que é usado para atender a interesses comerciais e outros diferentes dos fins pedagógicos.
    As muitas pressões desses interesses podem fazer com que as TIC sejam um modismo na educação, mas não se pode perder de vista que o grande desenvolvimento tecnológico tem levado muitos ramos de atividades profissionais a utilizar tais recursos, de forma a favorecer os seus crescimentos e sucessos. Quanto a isso, considera-se o seguinte:
   As profundas transformações ocorridas no mundo no último quarto de século tiveram tal abrangência e intensidade que afetaram praticamente todos os segmentos da vida, desde as organizações e reorganizações dos modelos de gerenciamento dos Estados nacionais, passando pelo desenvolvimento tecnológico e indo às fronteiras das novas indagações éticas trazidas à luz pela possibilidade da clonagem humana (CITELLI, 2000, p. 18).
    Este dinamismo social obriga a todos constantemente reverem os seus posicionamentos reformulando conceitos e atitudes, pois o momento presente que tem a informação e o conhecimento como elementos que o identificam, “possui alcance transterritorial, capacidade de redução do tempo de tráfego das ocorrências, permanência e imaterialidade”. (CITELLI, 2000, p. 19)
    Vê-se, com isso, que as noções de espaço e tempo até então restritas a ambientes físicos realmente palpáveis, têm que se estender a um mundo virtual em que a imaterialidade é a tônica. Isto faz com que as possibilidades de se estabelecer relações significativas de comunicação e fluxo das informações sejam ampliadas, mostrando mundos novos que apresentam um novo tipo de convivência. Estes mundos têm na informação e no conhecimento os seus elementos articuladores, diferenciadores e agregadores de valor que fazem com que os mais variados produtos tecnológicos que emergem deles sejam instrumentos por demais visados e valorizados na sociedade atual.
    Qualquer curso de formação de professores ou de outro profissional da educação não pode descuidar disso, sob pena de ficar alijado de um movimento social que avança em todos os sentidos e envolve a todos. Mesmo porque a escola, como um sistema que mantém relações com vários setores do ambiente que a circunscreve, não vive isolada prescindindo da participação de pessoas de outros meios. Ela não é uma instituição absoluta, que está acima de tudo e de todos e que pode ditar as suas regras sem contextualizá-las. As pessoas que a constituem sofrem as mais variadas influências, principalmente dos meios de comunicação, fazendo com que elas levem para a escola aquilo que vivenciam.
O uso de material informativo de jornal, revista ou mesmo televisão visa trazer para a sala de aula um conjunto de temas que pertencem à agenda pública de discussão social, atribuindo, assim, um fim pedagógico ao efeito agenda setting”  (BARROS FILHO, 1999, p. 10) De acordo com tal pensamento, há entre as pessoas o hábito de usar o que a mídia veicula como tema em suas conversas, não sem antes colocar as suas subjetividades fazendo comentários que levam as suas contribuições (BARROS FILHO, 1999).   
    Este é um fato que se constata no dia-a-dia. A influência dos meios de comunicação, em especial a televisão, que ditam normas de comportamento e alimentam o público com informações as mais variadas, é responsável em alguns aspectos pela formação de pessoas ou grupos sociais. Muitos têm em certos veículos sua única ou mais acessível fonte de informação, fazendo com que assumam como verdade a ser vivida aquilo que ouvem e vêem. Neste ponto a televisão se destaca, pois é dos meios a que mais penetração tem nas famílias. As estatísticas e muitos trabalhos estão aí para mostrar isso.
    Como ignorar este fato? Como não considerar isto nos cursos de formação de pedagogos? Olhando por este prisma se têm a nítida certeza que as TIC já adentraram a escola à revelia de qualquer um: defensores ou combatentes. A rápida ascensão tecnológica do rádio, da televisão, do cinema, da imprensa escrita e dos computadores trouxe uma série de inovações e problemas que atinge a todos na sociedade. Alunos e professores não estão livres deste assédio, pelo contrário, tomam conhecimento e participam de uma variedade de situações que os envolve, nutre e transforma sem nenhuma análise criteriosa e seletiva daquilo que deve ou não deve ser utilizado. Muitas vezes passivamente deixam-se influenciar pelos que ditam normas de comportamento, modas e outros interesses, passando a consumir produtos e  processos que lhes modificam a vida.
    Nesta discussão apresenta-se pontos importantes do uso das mídias que devem ser compreendidos pelos formadores em cursos de formação de pedagogos, de tal forma a perceber como é possível fazer das várias mídias cúmplices úteis em seu trabalho. Esta compreensão deve levar ao fim último de fazer com que os formandos, ao mergulharem em seus espaços profissionais, possam ter na reflexão um forte aliado de suas metodologias de trabalho, percebendo sempre as influências das TIC na escola e os benefícios educacionais que podem tirar disto.

LINGUAGENS E MEIOS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NA ESCOLA

        Analisando o papel das TIC na escola, inicialmente é necessário compreender os processos técnicos, ideológicos e estéticos da mídia, de forma a integrá-las à educação não como um fenômeno em si que tem um papel independente, mas como uma ferramenta que pode melhorar o processo ensino-aprendizagem. Neste sentido se faz necessário conhecer o funcionamento e as implicações dos vários meios de informação e comunicação que chegam à escola.
        “No mundo marcado pela aceleração tecnológica e pelas crescentes influências do rádio, da televisão, da imprensa escrita e das redes de computadores, as formas de aprender e sentir se modificaram, trazendo consigo alguns mitos da salvação e mazelas correspondentes”. (CITELLI, 2000, p. 20) Este fenômeno atinge a todas as instituições, mas a percepção desta realidade não acompanha o fluxo intermitente e constante com que as mídias fazem os seus produtos e os lançam no mercado.
        Muitos organismos tentam reagir e descobrir o que fazer, combatendo aquilo que lhes parece pernicioso e se apropriando do que lhe é saudável. Assim vê-se o mercado financeiro reagindo às oscilações dos índices divulgados pelos meios telemáticos, a Igreja desejando impedir o que a mídia apresenta como liberação dos costumes, o Estado culpando outros pela improbidade administrativa, o congressista e outros setores querendo censurar a imprensa. Todos os que se sentem atingidos pelo o que a mídia veicula reagem a seu modo. E a escola? (CITELLI, 2000)
    Percebe-se claramente o desencontro entre o discurso didático-pedagógico estrito e as linguagens institucionalmente não-escolares. Por tal categoria entenda-se a existência de uma pluralidade de signos e códigos que podem abranger desde anúncios publicitários, canções de sucesso, programas televisivos, até videogames e navegações pela internet.
    O discurso pedagógico, ocupado com as ações processadas na sala de aula, constitui a natureza “única e diferenciada” da retórica escolar. As outras linguagens pressionam a partir “de fora”, existem na fala dos alunos e nas conversas dos professores, circulam entre as salas de aula, nos espaços de reunião, nos corredores, no pátio, têm existência “subterrânea”. (CITELLI, 2000, p. 21)
      Isto está muito presente hoje. A escola não pode descartar esta vida “subterrânea” que a pressiona. É importante descobrir e conhecer no seu meio as implicações da influência das várias linguagens não-escolares que alunos e professores vivenciam. Não para execrá-las, pois é reconhecido o papel da mídia como mediadora do processo educacional formal e informal, mas torná-las participantes ativas e efetivas de uma educação exigida pelo tempo atual.
    Sabe-se da dificuldade em conhecer as linguagens e recursos tecnológicos, devido as limitações porque passa a escola em relação ao assunto. Visto não lhes ser familiar os sistemas e processos tecnológicos, os meios educacionais não se sentem confortáveis e seguros em empregá-los. Juntam-se a isso “as carências estruturais da escola brasileira”, que dificulta cada vez mais a superação de tal déficit conceitual, afastando os educadores dos meios de comunicação. (CITELLI, 2000)
       Esta é uma necessidade que alunos e professores têm que assumir: superar tal déficit. Para auxiliar no encaminhamento de tal discussão, levanta-se a seguir algumas considerações sobre algumas mídias e suas linguagens.

A LINGUAGEM DA TELEVISÃO E DO CINEMA

    A televisão é um dos veículos que tem ampla penetração nas famílias e nos meios educacionais. O trabalho de CITELLI (2000) traz estatísticas sobre o assunto e serve de fonte para esta afirmação.
        Este veículo possui uma linguagem formada por signos provenientes das imagens com tudo que lhes é próprio, como cor, posicionamento dos personagens e componentes do cenário, ambientação contextual, etc., que transmitem por si só alguma mensagem aos telespectadores. Acrescente a isso aquilo que é transmitido pelo plano verbal através dos diálogos, como também os sons que acompanham momentos do enredo ou da transmissão, que dá algumas ênfases que levam a quem assiste às mais variadas interpretações, vivenciando, assim, aquilo que foi planejado para ser evidenciado. Os desenhos e outras formas de apresentação do conteúdo televisivo também, a seus modos, obedecem a um ritual característico da televisão, seguindo algumas normas instituídas pelo meio que, velada ou declaradamente, servem a propósitos os mais variados e discutíveis.
        É por demais reconhecido o papel social que a televisão desempenha. Este fenômeno não é percebido muitas vezes pela escola, pois o uso que se tem visto deste meio de informação e comunicação é apenas para cumprir “determinadas funções simbólicas e ideológicas. Perde-se, neste movimento, a perspectiva da totalidade significante em suas passagens do estético ao ideológico, por exemplo” (CITELLI, 2000, p. 24). Isto acarreta a perda dos significados, pois os sentidos são atraídos mais para “as imagens pasteurizadas que alcançam o mesmo efeito encantatório do mágico diante das platéias infantis”. (CITELLI, 2000, p. 24)
       Aqui está o que se pode dizer como competência da televisão: ela dá às imagens uma importância primordial, ou seja, elas são os atrativos, aquilo em que os profissionais desta mídia centram as suas atenções para criar formas de prender o espectador diante deste instrumento.
São muitos os motivos que levam uma pessoa a estar na frente de um aparelho de televisão para assistir o que está sendo veiculado. Conforme FISCHER,

Ver e olhar, de um modo geral, ou especificamente estar diante da TV, olhar suas imagens pode significar uma série muito ampla de ações e objetivos: posso olhar para obter conhecimento, para ter notícia de alguma coisa, para observar como algo acontece, para reproduzir ou imitar um gesto ou simplesmente para me distrair com o que vejo. Esse ato pode relacionar-se ao fato de que se joga luz sobre algo ou sobre uma pessoa, que passam a ser por nós “vistos” (FISCHER, 2003, p. 55)

       Conscientes dos vários interesses dos telespectadores, os profissionais da televisão procuram manter uma programação que atenda a todos os gostos. No entanto, o foco de suas ações passa para a imagem buscando mostrar aquilo que prende a atenção do telespectador: um tipo de fato que dá audiência ou de pessoa que é destaque. Muitas vezes os fatos e as pessoas são criados para este fim, pois existe uma série de programas que mostram tipos de belezas, acontecimentos ou pessoas bizarros, tudo para prender pessoas diante da TV. Certas coisas existem mesmo, mas é dada uma ênfase desnecessária simplesmente para aumentar os índices de audiência. “O espectador de cinema ou de televisão passeia ingênuo e desarmado, buscando seu prazer em meio a um mercado que não é nem ingênuo, nem desarmado. E é bom que se diga desde logo que o cinema e a televisão não são meios democráticos como a sua intensa difusão popular parece mostrar” (ALMEIDA, 2001, p. 23). Por trás das suas realizações estão máquinas poderosas que atendem a interesses de pequenos grupos, que intencionalmente produzem aquilo que é para tratar outros grupos como uma massa controlável e consumidora. Que democracia é esta?
O cinema e a televisão [...] são indústrias grandes, com divisão e hierarquização de trabalho, poder, e interesses de mercado e de política social, que produzem para o consumo geral, como muitas outras. [...] Você pode pagar cinema, ver cinema, gostar, desgostar, porém dificilmente poderá produzí-lo (ALMEIDA, 2001, p. 24).
        Esta inacessibilidade provoca nas pessoas um tipo de relacionamento que as faz aceitar e sucumbir aos interesses dos produtores e diretores das mídias televisivas e cinematográficas.
Diferente de qualquer produto que você pode pegar e levar para trocar na loja ou na fábrica, a indústria de histórias-em-imagens é, em termos político-industriais, a mais aperfeiçoada na relação distância-consumidor (ALMEIDA, 2001, p. 25).
        Nela, a definição do que produzir, não é um processo democrático, porque torna a pessoa que busca estes tipos de mídia em receptor passivo daquilo que ela não contribuiu em nada para a sua realização. Os espaços possíveis para a sua crítica não são tão acessíveis, restando à escola vivenciar e possibilitar ao cidadão/formando, pelo menos ela, estes ambientes em que sua argumentação, fruto de uma reflexão consciente e fundamentada, é considerada e serve como estratégia de avaliação para a escolha daquilo que se deve ver e aceitar como um instrumento educativo e formativo.
         Resslte-se neste mundo de imagens que o cinema e a televisão fazem “produtos que buscam a necessidade/desejo de ouvir/dizer histórias, histórias faladas, contadas para serem ouvidas. É esta sua força. O cinema e a televisão têm sua origem na fala, na oralidade, na corporalidade da voz e do corpo, da natureza, da imagem do mundo”. (ALMEIDA, 2001, p. 26) O que é visto e ouvido é tido como real e faz com que as pessoas assimilem e assumam como passíveis de serem executadas. Isto é conhecido pelos que fazem televisão e cinema, pois buscam tornar o mais real possível aquilo que veiculam para fazer com que sejam aceitos. Só que as conseqüências para muitos é tornar tudo o que vêem e ouvem como verdade a ser seguida.
        Para reforçar esta idéia vale destacar o seguinte:

A sociedade moderna, apesar de muitas vezes parecer o contrário, é uma sociedade oral. A leitura e a escrita nesse tipo de sociedade são, como tendência, mais operativas e funcionais, não têm como objetivos a reflexão e a criação, mas a instrução e o cumprimento de diretrizes. Uma sociedade oral é estranha à literatura e à poesia escritas, às histórias escritas, mas não à história e mitos. As histórias-em-imagens filmadas são um prolongamento e um acréscimo visual das histórias faladas. Uma sociedade oral tem no ouvir incessante e no olhar exterior a fonte única de informações, valores, conhecimentos, comportamentos a serem imitados. (ALMEIDA, 2001, p. 27)

    Ter na fala e na imagem sua fonte única de “informações, valores, conhecimentos, comportamentos a serem imitados” faz com que as pessoas desconheçam e vivenciem uma variedade de possibilidades que poderiam enriquecer suas vidas em muitos sentidos. Desta forma elas passam a descartar uma série de meios e objetos que poderiam dar a elas uma acessibilidade maior a dados, informações e conhecimentos que melhorariam o seu estado de vida educacional, política e socialmente. Deixam de usufruir alguns aspectos da cultura que não lhes são acessíveis por uma série de barreiras.
        Tal proceder é do conhecimento de alguns que, tendo o controle de meios que podem barrar o acesso de muitos para aquilo que interessa a um pequeno grupo, passam a usar de mecanismos de massificação de grupos sociais para que esse estado não seja alterado em benefício de poucos. Alguns trabalhos têm mostrado que isto ocorre nos meios de comunicação e informação e que deve ser uma preocupação da escola em tentar desvendar essas mazelas, dando a alunos e professores possibilidades de superar tal quadro, que tanto prejuízo traz às suas formações.

OUTRAS LINGUAGENS NÃO-ESCOLARES

        Não somente a televisão e o cinema têm espaço na escola, mas outras mídias também chegam a influenciar o ambiente educacional. Neste sentido outras duas são consideradas neste trabalho: a propaganda e a informática e seus recursos.
A linguagem da propaganda é essencialmente persuasiva, pois sua finalidade é vender imagens, serviços, idéias etc. A articulação dos recursos visuais, verbais, sonoros e técnicos construirá uma rede de significações cujo efeito produzido na recepção poderá ser de caráter consumista ou ideológico (NAGAMINI, 2000, p. 42).
       Como todo aquele que vê a propaganda é um comprador em potencial, a propaganda procura ser a mediadora entre o produto e o consumidor, apresentando uma simbologia nas imagens que sugere felicidade e igualdade, de forma a criar no indivíduo uma necessidade que o leva a consumir. (NAGAMINI, 2000)
        Esta forma de vender um produto atrai o consumidor, principalmente quando os veículos usam de estratégias que envolvem intensamente a pessoa. Ela, quando menos percebe, passa a usar jargões, idéias, produtos que, muitas vezes, chegou a rejeitar enfaticamente em outros momentos.
A função da publicidade é impulsionar a circulação de objetos por meio da construção da imagem do produto e da marca, de acordo com o sistema de valores presente na sociedade; mais do que discurso sobre o objeto, o texto publicitário projeta sonhos e desejos que se realizam nas imagens ‘virtuais’ (NAGAMINI, 2000, p. 43).
        Esta leitura não pode ser deixada de lado, pois é necessário ter senso crítico suficiente para perceber o que se deve ou não comprar. Isto deve ocorrer num clima de responsabilidade, liberdade e limites que conscientemente o ser humano deve viver, sem pressões quaisquer que sejam elas, a fim de garantir à pessoa o direito de tomar as suas próprias decisões.
As instituições publicitárias são muito competentes naquilo que fazem, pois muitas vezes se tem notícias do peso que certas propagandas têm na venda de determinados produtos. Há uma eficiente especialização nas funções deste meio, que faz com que as peças publicitárias tenham destino certo em relação ao público que deve atingir. Há muitos interesses em jogo, não sendo ele muito democrático, pois muitas vezes impõe o que deve ser consumido baseado nas normas e critérios de um pequeno grupo que assim quis.
        No mesmo caminho transitam os instrumentos de informática e seus recursos. As tecnologias desta área também atendem a interesses subentendidos. Nenhuma instituição educacional pode descartar os momentos prévios de reflexão, análise e planejamento sobre o uso dessa tecnologia, submetendo-a ao plano pedagógico da escola, antes de qualquer iniciativa para levar a informática para a educação. Sabe-se da grande pressão que emana da sociedade e de planos governamentais para a inserção de computadores na educação, sendo este o principal motivo para que a escola tome cuidados, não colocando esses equipamentos no processo ensino-aprendizagem sem conhecer suas reais possibilidades.
        A informática traz para a educação um mundo virtual cheio de significações. Sua linguagem invade o mundo real criando neste uma quantidade de símbolos que passam a ser compreendidos apenas por quem vivencia este mundo. É uma situação que não merece mais o combate puro e simples, pois não se pode negar as boas contribuições que este tipo de mídia tem trazido para o ambiente escolar. É necessário que a escola compreenda os signos deste mundo para usar aquilo que serve aos seus propósitos, sem influência de idéias estranhas.
       Os programas de computadores (software) são tão diversificados hoje, que possibilitam administrar a escola de uma forma mais ágil e criativa usando poucos recursos. Há softwares educacionais que simulam atividades que antes só podiam ser feitas em ambientes sofisticados, perigosos e de difícil acesso. São instrumentos ricos em possibilidades mas que merecem toda atenção dos educadores, a fim de analisar adequadamente as viabilidades educacionais dos mesmos.
      O que dizer da internet? Uma rede de informações possibilitada pela evolução dos computadores, que tem trazido à escola uma infinidade de dados, textos, informações e conhecimentos que antes só podiam ser acessados em livros, revistas e outros tipos de material impresso. É claro que há muita coisa perniciosa, não somente na internet como também em outros recursos informáticos, mas para isso a educação tem que providenciar cuidados e meios a fim de ter uma metodologia de uso desta tecnologia que corresponda a uma linha de educação que respeite os valores humanos e sociais que formam um cidadão em todas as suas dimensões. Sabe-se do custo desta e de outras tecnologias, mas isto é uma discussão política e financeira que a escola tem que participar, embora poucos canais se abram com tal finalidade. Não se pode transferir este debate apenas para o plano político e econômico, mas falar dele também nos meios escolares, pelo menos tentando entendê-lo.

E OS CURSOS DE FORMAÇÃO DE PEDAGOGOS?

       Muitos autores têm trazido esta discussão do uso das TIC na educação para muitos encontros. Alguns trabalhos levam o leitor a uma discussão sobre a importância delas na escola, com cuidados sobre a escolha da metodologia de uso ou de desenvolvimento de instrumentos informáticos (ROCHA, 2002), ou sobre o papel delas nos cursos de formação de professores (CORTELAZZO, 2002; PURIFICAÇÃO, 2002).
        Esta discussão está longe de se encerrar, até porque este assunto nunca será esgotado, pois a velocidade e o dinamismo em que as modificações tecnológicas ocorrem não permitem. Uma razão que procede dos cursos de formação de professores é a seguinte:

        Muitas das novas tecnologias são desconhecidas, ou apresentam complicadores operacionais para serem ativadas em decorrência da própria estrutura dos cursos de qualificação do magistério. Os esquemas que regem as aulas de prática do ensino e didática, assim como as concepções que acompanham os cursos de graduação, por demais circunscritos a balizas acadêmicas nem sempre sintonizadas dialogicamente com as dinâmicas transformadoras da sociedade, têm contribuído muito para que o jovem professor ingresse na carreira no contrapé das experiências com os meios de comunicação e com as novas tecnologias já desenvolvidas pelos alunos (CITELLI, 2000, p. 30)
        Na seqüência desta sua afirmação, CITELLI mostra com dados de uma pesquisa que os professores que estão em sala de aula têm consciência disto, argumentando sobre suas dificuldades e a necessidade de ultrapassarem os limites que impedem fazer uso das muitas linguagens que as TIC proporcionam. Discorrendo mais ainda sobre o assunto, ele cita que as diversas licenciaturas estão orientadas basicamente para atividades com as linguagens verbal ou numérica. É algo que continua a persistir, embora muitos cheguem a fazer uso de outras linguagens, mas se vê que estão completamente desvinculadas do processo pedagógico, pois muitas vezes as TIC entram apenas como ilustrações de temas ou passatempo. Quando não, estão nos cursos apenas para os fins técnicos ou administrativos.
        O que se quer é que as TIC passem a fazer parte do processo ensino-aprendizagem como uma ferramenta educacional necessária, pois estas tecnologias já estão em todas as áreas profissionais e têm servido para o desenvolvimento de muitas delas. Com eficiência muitos setores na sociedade têm feito uso delas, alcançando uma eficácia que faz com que não descartem mais essas tecnologias do seu meio. Até porque, à revelia de interessados ou de indiferentes, as TIC já fazem parte da vida de todos.
        As mesmas não podem ser tratadas apenas como apêndices, usadas em certos momentos ou em disciplinas de caráter optativo, em que os alunos escolhem apenas para preencher um espaço em sua programação curricular ou porque têm afinidade, mas não lhes dão a importância necessária. Tais tecnologias têm que ser citada no Plano Pedagógico da Escola, que é o plano estratégico de atividades da mesma, após ampla discussão e participação de todos, de tal forma a se criar uma necessidade de uso e de mecanismos que possam ser usados no processo ensino-aprendizagem, com informações que levem à escolha de metodologias de uso ou de desenvolvimento de ferramentas informacionais e comunicacionais.
      Neste sentido as TIC não ficariam restritas a este ou aquele professor, ou esta ou aquela disciplina. Seriam instrumentos que todos os envolvidos com a formação de professores utilizariam, percebendo nelas as suas potencialidades e recursos, e que podem muito bem participar do processo ensino-aprendizagem com eficiência e eficácia. Os outros meios não seriam dispensados, conviveriam normalmente com as TIC, mas a cada um seria dado o espaço que lhe é próprio.
        É necessário, também, ter uma disciplina no currículo dos cursos de formação de professores e pedagogos, a qual seria oferecida a todos os alunos e que daria o suporte instrumental e teórico que possibilitasse compreender e usar todas as linguagens e meios de informação e comunicação na educação. Esta mesma disciplina deve ser reconhecida por todos os professores, principalmente da área de didática e prática de ensino, como um elemento curricular de caráter interdisciplinar que deve participar das atividades de estágio curricular e das que futuramente os egressos dos cursos profissionalmente assumirão.
        Desta forma, se absorver-se-á com competência a contingência que emana da sociedade ou do mercado no sentido de se usar as TIC na educação, fugindo assim de modismos ou outras pressões.

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TORRES, R. M. Educação e Imprensa. Tradução de Sandra T. Valenzuela. São Paulo: Cortez, 1996.

* Mestre em Tecnologia - Área: Educação Tecnológica. Especialista em Informática na Educação. Licenciado em Ciências e Biologia. Professor no ensino fundamental, médio e superior na área de ciências; professor e coordenador de cursos de Informática na Educação para alunos e professores no ensino fundamental, médio e superior, atendendo também a portadores de necessidades especiais usando a tecnologia.Professor nos cursos de Pedagogia, Letras e Administração/UTP


5-21

                                       


ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS ATRAVES DE SOFTWARES:
UM ESTUDO DO PROJETO LUZ DAS LETRAS

Daniella Lisboa   *
Graduanda
Universidade Tuiuti do Paraná
 
A presente pesquisa analisa  a experiência realizada com o Projeto Luz das Letras, ao longo de um ano,  demonstrando os principais fatores que distanciaram-no  de sua principal proposta que gira em torno da inclusão social e digital, acreditando na sensibilidade solidária das organizações vinculadas as competências profissionais e técnicas, descobrindo a forma de se aprender e produzir com os multimeios tecnológicos e a partir deles. O objetivo geral ficou sendo encontrar subsídios que comprovassem a falta de eficácia deste método de alfabetização no que se refere aos princípios didáticos-pedagógicos, levando-o a extinção em pouco mais de dois anos de funcionamento. E aí veio o grande questionamento: como realizar essa pesquisa? Escolhemos por metodologia de construção da investigação, a dialética, já que esta iria ao encontro de nossos anseios científicos, pois tínhamos uma tese – a ineficácia da metodologia utilizada no Projeto Luz das Letras, tanto no que se refere à alfabetização, quanto ao que se refere à inclusão social e digital – e uma antítese – os objetivos do Projeto Luz das Letras que o comprometem a alfabetizar sua clientela de forma rápida, eficaz e com baixos custos, através da utilização de um software, preparando o aluno para a vida profissional – e, diante disso, gostaríamos de fazer a síntese dessa construção conceitual, indo a campo e retirando dele dados significantes que poderiam dar um fecho/desfecho para nosso questionamento inicial, fazendo portanto, o papel da síntese entre pesquisa bibliográfica e a análise da coleta de dados encontrada no concreto-pensado.

Palavras-chave: educação de jovens e adultos, alfabetização, tecnologias de informação, alfabetização através de software, informática educacional.
   Apesar de vivermos num mundo cercado pelas mais diversas formas de tecnologias e informações oriundas dos mais diversos meios de comunicação, há uma grande dificuldade de assimilação, ou melhor, de harmonização de todo este avanço tecnológico pela sociedade, em especial, pela população de baixa renda que, raramente tem acesso a estas modernidades.
Os meios audiovisuais desempenham papel importante no acesso ao conhecimento, permitindo o desenvolvimento do indivíduo em sua totalidade.
    A telemática, abrindo estradas para a informação ao redor do mundo, tem sido vista como uma das partes importantes na infra-estrutura necessária para a emergência de uma cultura de formação continuada. Ela é essencial tanto por razões econômicas, quanto sociais que incluem a superação da intolerável exclusão social e carências provocadas pelo desemprego em nossa sociedade. Os cidadãos, gradativamente, poderão ou não aumentar sua tomada de consciência e suas expectativas em relação às oportunidades para aprender. Tais expectativas passarão a ser atendidas a qualquer tempo e em qualquer lugar inclusive pela interatividade de computador, se lhes for proporcionado acesso às informações globalmente disponíveis. Esta interação pode ser alcançada com um amplo uso das novas tecnologias de ensino.
    “Na área educacional, a telemática se apresenta como um novo meio de comunicação não só com o intuito de colaborar na produção e divulgação de informaçòes de pesquisas, como também de investigar alunos e professores a romperem as paredes das salas de aulas e comunicarem-se com seus colegas nas mais diversas regiões do planeta, criando um novo conceito de inter e transregionalidade, bem como de transnacionalidade”(CORTELAZZO,2002).
    Os sistemas educacionais no Brasil iniciaram-se, timidamente, há mais de uma década, estudos e experiências restritos de introdução da tecnologia informática em escolas públicas. Hoje, as organizações escolares expressam necessidades de receber o auxílio desses novos recursos para enfrentar os desafios de melhorar a qualidade e a quantidade de seu ensino. Já existem condições de aplicar amplamente o uso das tecnologias da informação e da comunicação nas escolas brasileiras. Mas estas oportunidades e desafios tem de ser considerados do ponto de vista da formação dos professores  e na escolha da metodologia, pois
 “a informática aplicada à educação não é solução! A solução dos problemas educacionais do Brasil está no nível dos recursos humanos, sua formação, sua capacitação, sua melhoria de nível econômico, sua participação nas definições políticas dos rumos da educação...A informática pode contribuir neste processo de capacitar educadores e educandos, de melhorar o nível de ensino e de lançar recursos e atenção para a tão carente escola brasileira” (ALMEIDA,1987:100)
A formação do professor precisa ser realizada sobre sua experiência de vida profissional, para que ele possa conservar tudo o que lhes parece válido daquilo que ele já sabe fazer e passe a incorporar a inovação, buscando transformar sua prática de modo significativo.
    Uma questão fundamental é a concepção corrente de que a ferramenta informática deve proporcionar o aumento de retenção no tempo. É senso comum que ambos podem ser medidos pelas respostas verbais do aprendiz.
    No suporte teórico construtivista, a concepção da ferramenta desejada é aquela que enriquece o ambiente de aprendizagem, suportando um processo de busca motivada pelo aluno, que apresenta complexidade de alternativas para desafiar uma interação de natureza operatória que sustentem um continuado equacionamento de variáveis, a construção de hipóteses e a validação de soluções possíveis, pelas diversas habilidades mencionadas por Gardner (1999) e reforçadas pela aprendizagem colaborativa/cooperativa, que é parte inerente à condição humana.
    Em muitas situações colaborativas, as interações construtivas e a aprendizagem orientada a um objetivo parecem ocorrer de uma forma natural, coesa e organizada. Em outras, o suporte da tecnologia pode apoiar e organizar as situações facilitando este processo. Por outro lado, podemos inferir que esse discurso, na filosofia do cotidiano, traz uma práxis pedagógica, na maioria das vezes, inversa a que se propôs, pois não há uma política econômica que proporcione um número de computadores suficientes para o atendimento da população matriculada, seja no ensino fundamental, seja no ensino médio; não há uma política educacional capaz de absorver e utilizar as tecnologias que amplificam a inteligência humana e suas funções cognitivas – memória, imaginação, raciocínio; não há um programa de formação de professores adequada à nova realidade. Há uma imensa necessidade de se rever a educação frente aos desafios das novas tecnologias, em todos os seus aspectos, buscando novos modelos de formação educacional em que os conhecimentos abertos e contínuos precisam ser entendidos como singulares, vinculados a alguns objetivos e contextos, devendo ser reconhecidos como pertencentes às pessoas e às suas comunidades. “O professor será cada vez mais um orientador indispensável, um coordenador de expedições em busca dos saberes coletivos.”(SILVEIRA, 2001:28)
    Com relação a pesquisa empírica, nossa expectativa no início do trabalho, foi buscar subsídios que comprovassem o distanciamento da principal proposta do Projeto Luz das Letras, que gira em torno da inclusão social e digital de adultos analfabetos absolutos ou funcionais, acreditando na sensibilidade solidária das organizações vinculadas às competências profissionais e técnicas, descobrindo a forma de se aprender e produzir com os multimeios tecnológicos e a partir deles.
    Ao discutirmos alfabetização de jovens e adultos,  uma certa angústia, uma inquietação vêm a tona. O que significa este conceito de educação? Que idéia queremos  transmitir ao elaborarmos tal questionamento?  
    Tornar-se-ia redundante tentarmos elencar aqui, as diversas dificuldades encontradas no cotidiano de um analfabeto, no desenvolvimento das mais banais atividades, no entanto, não podemos nos furtar a oportunidade de compará-la, em alguns aspectos, às sensações experimentadas por cada um de nós, adultos alfabetizados, ao nos depararmos com textos grafados em uma língua desconhecida, com povos que falam idiomas desconhecidos por nós em locais inéditos. Como nos sentiríamos?
    Para que estas necessidades do analfabeto adulto, que por algum motivo, não teve a oportunidade de freqüentar a escola, na idade adequada ou sequer, teve a chance de aprender a ler, deparar-nos-íamos com diversas circunstâncias que os levam a exigir atendimento adequado às suas especificidades físicas, psicológicas, sociais e econômicas, solicitando uma maior adequação de metodologias e conteúdos à estas necessidades.
    Ao se tratar da alfabetização de adultos, é comum que se tenha em mente a preocupação, única e exclusiva, com a decodificação de materiais escritos, publicados, passíveis de serem compreendidos e decifrados através do conhecimento das letras. Ainda mais importante, porém, é a compreensão de mundo que deve preceder e nortear o processo de alfabetização.
    Inspirando-se em Paulo Freire (1982), que afirma que a leitura do mundo precede a leitura da palavra, pode-se facilmente, verificar a importância de o indivíduo valorizar suas inúmeras experiências de vida na busca da leitura, seja ela, de um olhar, de gestos, de expressões faciais, do cheiro, do tato, do olfato.
    Desde o nascimento, o indivíduo observa, descobre e experimenta o mundo a sua volta, construindo, a partir desta experimentação uma visão de mundo intimamente ligada às suas interações com ele, explicitando, desta forma, que qualquer leitura é uma produção de sentido, ou seja, desde crianças, as pessoas procuram criar sentido para o mundo, compreendê-lo, configurá-lo segundo a realidade em que estão inseridas - “aprendemos a ler a partir do nosso contexto pessoal” (MARTINS.1982:15).
    Abre-se, então, uma discussão a respeito da relação entre a leitura de mundo e a leitura das palavras, propriamente dita. Quando se começa, ainda criança, a investigar o mundo na tentativa de se criar parâmetros que ajudem a entendê-lo, inicia-se, simultaneamente, a percepção das relações espaciais existentes, as relações de afeto, observa-se que cada coisa ocupa um lugar e tem um nome, manifesta-se preferências e rejeições .
Quando começamos a organizar os conhecimentos adquiridos, a partir das situações que a realidade impõe e da nossa atuação nela; quando começamos a estabelecer relações entre as experiências e a tentar resolver os problemas que se nos apresentam – aí então estamos procedendo leituras, as quais nos habilitam basicamente a ler tudo e qualquer coisa (MARTINS, 1982: 17).
        Tanto as relações com o outro quanto as relações com o mundo, propiciam a construção de símbolos, inicialmente ainda muito singulares e próprios até chegarem a construir em significados compartilhados socialmente. De onde se pode afirmar que antes de ler a palavra, a pessoa, especialmente o adulto, já vivenciou diversas leituras de mundo, pois este costuma ver filmes, novelas, participar de diversas atividades no trabalho, em casa, enfim, está habituado com diversos tipos de linguagens, que, normalmente, passam despercebidas. Há que se ter, porém, bastante cuidado, no momento da alfabetização, para que o método e a forma de trabalho seja condizente com a realidade do aluno, buscando, desta forma, a construção de significados, para que a partir destes significados os alunos se tornem curiosos e desenvolvam a necessidade de querer traduzi-los e compreendê-los.
        De nada adianta a utilização de frases prontas, comumente presentes em cartilhas como: Ivo viu a uva, pois nem todas as pessoas conhecem alguém com o nome de Ivo e, nem todo mundo tem condições financeiras de utilizar-se de uvas em sua alimentação. Esta prática é apenas um exemplo grosseiro, porém real, do que vem acontecendo no contexto de alfabetização, dificultando o levantamento de hipóteses sobre a leitura partindo da  vivência do aluno.Torna-se plausível lidar com uma frase que faça parte da vida do aluno, daquela realidade, daquela comunidade, do grupo específico com o qual se está lidando, o que torna possível que uma frase seja bem compreendida por todos os alunos tornando o aprendizado mais real e autêntico.
        Na visão de Paulo Freire, é necessário que se compreenda a ação de ler de modo amplo, caracterizando-se pelas relações entre o indivíduo e o mundo que o cerca,
A existência, porque humana, não pode ser muda, silenciosa nem tampouco pode nutrir-se de falsas palavras, mas de palavras verdadeiras, com o que os homens transformam o mundo. Existir, humanamente, é pronunciar o mundo, é modificá-lo. O mundo pronunciado, por sua vez, se volta problematizado aos sujeitos pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar (FREIRE, 1987: 78).
        A tentativa de impor ao mundo uma hierarquia qualquer de significados, representa, de antemão, uma leitura. O real torna-se um código com suas leis e a revelação destas traduz uma modalidade de leitura. Desde o início, esta leitura de mundo começa a ser realizada e é mediatizada pelo outro, é fruto de interação.
        Qualquer leitura do mundo é uma produção de sentido relacionada com o momento e a situação vivida e como qualquer leitura ela também não está isolada no tempo e no espaço. Ela sempre se relacionará com outras leituras, com outros textos inscritos pela vida, no leitor. A leitura da palavra está ligada à leitura propriamente dita, embora não possa estar afastada da leitura de mundo.
        Segundo Paulo Freire, a leitura da palavra comporta dois níveis: leitura dialógica e leitura não dialógica, pois, "Somente o diálogo, que implica em pensar crítico, é capaz, também, de gerá-lo. Sem ele não há comunicação e sem esta não há verdadeira educação.”(FREIRE, 1987:83)
    A leitura não dialógica choca-se e entra em conflito com a leitura de mundo porque não comporta uma pluralidade de interpretações. Entendida como um código, cabe decifrá-lo e isto é tudo o que importa. A leitura não dialógica não dá espaço à produção de sentidos e, se não se abre este espaço, se impede a dialogia, não há espaço para o sujeito-leitor. Em geral, esta leitura não dialógica informa práticas pedagógicas tradicionais e se ancora nas célebres cartilhas. Todos devem ler  e ver o mesmo mundo consensual, harmônico, dividido entre bem e mal, cheio de regras e prescrições de bom comportamento, bom falar, etc... além do mundo mostrado ser irreal é difícil lê-lo produzindo sentido através de textos que falem, por exemplo, do rato que rói a roupa do rei de Roma.
       Na pedagogia não dialógica, a grande maioria dos alunos fracassa porque suas experiências de vida (sua leitura de mundo) são banidas de sala de aula e tornam-se decifradores de sinais, não leitores.
      Já a leitura dialógica privilegia a interação. As leituras de mundo podem fluir  e o espaço se abre para que a leitura da palavra seja um processo natural, pois “é na realidade mediatizadora, na consciência que dela tentamos, educadores e povo, que iremos buscar o conteúdo programático da educação.”(FREIRE, 1987:87)
    Nessa visão, os textos lidos em aula são os textos produzidos pelos alunos. Eles são discutidos, comparados e muitas coisas são descobertas, até mesmo, por exemplo, que a letra R de Renata é a mesma de Mariana, embora sejam pronunciadas de forma diferente. Descobrem-se coisas e mais coisas, sem uma ordem pré-determinada. Nesta leitura dialógica a produção de sentidos não fica aprisionada a uma ordenação de fonemas.
       Aberto o espaço do diálogo, encorajando-se os alunos a dizerem a sua palavra num processo interativo, aberto o espaço de interlocução, os alunos têm oportunidade de apresentar sua leitura de mundo, precedendo a leitura da palavra.
    A partir do momento em que se entende a relação entre a leitura de mundo e a leitura da palavra, abrie-se o caminho para a interlocução entre o leitor e o texto e se houver espaço para interlocução com o texto, abrir-se-á o caminho para a formação do leitor.
Emília Ferrero (1987), psicopedagoga argentina realizou várias pesquisas publicadas a partir de 1980. Seus trabalhos contribuem significativamente para a compreensão do processo de aprendizagem da leitura e da escrita, demonstrando a existência de mecanismos que surgem da interação do sujeito que aprende, com a linguagem escrita. Há na sua concepção um papel ativo do sujeito na interação com os objetivos da realidade. Para que a descoberta do caráter simbólico da escrita seja aprendida, é preciso oferecer ao aprendiz situações em que a escrita se torne objeto de seu pensamento.
    Ferreiro revolucionou a forma de se conceber e trabalhar na alfabetização, indicando a necessidade de conhecer o processo de aquisição da leitura e da escrita separadamente. Ela aponta uma reflexão sobre as salas de aula de agora confrontadas a necessidades de preparação dos alunos para a vida contemporânea e futura.
    Em seus estudos sobre a evolução do processo de leitura, ela constatou que nenhum dos povos antigos que criaram e utilizaram escritas eram sociedades alfabetizadas. A história da prática da escrita,  ensina que, uma vez que fora dissociado da leitura durante séculos, nos dá a certeza de que os escribas, não eram leitores autorizados, pois "a escrita foi exibida durante séculos à populações incapazes de ler o que era escrito, porque era um símbolo de poder "( FERREIRO:1987:76 ).
    Para os romanos, ler era devolver a voz ao texto, pois a leitura em voz alta era uma interpretação real do texto. O leitor era um intérprete tal qual o intérprete de uma partitura musical.
A comunidade de leitores era reduzida e os textos também, e eram escritos sem espaços entre as palavras e sem sinais de pontuação. Cabia ao leitor, a tarefa da pontuação adequada. Havia entre os romanos um desejo de dificultar o acesso ao texto, atitude esta elitista. Muitos historiadores consideram que a separação sistemática entre as palavras é a verdadeira revolução na história da leitura, antes da imprensa ocidental.
    Quem criou a separação sistemática entre as palavras não foram os escribas, mas sim, copistas irlandeses, por volta do século VIII, o que causou o atraso de alguns séculos para sua implantação.(FERREIRO, 1987:76)
       Foi a imprensa que introduziu uma mudança total e completa: a idéia de cópia de um mesmo texto. A máquina de escrever permitiu uma variação na idéia da escrita. O texto datilografado limitava a marca pessoal do autor somente à assinatura. Nem sempre a idéia de pontuação editada, correspondia à interpretação do autor.
      O computador permite uma nova aglutinação: o autor das marcas pode ser seu próprio editor. Com maiores possibilidades do que a máquina de escrever ele pode ser o autor, o revisor e o editor. Ele re-introduziu e aperfeiçoou o poder da escrita, uma vez que possibilita a interação.
    Na análise teórica do material, percebemos que em nada se aproxima da concepção construtivista  a qual se propõe. Pelo contrário, o software é marcado por uma forte característica empirista de construção de conhecimento, onde o aluno é levado a reforçar determinados comportamentos afim de que possa evoluir dentro desta metodologia. Fato este perfeitamente ilustrado pela presença do “mascote” que surge na tela, quando da resposta correta do aluno, para elogia-lo, indicando que já está apto a prosseguir à próxima tela, aspecto importante que delata a incoerência entre o modelo pregado pelo Projeto e a realidade do mesmo, permitindo-nos inferir que esta análise do material foi de grande valia para a História da Educação e da Informática, pois, em um programa que promete alfabetização de jovens e adultos através de um software, promovendo, através disto, a inclusão social e digital, é imprescindível que se faça uma criteriosa avaliação de sua real dinâmica de funcionamento, para que se considere suas reais contribuições à sociedade.
        O rápido avanço tecnológico e a necessidade de uma adequação das instituições de ensino, em seu sentido mais amplo, exige que esta nova realidade, busque, através da implantação de um número maior de computadores nas escolas públicas, a inclusão das camadas populares no mundo das informações digitalizadas e globalizadas, pela criação de projetos de desenvolvimento de softwares destinados à facilitação do processo de ensino-aprendizagem, mas ao confrontarmos estas informações teóricas com a realidade encontrada no campo de pesquisa, percebemos imediatamente o antagonismo de forças que deveriam estar harmonicamente integradas, mas que, na prática, revela uma educação voltada para um mercado onde o conhecimento é vendido como se fosse mercadoria de troca e o mais grave, um conhecimento vendido para alfabetizar jovens e adultos carentes de cidadania e respeito em um curso que promete em aproximadamente seis meses, alfabetiza-los e ensina-los os conteúdos das séries iniciais do ensino fundamental, além, é claro, de prepara-los para o mercado de trabalho. Em contrapartida, o que se observou, é que este Projeto entregava seus alunos nas mãos de voluntários e estagiários despreparados e de uma metodologia frágil que desperta e enfatiza no aluno, o sentimento de debilidade e inferioridade desde o primeiro contato com o software.
        Ao abordarmos a questão da alfabetização de adultos, é importante abrir uma discussão  a respeito da importância da leitura não se restringir ao fator decodificação do código escrito, mas da necessidade de compreendermos e entendermos o mundo através de uma leitura centrada em diversos aspectos por ele evidenciados, despertando a criticidade nestes alunos, a partir de uma metodologia que leve em consideração suas diferenças, necessidades e especificidades.
      Um dado relevante,levantado na prática, é que a proposta pedagógica prometida ao cliente é um discurso baseado literalmente no “milagre pedagógico” onde o educador é um Zeus, dono e senhor de um Olimpo de técnicas e mágicas que transformam o aluno – cliente – já que a educação é voltada para o mercado de uma sociedade capitalista, que tem como gerenciador um Estado Liberal) em um ser crítico, alfabetizado e o pior de tudo: um cidadão. Qual é o conceito de cidadania que está proposta pedagógica tem como concepção norteadora do projeto de alfabetização em questão? Qual é o conceito de alfabetização que este projeto vivencia na prática já que a teoria promete alfabetizar esta clientela, única e exclusivamente, através deste software, sem nenhuma interferência pedagógica do professor, mas apenas, técnica e em pouquíssimo tempo a baixo custo.
É importante destacar e analisar o perfil da clientela que procura este tipo de curso. No nosso caso específico, pessoas pertencentes, em sua maioria, a uma classe econômica baixa, que vive com dificuldades precisando trabalhar e cuidar de uma família o dia inteiro, buscando, com muita pressa, a melhoria da qualidade de vida, justamente através da aquisição da capacidade de ler e escrever e, da promessa de aprender a usar a informática em suas atividades profissionais.
   As expectativas dessa amostra eram justamente : aprender a ler e usar o instrumento “informática” a serviço de uma ascensão social e, no final do curso, o que percebemos foi a frustração destes alunos por não conseguirem mais do que desenhar seus nomes, ou melhor, digitar seus nomes.
     É, de certa forma, frustrante a nós, educadores, que existam metodologias como esta, software Luz das Letras, inseridos no mercado com uma demanda incrível, apesar de serem construídos sobre uma teoria pedagógica totalmente contraditória, formando analfabetos funcionais e alfabetizados que reconhecem símbolos e letras, mas não compreendem a mensagem do que estão lendo tornando-se reféns de interesses e forças superiores que os orientam e manipulam de acordo com seus intentos.

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SILVEIRA, S.A. da. Exclusão Digital. A miséria na era da informação. São Paulo: Perseu Abramo; 2001


Graduanda do quarto ano de Pedagogia da Universidade Tuiuti do Paraná.  Pesquisadora Voluntária do Projeto ´Reconstrução Historica do Colegio Estadual do Paraná´

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FORMAÇÃO CONTINUADA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR:
DESAFIOS DO LIVRO VIRTUAL


Evelcy MonteiroMachado * 
Universidade Tuiuti do Paraná
 Iolanda Bueno de Camargo Cortelazzo **
Universidade Tuiuti do Paraná

O trabalho objetiva refletir sobre a formação do professor destacando a relevância da educação continuada ter como referência a educação superior inicial. Esta reflexão parte da discussão sobre a questão da exclusão social decorrente do processo de globalização econômica, social e cultural e evidencia a necessidade de redução da distância entre grupos produtores e consumidores de conhecimentos. Aponta-se a importância do domínio de conhecimentos de Tecnologia de Informação e Comunicação como alternativa de enfrentamento às distancias sociais no mundo globalizado. Apresenta-se, a seguir, uma experiência desenvolvida pelo programa: Pedagogia em Debate com o objetivo de estimular e iniciar o processo de apropriação com a elaboração  do Livro Virtual  Pedagogia em Debate – Textos, uma produção coletiva, construída a partir de uma experiência consolidada de extensão – (Pedagogia e Mestrado em Educação – UTP), que inova com a utilização do computador e da internet que propiciam a criação, revisão, edição e publicação em curto espaço de tempo.

Palavras-chave: formação do professor, formação continuada, livro virtual, educação superior

    Nas últimas décadas as condições sociais, culturais, e econômicas e de trabalho no país, assim como no mundo se alteraram  bruscamente. A globalização da sociedade contemporânea, fato marcante dessa fase torna o mundo mais complexo. Coexistem novas e velhas necessidades sociais. As indagações se tornam mais constantes do que as respostas. Nos países desenvolvidos, a sociedade transita de uma economia industrial para uma economia de serviços. Entretanto, nos países em desenvolvimento, o movimento da mudança é mais complexo. Coexistem diferentes modos de produção que vão desde setores cujas bases permanecem nos processos primários de extrativismo e de produção agro-pastoril, passando por setores passando por um processo de industrialização até setores que evidenciam transformações nas formas de produção e que estão mudando o foco da indústria para os serviços. Da mesma forma que na economia, a complexidade da estrutura social evidencia grupos em condições de precariedade, de exclusão, de marginalização e de pobreza e outros  com plenas condições de participação numa sociedade globalizada. A complexidade dessa nova organização social construída em um processo de mudança com ritmo muito acelerado gera novas demandas por conhecimentos evidenciando que os conhecimentos disponíveis são insuficientes. O desafio aumenta em complexidade já que se impõe,  ao mesmo tempo, a toda a sociedade, não se restringindo a grupos com maior desenvolvimento e poder econômico. Para as sociedades menos desenvolvidas, a necessidade de enfrentar questões de desigualdade  e de buscar um equilíbrio as expõem a processos de globalização muitas vezes em detrimento até de tradições culturais. Dessa forma todos os segmentos sociais se encontram pressionados pela urgência de produção de novos conhecimentos como enfrentamento do processo de transformação. Como tem sido debatido continuamente, há uma relação direta entre exclusão social e concentração de rendas. Neste aspecto, o processo de globalização tem favorecido em termos de oportunidade de crescimento econômico e de distribuição de riqueza aos grupos produtores dos conhecimentos. Essa iniqüidade de países ricos a países pobres manifesta-se, também, no interior de cada um deles distanciando grupos em termos econômicos, sociais e culturais.
      Na América Latina, a produção de novos conhecimentos e áreas estratégicas, em um estudo comparado, evidencia em relação aos países economicamente desenvolvidos “o déficit  acumulado em matéria de educação, formação de recursos humanos e acesso ao conhecimento” (SANDER, 2000, p. 140). Os percentuais reforçam a necessidade de mudanças estratégicas. Tendo como referência a população mundial, a América Latina representa 8,5% dessa população; produz 6% do Produto Interno Bruto; gasta 5,5% do total mundial; exporta menos que  5% das exportações globais e menos de 4% de engenheiros e cientistas desenvolvendo pesquisas; as exportações de manufaturas chegam a menos de 3% do índice mundial; participa do mercado de tecnologias com apenas 2%; as publicações de cientistas latino-americanos no âmbito internacional são inferiores a 2%; tem apenas 1% de “hosts” na Internet e as patentes industriais registradas internacionalmente por latino-americanos chegam a 0,2% (SANDER, 2000).
    Acresce-se, ainda, que as taxas de escolarização na América Latina estão em torno de 93% para a população de 7 a 12 anos pelos dados de 1993. São taxas elevadas comparadas à participação na sociedade mundial. Esses dados, entretanto, reforçam a necessidade de se inserir no debate  a questão dos conteúdos e da divulgação desses conteúdos na Sociedade do Conhecimento. Dentre as questões básicas, interroga-se a respeito de quais conteúdos, com quais finalidades e de que formas trabalhá-los para atender as demandas atuais. Tal situação que representa um desafio à educação e aos sistemas educacionais evidencia que as mudanças do nosso tempo passam a exigir a expansão da própria cultura dos grupos e que esta representa um capital cultural indispensável à manutenção da autonomia social e, também, a apreensão e domínio de conhecimentos das ciências básicas como alternativa ao enfrentamento do mundo globalizado e, de maneira consistente, a  incorporação demais informações e competência para produzir novos conhecimentos.
É neste contexto atual que a formação continuada na Educação Superior assume uma relevância significativa ao professor educador que é mediador entre conhecimentos produzidos e a disseminação desses conhecimentos junto aos grupos sociais.
    Os professores, enquanto participantes do processo educacional, se inserem no processo de transformação e “são agentes e resultantes das mudanças, já que participam do processo de globalização instituído pelo modelo político-econômico vigente; são profissionais atuantes em um momento de ruptura da estrutura social vigente; inserem-se num contexto de avanço da ciência e tecnologia com abrangência de conhecimentos a serem analisados, apreendidos e desvelados e que vivenciam na prática as transformações sociais em ritmo acelerado com implicações no cotidiano. OS conhecimentos para a formação continuada dos educadores estão sendo construídos  no próprio processo de produção do conhecimento. Representam uma mudança de paradigma que aproxima o conhecimento da forma de produção; a teoria da prática, transformando, ao mesmo tempo, parâmetros da educação inicial e da educação continuada. São demandas complexas com mudanças em relação ao já conhecido e já produzido, com desafios e perspectivas de inovações e que podem ter no livro virtual um referencial de apoio e de  avanço.
    O livro virtual  é a permanência do livro tradicionalmente conhecido, incorporando-se a ele as vantagens oferecidas pela informática e pela telemática de maior facilidade de criação, revisão e edição, bem como de divulgação pelas redes digitais.
Os avanços tecnológicos nas telecomunicações permitem que os homens se comuniquem mais rapidamente. E essa comunicação que era unidirecional e, em geral,  não promovia interação, quando muito permitia uma reação que levava um certo tempo a ser sentida, dá lugar a outro tipo de comunicação, cada vez mais multidirecional, reticulada, integrada e interativa. Os meios de comunicação se multiplicam e se diversificam formando uma verdadeira rede de mídias,  onde se encontram alguns elementos típicos da hipertextualidade como a heterogeneidade, multiplicidade, exterioridade, a não-centralidade das conexões e que respondem a especificidades próprias de linguagem e alvos de comunicação.  As redes de comunicação eletrônica facilitam a formação das redes de mídia e colocam-nas à disposição de qualquer um que tenha acesso a essas redes. Teoricamente, as redes de computadores, mais especificamente, a Internet, disponibilizam a seus usuários, entre eles professores e alunos, quantidades inimagináveis de informações sobre os mais diferentes temas. Daí que, por isso mesmo, as informações se avolumam e  multiplicam-se numa razão tal que não se pode mais afirmar que um único indivíduo possa estar ciente de toda a informação existente sobre um determinado produto, processo, conceito ou tema. Em todos os espaços até mesmo nas periferias e nas favelas urbanas, o computador e o acesso à Internet vem se somar ao rádio, à TV, ao vídeo, ao jornal "marron", à rádio pirata, etc, trazendo o mundo até esses indivíduos marginalizados da comunicação social oficial. Mas todas essa informação, bruta, oferecida pelos produtores dos meios de comunicação, para ser transformada em conhecimento que contribua com mudanças sociais,  necessita ser  analisada, interpretada, refletida. Portanto, a participação dos professores na leitura crítica dos meios de comunicação é fundamental, apresentando-se como uma nova função do trabalho do educador em todos os níveis de ensino e precisa ser incorporada na Formação Docente.
    Contudo, as instituições de ensino, em especial as de Educação Superior, conservam estruturas de comunicação unidirecional, considerando seus receptores indivíduos passivos e incapazes de interação produtiva. As Universidades, em geral, criam seus sítios  na WWW, utilizam-se da Internet, da mesma forma como utilizam  os murais e os folhetos com textos impressos e ilustrações visuais. Muitas das páginas de entrada dos sítios na WWW dessas instituições são tão poluídas como os murais das secretarias  de cursos, jogando informações indiscriminadamente.
    O uso das tecnologias de informação e de comunicação multidirecional não são mais uma opção, mas uma necessidade não só para a sobrevivência do indivíduo na sociedade mas sobretudo para o exercício da cidadania.
    Dessa forma, faz-se urgente a introdução e/ou a implantação efetiva dessas tecnologias na Educação Superior como tecnologias interativas e, sempre que possível, como tecnologias colaborativas.
    Porque integrar as novas tecnologias de informação e de comunicação na Educação Superior e, em especial, nos cursos de Pedagogia? Não seria mais simples criarem cada curso,  uma disciplina “O uso do computador na educação”, ou “As Tecnologias de Informação e da Comunicação na Educação”, como já acontece em muitas faculdades?
    A introdução dessas disciplinas  com o objetivo de sistematizar as informações já existentes sobre o assunto, provocar reflexões e produzir novo conhecimento sobre essa utilização e as possibilidades de manipulação provocando exclusão social é necessária e deve estar a cargo de educadores que já as utilizam, já refletem sobre o seu uso e pesquisam o seu impacto.
    A operacionalização do uso das tecnologias de informação e de comunicação, em especial o uso do computador como mediação na solução de problemas educacionais ou apoio às práticas pedagógicas tem ocupado muito do programa dessas disciplinas e estão a cargo de técnicos de informática, ou professores de Processamento de Dados que as vêem como fim e não como meio.  Não é difícil encontrar oposição a essas disciplinas com argumentos tais como  “nessas disciplinas, só se ensina a usar o Word e o Powerpoint”; “Não existe uma disciplina para se ensinar a escrever com lápis e caneta”.
    Ao primeiro comentário, pode-se responder que usar os programas de computador Word e Powerpoint é uma estratégia para fazer com que os alunos criem, revisem, editem uma comunicação sua para seus colegas lerem e debaterem as idéias que compõem esses textos. Trata-se de uma atividade de criação e publicação (divulgação) que permite a alunos e professores criarem, divulgarem e compartilharem suas idéias, experiências e dúvidas de uma maneira muito mais prática e rápida do que através da criação de textos com lápis, caneta e papel. Ao segundo argumento, pode-se esclarecer que todos os professores na Educação Básica usam e sabem usar relativamente bem o lápis e a caneta, bem como trabalham em suas disciplinas com textos impressos com  tranqüilidade. Os alunos, assim estão expostos a um uso corrente e transparente desses meios de comunicação. Já não ocorre o mesmo em relação ao uso do  vídeo cassete, da fita de áudio, do computador, seja como uma sofisticada máquina de escrever, seja como um gerenciador de multimeios. Os professores, em geral não sabem ler nem escrever textos sonoros, audiovisuais e digitais. Dessa forma, os seus alunos não incorporam essas outras tecnologias de informação e de comunicação tão tranqüilamente como o faziam com o lápis e o papel.  A formação inicial dos professores no curso de Pedagogia e em cursos de Licenciatura na Graduação deve, pois cuidar dessa familiarização dos futuros professores com as tecnologias de informação e de comunicação resgatando as já usuais e apresentando as não utilizadas e as novas.
    A familiarização com as tecnologias de informação e de comunicação e a discussão sobre seu uso podem estar a cargo de educadores em disciplinas específicas, mas o seu uso deve ser generalizado a todos os professores dos cursos de Graduação, não se  deixando seduzir ou ser manipulado, reconhecendo, criticamente, suas possibilidades e limitações.
    A introdução e a integração das tecnologias de informação e de comunicação na Educação Superior, e em especial, no curso de Pedagogia e nas Licenciaturas na Graduação, precisam ser norteadas pela reflexão de todos os envolvidos (da administração geral ao professor e alunos) sobre o  seu uso como elementos extensores e emancipadores.
    As tecnologias de informação e de comunicação  utilizam-se de diferentes que levam a diferentes leituras do mundo. A escola tem privilegiado a linguagem verbal e trabalha com ela, tanto na sua forma oral quanto na forma escrita, nem sempre explorando essa linguagem em todas a sua riqueza. Os alunos de todos os níveis de ensino são bombardeados no seu cotidiano por outras linguagens que os seduzem pois atingem mais o nível sensorial do que o cognitivo. Ao se trabalhar de forma adequada a linguagem audiovisual, por exemplo, o professor pode encaminhar o aluno para o desenvolvimento de sua inteligência tissular, que vai do sentir, para uma atitude afetiva, fazendo analogias, tendo uma experiência  de apreensão global, sensorial. Uma vez que o  indivíduo parte de um estímulo-sensação, sentindo um estado emocional novo, pode ficar nesse estágio se não ocorrer uma passagem do sensorial para a reflexão. (BABIN , & KOULOUMDIJAN, 1983:84-90).
        O professor  ao utilizar-se da linguagem audiovisual pode levar o aluno a compor uma teia de relações mais abrangente a partir da reflexão, da  conceitualização, até fazê-lo chegar a uma apropriação e à  crítica do texto audiovisual trabalhado, percebendo , por exemplo, as técnicas utilizadas para a manipulação dos sentimentos nos programas televisivos. Pela falta de uma formação específica, muitos professores até trazem essas outras linguagens (através de trabalhos com as fitas de áudio, de vídeo, e software educacional), mas não aproveitam plenamente das suas especificidades que podem ampliar a compreensão e a capacidade de expressão dos alunos. O que se presencia é o uso de suportes tecnológicos para ilustrar a aula e não o uso de tecnologias para mediar a aprendizagem, a compreensão do mundo audiovisual e a comunicação entre alunos  e entre alunos e professor.
    Em geral, a política de implantação é movida por questões de Marketing Educacional ou por  necessidades administrativas sem consulta ou participação de profissionais da educação com experiência - na implantação e no uso dessas tecnologias na prática pedagógica e no processo de planejamento e implantação. Os investimentos na preparação de recursos humanos são feitos apenas em relação aos técnicos de informática. Investimentos na capacitação de diretores de faculdade,  coordenadores de cursos,   professores e bibliotecários não existem. Quando existem são orientados por modismos ou interesses que não visam um aprofundamento na capacitação; ao contrário, introduzem-nas de forma superficial e automatizada, com receitas gerais que não levam em conta a especificidade dos diferenciados contextos existentes em todo o país.
    Não basta a criação de propostas isoladas de formação continuada dos professores sem que ocorra, em conjunto, uma política institucional comprometida com a produção e divulgação de conhecimento que incorporem os avanços das tecnologias de informação e de comunicação também no setor educacional.
    Os investimentos em equipamentos, infra-estrutura e software para a implantação das novas tecnologias de informação e de comunicação poderão otimizar e,  as tecnologias de informação e de comunicação para que elas não sejam sub-utilizadas, propiciando uma constante atualização, rompendo-se o, assim, o circulo vicioso - os professores não as usam por que não foram preparados e porque as tecnologias não são configuradas adequadamente, por outro lado, as tecnologias não são atualizadas porque “seria um investimento muito grande inútil já que os professores não as utilizam”.
    Na vida prática cotidiana, o cidadão está rodeado por essas tecnologias em sua casa, no trabalho, no supermercado, no banco. Como não reflete sobre seu uso, ela deixa de ser um elemento  extensor e emancipador para  provocar a rendição da cultura à tecnologia, isto é os indivíduos se submetem ao seu uso irrefletidamente. Se houver o comprometimento,  a falta de acesso e a falta de preparo para a utilização das tecnologias deixam de ser um elemento de exclusão social. Aqueles que já sofrem uma exclusão inicial por não terem poder aquisitivo suficiente para usufruírem dessas tecnologias em suas casas, ao poderão ter o contato, o preparo,  e o acesso nas instituições de ensino que as disponibilizarem de forma efetiva, evitando esse outro tipo de exclusão,  a de uma formação desatualizada ou de uma formação em processos obsoletos.
    Desde o início da década de 90, iniciativas isoladas proliferam e buscam divulgar seus resultados inovando com a introdução de novas práticas pedagógicas, utilizando-se as tecnologias de informação e de comunicação como tecnologias emancipadoras.  A criação de um Livro Virtual é uma dessa práticas.

Livro Virtual : uma proposta viável

    As organizadoras do Projeto de Extensão Pedagogia em Debate, do Curso de Pedagogia da Universidade Tuiuti do Paraná, na terceira edição, optaram por iniciar uma atividade, a produção de um livro digital,  que pudesse colocar os professores de Pedagogia em contato com essas tecnologias de modo a otimizar uma de suas especificidades que é o trabalho em  rede que permite a divulgação em ampla escala e o acesso a partir  de qualquer parte do mundo. Objetivou-se disponibilizar, aos professores do curso de Pedagogia, mesmo aqueles que não têm contato sistemático com o computador, a possibilidade de divulgar suas produções e conhecer a de seus colegas de maneira mais rápida.
    A proposta do livro digital apresenta-se como uma possibilidade que permite uma transição menos conflituosa do uso  de um suporte tecnológico tradicional  tão comum nos cursos de Educação Superior – o livro – para o uso do Computador Pessoal, um suporte que, como o vídeo cassete, não é mais novo, pois já se encontra em uso em outras atividades da sociedade desde o final da década de 80, mas que se apresenta ainda como uma incógnita para grande parte dos professores em qualquer nível de ensino.
    Foi solicitado aos professores do curso de Pedagogia que preparassem um artigo introduzido por um resumo para que fosse apresentado na Semana da Pedagogia, tendo como base a proposta do Programa de Extensão Pedagogia em Debate e que comporia o Livro Virtual.
    Os professores prepararam seus textos e entregaram-nos digitados e salvos em disquetes. Todos os textos encaminhados foram aceitos, considerando-se esta uma primeira experiência em que o critério era estimular os professores do curso de Pedagogia produzirem um texto para divulgação. As organizadoras do Livro Virtual leram os resumos e os textos para organizaram os artigos em uma certa  seqüência, formatando-os de acordo com as normas pré-definidas e a tecnologia digital. Compuseram um  documento único com apresentação, sumário e 22 artigos totalizando 173 páginas. Até aqui essa organização é semelhante a de um livro impresso normal. O que diferencia é que o Livro Virtual é  disponibilizado na Web, cada artigo pode ser acessado, a partir do sumário e imediatamente  visualizado na tela do computador em arquivo html (hipertextual) e pode ser salvo no computador de quem o está acessado em documento de editor de texto Se houver interesse, o livro pode ser descarregado no computador do usuário em um só arquivo e ele poderá imprimi-lo todo ou escolher, na opção “ imprimir” apenas as páginas ou o trecho que desejar. 
    No caso do Livro Virtual, Pedagogia em Debate – Textos, que está disponibilizado na WWW  sem qualquer custo, o professor que desejar trabalhar o texto para seus alunos, pode indicar a URL (endereço da página na WWW) e os alunos poderão ir até qualquer computador que tenha acesso à Internet e  fazer “download”  (descarregar em um computador ou disquete) do texto recomendado. Se os alunos estiverem trabalhando em um laboratório, podem ler na tela , salvar em disquete ou imprimir e trabalhar imediatamente com o texto .
    Essa tecnologia permite que professores resgatem a função do livro, que voltem a trabalhar a produção escrita com a finalidade de divulgação das idéias trabalhadas, refletidas, não como atividade de responsabilidade exclusiva do professor de Língua Portuguesa, do  professor de Redação ou do Professor de Comunicação e Expressão, mas como atividade intelectual necessária à comunicação em qualquer disciplina escolar. Permite, ainda,  que os professores estimulem seus alunos a escreverem e  revisarem seus textos, trocando-os com seus colegas para uma segunda revisão e comentários seguida de edição para divulgação na rede. A integração do meio de comunicação livro com a  telemática (uso do e-mail, de fóruns de discussão, e de espaço publicação na WWW) abre oportunidades para a produção de novos conhecimentos a partir dos trabalhos dos alunos que não ficarão nas pastas dos professores ou nas estantes da bibliotecas. Um espaço cibercultural que poderá ser explorado pelos alunos, se for adequadamente explorado, antes, pelos professores.
    A elaboração colaborativa  de textos se vê facilitada com o uso da telemática uma vez que cada autor (aluno ou professor) pode escrever a sua parte onde estiver, no tempo livre que encontrar e trocar com seu colaborador, revisando e comentando o que o outro escreveu, utilizando-se dos recursos dos editores de texto e novamente trocando essas elaborações via correio eletrônico ou através de outros programas disponibilizados na intranet da universidade, otimizando o tempo disponível de cada um. Quando os textos ficam prontos, são revisados, editados e socializados em tempos e custos  muito menores do que os exigidos na forma impressa. Novamente, os recursos para a socialização estão disponibilizados na Universidade: seja como anexo à mensagem enviada por correio eletrônico, seja em um sítio da WWW. Inicialmente, o trabalho é feito apenas com os textos verbais; à medida que os professores estiverem confortáveis com esse tipo de produção, poderão começar a trabalhar com o hipertexto, técnica que permite a construção significativa de nós que aprofundam ou estendem os significados das palavras. Uma vez dominada essa técnica ao nível da linguagem verbal, outras linguagens poderão ser incorporadas significativamente ao texto, produzindo-se, então a hipermídia  - integração de texto,  som e imagem. 
    As atividades serão otimizadas por que os professores responsáveis estarão preparados e capacitados para organizá-las e conduzi-las com seus alunos usando um novo espaço de criação. O espaço de criação é um espaço de manipulação da ambigüidade,  de criação, de experimentação,  de interação e de integração dos participantes da ação colaborativa. Um espaço em que cada um poderá trabalhar e criar com diferentes representações (Cortelazzo, 2000:42).
    Desenvolver e estender esse espaço  é um dos objetivos do Pedagogia em Debate – Textos.  Assim, também, o Livro Virtual inaugura no curso de Pedagogia e no Programa de Mestrado em Educação da Faculdade de Ciências Humanas, Letras e Artes da UTP, um novo espaço de debate contínuo entre professores, especialistas e alunos a partir da construção, edição e socialização de artigos através da telemática.
    O Livro Virtual que serviu como estímulo para processos inovadores de formação continuada de professores pode desencadear um processo de inclusão social de professores e consequentemente de seus alunos, como participantes ativos da Sociedade do Conhecimento e como agentes de transformação para uma vida humana mais sustentável.

REFERÊNCIAS

BABIN , Pierre & KOULOUMDIJAN, Marie-France. Os novos modos de compreender. São Paulo, Edições Paulinas, 1983:84-90
CORTELAZZO, Iolanda B. C. Colaboração, Trabalho em equipe e as Tecnologias de Comunicação: Relações de Proximidade em Cursos de Pós-Graduação. Tese de Doutorado - Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, 2000
SANDER, B. Educação, Trabalho e Cidadania: Eixos de uma política social relevante na América Latina. In: Revista Brasileira de Política e Administração da Educação. V. 16, n. 2 , Porto Alegre, 2000, p. 137-255.

BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA

MACHADO, E. M. Pedagogia e a Pedagogia Social: Educação não formal In: Pedagogia em Debate on Line – Livro Virtual – Curitiba – UTP – 2003 – Disponível em : http://www.utp.br/mestradoemeducacao/pedagogiaemdebate.html

MACHADO, E. M. & CORTELAZZO, I. B. C (orgs) Pedagogia em Debate on Line – Livro Virtual. Curitiba, UTP, 2003. Disponível em: http://www.utp.br/mestradoemeducacao/pedagogiaemdebate.html

BERNET, J. T. La Educación fuera de la escuela. Barcelona: Ariel, 1996.

MARIN, A. J. (org.). Educação continuada. Campinas: Papirus, 2000.

DESTRO, M. R. P. Educação continuada: visão histórica e tentativa de conceitualização. In: Educação Continuada. Caderno CEDES. Campinas: Papirus, nº 36, 1995, p. 21.27.

BEHRENS, A. P. Formação continuada dos professores e a prática pedagógica. Curitiba: Champagnat, 1996.

MORAES, Maria Cândida . Novas tendências para o uso das Tecnologias da Informação da Comunicação na Educação. (In) FAZENDA, Ivani (et al) Interdisciplinaridade e Novas Tecnologias. Campo Grande, MS : Ed. UFMS, 1999.

PETERS, O . Didática do Ensino a Distância. São Leopoldo-RS, Editora UNISINOS, 2001.

PURIFICAÇÃO, I.; VERMELHO S. C. S.D. Informática na Educação: a percepção dos professores. Tuiuti Ciência e Cultura. Volume 16, m


Doutora em Filosofia e Ciências da Educação – Universidade Santiago de Compostela, Espanha. Mestre em Educação, área de concentração Currículo. Pedagoga, Especialista em Métodos e Técnicas de Ensino. Docente e pesquisadora de Programa de Pós-Graduação – Mestrado em Educação e do Curso de Pedagogia da Universidade Tuiuti do Paraná.

Doutora em Educação pela USP. Professora no Programa de Pós-Graduação em Educação - Mestrado em Educação na Universidade Tuiuti do Paraná. Coordenadora do Núcleo de Pesquisa em Processos Educacionais Interativos. Pesquisadora nas áreas de Educação a Distância , Ambientes de Aprendizagens Colaborativos e Tecnologias de Informação e Comunicação em Educação. Membro da ABED, sócia fundadora da ABED - Polo Paraná.

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GESTÃO EDUCACIONAL:
DISCUTINDO INVEJA NAS ORGANIZAÇÕES


Evelcy Monteiro Machado *
Universidade Tuiuti do Paraná
Larissa Monteiro Machado
**
Mestranda em Administração
Universidade Estadual de Londrina

Neste estudo pretende-se discutir um dos aspectos relevantes na estrutura organizacional referente ao nível pessoal que interfere na gestão educacional, tanto em espaços escolares como não escolares. Trata-se, assim, de discutir inveja, um sentimento que para Kant é inerente à própria natureza humana. Fundamenta-se em diferentes autores, destacando-se a obra de Tomei – Inveja nas Organizações. Ressalta-se, no estudo, que a inveja está presente, em maior ou menor grau, nas relações entre os atores dos processos organizacionais. É analisada como um sentimento que evidencia conflitos e que pode ser manifesto ou oculto, mas que pode também propiciar condições para transformação na gestão organizacional com a inclusão de princípios éticos de responsabilidade social e de respeito humano mútuo.

Palavras-chave: inveja, gestão educacional, processos organizacionais

As transformações da sociedade moderna, com os avanços científicos e tecnológicos, o fenômeno da mundialização econômica e política, o desenvolvimento urbano, e as contradições resultantes do próprio processo de transformação geram novas necessidades educacionais e apontam para além da necessidade da universalização do saber ler, escrever e contar, amplamente discutida no país. A escola, organizada como espaço natural para a elite cultural e econômica dominante, por pressões sociais e econômicas, lenta e gradativamente passa a ampliar seus espaços para oferecer uma educação mais democrática. Passa a incluir novos segmentos sociais desde o inicio da escolarização, expande-se nos níveis intermediários, amplia a oferta de vagas na educação superior e ainda se compromete com a questão da educação continuada ao longo da vida.
Essa é uma nova amplitude da educação contemporânea: a que incorpora a estrutura burocrática do sistema formal e, que contraditoriamente, rompe com os próprios limites ofertando educação não formal – ainda que organizada e estruturada – e que também oferta a educação informal, emergente de necessidades e interesses diversificados, inovadores, momentâneos e criativos ou mesmo conservadores e tradicionais.
Nesta diversidade é conveniente voltar à década de setenta, em que a escola é discutida como uma organização complexa, tal qual outras organizações, e que apresenta relações de poder e de conflito que vão sendo estabelecidas no interior das instituições educacionais no desenvolvimento de seus fins pedagógicos. Para efeito das organizações, nas quais a escola se insere, são relevantes as contribuições no decorrer do século XX provenientes de diferentes áreas, dentre as quais a sociologia, a psicologia e a filosofia. Esses estudos discutem a questão dos problemas sociais incluindo a compreensão do comportamento humano nas organizações (ETZIONE, 1967). Salienta Tragtenberg (1978, p.6) que a “burocracia pedagógica” própria da estrutura dos sistemas educacionais se estrutura em três níveis de organização: do pessoal, de programas e trabalhos e de inspeções e exame, e que “no que se refere a pessoal, o burocrata da educação está separado dos meios de administração como operário dos meios de produção, o oficial dos meios de guerra e o cientista dos meios da pesquisa”.
Neste estudo pretende-se discutir um dos aspectos relevantes na estrutura organizacional referente ao nível pessoal que interfere na gestão educacional, tanto em espaços escolares como não escolares. Trata-se, assim, de discutir a inveja, um sentimento que evidencia conflitos e que pode ser manifesto ou oculto, mas que está em maior ou menor grau presente nas relações entre os atores dos processos organizacionais.
Devido à complexidade de se discutir a dimensão pessoal, ou seja, as relações humanas e também a importância do assunto para as organizações, tornou-se necessário apresentar o tema.
A inveja está associada à história da humanidade. No Gênesis surge como pecado; na tradição cristã, como um dos pecados capitais, como um vício que se opõe à virtude. São Tomás de Aquino destaca que o sentimento de entristecer-se por não ter o que o outro tem não é reprovável, é incontrolável. O reprovável vício se manifesta quando os indivíduos são compelidos a agir para compensar essa tristeza. Essa ação é livre, consentida e negativa.
Muitos filósofos têm condenado a inveja como vício. Descartes registra que afeta não só ao outro como ao próprio indivíduo; Spinoza relaciona com tristeza e ódio. Kant vai além, aponta a inveja como um dos vícios da misantropia, que está associada à ingratidão e à alegria pelo mal alheio. Embora reconheça que a inveja é inerente à natureza humana, não a reprova pelo impulso mas pelo “abominável vício de uma paixão humana que se atormenta a si mesma e que se dirige, ao menos como desejo, a destruir a felicidade alheia; portanto, opõe-se tanto ao dever do homem a si mesmo quanto ao dever do homem para com os demais.” (KANT, p.36). Nesta interpretação entende-se a inveja como uma característica própria do homem, que se torna negativa quando é cultivada, gerando o ódio que é destrutivo para o indivíduo e para a sociedade (TRINDADE, 2004).
Para Aristóteles a inveja resulta da proximidade dos indivíduos, da semelhança. Surge da comparação e está relacionada à ambição. Neste enfoque são várias as relações que encaminham para aproximar inveja, moral e justiça. Para Nietzsche é uma moral baseada no ressentimento, na destruição do outro. Marx relaciona a primeira fase do comunismo com um senso de justiça baseada na inveja dos que têm mais. Freud aponta a inveja como origem da justiça que gera a necessidade de igualdade de tratamento.
Rawls (2000) analisa inveja sob outro enfoque. Discute a justiça social, que não tem raízes na inveja; aponta que numa sociedade bem ordenada são neutralizadas as condições para se produzir a inveja, que é representada por falta de confiança e segurança em si próprio, por sentimentos de impotência frente ao outro e pelas desigualdades das estruturas sociais que impelem os menos favorecidos a perceberem alternativas. Apresenta a inveja moral, que não produz danos ao individuo e à sociedade.
Em síntese foram apresentadas duas interpretações para inveja: a primeira relacionada a ódio e destruição e a segunda que propicia condições para transformações de valores estabelecidos e redução das desigualdades.
A inveja como parte integrante da natureza humana, que já havia sido estudada por Kant em 1922, tem sido discutida por vários autores entre os quais Vries (1996) e Beck (1998). Tomei (1994), autora do livro “Inveja nas Organizações”, baseia seus estudos em Freud e Melaine Klein e reafirma a questão apontando que a inveja pode ser um comportamento inerente ao homem.
A inveja apresenta características próprias e distingue-se do ciúme. Repetindo Klein, Tomei (1994, p.6) apresenta a inveja como “o sentimento de ira por outra pessoa possuir e usufruir de algo desejável, sendo o impulso invejoso de retirá-lo ou estragá-lo” diferenciado do ciúme, mas muito próximo em termos de sentimentos, já que estão relacionados à perda ou à ameaça de perda: “é uma situação que envolve três pessoas, na qual a terceira pessoa retira, ou lhe é dado, o ‘bem’ que por direito pertence ao indivíduo ciumento”.
Assim, apesar de que inveja e ciúme possam ser considerados como sentimentos semelhantes, existe uma distinção significativa entre eles: o ciúme normalmente se refere a pessoas, é um sentimento consciente, vindo da dúvida, da insegurança e da rejeição. A inveja traz sentimentos de inferioridade, dificuldade de aceitação, culpa, sentimento de destino injusto e desejo por algo de terceiros.
Destaca Tomei (1994, p.9) seis experiências emocionais que, isoladas ou em qualquer combinação, podem fazer parte da inveja, apontando: aspirações, inferioridade, ressentimento do agente em questão, ressentimento global, culpa, admiração.
    O sentimento da inveja também está intimamente ligado à escassez, simplesmente porque a falta de condições básicas de sobrevivência, a necessidade de status (através de bens) e as virtudes humanas são fatores causadores de inveja. E as bases da escassez são o fato de que as coisas ou qualidades, entendidas como posses, estão sob domínio de outra pessoa ou não estão à disposição. Entretanto, Tomei (1994, p. 29) ressalta que “É claro que a inveja não está reduzida somente a condições de escassez absoluta. Uma situação de privação relativa e de suposta injustiça institucional, interpessoal, ou social é suficiente para o aparecimento da inveja”.
    A inveja pode ainda estar relacionada a uma sensação de injustiça. Isso ocorre porque o conceito de justiça pode ser diverso entre os indivíduos. A questão é mais ampla ao se considerar, a partir das referências sobre o tema, a diversidade das teorias que fundamentam a discussão sobre justiça, tais como:
  • Liberalismo, defendido por Robert Nozick, que ressalta que cada pessoa tem direito àquilo que produz;
  • Liberalismo político, que tem em John Rawls um grande defensor e que destaca que cada pessoa é livre para fazer o que quiser desde que não interfira na liberdade do outro;
  • Teoria pluralista, representada por Michael Walzer que defende que os direitos individuais devem ser decididos por meio de negociações entre os membros da sociedade e organizações sobre o sentido social dos bens comuns.
       Tendo como cenário a diversidade teórica, Tomei (1994, p.31) afirma que “numa sociedade dentro da qual nenhum princípio uniforme de justiça prevalece e na qual uma variedade de princípios de justiça convivem uns com os outros, o caráter moral de qualquer ressentimento sobre condições de desigualdade é mais difícil de ser apurado”. O ressentimento moral passa a ser inveja de fato quando a pessoa ressentida é incapaz de colocar suas reivindicações, provando porque se ressente de ter menos que os outros.
       Sobre a relação entre a inveja e a justiça social, Heider (Apud Tomei, 1994, p.32) aponta que “quando um indivíduo é parecido ou está na mesma categoria daquele que possui vantagens e é invejado, parecerá natural, e de algum modo mais justo, se suas quantidades e qualidades forem equalizadas”. Complementa afirmando que “mesmo nos casos em que a vantagem do outro pode parecer justa por padrões sociais objetivos, a privação certamente ferirá o sentimento de igualdade”.
      Apesar das contradições é importante salientar que a inveja pode ter características benignas ou construtivas. Isso pode acontecer quando, por exemplo, um indivíduo deseja adquirir para si qualidades, bens e posses que admira nos outros, através de seu próprio esforço. Nessa situação não existe uma relação negativa em relação ao objeto da inveja; ao contrário, o objeto torna-se um modelo a ser seguido. Com isso torna-se um sentimento estimulante, aumentando o sentimento de ambição e a competição saudável para se obter o que se deseja.
    Segundo Tomei (1994, p.39), “a inveja pode ser canalizada para o estímulo e competição em questões não-materiais, como honra, status e estima”. Pode-se inferir pelos registros históricos, diferentes situações geradoras de motivações sociais que podem ter a inveja como fonte geradora e incentivadora para novos padrões de comportamento. Enfeitar-se, por exemplo. As sociedades sempre valorizaram os padrões de beleza, mesmo nas histórias infantis. Ressalta-se, entretanto, que, mais do que pelo lado físico das pessoas, a inveja acontece por questões que não podem ser medidas como as qualidades, virtudes, emoções, sentimentos.
        Na sociedade contemporânea vive-se um momento de questionamento e transição de valores instituídos. As transformações do contexto interferem nas relações dos indivíduos no trabalho. Acentua-se o individualismo, a competitividade em contraposição à solidariedade crescente e a uma nova responsabilidade social. São filosofias de vida que se contradizem em sua essência. Com tais transformações surgem novos valores éticos e morais. Segundo Tomei (1994, p.54), “a transição social e o processo de mudança ambiental acelerado têm demandado da sociedade rediscussões constantes do sistema de valores”.
        Os valores, antes restritos a relações na vida em família, na comunidade e nas organizações de trabalho, com a globalização abrangem, além do ambiente, questões da cidadania nacional e mundial. A inclusão do debate na organização sobre valores sociais, questões éticas e morais torna-se umas das alternativas não só para as organizações, mas para a sociedade, para enfrentar as mudanças.
        Em um estudo diagnóstico sobre os ambientes organizacionais brasileiros Tomei (1994, p.57) descobriu que a inveja está presente, mas deixa de ser assumida pelos diferentes indivíduos. A autora afirma que “nesse diagnóstico geral, concluímos que o povo brasileiro não demonstra a sua inveja, talvez por superstição ou por princípios éticos, e que as percepções referentes a existência da inveja são ambíguas” Muitas vezes o sentimento da inveja nasce não da necessidade de ter o que o outro possui, mas da necessidade de sentir o mesmo prazer que ele, alcançar o mesmo nível de felicidade. Apesar de que todos os seres humanos sofrem de inveja, os que são menos desenvolvidos tendem a senti-la de forma mais intensa. É o que acontece com as crianças, que não conseguem dissimular esse sentimento. “Assim sendo, podemos afirmar que a inveja é, de início, inevitável, embora isso não signifique que não possa e não deva ser superada ao longo da vida” (id .ib.,p.63). Mesmo sendo um sentimento inerente ao homem, são poucas as pessoas que chegam a tomar alguma atitude concreta, até mesmo agressiva, em relação à inveja, normalmente esta não passa de intenções.
        Como não é possível evitar que as pessoas invejem, deve-se preocupar com aqueles indivíduos que não conseguem controlar seus sentimentos prejudicando os demais.
        A inveja pode ser classificada em três categorias:
  • Inveja Sublimada, que inclui indivíduos que sentem inveja mas conseguem superar esse sentimento, utilizando-o para seu próprio crescimento. Tais indivíduos admitem as qualidades do seu objeto de inveja e buscam se superar para alcançar os seus próprios objetivos.
  • Inveja Neurótica. Nesta categoria estão os indivíduos que sentem inveja e sofrem com isso, sem fazer nada para mudar suas atitudes. Normalmente são deprimidos, amargos e ansiosos.
  • Inveja Perversa, se refere a indivíduos que são invejosos e que buscam destruir seu objeto de inveja. São difíceis de se encontrar em organizações porque ao depreciar seu objeto de inveja acabam por destruir suas próprias relações de trabalho.
        Dentre outros fatores que podem desencadear processos de inveja estão a presença de lideranças que representam papéis de heróis ou até de mitos. A própria existência de mitos e heróis em uma organização já remete a um modelo de gestão centralizado, que se contrapõe a uma liderança eficaz. Até o termo liderança, por si só, já nos remete a grandes líderes da história. Com isso o líder passa a ser uma figura quase mítica e que propicia atitudes invejosas.
        O mesmo processo de inveja pode ocorrer nas relações interpessoais que vão se estabelecendo com o poder formal.
        Tomei (1994, p.88) afirma ainda que o sentimento de inveja nas organizações se concentra nas chefias intermediárias que têm “dificuldades de ascensão organizacional e o poder de bloquear ou manipular o processo de informações/comunicações e de decisões”.
        A inveja pode acontecer também entre as diferentes gerações, onde o mais velho inveja o mais novo por viver a juventude numa época “mais fácil” e o mais novo inveja a experiência e a maturidade do mais velho.
Nas organizações, diferentes estratégias são utilizadas para enfrentar a questão da inveja – algumas já comentadas. Entre os próprios indivíduos vão sendo encontradas alternativas para sublimar seus sentimentos em relação a colegas de trabalho como as estratégias de projeção e retirada, a desvalorização e a negação.
        Entretanto, como salienta Vries (1996, p.76), as diferentes formas de fazer frente à inveja podem ser destrutivas ou construtivas. “Sublinhemos que estas diferentes expressões não se excluem mutuamente, e que elas não estão tampouco necessariamente fixadas. Uma maneira particular de conter a inveja evoluirá muitas vezes para uma outra forma segundo a intensidade do conflito intrapsíquico”.
        Ainda que a inveja possa ser teorizada como um sentimento real nos indivíduos, estes costumam apresentar atitudes de defesa contra seu próprio sentimento. Tais atitudes, na gestão organizacional, se não forem discutidas, analisadas e trabalhadas, podem comprometer o ambiente de trabalho. Dentre as maneiras destrutivas de fazer frente à inveja encontram-se: a idealização, onde o objeto invejado é colocado fora do alcance; a retirada, onde o indivíduo invejoso se torna incapaz de tolerar seu próprio sentimento – nessa situação o indivíduo passa também a ter medo do sucesso, desvalorizando-se, para não objeto de inveja; a desvalorização, quando a pessoa sofredora do sentimento deprecia o objeto de inveja, movida pelo desejo de vingança, e nesse caso procura fazer papel de vítima, provocando no outro sentimento de culpa pelo sucesso obtido; a projeção, onde o invejoso não assume seu sentimento e atribui o mesmo aos outros; e a negação e bajulação, nessa situação o indivíduo tem dificuldade de aceitar seu sentimento e procura bajular o objeto de inveja, porém, depreciando-o quando da sua ausência.
    Para gerenciar a inveja nas organizações, fazendo que ela se torne um sentimento saudável, Beck propõe estratégias, como as apresentadas no quadro a seguir.

Fatores que podem induzir a inveja  Fatores que podem reduzir a indução da inveja
Nível Organizacional Nível Organizacional
O individualismo Cooperação e trabalho em equipes
As estruturas fechadas Gestão participativa
Os modelos autoritários  Flexibilidade e autonomia
Os privilégios e ostentações Programas de salários redondos
A polarização, Participação de lucros
A politização, Negociação de conflitos
As mentiras e boatos, Avaliação de mérito e potenbciais
Programas de salários sem créditos, Sistemas de informação


Nível individual, Nível individual
A busca do sucesso a qualquer preço, A busca do autoconhecimento
As estratégias de desvalorização, A busca da autovalorização
As projeções, A busca da excelência
A busca da ostentação, A busca de lideranças
As estratégias de negação, A busca do senso da responsabilidade
A estratégia de idedalização, A busca da reciprocidade
             Fonte: Beck (1998, p. 165)

        De acordo com Tomei (1994, p. 113) os indivíduos estão em processo contínuo de ajustamento, ou seja “um organismo relaciona seu comportamento interior com as exigências do meio que o cerca”.
Quando as oportunidades de uma pessoa mudam dentro da organização cria-se um conflito entre o ajustamento individual e as necessidades/exigências do grupo. A gerência desse conflito está ligada à gerência dos sentimentos de inveja.
        A autora afirma que sublimar o sentimento de inveja pode prejudicar relações dentro das organizações. E que é possível gerenciar esse sentimento, porém é necessário levar em conta o propósito de cada organização: “as suas crenças, os seus valores, os seus comportamentos e o papel da liderança na sua forma de agir” (id.ib., p.115).
        A partir de levantamentos de formas depreciativas de como fazer frente à inveja, como a desvalorização, negação e bajulação entre outras, a autora discute maneiras construtivas de fazer face a esse sentimento. Destaca que organizações capazes de criar ambientes sadios de trabalho, sem a presença de heróis ou mitos, com lideres eficazes, que não criam competição entre seus subordinados estão menos propensas a sofrer com a inveja organizacional.
        Segundo Vries (1996, p.82), para vivermos num mundo com menos conflitos “devemos evitar nos tornar prisioneiros de um equilíbrio interior ilusório que nos faz viver uma cadeia ininterrupta de autodecepções geradoras de angústia e tensão”. Complementa o autor que “para prevenir tal estado de coisas, deve-se transcender a inveja e, para isso, é preciso dar prova de certa maturidade emotiva que permita a auto-avaliação, a compaixão, o reconhecimento, a responsabilidade, o engajamento pessoal”.
       Já Beck (1998, p.169) afirma que é possível se chegar na organização utópica proposta por Tomei. “Percebe-se (...) que a organização que possui uma gestão competente e que permeia as suas ações apoiada numa ética de responsabilidade é capaz de reduzir os fatores de indução da inveja”. O autor apresenta estratégias para se atingir a empresa ideal como mudança nos modelos de gestão, diminuição dos níveis hierárquicos, programas de recursos humanos que instrumentalizem práticas de valores éticos, de responsabilidade social. Admite Beck que “esses fatores, colocados em prática, podem facilitar um clima de excelência pessoal e organizacional, no qual os comportamentos de inveja sejam controlados e gerenciados”.
    A questão da inveja, pelas dimensões que pode assumir, torna-se um dos aspectos relevantes a serem considerados na gestão educacional tanto escolar como não escolar quando se defende gestão democrática, autônoma e participativa.

REFERÊNCIAS

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VIEIRA, S. L. (org) Gestão da escola: desafios a enfrentar. Rio de Janeiro: DPSA, 2002.


* Doutora em Filosofia e Ciências da Educação – Universidade Santiago de Compostela, Espanha. Mestre em Educação, área de concentração Currículo. Pedagoga, Especialista em Métodos e Técnicas de Ensino. Docente e pesquisadora de Programa de Pós-Graduação – Mestrado em Educação e do Curso de Pedagogia da Universidade Tuiuti do Paraná.
** Graduada em Administração com habilitação em Hotelaria e especialista em Metodologia do Ensino Superior. Mestranda em Administração com ênfase em Gestão de Negócios pela Universidade Estadual de Londrina.


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FORMAÇÃO DE PROFESSORES: UMA HISTÓRIA DE DESCASO E DIFICULDADES

  Fabiana Andrea Barbosa *
Mestranda em Educação
Universidade Tuiuti do Paraná
O presente trabalho visa a  demonstrar a precariedade da formação de professores no Brasil desde seu surgimento até os dias atuais. Tal situação foi-nos dada como herança dos primeiros momentos de aculturação do povo indígena quando da colonização brasileira. Abordam-se as transformações no campo intelectual ocorridas em virtude da chegada da família real portuguesa no Brasil e  vislumbra-se a formação de professores desde a criação da primeira escola normal brasileira, em 1835, até sua extinção com  a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, em 1996. Aborda-se o descaso com a profissão – professor que invadiu os cursos de formação, bem como a perda de prestígio da docência e a política de alienação dirigida que se instalou de forma impiedosa nos bancos escolares. No período “pós-LDB”, houve uma abertura maior de espaços de formação superior de professores, que não estão suprindo as necessidades de formar os responsáveis pela desalienação da sociedade brasileira. Com a determinação governamental de os cursos de pedagogia estarem formando somente “cientistas da educação”, desvinculados da docência, e o curso normal superior assumindo esse papel sem, contudo, a necessidade de se fazer pesquisa no processo de  graduação, novamente a educação brasileira estaria tendo cursos de formação acelerada, sem a qualidade almejada em um docente. Mais do que criar novos espaços de formação, faz-se necessário um repensar no papel político e pedagógico do professor, ato este que em momento algum foi feito em nossa história da educação brasileira. Formar professores exige dos estabelecimentos que se propuserem a tal ação um olhar global acerca da práxis pedagógica, pois esta precisa ir muito além do simples associar teorias a práticas.

Palavras-chave: Formação de Professores, Escola Normal, História dea educação

Não há ensino de qualidade, nem reforma educativa,
nem inovação pedagógica, sem uma adequada formação de professores
”.
(António Nóvoa)
Refletir acerca da formação atual de nossos professores requer que vislumbremos primeiramente o contexto histórico da Formação destes no Brasil. Conhecemos, através da história, o processo de aculturação indígena sofrido no Brasil-colônia, bem como a instalação da Companhia de  Jesus, representada pelos jesuítas, e que se fez a responsável por catequizar os índios. “somente pela aculturação sistemática e intensiva do elemento indígena aos valores espirituais e morais da civilização ocidental e cristã é que a colonização portuguesa poderia lançar raízes definitivas (...) ( MATTOS, 1958)
Nesse momento histórico, ainda não havia a escolarização de um modo efetivo, ao menos não para os índios. Os colégios jesuíticos, instalados no país a partir de 1570, visavam à formação da elite colonial, iniciando, dessa forma, a elitização do ensino brasileiro. Enquanto aos negros, índios e mestiços destinava-se a formação para o trabalho braçal, a elite era preparada para o trabalho intelectual. Tal herança elitista foi tão forte que até hoje, 500 anos depois, ainda vigora no país o sistema do “apartheid” educacional.
“A expulsão da Companhia de Jesus dos domínios portugueses, após séculos de predominância em nossa educação, faz com que se inicie nesta colônia, um processo de laicização da instrução com o envio dos professores régios.” (VILLELA,2003).
Com a vinda da família real para o Brasil  e o país sendo a sede da Coroa portuguesa uma série de modificações no setor intelectual foram lançadas. Destacam-se a criação da Biblioteca Pública (1810), do Museu Nacional (1818), circulação do primeiro jornal, A gazeta do Rio (1812) e a primeira revista – As Variações  ou Ensaios de Literatura – em 1813. No âmbito educacional propriamente dito, visando à unificação do sistema de ensino, houve a adoção de métodos unificadores, para que a pluralidade de formação ( na família, na igreja, em preceptores particulares, etc) pudesse ser única. Contudo, o sistema de ensino ainda era incipiente e foi somente a partir de 1827, com a implantação da Lei Geral do Ensino, única lei geral relativa ao ensino elementar até 1946, que houve uma organização docente no Brasil. (RIBEIRO, 1998) “Esta [lei] era (...) onde estavam presentes as idéias da educação como dever do Estado, da distribuição racional por todo o território nacional das escolas dos diferentes graus e da necessária graduação do processo seletivo (...)” Nesse contexto surge, em 1835, a primeira escola normal brasileira, em Niterói, Rio de Janeiro, criada visando a uma melhora no preparo docente, seu curso tinha duração de dois anos era em nível secundário.
RIBEIRO (1998) faz uma crítica à escola normal afirmando que os cursos ofertados por esta eram instáveis e  por somente em 1880 passarem, em São Paulo, a ter duração de três anos. As escola normais, segundo o autor, apresentavam alguns problemas: quanto à programação,  detalhavam desnecessariamente alguns aspectos e tratavam superficialmente de outros; por serem noturnos e, portanto, terem poucas aulas práticas; pela não garantia de profissionalização; e pelo mau preparo dos professores.
Cabe aqui uma breve reflexão. Somente depois de trezentos anos de sua “descoberta” é que o país recebeu o primeiro espaço unicamente destinado à formação de professores. Como sobreviveu a educação brasileira durante todo esse tempo? Haveria algum motivo político para que se promovessem mais de trezentos anos de alienação cultural? Em qual contexto político-econômico estava calcado esse atraso no interesse de formar os professores? E agora, com esse “novo” espaço de formação, a Escola Normal realmente estaria formando ou deformando seu egressos?
Em 1845, na Assembléia Legislativa fluminense, o vice-presidente daquela casa discursava: “A nossa primeira necessidade é a instrução; não a instrução concentrada em poucos, senão derramada por todas as classes” (VILLELA,2003). Belíssimo discurso se não ficasse somente na oratória política. A educação, na época, era vista como uma forma de conter os “bárbaros” que ameaçavam a ordem social. Assim, pondo-os na escola, a sociedade estaria “fazendo seu papel” de garantir acesso à “civilização”, a fim de controlar a população. A educação estaria assumindo um de seus papéis mais cruéis que é o de reprodutora de classes sociais. Voltariam, então, a aplicar a educação de Roma quando da conquista dos espanhóis: “As armas não tinham conseguido submetê-los a não ser parcialmente; foi a educação que os domou.” (BRANDÃO,2002)
Nesse contexto histórico e de busca pela dominação através da instrução é que surge a escola Normal brasileira. Muito mais do que dotar os seus ingressos de conhecimentos necessários para se exercer a profissão de professor, tal espaço formativo tinha um forte cunho ideológico. Para os governantes da época, a educação era uma forte arma para se conhecer e controlar o povo e, assim sendo, os professores que estariam formando precisariam comungar da limitação de pensamento e da ausência  de idéias reflexivas acerca do contexto político-social vigente.
Nessa perspectiva histórica, que nos dá uma breve noção de como se iniciou o processo de formação dos professores brasileiros, torna-se fácil perceber por que estamos mergulhados atualmente nesta “babel” de cursos de formação, os quais pouco ou nada formam e que a cada dia diminuem mais o papel do professor e despejam no mercado milhares de mentes não-reflexivas, pois lhes foi negado o direito de pensar.
Viajemos cem anos no tempo. Século XX, novos desafios, o comércio aquecido pelas indústrias e pela mão-de-obra imigrante, um país “livre”, escravos “libertos”, Ordem e Progresso. Será? É nesse contexto, a partir da década de 40, que estaremos revendo nossa Escola Normal.
Com uma herança de manipulação, os frutos da Escola Normal não poderiam ser diferentes. Os professores formados pelos seus bancos estariam responsáveis  pela formação inicial  das primeiras séries do ensino fundamental e assim o foi até o desaparecimento da Escola Normal com a instituição da Lei de Diretrizes e Bases da Educação em 1996.
A Escola Normal não conseguiria libertar-se do caráter elitista que lhe foi concedido quando da sua criação. Muitos de seus egressos estariam em uma sala de aula simplesmente em caráter de transmissão de conteúdo, sem ao menos se preocuparem em formar a consciência crítica de seus alunos. Muitos, também, não procuraram na formação continuada, tampouco, no ingresso em uma graduação, o complemento de sua formação inicial. Contentaram-se com as migalhas que lhes foram dadas e essas mesmas migalhas eram transmitidas aos seus alunos.
Os professores, frutos dessas instituições, concluíam o curso de magistério e imergiam em um mercado de trabalho muitas vezes diverso daquele “mundo encantado” que lhes era mostrado em aulas como psicologia da educação ou metodologia. Aos poucos estes percebiam que educar era mais do que fazer lindos painéis com motivos diversos. Educar exigiria deles uma visão política, que lhes foi negada nos bancos escolares. A “duras penas”, aprenderiam que educar é ter compromisso social, é uma incansável busca por ser melhor. Mas será que todos aprenderam? Será que compromisso e visão política chegaram a fazer parte de seus dicionários? Creio que não. Se isso houvesse acontecido, o desânimo não se haveria instalado nas séries iniciais do ensino fundamental. Não seria possível encontrar  tantos “analfabetos funcionais” ocupando hoje os bancos dos mais diferentes níveis de ensino. Concordo com DEMO (2000) quando este afirma que “tem-se a impressão de que houve uma aceitação social de que para as primeiras séries do ensino fundamental, basta profissional menor, estabelecendo a mesma iniqüidade social com a qual todos convivem, mesmo os que se dizem decididos a combater as desigualdades de classe. A escola normal acabou tornando-se lugar onde se inventam profissionais menores para populações menores, ou seja, coisa pobre para pobre.”
 Desde a criação da Escola Normal, observa-se que a formação dos profissionais da educação sempre esteve fadada a segundo plano nas políticas públicas de educação. Tais políticas encontram-se fortemente vinculadas com interesses externos à educação e que, por isso, não formam adequadamente os docentes. AGUIAR (in SGUISSARDI, 2000)  menciona que “pauta-se esta reforma [educacional], tal como vem ocorrendo na maioria dos países da América Latina, por referenciais comuns, cujos nexos podem ser encontrados nas orientações de organismos internacionais, a exemplo do Banco Mundial, BID, UNESCO e Cepal.” 
Em uma análise dos currículos da Escola Normal, percebe-se, claramente, que há um excesso de técnica, mas o humanismo e a aplicabilidade não caminharam juntos para formar o profissional que se espera neste contexto de modernidade no qual estava inserida. DEMO (2000) comenta que “os professores separam totalmente a teoria da prática: ao mesmo tempo em que imaginam saber defender a idéia do projeto pedagógico, não o colocam em nenhum lugar prático, onde tenham que aplicá-lo.”
Segundo KRAMER (1997), “A própria formação a nível de 2º grau não prepara o professor para a heterogeneidade social e cultural que irá encontrar e enfrentar na escola: em outras palavras, o curso normal não qualifica, ou seja, o professor, ao chegar à escola, nem dispõe de uma visão teórica abrangente sobre a prática pedagógica, nem conhece a realidade da escola e sua prática concreta. Ao invés da teoria-prática dinamicamente articuladas, o que se adquire na escola normal são discursos e técnicas.”
Assim sendo, o caos instalou-se na educação brasileira, se é que algum dia ele esteve ausente. As classes pobres, fadadas à educação pública, eram realmente instruídas ou, melhor dizendo, adestradas por um professor muitas vezes insatisfeito com sua posição social, mas acomodado, fruto de uma política de exclusão das massas. Em um país como o Brasil - que engatinha no setor social e sobrevive à custa de empréstimos milionários dos gestores internacionais - obter graduação secundária em  um curso técnico, com o qual aos dezessete, dezoito anos já se poderia ingressar no mercado de trabalho era realmente uma forma de “garantia” de se ter um mísero salário  no final do mês. DEMO define tal exercício do magistério como “(...) uma profissão decadente, mal paga e mal vista; embora não se ganhe coisa apreciável e se tenha ambiente de trabalho pouco valorizado, ela é útil em termos sociais; afinal de contas, tem-se aposentadoria integral, muitas folgas e férias escolares, licenças de toda ordem acomodação dos interesses pessoais(...)  e prossegue (...) é mais cômodo continuar dando a  mesma aulinha de sempre, sem admitir que muitos alunos querem esse tipo de aula também para não terem de se dedicarem mais(...)”.
A acomodação de muitos professores, os quais permaneceram durante décadas sem importar-se com a formação continuada e muito menos com a busca por uma graduação universitária somente foi abalada com a LDB 9394/96, a qual tece algumas considerações acerca da formação de professores:

A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida como formação mínima para o exercício do magistério e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal.

Ainda a LDB, em seu artigo 87, previa um prazo de dez anos , a partir do qual só seriam admitidos professores habilitados em curso superior. Tal iniciativa, embora tenha causado expectativas de reais reformas educacionais e de melhora no panorama educacional do país, maquiava interesses externos relacionados com o Banco Mundial e outros órgãos financiadores da educação brasileira. Essa mudança, priorizava um “avanço” quantitativo em nossa educação, esquecendo-se da qualidade. A Lei 9394/96 maquiava uma nova educação, literalmente, “para inglês ver” e que se perdeu em meio a tantas mudanças, negociatas políticas e interesses de setores públicos e privados, que vislumbraram na nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação um novo filão financeiro.
Com tal ato, jogaram-se fora anos de Habilitação magistério como se o problema fosse o curso.  Como já citei, durante muito anos a Escola Normal foi vista cano um “cano de escape”, pois o referido curso passou a ser procurado por uma clientela que via no magistério a saída para um possível desemprego, o que fez com que a vocação e a vontade de ser educador não fossem os principais objetivos dos ingressos.
Esse fato  tem seu reflexo na base curricular dos cursos da Escola Normal. Eram priorizadas disciplinas do núcleo comum, e as específicas e humanistas fadadas, muitas vezes, ao último ano, juntamente com o estágio supervisionado. Assim, anualmente eram “despejados” no mercado de trabalho profissionais com o mínimo de conhecimento didáticos e metodológicos, que não conseguiam estabelecer uma relação entre teoria e prática. E, para reduzir ainda mais a função social desses profissionais, não possuíam formação política – herança do século XIX – e reduziam-se a meros transmissores de conteúdos, seguindo modelos prontos, não questionador, não conduz seus alunos aos questionamentos  e não perceberam a importância da reflexão em sua prática.
Mas, após a implantação da nova LDB tudo mudou. Será? Essa lei prevê, como já mencionei, a obrigatoriedade do curso superior para ser docente das séries iniciais do ensino fundamental. Surgem, então, novos espaços de formação.
         Nesse contexto, buscando facilitar o acesso ao ensino superior, um modelo que  prioriza a certificação em detrimento à qualidade de ensino, o Estado, através da LDB/96, amplia o leque de instituições superiores que poderiam estar qualificando o acadêmico para o mercado de trabalho. Abrem-se, então, muitas possibilidades de formação superior, dentre e elas os Institutos Superiores de Educação.
Porém, somente com a publicação do decreto n.º 3276, em 6 de dezembro de 1999 que estes, juntamente com os Cursos Normais Superiores seriam denominados, pelo então presidente da república Fernando Henrique Cardoso, os responsáveis pela formação dos docentes da educação básica, retirando o locus de tal função do Curso de Pedagogia, o qual estaria destinado a formar “cientistas da educação” (AGUIAR, in SGUISSARDI,2000) e não mais docentes. Fragmentar a formação de professores, deixando de observar o modelo HUMBOLDTIANO de universidade, o qual prevê a contínua associação entre ensino, pesquisa e extensão,  oferecendo aos professores de séries iniciais espaços somente de ensino é retroceder à mera transmissão, sem pesquisa, sem produção de novos conhecimentos, sem reflexão: somente adestramento.
Os Institutos Superiores de Educação  têm a autonomia de ofertar o curso Normal Superior para a formação de docentes para a educação infantil  e para as séries iniciais do ensino fundamental; cursos de licenciatura, para a formação de docentes dos anos finais do ensino fundamental e médio e seriam, conforme  o Artigo 45 da LDB, responsáveis por programas de formação continuada para a atualização de docentes da educação básica. Contudo, ao contrário de um processo lógico de ouvir-se as partes envolvidas em tal processo de criação de um novo espaço formador de professores, a “malha” do Institutos Superiores foi tecida nos gabinetes, respeitando apenas interesses governamentais e financeiros.
Essa atitude comprova a hegemonia do Estado perante as decisões relativas à educação e o descaso do sistema com a formação daqueles que serão responsáveis pela formação da massa.  É notório o descaso com a formação intelectual do país. Quando se pensa em um curso de menor duração, pensa-se somente em cumprir pré –requisitos exigidos de agentes externos. Ignora-se e destrói-se , ainda mais, a profissão do professor, a qual é vista sob o estigma de uma profissão menor. Alguém proporia encurtar a formação inicial de um médico? ...
Tais reformas, movidas por interesses, que não são os de caráter pedagógico, somente contribuem para o círculo vicioso : má formação  sinonímia de baixos salários, baixa auto-estima, baixo status social, etc. Calar-se diante de tais reformulações é ser conivente com a teoria do pouco. Pensar no Pedagogo como um cientista da educação, o qual estaria “proibido” de  atuar na docência da educação básica, é pensar em docentes que não necessitariam refletir sobre sua prática, tampouco investir em pesquisa. Denominar novos cursos de formação sem o devido cuidado de formar e não (de) formar talvez seja realmente o que o neoliberalismo queira. “ Muita mão-de-obra barata, produzida de forma rápida e incapaz de refletir e questionar a realidade... Realmente um banquete neoliberal...” ( PUIGGRÓS,1997) Afinal, no “jogo global”, se o domínio pelas armas impulsiona manifestações em diversos segmentos sociais, o domínio pela ignorância passa despercebido.
Contudo, com  a obrigatoriedade, proposta pela nova LDB, de os professores deixarem de ser somente polivalentes e buscarem a especificidade de um curso universitário (leia-se Licenciatura e/ou o Curso Normal Superior), o ensino deparou-se com outros problemas. Além do inchaço dos bancos universitários – quantidade nem sempre será sinônimo de qualidade – muitos dos que hoje ocupam uma vaga nas licenciaturas não almejam a profissão de professor. Têm, sim, a expectativa de  serem biólogos, geógrafos, matemáticos, historiadores ou lingüistas. Ingressam, muitas vezes, em tais cursos, por esses terem uma concorrência menor no vestibular e vislumbram a chance de, após concluírem a graduação, trabalhar em qualquer outra ramificação que lhes permita o curso por eles feito.( MELO,2000)
Outra desapontante confirmação é que os  cursos de licenciatura, como estão articulados, não têm contribuído para reverter tal quadro. Estes, com seu modelo de formação piramidal ( CARVALHO, 2000), no qual as disciplinas teóricas ocupam a base da pirâmide; as teórico-práticas, muitas vezes mais teórico do que práticas, ficam  com o “meio” da pirâmide, restando aos acadêmicos  as disciplinas práticas – estágios - no final do curso, alargam ainda mais o hiato que há entre teoria e prática. “Desta forma , a universidade nada mais faz do que jogar esse profissional, mal preparado, no mercado de trabalho cada vez mais exigente.
 Segundo SCHÖN ( in PIMENTA, 2002), os professores devem ter sua formação não mais nos moldes de um currículo normativo, o qual apresenta , primeiramente, a ciência para, posteriormente, detalhar sua aplicação e por último o estágio. Tal formação, segundo o autor, não contribui, tampouco articula teorias e práticas. Para ele, a reflexão é preponderante nesse processo, pois, refletindo sua experiência , o professor otimiza a reflexão na ação, ato que propiciaria mudanças em suas práticas docentes, que deixariam de ser mecânicas e reprodutivas para serem pensadas e repensadas.
Mais do que criar novos espaços de formação, faz-se necessário um repensar no papel político e pedagógico do professor, repensar este que , pelas colocações feitas, em momento algum foi feito em nossa história da educação brasileira.  Formar professores precisa deixar de ser sinônimo de formar reprodutores. “O modelo de formação proposto baseia-se numa reflexão do professorado sobre a sua prática docente, que lhe permite repensar a sua teoria implícita do ensino, os seus esquemas básicos de funcionamento e as próprias atitudes” (MEC, 1989, P. 106 in NÓVOA)
Formar professores exige dos estabelecimentos que se propuserem a tal ação, independentemente da nomenclatura que recebam, um olhar dialético acerca da práxis pedagógica. Esta precisa ir muito além do simples associar teorias a práticas. Pensar dialeticamente significa ter um olhar inquieto sobre a realidade. Um olhar questionador e plural, que pense e repense suas ações constantemente e que as modifique negando suas práticas anteriores, mas que uma descoberta seja o ponto de partida para outras descobertas. Tal processo NÓVOA (1995) denomina indagação-reflexão. Este que diferenciará um professor e sua prática de um mero reprodutor de fórmulas prontas e incapaz de questionar as verdades que lhe são apresentadas.
Uma formação de professores consistente deve preconceber o “continuum”  ( NÓVOA, 1995) que não pode restringir-se à sua formação inicial. Nessa perspectiva entram em cena tanto a formação continuada, a formação pela prática, propiciando uma constante construção e desconstrução de um novo profissional. Um profissional consciente de suas ações, reflexivo e disposto a inovar a fim de deixar marcar positivas naqueles com os quais interagir no processo professor-aluno. “Para transformar a realidade, visando à emancipação, é preciso ousar, desafiar as concepções dominantes, as quais perpetuam a  miséria, a injustiça e a desigualdade. Nesse sentido, uma ação educacional que pretende avançar para além da racionalidade técnica, não pode limitar-se a olhar para a relação educação e sociedade de forma não problemática, como se a escola estivesse aí apenas para transmitir saberes acumulados e formar mão-de-obra “qualificada”. “( BASTOS, 2001)
Os problemas acima citados tiveram graves conseqüências, com as quais convivemos até hoje. Através da globalização crescente, e, também da concepção da “sociedade do conhecimento”,  foi-se exigindo também um profissional global, um aluno global. Nosso modelo de educação já não serve para a economia mundial (talvez nunca tenha servido e nós não quisemos ver).
Talvez, daqui para frente, seja necessário repensar o que é educação. Deve-se lembrar  que educação, antes de ser um substantivo, deriva de um verbo que remete a ação. Se analisada sua raiz etimológica, edoceo, em latim, possui o prefixo grego edo, que significa alimentar-se.(PUIGGRÓS, 1997) Alimentar-se? Será que muitos não estão morrendo de  inanição diante do “pouco alimento “que lhes é dado atualmente nos bancos escolares de diferentes níveis do Brasil?
É preciso que os profissionais da educação e os formadores desses profissionais compreendam que a educação é um processo de humanização. Estamos todos juntos em barco e nós, professores, precisamos  tomar o leme desse barco, a fim de termos uma direção segura e seguirmos rumo à educação de qualidade que almejamos. (BRANDÃO citado por GADOTTI, 1994)

REFERÊNCIAS

BRZEZINSKI, Iria (org.). LDB Interpretada: diversos olhares se entrecruzam. São Paulo: Cortez, 2002.
CANDAU, Vera Maria (org.). Magistério: construção cotidiana. Petrópolis: Vozes, 1997.
DEMO, Pedro. Ironias da educação – mudanças e contos sobre mudanças. Rio de Janeiro: DP&A, 2000.
GADOTTI, Moacir. Pensamento pedagógico brasileiro. 5ª ed. São Paulo: Editora Ática,1994.
MION, Rejane Aurora. SAITO, Carlos Hiroo ( org.). Investigação – Ação: Mudando o Trabalho de Formar Professores. Ponta Grossa: Gráfica Planeta, 2001.
NÓVOA, António ( org.). Os professores e a sua formação. 2ª ed. Lisboa: Dom Quixote, 1995.
PIMENTA, Selma. Professor reflexivo no Brasil: gênese e crítica de um conceito. 2 . ed. São Paulo: Cortez, 2002.
PUIGGRÓS, Adriana. Voltar a educar: a educação latino – americana no final do século XX. Rio de Janeiro: Agir, 1997.
RIBEIRO, Maria Luisa Santos . História da educação brasileira: a organização escolar. 15ª ed. Ver. E ampl. Campinas, São Paulo: Autores Associados, 1998.
SGUISSARDI, Valdemar (org.) Educação Superior: velhos e novos desafios. São Paulo: Xamã, 2000.
TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2002.
VILLELA, Heloísa In: LOPES, Eliane M. Teixeira (org.) 500 anos de educação no Brasil. 3ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.

Graduada em Letras – Habilitação Português – Especialista  Mestranda do Programa de Pós-Graduação, Mestrado em Educação da UTP, Linha de Pesquisa “Políticas Públicas e Gestão da Educação".

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A DIMENSÃO POLÍTICA DO  PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO:
RUMO A AUTONOMIA POLÍTICA E PEDAGÓGICA DA ESCOLA PÚBLICA


Gilmar Dias *
Mestrando em Educação
Universidade Tuiuti do Paraná
Segundo Aristóteles, “o homem é um animal político”, portanto, todas as sua ações se dão de forma intencional e nas relações sociais. A educação sendo uma construção humana e ocorrendo nas relações sociais de forma intencional, passa a ser um ato político. A educação engendra desde sua gênese uma contradição histórica em sua práxis, com interesses antagônicos construídos e desenvolvidos nas relações sociais do meio onde a escola está inserida. A administração escolar, nela incluída o ato de planejar as ações educacionais, pode ser feita de forma centralizada e autoritária, como participativa e democrática, includente ou excludente. Quando a mesma assume a forma participativa e includente, permite uma maior eficiência social e educacional. Para tanto, necessitamos de um instrumento de planejamento que permita a participação de todos os atores de forma democrática, para isso surge o Projeto Político-Pedagógico, que quando elaborado e executado de forma participativa, tem se mostrado um importante instrumento de inclusão social e de gestão democrática da escola pública. A qualidade no ensino, é o ponto central de qualquer proposta para a escola pública. Abordamos nesse artigo, as questões relacionadas ao Projeto Político-Pedagógico, como um instrumento de gestão democrática na escola pública. A qualidade que se busca implica dimensões indissociáveis entre a técnica e a política. Uma não está subordinada à outra; cada uma delas tem perspectivas próprias. Portanto, o político e o pedagógico, sempre deverão andar juntos, quando se tratar de uma ação intencional de educação escolar.

Palavras-chave: projeto político-pedagógico, autonomia,  escola pública
.

 “o homem é um ser político
Aristóteles
    O slogan, expresso na frase “a educação é sempre um ato político”, é debatida por Saviani em seu livro Escola e Democracia, onde o autor procura separar a prática pedagógica da prática política, evitando com isso a dissolução da especificidade do fenômeno educativo (1997, p. 91).
    Para o autor (ibid), a vinculação do político com o pedagógico, no sentido de se criar uma identidade única, deverá ser rejeitada, porem ele reconhece que em duas situações esse slogan está correto. Tomando “político” como um adjetivo da prática social global , onde todo o ato humano é político, produzindo com isso uma tautologia do tipo: tudo é tudo, nada é nada. No outro momento onde Saviani aceita o slogan, se refere a dimensão política da educação independentemente de ter ou não ter consciência disso.
Concluindo, Saviani afirma que
Com efeito, eu só posso afirmar que a educação é um ato político (contém uma dimensão política) na medida em que eu capto determinada prática como sendo primordialmente educativa e secundariamente política (1997, p. 101).
    Podemos concluir com isso, que a educação é um ato político a partir do pressuposto que é um ato humano, ou seja, confirmando Aristóteles que disse que “o homem é um animal político”, todas as suas ações são políticas na medida em que são ações tomadas dentro de uma coletividade, tendo as influências da aplicação dessas ações também nessa coletividade.
    Como tudo que o homem faz, faz no sentido de estabelecer a sua relação com outros humanos e com o meio ambiente onde está inserido, isso também poderá ser entendido como um ato de educação, por estes atos, passarem a influenciar outras pessoas.
    Já para Veiga, “Político e pedagógico têm assim uma significação indissociável.” (In, VEIGA 1995, p. 13).
Veiga ainda afirma que existe uma reciprocidade na vivência democrática da escola, onde a dimensão política e a dimensão pedagógica, coexistem harmoniosamente, ou seja, para que exista uma vivência democrática é necessário a existência de uma ação política e pedagógica da escola. 
   A escola é um espaço social e democrático, composto pelos alunos e seus familiares, professores, funcionários e por demais membros da comunidade.
    Quando o Estado, através de ações políticas coercitivas, ou seja, ações que impedem ou não estimulação a participação da comunidade dentro do espaço escolar, não dando oportunidade para que essa comunidade onde a escola está inserida, de participação direta e efetiva na elaboração do seu planejamento das ações educacionais ali produzidas, essas ações passam a ser entendidas como obrigações ou determinações superiores,  inibindo a participação de todos nos rumos da escola, além de produzir a sensação de que a sua contribuição não é importante ou não é bem vinda.
    O Estado brasileiro possui um histórico de intervencionismo em todas as áreas de nossa sociedade, sendo a sua política maior ao longo de décadas a do assistencialismo, mantendo o cidadão como “cliente” do Estado, e a sociedade e a educação escolar sobre controle.
    Ao nosso ver, a única forma eficiente de quebrar essa lógica perversa, é diminuir  a ingerência do Estado sobre os rumos da educação brasileira, dando autonomia (ainda que relativa) com gestão democrática da escola pública (participação efetiva e intensa de todos os atores que de forma direta ou indireta estão presentes nas ações educativas decididas pela escola), e com isso, condições dela se planejar para atender aos anseios da comunidade da qual faz parte.
    A gestão democrática na escola pública, necessita do envolvimento político de  todos que a compõem, isso é confirmado por Zilah Veiga, que afirma, “é preciso desencadear um movimento no sentido de organizar o trabalho pedagógico com base na concepção de planejamento participativo e emancipador.” (In, VEIGA1998, p. 124).
    A escola está organizada basicamente em instancias colegiadas tais como, Conselho Escolar, Conselho de Classe, Associação de Pais e Mestres (APM) e o Grêmio Estudantil (ibid, p. 114). A constituição do Conselho de Escola, que é “um colegiado formado por todos os segmentos da comunidade escolar: pais alunos, professores, direção e demais funcionários.” (Ciseki In, MEC, 1998, p. 49), ao nosso ver é o primeiro passo para a autonomia e a gestão democrática da escola pública, sendo o segundo passo, a construção de forma democrática e participativa do Projeto Político-Pedagógico.
Segundo Gadotti, “Não se constrói um projeto sem uma direção política, um norte, um rumo. Por isso, todo projeto pedagógico da escola é também político.” (In MEC, 1998, p. 16).
Entendemos que essa autonomia é relativa, pois a escola ainda está atrelada a um aparato estatal de rígido controle, onde praticamente todas as suas ações administrativas e pedagógicas são regulamentadas e controladas pelos órgãos oficiais de gestão educacional, não tendo a escola nenhuma ou quase nenhuma autonomia sobre as verbas escolares e gestão dos recursos humanos a ela afeto. A busca pela autonomia nessas áreas é ainda uma meta muito distante.
A escola deve ser um espaço onde todos participem do planejamento e execução de todas as sua ações, onde o conjunto de valores, normas e relações obedecem a uma dinâmica singular e viva  (VEIGA e RESENDE, 1998).

     Para que isso ocorra, é necessário que o planejamento de todas as suas ações sejam de forma coletiva e democrática, dando a todos que estão direta ou indiretamente ligados a escola, oportunidade de participarem da elaboração de um projeto de vida, de um projeto que irá afetar de forma positiva ou não os destinos de todos que por ele serão influenciados. Citamos ainda Vasconcellos, que dá grande ênfase ao planejamento das ações educacionais, afirmando que
“cabe ao planejamento a oportunidade de repensar todo o fazer escolar, como um caminho de formação dos educadores e dos educandos, bem como de humanização, de desalienação e de libertação.” (1995, p. 92).
Nesse sentido,
o projeto político pedagógico, ao nosso ver,  passa a ser o único instrumento democrático para que a comunidade escolar possa se organizar e construir dentro de seu espaço, a sua autonomia, que será o impulsionador da descentralização de suas ações e o fortalecimento de atitudes democráticas e comunicativas (CARVALHO e DIOGO, apud, VEIGA e RESENDE, 1998, p. 113).
    A autonomia e a gestão democrática da escola pública a qual nos referimos, se faz necessária para a democratização do espaço escolar e das ações por ela planejada. A montagem do seu plano de educação com base em um projeto de vida, ao nosso ver, deve envolver a toda a comunidade, tornando essa escola um local de educação para todos e não apenas para os seus alunos, permitindo com isso, mobilizar essa comunidade na construção de um projeto que permita o surgimento de uma nova sociedade, onde a sua cultura e os seus valores possam ser preservados e ensinados, e que todos possam participar dos rumos dessa nova escola. Para nós, esse projeto é o Projeto Político-Pedagógico.
    Reforçando ainda essa posição da necessidade da comunidade escolar participar do planejamento educacional, citamos Paulo Freire, onde ele afirma que:
Todo o planejamento educacional, para qualquer sociedade, tem que responder ás marcas e aos valores dessa sociedade. Só assim é que pode funcionar o processo educativo, ora como força estabilizadora, ora como fator de mudança. Às vezes, preservando determinadas formas de cultura. Outras, interferindo no processo histórico, instrumentalmente. De qualquer modo, para ser autêntico, é necessário ao processo educativo que se ponha em relação de organicidade com a contextura da sociedade a que se aplica (2002, p.10).
    Por que consideramos importante manter o nome de Projeto Político-Pedagógico e não de Projeto Educativo, ou Projeto de Escola, ou mesmo Plano Diretor importante.  Porque a palavra Político no nome, lembrará a todos que a ação política ocorre nas relações sociais, porque deverá envolve à todos na sua construção, porque a ação política tem a capacidade de aglutinar pessoas entorno de idéias e ideais, porque é essencialmente uma ação democrática e participativa, porque não pode ser feito por uma única pessoa ou por um grupo que não represente a totalidade de vertentes e correntes culturais, sociais e políticas que estão presentes na comunidade afetadas pela escola onde esse Projeto Político-Pedagógico está sendo construído.
Pedagógico por envolver as ações educacionais da escola, do planejamento pedagógico, da elaboração do currículo, das atividades internas e externas, enfim, de todas as ações que cominem na “assimilação do saber historicamente construído e sistematizado pelos homens” (Saviani, 1997, p. 56).
    Podemos entender que a autonomia é uma questão vital para a gestão democrática da escola pública, e que ao nosso ver o Projeto Político-Pedagógico é um instrumento eficiente e capaz de dar a essa escola pública, condições de se planejar e buscar meios e aglutinar  pessoas e recursos na concretização desse projeto, que para nós, antes de tudo é  um projeto de vida, de no mínimo uma geração, que necessita de pessoas envolvidas na sua construção e execução, que tenham bem definidas uma visão de homem, uma visão de sociedade e uma visão de mundo, que tenham bem claro, que homem que essa escola irá formar, para qual sociedade e para qual mundo, mundo esse que devido ao fenômeno da globalização afeta qualquer ser humano em qualquer parte do nosso planeta Terra.
    eforçando o nosso entendimento sobre a importância do Projeto Político–Pedagógico em ser um instrumento poderoso para a gestão democrática da escola pública, para a formação da consciência coletiva, para a mudança de hábitos tanto dos alunos, seus familiares e da comunidade em geral, e na imersão do homem na vida pública de sua comunidade, citamos novamente o nosso grande mestre Paulo Freire (2002, p. 96), que afirma,
 O que importa é que a escola de nossa atualidade eduque seu aluno e suas famílias no sentido da responsabilidade social e política, de que somos tão carecentes ainda. Responsabilidade que só se ganha vivendo. Que só se obtém inserindo em projetos onde seja ela experimentada.
    Autonomia é uma palavra de origem grega - autonomía  que segundo o Vocabulário Técnico e Critico de Filosofia de André Lalande, o seu significado etimológico é “...condição de uma pessoa ou de uma coletividade autônoma, quer dizer, que determina ela mesma a lei à qual se submete”, na mesma obra, no sentido Ético, a definição seria “A autonomia da vontade para Kant é a característica da vontade pura enquanto ela apenas se determina em virtude da sua própria essência, quer dizer, unicamente pela forma universal da lei moral, com exclusão de todo motivo sensível”. Continuando na busca da definição de autonomia, citamos novamente Lalande, que  afirma que:
Liberdade moral, enquanto estado de fato, oposto, por um lado, à escravidão dos impulsos, por outro, à obediência sem críticas à regras de conduta sugeridas por uma autoridade exterior. ‘É esta servidão que os homens chamam heteronomia; e eles lhe opõem, com o nome de autonomia, a liberdade do homem que, pelo esforço da sua própria reflexão, dá a si mesmo os seus princípios de ação. O indivíduo autônomo não vive sem regras, mas apenas obedece às regras que ele escolheu depois de axaminá-las' (1996, p. 115).
    Como podemos observar, o sentido de autônomo, está diretamente relacionado a liberdade de escolha, ou seja, quem detêm autonomia, tem a prerrogativa de escolher o que deve ou não deve fazer. Outra característica, é o fato da autonomia não isentar as pessoas ou os grupos, possuírem regras e as segui-las, apenas faculta a escolha das regras a serem seguidas.
    Para Gadotti e Romão, no Brasil, a autonomia na escola   encontra suporte na própria Constituição, promulgada em 1988, que institui a “democracia participativa” e cria instrumentos que possibilitam ao povo exercer o poder “diretamente” e cria instrumentos que possibilitam ao povo exercer o poder “diretamente” (Art. 1º). No que se refere à educação, a Constituição de 1988 estabelece como princípios básicos: o “pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas” e a “gestão democrática do ensino público” *Art. 206). Esses princípios podem ser considerados como fundamentos constitucionais da autonomia da escola. (2000, p. 44).
A nova LDB trata a questão da autonomia no:
Art. 15. Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público.
    Sousa e Corrêa, também percebem a questão da autonomia na Lei 9.394/96 – LDB,  como sendo parte do trabalho da escola, que são orientados por cinco eixos (flexibilidade, autonomia, responsabilidade, planejamento e participação), que devem ser observados na construção do projeto político-pedagógico da escola, sendo que a autonomia se fará na pratica cotidiana da escola. (In VIEIRA, 2002, p. 56).
    A escola autônoma, não é uma escola sem regra ou sem controle do Estado, a escola autônoma que deseja caminhar para se tornar uma escola cidadã, necessita compreender que a sua autonomia se limita a estabelecer as regras pelas quais ela será gerida, de forma democrática, com a participação de todos os atores envolvidos em suas ações educacionais, porém, essas regras estarão sujeitas a uma lei maior, que em primeiro lugar é a Constituição Federal e a LDB vigente, além das normas do Conselho Nacional de Educação – CNE e do Conselho Estadual de Educação – CEE de seu Estado.
    Portanto, uma escola autônoma, é uma escola que teve a liberdade de montar o seu Projeto Político-Pedagógico e o seu Regimento Interno de forma democrática, obedecendo a legislação vigente, mas acima de tudo, faz desses documentos o seu guia nas suas ações educacionais e administrativas que norteiam todo o fazer escolar.
Para Padilha, a palavra autonomia significa dentro da perspectiva da democracia social “a possibilidade de aproveitar a liberdade, a inteligência criadora e a iniciativa no gerenciamento de sua vida individual, familiar e associativa.” (2001, p.65).
    Para Castro Neves, o conceito de autonomia também está ligado ao de liberdade e democracia, que segundo a autora são valores inerentes aos homens. A autora também concorda que autonomia não significa falta de regras, não é um valor absoluto, fechado em si mesmo, porém “um valor que se define numa relação de interação social”. (In VEIGA, 1995, p. 97).
    Continuando a citar a autora, a autonomia serve para encaminhar de forma rápida e urgente, as soluções que são reclamadas pelos alunos, pais, professores e direção, na busca de atender as necessidades do dia-a-dia, na busca da qualidade.
    A autonomia da escola, é pois, um exercício de democratização de um espaço público: é delegar ao diretor e aos demais agentes pedagógicos a possibilidade de dar respostas ao cidadão (aluno e responsável) a quem servem, em vez de encaminha-lo para órgãos centrais distantes onde ele não é conhecido , muitas vezes, sequer atendido. A autônima coloca na escola a responsabilidade de prestar contas e, ao aproximar escola e famílias, é capaz de permitir uma participação realmente efetiva da comunidade, o que a caracteriza como uma categoria eminentemente democrática. (CASTRO NEVES, op. cit., p. 99).       
    Para Cavagnari, autonomia da escola pública é uma questão de competência e compromisso, sendo a competência o elemento fundamental à conquista da autonomia, se dando na dimensão  política  através do compromisso social de seus profissionais de educação de ensinar, e ensinar bem a todos. (In VEIGA e RESENDE, 1998, p. 98).
    Segundo o mesmo autor, “Uma autonomia que não é dada, mas que se efetiva pela capacidade e pela responsabilidade da escola e do grupo de educadores de colocar em ação o seu projeto político-pedagógico” (CAVAGNARI, In VEIGA e RESENDE, op. cit., p. 98-99).
    Para Saviani, é necessário:
Assegurar a autonomia das escolas e universidades na elaboração do projeto político-pedagógico de acordo com as características e necessidades da comunidade, com financiamento público e gestão democrática, na perspectiva da consolidação do Sistema Nacional de Educação  (1998, p. 138).
    Saviani afirma ainda que é necessário “Garantir autonomia político-pedagógica às Instituições de educação básica e superior, assegurando-lhes condições materiais e financeiras adequadas e suficientes” (op. cit., 139).
A escola enquanto um “parelho” do Estado, visa reproduzir as relações sociais de produção, dificultando com isso a sua autonomia política, onde a educação de qualidade ira buscar a superação dessas relações sociais de produção. Para Martins,
Há um consenso sobre a necessidade de a escola ser autônoma, pois a construção e o exercício da autonomia incentivam o pluralismo de idéias, o respeito às diferenças e a emergência de atores sociais criativos e responsáveis  (In OLIVEIRA e ROSAR, 2002, p. 120).
    Gadotti acredita que “A autonomia e a gestão democrática da escola fazem parte da própria natureza do ato pedagógico. A gestão democrática da escola é, portanto, uma exigência de seu projeto político-pedagógico.”  (In MEC, 1998, p. 17).
    Para Sousa e Corrêa,
Ao procurar articular tais demandas, o projeto pedagógico necessita escutar o que a prática dos sujeitos que o constroem tema dizer, ao mesmo tempo em que deve amadurecer neles a idéia de que o princípio de autonomia implica o compromisso de decidir e assumir ações coletivas no âmbito da escola  (In VIEIRA, 2002, p. 52).

    Para Vasconcelos, a autonomia precisa ser vista com cuidado, pois ao poder público transferir para a escola a responsabilidade da elaboração do seu projeto político-pedagógico, transfere também a questão do seu sucesso ou fracasso, podendo ser uma estratégia de descompromisso e de transferência de responsabilidade por parte do Estado.  (2000, p. 173).
    Não devemos pressupor, no entanto,  que a autonomia desejada por nós seja a que isole a escola da sociedade, que a mantenha como uma célula social que pensa e age sem um sentido de unidade. A liberdade conquistada pela autonomia deverá ser no sentido de permitir que ela dirija o seu destino através das decisões tomadas de forma participativa e democrática, porém fundamentada nas legislações a que a escola está subordinada.
    Para Gadotti e Romão, “A ampliação da autonomia da escola não pode opor-se à unidade do sistema. Deve-se pensar o sistema de ensino como uma unidade descentralizada. Descentralização e autonomia caminham juntas.” (2000, p. 47).
    A autonomia desejada é a que permite a escola escolher os seus rumos, decidir o seu futuro, dentro de uma unidade nacional, respeitando as leis e normas da educação nos seus três níveis administrativos – Federal, Estadual e Municipal. A gestão democrática da escola pública é o caminho mais seguro para a sua autonomia e para a sua concretização como uma escola cidadã.
Para Padilha, “A autonomia , na escola cidadã, pressupõe, pois, a alteridade, a participação, a liberdade de expressão, o trabalho coletivo na sala de aula, na sala de professores, na escola e fora dela.” (2001, p. 65).
    A razão fim da busca pela autonomia escolar, rumo a escola cidadã., deverá ser a da qualidade do ensino e da formação moral e cívica de todos os seus atores, que sentindo a sua importância no fazer escolar, possa com isso buscar a sua inserção nos demais “aparelhos” do Estado, e nos rumos de nossa sociedade.
Nesse sentido, Padilha afirma ainda que
 “a escola projetada com base na referida autonomia tem a finalidade de formar seus educandos para a vida, para o trabalho, para a construção de relações humanas e sociais civilizadas, justas e  éticas para o exercício  e a prática da cidadania crítica e ativa e para resistir a toda forma de exclusão.” (ibidi., p. 65).
    A qualidade no ensino, é o ponto central de qualquer proposta para a escola pública. Abordamos nesse artigo, as questões relacionadas ao Projeto Político-Pedagógico, como um instrumento de gestão democrática na escola pública.
    Para Veiga, “A qualidade que se busca implica dimensões indissociáveis: a formal ou técnica e a política. Uma não está subordinada à outra; cada uma delas tem perspectivas próprias.” (In, VEIGA, 1995, p. 16).
Observamos até aqui, que os autores citados, buscam dar uma dimensão política ao ato pedagógico, enquanto fazer escolar, buscando com isso, que se tenha uma intencionalidade no planejamento escolar e que essa intencionalidade possibilite o engajamento de todos os atores envolvidos nas ações educacionais.
    Portanto, o político e o pedagógico, sempre deverão andar juntos, quando se tratar de uma ação intencional de educação escolar.

REFERÊNCIAS

LALANDE, André.  Vocabulário técnico e crítico da filosofia.  2. ed. São Paulo : Martins Fontes, 1996.
MEC – Secretaria de Ensino a Distância.  Salto para o futuro: construindo uma escola cidadã.  Brasília: MEC/SEED, 1998.
PADILHA, Paulo Roberto.  Planejamento Dialógico: como construir o projeto político-pedagógico da escola.  São Paulo: Cortez; Instituto Paulo Freire, 2001.
SAVIANI, Dermeval.  Escola e democracia: teorias da educação, curvatura da vara, onze teses sobre educação e política.  31. ed.  Campinas: Autores Associados, 1997.
______.  Da nova LDB ao novo plano nacional de educação: por uma outra política educacional.  Campinas: Autores Associados, 1998.
VASCONCELOS, Celso dos S.  Planejamento: projeto de ensino-aprendizagem e projeto político-pedagógico.  7. ed. São Paulo: Libertad, 2000.
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VEIGA, Ilma Passos Alencastro; RESENDE, Lúcia Maria Gonçalves (Orgs.).  Escola: espaço do projeto político-pedagógico.  Campinas: Papirus, 1998.


Graduado em Pedagogia pela UFPR. Especialista em Administração Financeira e Informatização pela  FADEPS- Faculdade de Placido e Silva. Professor Assistente da Graduação e da Pós Graduação Lacto Sensu e Mestrando no Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná, na linha de Políticas Publicas e Gestão da Educação, sob a orientação do Prof Dr. Sidney Reinaldo Silva.

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FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM DIDÁTICA PARA A EDUCAÇÃO A  DISTÂNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

Iolanda Bueno de Camargo Cortelazzo *
Universidade Tuiuti do Paraná
As profundas transformações acontecidas nas formas de se comunicar pelos avanços ocorridos na tecnologia de informação e de comunicação  permitem a quebra de barreiras de tempo e espaço e exigem uma nova concepção de  conhecimento. Uma concepção que não se baseia apenas no conhecimento acadêmico explicito mas que o articula ao conhecimento tácito que os indivíduos desenvolvem não só em ambientes escolares, como também em ambientes extra-escolares.  Exige, ainda, por parte das empresas e das Universidades, uma  Gestão do Conhecimento que considere tanto as ofertas e as disponibilidades quanto as necessidades e os interesses de cidadãos (na sociedade civil) e de profissionais (no âmbito empresarial). Uma nova concepção de comunicação que seja interativa, e se realize na interlocução entre professores e seus pares, professores e alunos e entre alunos em uma nova Universidade, com um movo docente. Esse novo contexto gera  a necessidade de formação de professores  em uma Didática para a Educação Superior, uma didática que contemple as diversas modalidades de ensino, tanto a presencial quanto a Educação a Distância e que permita uma docência que seja comunicativa, que realize uma verdadeira interlocução com os discentes, que componha redes interativas e colaborativas, realizando sua função de desenvolvedora de profissionais e cidadãos para uma sociedade mais humana e uma vida mais sustentável .
Palavras-chave: Formação de Professores, Educação a Distância,  Docência na Educação Superior

Depois da Segunda Guerra Mundial, na segunda metade do século XX,  aceleraram-se os avanços nas tecnologias de informação e de comunicação que encurtaram as barreiras de tempo e de espaço. Os meios de comunicação difundem desde então informações sobre fatos quase que simultaneamente ao seu acontecimento. Muitas verdades passam a ser efêmeras e o conhecimento precisa atualizar-se cm uma freqüência muito maior. Crianças, jovens e adultos têm acesso às informações com uma certa instantaneidade e, em geral, sem criticidade.
A escola, cuja função é a de sistematizar os conhecimentos de modo a conservar tradições e valores e, ao mesmo tempo, transformar os aspectos e as condições negativas da sociedade de modo a tornar a vida humana mais significativa e sustentável, não tem dado conta em acompanhar as mudanças aceleradas e mantém sua estrutura arcaica, calcada apenas na fragmentação, na departamentalização, na disciplinaridade, no individual.
Na atualidade, a Universidade, instituição educativa em nível superior, sustentada na pesquisa, no ensino e na extensão, tem uma estrutura que reforça, como dizem Pimenta e Anastasiou,
um  ambientes adequado a uma pedagogia calcada na transmissão de saberes, num papel docente centralizador, numa relação de reprodução de conhecimento tido como verdadeiro e na não-problematização e crítica da realidade social, cultural, econömica e científica (Pimenta e Anastasiou, 2002

A Educação Superior no Brasil no momento atual

Ao se analisar a Educação Superior no Brasil,  observa-se uma proliferação desorganizada de instituições, que os órgãos governamentais procuram regulamentar, que se colocam no mercado educacional oferecendo atrativos numa frenética mercantilização de diplomas, como se estivessem a vender bens de primeira necessidade. Boa parte dos intelectuais corrobora com  esse quadro quando se coloca na defesa de “Universidade para todos”, afirmando que todos os brasileiros deveriam ter o direito de terem acesso à Universidade, mas não questiona  “que universidade?”. Além do mais, a Educação Superior está sendo oferecida em instituições que, na sua maioria,  não são universidades. São faculdades isoladas, Instituto de Ensino Superior, Centros Universitários, que não têm compromisso com a pesquisa. Nessas instituições, os professores são horistas, isto é, são pagos por hora/aula, para “darem aulas”. Isso significa que esses professores têm compromisso com o ensino, mas não, necessariamente, com a aprendizagem. São indivíduos que em algumas instituições são chamados de “taxistas”, pois começam a ganhar na hora que “ligam o taxímetro”, isto é, na hora que vão para a sala de aula, que são fiscalizados por funcionários encarregados de verificarem se estão, ou não, na sala de aula. Muitos desses professores não têm tempo para pesquisar, para ler, para preparar a aula. Muitos desses professores chegam na sala de aula e perguntam “onde é que paramos na aula passada?”. Muitos desses professores não têm competência para estarem na sala de aula, entendendo-se competência como conjunto de conhecimentos específicos sobre a sua área de atuação, de habilidades (cognitivas, operacionais, pedagógicas e sociais) e de atitudes.
Como há um certo consenso de que a universidade deve ser para todos, com uma concepção perigosa de que é “obrigatório” se ter curso superior, cria-se um círculo vicioso difícil de ser rompido mas que traz prejuízo a todos os níveis sociais e começa a ser percebido por conjuntos de pessoas que trabalham de maneira colaborativa e crítica em relação à educação. Esse círculo vicioso é composto por alunos e professores que firmam um contrato silencioso, o professor, subestimado e desvalorizado, “ensina” e cobra a repetição do que ensinou, o aluno, pressionado a fazer um curso superior,  devolve o mínimo do que  recebeu e fazendo de conta de que aprendeu, recebe o certificado no final do tempo contratado com a instituição escolar. Com o certificado (diploma) na mão, vai para um mercado cada vez mais inflacionado de profissionais certificados. As instituições públicas e a iniciativa privada abaixam seus salários, pois a oferta de mão de obra certificada é maior do que o número de vagas.
Os egressos das poucas instituições que ainda oferecem educação de qualidade, são disputados no exterior ou conseguem as pouquíssimas vagas muito bem remuneradas. Ainda assim, os demais bem preparados são contratados por salários inadequados. As empresas que precisam de maior qualidade de mão de obra criam centros de treinamento e desenvolvem competências para atender as suas necessidades. As grandes empresas passam, então, a desenvolver a educação corporativa. Na verdade, na atualidade, já se tem a presença marcante das Universidades Corporativas. E os intelectuais acadêmicos, muitos mostrando uma atitude “avestruz” ao não quererem ver o quadro real atual, condenam essas iniciativas como sendo “fruto da ideologia neo-liberal”.
No caso da Educação Escolar, a situação ainda é pior, pois professores mal-preparados acabam prestando concursos mal-elaborados e são admitidos para ensinarem nas escolas públicas. Esses professores que não dominam o conteúdo específico de suas disciplinas e que não têm uma boa formação didático-pedagógica trabalham em escolas com tecnologia de informação e de comunicação defasada com a usada fora da escola e são mal-remunerados. Desta forma, assiste-se, de um lado, a desvalorização, cada vez maior, da profissão professor, e, de outro lado, a exclusão social que essa escola causa, ao deixar de preparar seus alunos, para as funções sociais e profissionais que eles deveriam exercer fora da escola. Isto é, a escola prepara um “cidadão” de segunda categoria, que não sabe refletir, analisar, criticar, questionar, tomar decisões e agir para transformar o meio em que vive resultando a si e aos seus uma vida ,melhor.
Em paralelo, os auto-didatas, ou os que tiveram a possibilidade de ter uma educação emancipadora, ocuparão funções melhores, terão acesso  às melhores oportunidades, desfrutarão de melhores condições de vida, mas viverão ameaçados por contingentes cada vez maiores de excluídos.
Formação de Professores em Didática:  Diálogo e Colaboração como novas possibilidades para a Educação Superior
Diante de toda essa situação, um grupo de pesquisadores começou a pesquisar e a propor uma mudança de atitude  que vai para além da crítica, isto é, uma mudança na prática pedagógica na Educação Superior. De certo, que esta não é uma iniciativa somente desses pesquisadores. Muitos professores, individualmente, têm sua prática pedagógica embasada no  diálogo e no trabalho colaborativo com seus pares e com seus  alunos.
Esta é, porém, uma iniciativa que procura chamar a atenção para a necessidade premente de se cuidar da prática pedagógica na Educação Superior para uma vida profissional proficiente e uma vida social sustentável. Em sua pesquisa e na sua ação pedagógica, esse grupo baseia seu trabalho em pilares como o diálogo, a autonomia,  a colaboração, o trabalho em equipe, usando as tecnologias de informação e de comunicação como mediadores, inclusive na criação e na utilização de ambientes virtuais de aprendizagem.
Para uma melhor compreensão, buscamos explicitar brevemente, o que cada um desses pilares significa para esta equipe de pesquisadores.

Diálogo

Compreendemos diálogo como a interlocução entre indivíduos que se respeitam no compartilhamento de idéias, podendo a divergência existir. PETERS apresenta, em seu livro, Didática do Ensino a Distância, a definição de diálogo dada por Moore (1993),
Um diálogo é direcionado, construtivo  e é apreciado pelos participantes. Cada uma das partes presta respeitosa e  interessada atenção ao que o outro tem a dizer. Cada uma das partes contribui com algo para seu desenvolvimento e se refere às contribuições do outro partido. Podem ocorrer interações negativas e neutras. O termo diálogo, no entanto, sempre se reporta a interações positivas” (Moore apud PETERS, 2001, p. 73)
A partir do momento, em que o professor da Graduação ou da Pós-Graduação entende diálogo com o significado aqui apresentado e, troca a aula expositiva pela aula dialogada, ele  começa a trabalharem um novo paradigma educacional. Aquele, estudado por MORAES (1997, p.135-208) que considera o aprendiz, ao mesmo tempo, “um ser diferente e único”, “um ser inconcluso, inacabado, em permanente busca” e “um sujeito de práxis”, com quem o professor deve tratar dialogicamente, ora como ensinante, ora, ele próprio professor,  aprendiz.  Ao mesmo tempo, que esse aluno é sujeito, adulto, produto de seu tempo, histórico e parte da história, ele é um sujeito de diálogo, como dizem MORAES (1997) e FREIRE (1970),  e o processo que envolve professor e aluno, mesmo na Educação Superior, deve ser um processo amoroso, esperançoso, dialogal, de parceria. Ainda, nesse diálogo, há diferentes perspectivas, pois um é o professor, mas muitos são os alunos, e cada um, professor e alunos, vêem o mundo de onde seus pés pisam (BOFF, 1996) e a partir de suas histórias de vida. Assim,  o professor não está ali só para ensinar, mas para afazer o aluno aprender, pois a educação é uma moeda de duas faces em que o aprender e o ensinar são o verso e o reverso. Através do diálogo, o professor provoca inquietações e desafios que provocam, no aluno, o desejo de buscar respostas, que contribuirão para a construção de novos conhecimentos (MORAES,1997, p.144)
Assim, na Educação Superior, o aluno, adulto, deixa de ser visto como antagonista e passa a ser visto como co-protagonista, como parceiro do processo educacional. Para tanto, é necessário e tem que se respeitar a sua autonomia.

Autonomia

Tem-se tratado o aluno na Graduação e, em alguns Cursos de Pós-Graduação, sob o olhar da Pedagogia, que considera o indivíduo como dependente de um professor que decide o que ele vai aprender, como ele vai aprender, o quanto ele vai aprender e quando ele deve aprender. Esquece-se que esse aluno, na Educação Superior, é, em geral, um indivíduo que já responde, civil e criminalmente, pelos seus atos; casado, em geral, provedor da família, tem uma profissão; enfim, é um cidadão.
Se esse cidadão pode decidir o que quer e como quer em sua vida profissional, social e política, deve também ser considerado como autônomo  enquanto aprendiz na Educação Superior.
Peters (2001, p.94-97) apresenta considerações de ordem filosófica, pedagógica e didática para se considerar a autonomia na Didática do Ensino a Distância e que esta equipe de pesquisadores considera válidas.Ao se referir à dimensão filosófica, afirma se (a educação) quiser ativar a liberdade moral do educando autônomo, não pode ser prescrevedora e determinadora de fora, mas ,sim, somente despertadora  e doadora (Bohm, 1994 apud PETERS, 2001, p.94).
Na dimensão pedagógica, o aluno da Educação Superior tem que ser visto como sujeito de sua educação, isto é, a responsabilidade não é apenas da instituição escolar e do professor, mas deve ser compartilhada com o aluno. A partir dessa perspectiva, o aluno tem que cumprir seus deveres e estar atento aos seus direitos, principalmente, em relação à qualidade do que lhe é oferecido bem como em relação à cobrança de sua participação.
A dimensão didática, também, muda. O aluno na Educação Superior deve estabelecer seus objetivos, selecionar conteúdos de seu interesse, estabelecer estratégias de aprendizagem e organizar as tecnologias que poderão otimizar essa aprendizagem.
Dessa forma, o professor  não é mais o sujeito que transmite o conhecimento e o aluno, como uma tabula rasa, receptor passivo; ao contrário, o aluno passa a ser o sujeito de sua aprendizagem que tem no professor o interlocutor que poderá organizar conteúdos que lhe possam interessar, propor desafios e despertar  inquietações  que no diálogo poderão ser esclarecidas ou propor novos desafios.
Portanto, o diálogo se constrói  e se concretiza em ações conjuntas entre indivíduos autônomos, através de parcerias, que não se realizam se não houver colaboração.
E, na modalidade de Educação a Distância, não se pode usar o termo tutor para o professor que atua como um orientador de aprendizagem. Ao se defender que a autonomia tem que ser desenvolvida e respeitada, ao se pode usar uma terminologia que coloca o aluno como um ser tutelado, isto é, dependente de um professor-tutor.

Colaboração

Colaboração tem sido a marca da ação concreta desta pesquisadora, inclusive, tema da tese de Doutorado (CORTELAZZO, 2000). Para realizar a pesquisa de doutorado, no período de 1998 a 2000, foram consultadas muitas obras em educação escritas em Língua Portuguesa e, dificilmente, as palavras: colaboração, colaborativo, colaborador eram encontradas. Quando as encontrava, apareciam no sentido de “doação”, de “doador”. Nas obras em língua estrangeira,  essas palavras estavam, geralmente, associadas ao trabalho de grupos com computador. Foram pesquisadas, então, algumas obras da área de administração; e um capítulo da tese foi dedicado à colaboração, como era entendida pela pesquisadora e como ela estava relacionada com uma prática pedagógica bem sucedida. Desenvolveu-se, ainda, nesse capítulo, uma conversa com os pares, alunos e especialistas , buscando detectar o que eles pensavam e relacionando com a formação etimológica da palavra “co-laborare” ,  isto é, “trabalhar junto”.
Em 2002, continuando a pesquisa sobre Educação Superior, encontrei, em um artigo publicado na WWW, a definição dada por T. Panitz, que traduzo, aqui, Colaboração é uma filosofia de interação e estilo de vida pessoal no qual as pessoas são responsáveis por suas ações, incluindo aprendizagem e respeito pelas habilidades e contribuições de seus pares (PANITZ, 2002). Essa definição integra algumas das regras de colaboração que são apresentadas na tese como a responsabilidade,  o respeito, o trabalho com os pontos fortes do parceiro,  a interação, a divergência, o uso de diferentes formas de representação em diferentes espaços de criação, com o uso de saber especializado, não disponibilizado pelos integrantes da parceria,  se necessário.
Enfim, colaboração ultrapassa o indivíduo e exige a presença de outros, principalmente na contemporaneidade, uma vez que ninguém é auto-suficiente. Mesmo vivendo em uma sociedade tão competitiva, os indivíduos para sobreviverem precisam agrupar-se em grupos que não podem ser apenas conjuntos de pessoas justapostas, precisam ser pequenos coletivos integrados, isto é, equipes de trabalho.

Trabalho em equipe

Trabalho em equipe supõe a existência de um grupo de pessoas que comungam interesses comuns e que temporariamente se unem para atingir um mesmo objetivo. Certamente, essas pessoas têm seus projetos de vida particulares, mas, por trabalharem juntas ou por estudarem juntas, em determinados momentos, precisam realizar ações e alcançar objetivos comuns.
O trabalho em equipe não se realiza se não houver integração e respeito entre seus participantes. Cada um precisa se responsabilizar por uma meta, isto é, realizar uma tarefa em um determinado tempo. Essa tarefa lhe é atribuída porque esse indivíduo tem competência para realiza-la, portanto, trabalha-se com os pontos fortes de cada participante, e não com suas fraquezas.  Ao final de um determina do período, a equipe avalia seu trabalho e replaneja suas atividades a partir das metas cumpridas ou não. Assim, há uma interdependência entre os participantes, que se não for considerada, poderá comprometer o trabalho de toda a equipe.
Passa-se a falar assim em um projeto pedagógico construído coletivamente, com a participação de professores e aluno. O aluno, adulto, não é  mero receptor de um conhecimento “tido como verdadeiro”, mas interlocutor que, com base em pesquisa, aprende junto com o professor  que ensina, esclarecendo-lhe as dúvidas, instigando sua busca da verdade, orientando em suas dificuldades e desenvolve, ainda junto a seus colegas e professor, uma atuação na comunidade através de projetos de extensão. Cumpre-se assim a tríplice finalidade da universidade.
Desta forma, percebe-se que não há trabalho em equipe se não houver colaboração, autonomia e diálogo.

Didática para a Educação a Distância

O leitor pode estar a pergunta-se, mas até agora se falou de Educação Superior, mas pouco se falou de Educação a Distância.
Distância é um conceito entendido e repetido envolvendo apenas a dimensão espacial ou a dimensão temporal, mas há ainda uma terceira dimensão, a ser levada em consideração que é a transacional - espaço psicológico e comunicacional existente entre professor e aluno  (TORI, 2002).  Considerando que a distância transacional não existe apenas quando alunos e professores estão separados física e temporalmente,  faz-se necessária uma formação do docente da Educação Superior que trabalhe as questões geradoras dessa distância transacional que existem quer na modalidade de Educação a Distância quer na presencial.
Uma formação de professores que desenvolva o professor para trabalhar o diálogo, a autonomia, a colaboração  e o trabalho em equipe e que desenvolva suas competências para a otimização de seu trabalho com o auxilio das tecnologias de informação e de comunicação estará resolvendo a questão da distância .

Referências

CORTELAZZO, I.B.C.  . Colaboração, Trabalho em Equipe e as Tecnologias de Comunicação: Relações de Proximidade em Cursos de Pós-Graduação. Doutoramento em Educação. Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, 2000.
MACHADO, N. J. Apresentação. IN BICUDO, M. A . V. Fenomenologia: confrontos e avanços. São Paulo, Cortez, 2000, p.7-11.
MASON, Robin. Networked Lifelong Learning: Innovative Approaches to Education and Training Through the Internet. Edited by L. Banks, C. Graebner, and D. McConnell. University of Sheffield, 1998. Disponível em
M ORAES, M. C.  O Paradigma Educacional Emergente. Campinas-SP, Papirus, 1997.
PANITZ, T. Collaborative Versus Cooperative Learning. Disponível em http://home.capecod.net/~tpanitz/tedsarticles/coopdefinition.htm Acesso em 1006/2003.
PETERS, O . Didática do Ensino a Distância. São Leopoldo-RS, Editora UNISINOS, 2001.
PIMENTA, Selma Garrido e ANASTASIOU, Lea das Graças Camargos. Docência no Ensino Superior. São Paulo: Cortez Editora, 2002.
TORI, Romero. A Distância que Aproxima.  Revista de Educação a Distância. Vol 1 n.º 1. Disponível em http://www.aomestrecomcarinho.com.br/ead/ead20.htm . Acesso em 12/09/2003.


Doutora em Educação pela USP. Professora no Programa de Pós-Graduação em Educação - Mestrado em Educação na Universidade Tuiuti do Paraná.     Coordenadora do Núcleo de Pesquisa em Processos Educacionais Interativos. Pesquisadora nas áreas de Educação a Distância , Ambientes de Aprendizagens Colaborativos e Tecnologias de Informação e Comunicação em Educação. Membro da ABED, sócia fundadora da ABED - Polo Paraná.


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O ENSINO DA ARTE E A SUPERAÇÃO DO APARTHEID CULTURAL

Joelma Zambão Estevam *
Universidade Tuiuti do Paraná
Josélia Schwanka Salomé **
Universidade Tuiuti do Paraná
O presente trabalho apresenta alguns conceitos de cultura e discute a problemática do acesso da classe desfavorecida economicamente à cultura erudita. Reflete sobre o papel da escola e mais especificamente das aulas de arte na superação do que denominamos de apartheid cultural, através da questão da responsabilidade e, oferecer oportunidades de acesso aos alunos, aos códigos, símbolos e regras da linguagem artística produzidos, democratizando a gramática da arte.
A inclusão das classes subalternas no mundo da cultura erudita passa definitivamente pela escola e alguns passos tornam-se fundamentais para que isto ocorra, como a exigência de formação na área ao profissional que deseja trabalhar com o ensino da arte. Muitas escolas consideram a disciplina de artes menos séria e importante que várias outras do currículo, sendo assim, normalmente o professor que a assume é aquele que precisa completar carga horária ou o que já está cansado de anos de labuta e escolhe uma área com a qual não precise dispensar tanta atenção. Sem os conhecimentos mais elementares de arte e estética, não é possível desenvolver um trabalho que promova a inclusão cultural dos alunos.  Guiados pela concepção básica de que a arte pode ser ensinada e que deve ser trabalhada a partir da percepção de mundo, acreditamos que a escola necessita urgentemente rever o seu papel enquanto um dos agentes de transformação social e essa necessidade perpassa também pela inserção da arte na escola como um elemento auxiliar na construção de um olhar crítico no exercício da cidadania do indivíduo.
O texto ora apresentado parte do referencial teórico de importantes autores na área em questão, tais como: Alfredo Bosi, Ana Mae Barbosa e Dermeval Saviani.

Palavras-chave:  Educação, Ensino da Arte, Apartheid Cultural
Os indivíduos que constituem a classe dominante possuem entre outras coisas
uma consciência disso que pensam; à medida que dominam enquanto classe
e determinam uma época histórica em toda a sua extensão, é lógico
que esses indivíduos dominem em todos os sentidos,
que tenham, entre outros, uma posição dominante como seres pensantes,
como produtores de idéias, que regulamentem a produção e
a distribuição dos pensamentos da sua época; as suas idéias são, portanto,
as idéias dominantes da sua época
. (Karl Marx).

Por mais abrangente que possa ser uma definição, dificilmente conseguir-se-à conceituar o termo cultura de forma completa e unívoca. Os autores que mais se aproximam são os que mais ampliam a discussão deixando a questão mais complexa.  Aldo Vannucchi (1999, p.14), em suas reflexões sobre cultura tenta inserir a devida complexidade que envolve o problema, Quando conceitua, tenta fazê-lo de forma mais abrangente, conforme essa sua colocação:

... a cultura não existe em seres humanos genéricos, em situações abstratas, mas em homens e mulheres concretos, pertencentes a este ou àquele povo, a esta ou àquela classe, em determinado território, num regime político A ou B, dentro desta ou daquela realidade econômica. Somente se poderá conceituar cultura como auto-realização da pessoa humana no seu mundo, numa interação dialética entre os dois, sempre em dimensão social. Algo que não se cristaliza apenas no plano do conhecimento teórico, mas também no da sensibilidade, da ação e da comunicação.

Extrair dessa realidade um conceito único e universal de cultura é tarefa difícil. O termo avulta e “passeia” por vários campos do saber. Alfredo Bosi (1992, p.308) adota o termo no plural: culturas, principalmente quando se refere ao que é realizado no Brasil:

Estamos acostumados a falar em cultura brasileira, assim, no singular, como se existisse uma unidade prévia que aglutinasse todas as manifestações materiais e espirituais do povo brasileiro. Mas é claro que uma tal unidade ou uniformidade parece não existir em sociedade moderna alguma e, menos ainda, em uma sociedade de classes.

Em seu texto “Cultura Brasileira e Culturas Brasileiras” , relembra a tradição da Antropologia Cultural Brasileira que dividia o Brasil em culturas utilizando o critério racial: cultura indígena, cultura negra, cultura branca e culturas mestiças. Mudando os critérios, pode-se ter outras classificações: cultura do rico, do pobre, cultura burguesa, cultura operária, mas, de qualquer forma o reconhecimento do plural é essencial.
Devido à colonização européia, foram distinguindo-se dois planos culturais no Brasil: o considerado erudito, marcado pela branquidade e europeidade; e o definido como vulgar, sem valor, das camadas subalternas. Tal distinção, que traz em seu bojo uma carga significativa de preconceito, confunde ainda hoje grande parte da população que não reconhece suas ações como manifestação de cultura, elegendo o que é produzido pela classe dominante como modelo a ser seguido. Sobre tal afirmação, Alfredo Bosi (1992, p.312) escreve:

Se pelo termo cultura entendemos uma herança de valores e objetos compartilhada por um grupo humano relativamente coeso, poderíamos falar em uma cultura erudita brasileira, centralizada no sistema educacional (e principalmente nas universidades), e uma cultura popular, basicamente iletrada, que corresponde aos mores materiais e simbólicos do homem rústico, sertanejo ou interiorano, e do homem pobre suburbano ainda não de todo assimilado pelas estruturas simbólicas da cidade moderna.

Além dessas, pode-se acrescentar outras duas que o desenvolvimento da sociedade urbano-capitalista foi alargando: “A cultura criadora individualizada de escritores, compositores, artistas plásticos, dramaturgos, cineastas, enfim, intelectuais que não vivem dentro da Universidade, e que, agrupados ou não, formariam, para quem olha de fora, um sistema cultural alto” (Bosi, 1992, p.312). E por fim a cultura de massas que, pela sua íntima imbricação com os sistemas de produção, acabou sendo conhecida como indústria cultural.
Outras áreas do conhecimento, como a filosofia, a etnologia e a antropologia cultural também apresentam estudos na tentativa do entendimento do termo, mas, apesar de tantas possibilidades, tem-se no Brasil uma vaga idéia do que seja cultura. Arnaldo Jabor (1993, p.9) já se pronunciou a este respeito:
“Cultura”, o que é isso? De onde vem esta coisa meio vaga, este clima meio gasoso, que envolve a palavra no Brasil como um manto diáfano?
Tal concepção (ou falta de) não é somente resultado da falta de conhecimento e de escolarização precária. Segundo Aldo Vannucchi, (1999, p.15)

... cultura é problema político, porque não acontece no vazio, magicamente. Toda produção cultural nasce, desenvolve-se e repercute no âmbito do social e do econômico. Uma casa que se levante, uma plantação que se planeje, um poema que se componha ou uma experiência científica que se processe, tudo supõe o húmus polivalente da sociedade, tudo requer recursos variados, material de trabalho, organização de serviços, troca de bens e outros expedientes complexos, máxime em nossa sociedade capitalista, estruturada em classes antagônicas. Por essa sociedade correm triunfais expressões como “Saber é Poder”ou “Quem Sabe, Sabe...”

 E quem sabe (classe dominante), determina o que é e o que não é cultura erudita e cultura popular.
Segundo Waldenyr Caldas (1986, p.94),

a cultura erudita possui um universo que a legitima através da filosofia, da ciência e do saber produzidos na Universidade e nas instituições científicas. Às classes subalternas não há possibilidade de participar da cultura erudita. Nem como produtoras, muito menos como consumidoras. As instituições que produzem a alta cultura, ou seja, a cultura erudita, estão fora do alcance dessa classe.
Entretanto o oposto - a apropriação da cultura popular pela elite – segundo Waldenyr Caldas (1986, p.66) é bastante freqüente:

Seja interferindo de forma definitiva  em manifestações originariamente populares, como é o caso do carnaval, seja através  do artista produtor de cultura erudita lançando mão de temas considerados populares, como é o caso de Heitor Villa Lobos, que se valeu, por diversas vezes, do universo caipira paulista, da cultura popular, para realizar suas composições, como, por exemplo, a obra intitulada Trenzinho Caipira. Cândido Portinari internacionalizou o drama social e político do retirante nordestino com o quadro Os Retirantes. Estão contidos nessa obra elementos da cultura popular nordestina, que vão desde a sobrevivência física, passando pelo problema do latifúndio até o êxodo rural. Na literatura sucede-se o mesmo, João Guimarães Rosa, no livro Grande Sertão: Veredas, discorre sobre os usos e costumes, tradições e linguagem do povo do interior de Minas Gerais.

O acesso da classe dominante à cultura popular e a exclusão do povo da cultura erudita foi denominado por alguns autores, dentre eles Ana Mae Barbosa (1991, p.33) como Apartheid Cultural:
O que temos entretanto, é o apartheid cultural. Para o povo o candomblé, o carnaval, o bumba-meu-boi e a sonegação de códigos eruditos de arte que presidem o gosto da classe dominante que, por ser dominante, tem possibilidade de ser mais abrangente e também domina os os códigos da cultura popular. Basta ver o número de teses que se escrevem na universidade sobre cultura a arte popular, e ainda a elite cultural desfilando nas escolas de samba no carnaval. (...) As massa têm o direito a sua própria cultura e também à cultura da elite, da mesma maneira que a elite já se apropriou da cultura da massa, embora quase sempre “hospedada no Hilton Hotel.

Este procedimento reforça as posições das respectivas classes sociais. Na educação percebemos que, historicamente, os cursos técnico-profissionalizantes são dirigidos às classes subalternas e, com a justificativa de encaminhar seus membros ao mercado de trabalho, forma-se mão-de-obra barata. Entretanto, à classe dominante é oferecida a cultura científica e a produção cultural erudita. E é esta classe a responsável pelo desenvolvimento científico e tecnológico da sociedade. Ela produz a cultura científica e tecnológica nos laboratórios e nos centros de pesquisa e a classe proletária executa os projetos com a sua força de trabalho. De acordo com Waldenyr Caldas (1986, p.35) “nessas condições, enquanto classe dominante, ela influencia, cria padrões de comportamento e educa as classes subalternas segundo sua própria visão de mundo, seus conceitos e seus interesses”.
No caso específico da educação em arte e pela arte, verifica-se que os professores que ministram esta disciplina na escola pública (onde está a classe subalterna) também têm negado o acesso à cultura erudita e apresentam muita dificuldade, quando não a impossibilidade absoluta, de apresentar aos seus alunos os bens artísticos e estéticos produzidos historicamente. Cabe ressaltar que não se está defendendo aqui a imposição da cultura erudita em detrimento da cultura popular, mas a democratização dos saberes contra todas as formas de distribuição desigual dos bens simbólicos (culturais).
A inclusão das classes subalternas no mundo da cultura erudita passa definitivamente pela escola e alguns passos tornam-se fundamentais para que isto ocorra, como a exigência de formação na área ao profissional que deseja trabalhar com o ensino da arte. Muitas escolas consideram a disciplina de artes menos séria e importante que várias outras do currículo, sendo assim, normalmente o professor que a assume é aquele que precisa completar carga horária ou o que já está cansado de anos de labuta e escolhe uma área com a qual não precise dispensar tanta atenção. Sem os conhecimentos mais elementares de arte e estética, não é possível desenvolver um trabalho que promova a inclusão cultural dos alunos.
Essa necessidade de um profissional formado na área, juntamente a outras questões da educação, fez com que fosse elaborada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de número 5692 de 1971, onde a arte surge no currículo escolar como Educação Artística, cuja obrigatoriedade está prevista pelo artigo 7º desta lei: “Será obrigatória a inclusão de Educação Moral e Cívica, Educação Física, Educação Artística e Programas de Saúde nos currículos plenos dos estabelecimentos de 1º e 2º graus” ( NISKIER, 1996, p.82)
Desta premissa, surge a polivalência na formação do professor.quando este se vê diante de aulas onde deveriam ser trabalhadas as quatro linguagens artísticas (Artes Plásticas, Teatro, Dança e Música) e essa formação, de caráter superficial, traz para a educação a idéia de que ao se trabalhar com técnicas isoladas, estariam se trabalhando todas as áreas. Surgem então na escola as técnicas de trabalho artístico, voltadas para o desenvolvimento da sensibilidade e da criatividade do aluno.
Na verdade, essas técnicas não previam um conteúdo teórico acerca da história da arte ou das produções artísticas dos diversos períodos, eram atividades isoladas com o caráter de trabalhar o ‘fazer expressivo’, através de aulas com temas, ou simplesmente com o desenvolvimento de técnicas artísticas.
E esta presença dos temas e das técnicas no ensino arte hoje, é muito freqüente. A escola continua, apesar dos avanços nas teorias, a trabalhar com uma metodologia ultrapassada, comprovando o desconhecimento dos fundamentos históricos, filosóficos e estéticos que norteiam a atual concepção de arte.
É muito comum
A maioria dos professores acreditar que desenhar, pintar, modelar, cantar, dançar, tocar e representar é bom para os alunos, mas poucos são capazes de apresentar argumentos convincentes para responder ‘Por que essas atividades são importantes e devem ser incluídas no currículo escolar?’ Isso é desalentador, pois o mínimo que se espera de alguém que ensina é que saiba por que ensina.”. (BARBOSA, 2001. p. 13)

Nesta perspectiva, surgem,  na década de 80, questionamentos acerca da validade destes conteúdos voltados para a confecção de trabalhos, pintura de desenhos e objetos decorativos. Até que ponto este trabalho desenvolve uma atitude crítica do indivíduo frente ao mundo, possibilitando-o perceber-se enquanto sujeito de um momento histórico.
Esses movimentos de Arte-Educadores ressaltam a preocupação com os rumos da arte e da educação.”(...) educadores brasileiros mergulham em um esforço de conceber e discutir práticas e teorias de educação escolar.(...)E nos convidam a discutir as ações e as idéias que queremos modificar na educação em arte, como um desafio e compromisso com as transformações na sociedade.”(FERRAZ, 1993, p.33)
Com o advindo da LDB de número 9394 de 1996, a Arte torna-se componente curricular obrigatório e reconhecida enquanto objeto de conhecimento pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, documento do Ministério da Educação, ganhando o status de disciplina voltada à aquisição de conhecimentos específicos.
Enquanto disciplina, temos um posicionamento teórico-metodologico em vigor, apontado pelos Parâmetros Curriculares Nacionais na área. Este posicionamento é conhecido por Metodologia Triangular, proposta elaborada por Ana Mae Barbosa, a partir de estudos feitos nos EUA, “as fundamentações desta proposta estão baseadas no projeto D.B.A E. (Disciplined Based Art Educacion), incentivado pela Getty Foundation, e vem sendo desenvolvido nos Estados Unidos, desde o final dos anos 80.” (ibidem, p.35)
A preocupação com a contextualização histórica, a dimensão estética do objeto de estudo e o fazer artístico, faz com que a arte se aproxime do conceito de educação visto anteriormente, uma educação que visa a promoção do homem, que busca propiciar ao aluno “o acesso e o contato com os conhecimentos culturais básicos e necessários para uma prática social viva e transformadora.” (ibidem, p.34).
Assim, a preocupação é trabalhar dentro de uma proposta metodológica que propicie o desenvolvimento de um olhar mais crítico, possibilitando uma leitura de mundo através da consciência histórica e da reflexão crítica sobre os momentos, as idéias, as produções do homem.
Nesta perspectiva alicerçada na Pedagogia Histórico-Crítica, enquanto prática e teoria da educação, concordamos com Saviani  (1980, pp 60-61) quando este afirma que:

Tais métodos se situarão para além dos métodos tradicionais e novos, superando por incorporação as constituições de uns e de outros. Portanto, serão métodos que estimularão a atividade e iniciativa dos alunos, sem abrir mão, porém, da iniciativa do professor; favorecerão o diálogo dos alunos entre si e com o professor, mas sem deixar de valorizar o diálogo com a cultura acumulada historicamente; levarão em conta os interesses dos alunos, os ritmos d aprendizagem e o desenvolvimento psicológico, mas sem perder de vista a sistematização lógica dos conhecimentos, sua ordenação e gradação para efeitos do processo de transmissão-assimilação dos conteúdos cognitivos.

Apesar de termos uma nova proposta de ensino da arte centrada nas questões da fruição, da reflexão e da produção, os métodos tradicionais de ensino parecem estar enraizados nas escolas, sendo necessária sempre uma justificativa da importância da arte na educação para que esta área seja mais valorizada.
É fundamental que a escola perceba a arte como um meio de expressão, pelo qual o aluno apresenta a sua visão de mundo, compreendendo que é por meio da arte que o homem expressa o seu momento histórico, com características próprias, enquanto leitor e intérprete do mundo.
Na verdade, a educação se apresenta como uma jovem muito doente e muito traumatizada pelo percurso histórico sofrível pelo qual ela passou e está claro que, estudar criticamente um assunto significa buscar os seus condicionantes históricos, como é o caso do ensino da arte, como é o caso da educação de uma maneira geral.
Guiados pela concepção básica de que a arte pode ser ensinada e que deve ser trabalhada a partir da percepção de mundo, acreditamos que a escola necessita urgentemente rever o seu papel enquanto um dos agentes de transformação social e essa necessidade perpassa também pela inserção da arte na escola como um elemento auxiliar na construção de um olhar crítico no exercício da cidadania do indivíduo.
Por fim, a escola e o professor de arte devem assumir a responsabilidade primordial de oferecer oportunidades de acesso ao aluno aos códigos, símbolos e regras da linguagem artística historicamente produzidos, democratizando a gramática da arte. Pois, de acordo com Ana Mae Barbosa (1994, p.13): “ A consciência de ser colonizado dos brasileiros é titubeante, confusa e mal explicitada” Se o professor não reconhece sua condição de excluído, jamais trabalhará no sentido da emancipação dos alunos que estão sob a sua responsabilidade e contribuirá para a formação de uma mentalidade elitista. A sonegação de conhecimentos nos faz acreditar na normalidade de uns terem acesso a tudo e outros não terem este direito.
De alguma forma esta reflexão sobre a educação, a cultura e a arte, levantaram alguns pontos cruciais, algumas lacunas que precisam ser pensadas e preenchidas na tentativa de alcançarmos os fins a que nos propomos.


BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA

BARBOSA, A M. A imagem no ensino da arte. São Paulo: Perspectiva, 1991.
______________. Arte-educação pós-colonialista no Brasil: Aprendizagem triangular.     Santa Catarina: USSC, 1994.
_______________. Arte-educação no Brasil. São Paulo : Perspectiva, 1978.
BOSI, A. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia da Letras, 1992.
CALDAS, W. Cultura . São Paulo: Global, 1986.
FERRAZ, M. H. C. de T.  Metodologia do ensino da arte./ Maria Heloísa de T. Ferraz , Maria F. de Rezende. - São Paulo : Cortez, 1993.
FUSARI, M. Arte na educação escolar / Maria F. de Rezende e Fusari, Maria Heloísa de T. Ferraz. – São Paulo : Cortez, 1992.
GENTILI, P. ALENCAR, C. Educar na esperança em tempo de desencantos. Vozes: Petrópolis, 2002.
KOSIK, K. Dialética do concreto. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1976.
READ, H. A educação pela arte / Herbert Read ; tradução Valter Lellis Siqueira. – São Paulo : Martins Fontes, 2001.
MENDES DE ALMEIDA, C. J. A arte é capital – Visão aplicada de Marketing cultural. Rio de Janeiro: Rocco, 1993.
NISKIER,  A . LDB : a nova lei da educação. Rio de janeiro : consultor, 1996.
SAVIANI, D. Educação : do senso comum à consciência filosófica. Campinas, SP : Autores Associados, 1996.
___________. A nova lei da educação : trajetória, limites e perspectivas. Campinas, SP : Autores Associados, 1997.
VANNUCCHI, A. Cultura brasileira. O que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 1999.

* Coordenadora e professora do curso de Artes Visuais com Ênfase em Computação da Universidade Tuiuti do Paraná. Mestranda do Programa de Pós-Graduação , Mestrado em Educação da UTI, Linha de Pesquisa: "Políticas Públicas e Gestão da Educação.
** Professora dos cursos de Artes Visuais com Ênfase em Computação e Pedagogia
da Universidade Tuiuti do Paraná. Mestranda do Programa de Pós-Graduação , Mestrado em Educação da UTI, Linha de Pesquisa: "Políticas Públicas e Gestão da Educação.

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CICLOS DE APRENDIZAGEM:
as duas faces da  política educacional municipal

Josiane Gonçalves Santos  *
Universidade Tuiuti do Paraná
Este trabalho corresponde à  pesquisa, em desenvolvimento,  no Mestrado em Educação da UTP, centrada  na  proposta  educacional das escolas municipais de Curitiba, os Ciclos de Aprendizagem. A pesquisa  contemplará investigações realizadas no campo teórico e empírico, buscando identificar fatores responsáveis pelo baixo desempenho escolar dos alunos, afinal o ensino verdadeiramente comprometido com sua responsabilidade social é semente para a construção de uma nova sociedade que ultrapasse as barreiras impostas pelas relações sociais capitalistas. A  comunidade educacional e  diversos segmentos sociais questionam o desempenho escolar dos  alunos de escolas públicas, demonstrando a crise vivida pela educação no mundo contemporâneo e, propiciando o desenvolvimento de inovações pedagógicas. Os Ciclos de Aprendizagem surgem como uma concepção de ensino em que a escola deve  integrar aos conteúdos trabalhados à realidade do aluno e da comunidade em que esteja inserido. É uma organização de ensino que  exige a transformação da postura  do educador  em relação ao processo ensino-aprendizagem, entendendo que cada aluno possui um determinado tempo, resultante  de sua história  de vida,  que interfere na construção de seu conhecimento. É uma concepção de educação onde a aprendizagem do aluno ocorre sem as rupturas temporais existentes na organização escolar em séries, torna-se um processo contínuo, valorizando a formação global humana. A concepção dos Ciclos de Aprendizagem demonstra coerência com o modelo educacional desejado pela sociedade, porém os resultados práticos da proposta educacional não correspondem às necessidades sociais e culturais que a sociedade capitalista contemporânea exige de todos os indivíduos,  demonstrando falhas metodológicas, estruturais e organizacionais ainda não sanadas, propiciando a interpretação  de que a política educacional  municipal  traz implícito  o objetivo  da  redução de gastos, seguindo a orientação do Banco Mundial que estabelece um tempo específico para a escolarização do indivíduo. 

Palavras-chave: educação, ciclos, aprendizagem
1.    INTRODUÇÃO

A evolução sócio-cultural da humanidade trouxe a necessidade da escola rever sua organização  e função social, afinal, ocorreram modificações históricas e sociais  trazendo ao ambiente escolar  uma diversificação de etnias, experiências culturais e problemas sociais e, que exigiram mudanças no contexto educacional – nem sempre realizadas.
A escola é local de transmissão e apropriação dos instrumentos conceituais  necessários para a compreensão da realidade. ANDRADE (2002, p. 09) acredita que como instituição social, ela é “parte de um sistema mais amplo e complexo – a sociedade – do qual depende e recebe influência, ao mesmo tempo e na mesma medida em que a ele serve e influencia.” Essa relação dialética  faz com que a instituição escolar reflita as características da sociedade em que esteja inserida.
As relações sociais contemporâneas trouxeram a possibilidade de acesso à todos os indivíduos, porém, a escola acabou se transformando em instância de seleção prévia, onde aqueles indivíduos considerados os mais “educáveis” adaptam-se às finalidades – e efeitos perversos – do processo produtivo. No entanto desacreditar no poder da educação é, no mínimo, matar a esperança em um futuro melhor.
A Rede Municipal de Ensino de Curitiba nos últimos anos, com vistas a aperfeiçoar o trabalho pedagógico dos docentes, avançar no processo ensino-aprendizagem e, fundamentalmente, encontrar alternativas para a crescente seletividade e exclusão social presente nas séries iniciais do Ensino Fundamental, desenvolveu projetos e estudos  que culminaram  com a implantação, em 1999, da organização do tempo escolar em Ciclos de Aprendizagem.
A política educacional dos  ciclos básicos de educação surgiu em um primeiro momento  como uma possibilidade de oposição ao perfil fragmentário e seriado do ensino tradicional da escola burguesa. Modelo educacional instituído na época da Revolução Francesa como forma de separar a sociedade e classificar os membros da sociedade, permitindo  a dominação de uns sobre outros a partir do momento em que determinava os conhecimentos a serem dominados pelos diferentes segmentos sociais.
A organização  escolar em ciclos visa adequar o tempo escolar ao desenvolvimento global do aluno, considerando suas características individuais e culturais, suas individualidades, potencialidades e dificuldades, diferentemente da idéia simplista de que seria, apenas, um processo onde os alunos considerados mais fracos teriam um tempo maior para aprender ou uma inovação para acabar com a repetência escolar. É uma concepção de ensino onde a aprendizagem do aluno ocorre sem as rupturas existentes na organização escolar em séries. A aprendizagem torna-se um processo contínuo que ocorre concomitantemente ao desenvolvimento biológico do educando, valorizando a formação global humana.
                
2.    A INTERFERÊNCIA ECONÔMICA NA POLÍTICA EDUCACIONAL

O novo milênio desencadeou avanços científicos e tecnológicos, ocasionando transformações sociais em todo o mundo, modificações estas fruto das inovações e das novas organizações sócio-econômicas. O Brasil, país em desenvolvimento , viu-se obrigado à abrir sua economia para o capital estrangeiro que passou a interferir diretamente na construção e implantação de políticas públicas, resultando em profundas conseqüências na educação brasileira.
Em 1990 aconteceu na Tailândia a Conferência de Jontiem, onde o Banco Mundial propôs reformas educativas aos países com maiores taxas de analfabetismo no mundo. O Brasil,  participante do evento, enquanto um dos países  enquadrados dentro da triste estatística, se viu compelido a desenvolver ações sociais de modo a diminuir os analfabetos brasileiros. O Plano Decenal de Educação surge como uma das estratégias governamentais para a viabilização do objetivo, propondo  metas a serem desenvolvidas no dez anos seguintes.
 A partir de 1994 o Banco Mundial direcionou um maior apoio ao desenvolvimento de políticas voltadas ao setor social como meio de amenizar o quadro de pobreza no planeta Terra. Nesse contexto a educação básica foi encarada como prioridade. No entanto as propostas do banco são embasadas em projeções econômicas que definem as prioridades de investimento utilizando-se da relação custo-benefício e da taxa de retorno, caracterizando uma proposta em que o interesse financeiro se sobrepõem ao educativo. Posteriormente, em 1996, o Congresso Nacional brasileiro aprovou a Lei 9394 que expressava em suas diretrizes as várias possibilidades de organização do tempo escolar, entre elas os CICLOS.
A implantação dos Ciclos de Aprendizagem pela Secretaria Municipal de Educação em 1999, ocorreu em decorrência da reflexão iniciada em 1996 sobre o processo ensino-aprendizagem. O documento (PMC, 1999) sobre a implantação dos Ciclos na RME em seu texto de apresentação afirma
Os desafios postos hoje à escola pública, em decorrência das transformações no mundo do trabalho, nos meios de comunicação e informação, no exercício da cidadania e na busca da preservação do meio ambiente, entre outros, apontam para a necessidade de uma organização de ensino que contemple fundamentalmente a diversidade cultural e individual dos cidadãos e que tenha o desenvolvimentos do ser humano como referência para a construção de aprendizagens significativas. 
Nesse contexto, esta proposta da Rede Municipal representa uma resposta a esses desafios e uma alternativa ao fortalecimento da ação educativa. Fundamentadas no compromisso assumido entre os representantes de todos os segmentos institucionais com a busca crescente de autonomia administrativa e pedagógica do ensino municipal e o sucesso de todos os alunos, as mudanças na organização do ensino municipal aqui propostas visam à excelência na educação e à promoção da participação cooperativa de todos no processo de formação dos cidadãos. O desafio está em ousar fazer um novo cotidiano pedagógico, que possa vir a contribuir para a transformação das escolas municipais, atendendo às necessidades e expectativas da sociedade.
Apesar da coerência presente entre a proposta educacional e o contexto social vivido pela maioria dos alunos das escolas municipais, os Ciclos foram, gradativamente, sofrendo críticas maiores, oriundas inicialmente dos professores, avançando depois para diferentes segmentos sociais. Os docentes municipais passaram a  enxergar nos ciclos a responsabilidade da dificuldade de aprendizagem crescente de seus alunos, questionando, inclusive, a forma como ocorreu a  implantação  nas escolas. A maioria dos professores  alega que houve imposição dos núcleos de educação  para que as escolas optassem pelos Ciclos, além de promessas de assessoramentos  que deixaram de ser cumpridas e que resultaram no fracasso do trabalho pedagógico. Consideram  que as alterações efetivas ocorreram, apenas, na forma de registro do rendimento escolar e no número de alunos matriculados nas séries iniciais do Ensino Fundamental, pois enxergam na implantação o caráter compensatório de uma política educacional fundamentada na inserção e freqüência do aluno na escola.
O SISMAC (Sindicato dos Servidores Municipais de Curitiba) passou a criticar duramente a proposta educacional municipal, entendendo que a política pública atendia plenamente aos interesses e imposições do Banco Mundial, mas eximia-se da responsabilidade de transmitir os conteúdos essenciais para a formação de um indivíduo inserido em uma sociedade capitalista e seletiva. Em artigo publicado na revista Chão da Escola (2002, p.06) o sindicato afirma
A proposta para a reorganização do tempo escolar em Ciclos, apresentada e subseqüentemente imposta pelas/os chefes de núcleo e que acabou sendo implementada em 1999, na quase totalidade das escolas da Rede, foi outra dessas manobras que considerou apenas dar conta estatisticamente do problema da retenção, apontando necessariamente para uma diminuição de “gastos” com a educação. Esta postura, que não garantiu discussões prévias, não preparou os professores, não garantiu condições materiais, estruturais e nem de pessoal, além de ser vazia de conteúdo pedagógico e cheia de conteúdo econômico, acaba por comprometer uma proposta educacional que tem sido implementada com sucesso nas administrações populares e democráticas em  todo o Brasil. A definição de uma nova forma de organização do tempo de trabalho com o aluno em Ciclos não tem refletido em novas formas de organização da própria escola e do tempo de trabalho de seus profissionais. As mudanças se fizeram presentes apenas na aprovação automática e no aumento do número de alunos por professor nas salas de aula, sem preocupações efetivas sobre quaisquer transformações efetivas no trabalho pedagógico.

  
Nessa visão, entende-se que a organização do ensino em Ciclos de Aprendizagem desenvolvida nas escolas municipais de Curitiba traz embutido em sua filosofia de desenvolvimento humano a estratégia para a redução da repetência e da evasão escolar, determinantes essenciais para a efetivação de empréstimos, demonstrando, na prática, a submissão da educação aos interesses econômicos e apresentando o caráter contraditório da política educacional, que reveste a escola de responsabilidades que desviam a função educativa, priorizando o caráter quantitativo em detrimento ao qualitativo, pois possibilita-se o acesso à todos através do aumento do número de vagas. É o caráter dúbio da proposta educacional que possibilita e propicia o acesso à escola, mas que frusta a sociedade diante dos resultados obtidos onde, por exemplo, alunos  da 2.ª Etapa do Ciclo II (4.ª série) chegam ao final do  ano letivo sem dominar a leitura e a escrita.  É o fracasso da escola pública municipal!

3.  ENTENDENDO A CONCEPÇÃO DOS CICLOS

Ciclos de Aprendizagem surgiram diante da necessidade de reorganizar o tempo escolar em decorrência do baixo desempenho escolar apresentado pelos alunos do Ensino Fundamental, aliada aos resultados de pesquisas realizadas pelas áreas  que estudam o desenvolvimento do ser humano e suas relações sócio-culturais. É um concepção de ensino que orienta-se através do desenvolvimento individual de cada educando.
Ciclos de formação  está relacionado à uma concepção de ensino em que a escola deve integrar os conteúdos à realidade do educando e à organização social vigente, “quebrando” a rigidez na organização do tempo escolar, pois exige  uma modificação na visão que o educador possui do educando, conscientizando-o de que cada aluno possui tempos diferentes de construção de seu conhecimento. Essa inovação necessita de uma reconceituação do espaço escolar, ocasionando mudanças que englobam todo o processo ensino-aprendizagem.
LIMA (2000, p. 04) justifica a organização do tempo escolar em Ciclos afirmando que
Ciclo não é solução para o fracasso escolar, não vem como mera contraposição à seriação. É uma proposta de reformulação da estrutura escolar, que sustenta um processo contínuo constituído pelas atividades de ensino e as atividades necessárias para a aprendizagem, levando, assim, ao desenvolvimento humano de todos os educandos. A proposta de ciclos encerra a tentativa de se organizar um processo de ensino e aprendizagem que se adeqüe às características do desenvolvimento humano que é, essencialmente, diverso e que se efetua por idas e vindas até que o educando constitua determinado conceito, entenda e utilize um sistema simbólico, utilize os conceitos formais para a compreensão da vida cotidiana, constitua formas novas de pensamento e se situe em relação ao conhecimento.
É uma concepção de ensino que necessita da reformulação da relação pedagógica entre professor e aluno, valorizando a formação e desenvolvimento global do indivíduo e propondo rupturas com os modelos tradicionais de ensino.
               
4.    CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na construção de um plano que efetive a justiça social no Brasil, a educação é encarada como elemento fundamental na esperança da concretização da transformação social. É o momento em que os processos educativos sofrem ressignificações conseqüentes das novas organizações sociais e das políticas públicas. A educação torna-se exigência do mercado de trabalho favorecendo a proliferação de propostas milagrosas e inovadoras, desconsiderando o fato de que a educação é elemento decisivo para a  emancipação  social do indivíduo.
É um momento em que os interesses da classe dominada contrapõem-se aos da classe dominante. A elite dominante, na sociedade capitalista, tem como objetivo educar as crianças oriundas das famílias trabalhadoras para o exercício da submissão cotidiana, a submissão no trabalho, o respeito à propriedade privada, o respeito ao patrão, o respeito à autoridade, o respeito à polícia e assim por diante. É esta a função da escola numa perspectiva burguesa. Na perspectiva da classe dominada o interesse é que a escola  possibilite produzir a emancipação da classe trabalhadora, portanto são interesses antagônicos. Para a classe trabalhadora, além do desenvolvimento da criticidade,  interessa ao indivíduo o  domínio do conhecimento historicamente acumulado e sistematizado.
Os Ciclos de Aprendizagem implantados pela Secretaria de Educação Municipal de Curitiba, e bem sucedidos em outras localidades brasileiras, não efetivam na prática o objetivo implícito em sua concepção, onde a construção do conhecimento respeita as diferenças, potencialidades e dificuldades entre os educandos. Vários estudos e encaminhamentos estão sendo realizados visando a reorientação do trabalho pedagógico desenvolvido pelos professores, demonstrando a possibilidade de que a dificuldade de aprendizagem dos alunos possa  ser resultante  da metodologia desenvolvida em sala de aula.
As dúvidas são muitas em busca de respostas. São  questões envolvendo os  baixos desempenhos escolares dos alunos, sobre a responsabilidade da mantenedora e dos professores na aprendizagem dos alunos,  críticas ao modo como ocorreu a implantação dos Ciclos de Aprendizagem nas escolas municipais de Curitiba,  as conseqüências sociais na vida dos indivíduos que estão passando pelo período escolar sem dominar os conteúdos básicos, essenciais para o desenvolvimento pessoal e profissional, os interesses políticos e econômicos implícitos na proposta, entre outros.
São questionamentos que serão esclarecidos no decorrer da história deixando, no entanto, cicatrizes profundas na vida dos educandos. Muito ainda precisa ser estudado, avaliado e discutido para podermos, verdadeiramente, argumentar sobre a proposta pedagógica dos Ciclos de Aprendizagem.

REFERÊNCIAS

ANDRADE, R. C. de. Questões desafiadoras na escola. Ed. Artmed, 2002.
LIMA, E. S. Ciclos de formação: uma reorganização do tempo escolar. São Paulo: Sobradinho 107 Editora, 2000.
PREFEITURA MUNICIPAL DE CURITIBA. Projeto de implantação da rede municipal de ensino de Curitiba. Curitiba, PR, 1999.

BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA

GENTILI, P. & ALENCAR, C. Educar na esperança em tempos de desencanto. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002, 2.ª ed.
GENTILI, P. (Org.) Pedagogia da exclusão: crítica ao neoliberalismo em educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001, 9.ª ed.
LIMA, E. S. Ciclos de formação: uma reorganização do tempo escolar. São Paulo: Sobradinho 107 Editora, 2000.
PARO, V. H. Reprovação escolar: renúncia à educação. São Paulo, SP: Xamã, 2001, 1.ª ed.
PREFEITURA MUNICIPAL DE CURITIBA. Projeto de implantação da rede municipal de ensino de Curitiba. Curitiba, PR, 1999.
REVISTA Chão da escola. Revista do SISMAC, Abril de 2002, n.º 01.
SAVIANI, D. Escola e democracia. Campinas, SP: Editora Autores Associados, 1992, 26.ª ed.

* Mestranda do Programa de Pós-Graduação, Mestrado em Educação da UTP, Linha de Pesquisa “Políticas Públicas e Gestão da Educação

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DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO PARA UM PROJETO POLÍTICO E PEDAGÓGICO: Um Contrato Entre Gestores, Professores e Alunos

Josimary Morastoni *
Mestranda em Educação
Universidade Tuiuti do Paraná

Marlei Gomes Da Silva Malinoski **
Mestranda em Educação
Universidade Tuiuti do Paraná
Do Projeto Político-Pedagógico para um Projeto Político e Pedagógico: um contrato entre gestores, professores e alunos. Discussão sobre a importância do comprometimento de gestores e professores na construção de uma proposta educativa que torne a aprendizagem mais significativa e crítica dentro de um contrato pedagógico. Instituído em um Projeto Político e Pedagógico democrático, com base em uma identidade política e pedagógica para a educação escolar norteada pelos novos paradigmas emergentes de educação, os saberes docentes e os compromissos de gestão em educação. De acordo com o paradigma emergente, o desafio passa por criar e permitir uma nova ação docente na qual tanto professores quanto alunos participam de um processo para aprender de forma criativa, dinâmica encorajadora que tenha como base o diálogo e as descobertas. Este processo deve permitir ao professor e os alunos aprender a aprender num processo coletivo para produção do conhecimento, colocando como foco o aprendiz em um sistema aberto que permita a percepção e integração de um currículo vivo, no qual o ensino/ aprendizagem se dê nas relações interdisciplinares e que o conhecimento seja tomado como um bem renovável em que educadores e educandos estejam comprometidos com a produção do mesmo dentro de um contexto que vá além da escola. Contemplando as demandas mercadológicas, a sociedade de comunicação e a importância dos saberes docentes na configuração do que vem a ser um plano de ação conjunta e colaborativa, que possa determinar a construção producente da noção política de escola, currículo e conhecimento juntamente a noção pedagógica, frente à percepção dos saberes de professores/profissionais e suas representações do currículo e da práxis educativa dentro de um ambiente escolar gerido pelo diálogo em uma visão democrática e colaborativa do Projeto Político e Pedagógico.

Palavras-chave: saberes docentes, conhecimento, formação de professores, currículo, ensino/aprendizagem, gestão, projeto político e pedagógico.

Pensar e construir uma escola é, essencialmente colocar em prática
uma concepção política e uma concepção pedagógica
que se realimentam e que se corporificam
na sua Proposta Política-Pedogógica.
  (
Bordignon & Gracindo)
Pensar a escola e a construção de seu projeto de vida requer o estabelecimento dos conceitos pelos quais se fundamentam suas percepções de um projeto político-pedagógico. Sendo suas bases a visão de sociedade a qual responde, os novos paradigmas educacionais, as definições das especificidades da organização escolar, a visão clara da finalidade da escola como construtora da cidadania e as ambigüidades dos saberes docentes, no que estabelece a dimensão da qualidade desejada na educação.
Na concepção de um projeto político tem-se que, a emancipação humana dá-se dentro da filosofia de educação que norteia a sociedade vigente. Sendo assim, o projeto político deve estabelecer quais as necessidades sociais, de acordo com a sociedade e momento histórico, a que estará incluído. Dentre elas vê-se a qualidade de vida e as definições mercadológicas, que configuram um dos novos paradigmas educacionais emergentes, ou seja, a importância do contexto, à que o movimento de aprendizagem se inicia na relação do homem com o mundo e na objetivação deste com o mundo do trabalho. Este posicionamento permitirá a construção do conhecimento como missão da escola, sendo dada pela inter-relação dos sujeitos envolvidos: diretores e equipe pedagógica (coordenadores, supervisores e orientadores), professores, alunos e comunidade externa. Em um processo sem um determinador hierárquico e sim, de acordo com as diferentes esferas de responsabilidades.
Essas necessidades sociais delinearão os norteadores a que se referem os conhecimentos curriculares. Compete à instituição escolar gerir a seleção de um conjunto de conhecimentos curriculares mínimos, que correspondam aos interesses e peculiaridades de seus agentes e ao contexto que estão inseridos. O que fornece ao projeto político a autonomia pedagógica, que auxiliará a aprendizagem, dentro do novo paradigma educacional, que coloca como foco o aprendiz, definindo-o como ser totalitário, autônomo, incluso e que possui relação dialética com o mundo. Porém, primando que a interação social não parta de interesses apenas individuais ou locais e sim vinculados a um contexto maior de sociedade emancipatória do sujeito.  Nesse momento dá-se a construção dos norteadores educacionais, também conhecidos como planos de ensino ou ementas educacionais.
Nestes norteadores curriculares, tem-se o direcionamento para o conhecimento como rede ou como modelo cartesiano. Concebido em rede, o conhecimento nega a teoria cartesiana de que o caminho é um só e que só se compreende o objeto por meio de uma enumeração e decomposição exaustiva de suas partes simples. Neste sentido o método era: decompor, analisar, reduzir o complexo a idéias simples. Desta forma o objeto do conhecimento é reduzido a fragmentos, esvaziando-se seu significado.  O que não cabe em um projeto político voltado para os novos paradigmas educacionais, em que o auto conhecimento e o conhecimento do outro agem ao incorporar estratégias à realidade vigente. Pois, existem diferentes formas de aprender, lembrar, compreender e desempenhar algo. O conhecimento decorre das interações produzidas entre sujeito e objeto. E entre as disciplina ou as áreas do mesmo.
A idéia de rede constitui uma idéia emergente baseada nas tecnologias de informação. Conhecer é como enredar, fazer parte, tecer significados e partilhar resultados, a rede é acêntrica, o conhecimento não parte de um ponto ou pertence a uma só disciplina ele enreda as discussões interdisciplinares, desta forma o conhecimento não parte de uma, ou para uma, única direção. Compete ao projeto político a iteração das disciplinas dentro de uma percepção do conhecimento democrática, porém qualitativa, visando a proposta de desenvolver o potencial emancipatório do sujeito.
O sujeito não é passível de adestramento, o ser humano por sua própria característica criativa, busca burlar todos os mecanismos que lhe pareçam repetitivos e descontextualizados. O homem é imprevisível, é essa imprevisibilidade que o torna articulador de seus conhecimentos que são instintivamente direcionados para uma utilidade imediata ou não. A sociedade está em contínua evolução, estamos na era da informática, da robótica e do virtual, que justifica a característica do conhecimento como sendo transitório que muda por um melhor. Nada pode ser apresentado como cabal para o sujeito, pois a sociedade, que o cerca, está em constante elaboração de raciocínio e conceitos. Cabe ao projeto político, democratizar o conhecimento em uma rede de relações significativas, propiciando aos seus agentes transformadores, sejam eles alunos e/ou professores, comungar (referência a comum, comunhão, tornar conjunto) seus saberes.
Trata-se o conhecimento no projeto político como um norteador dos saberes a serem trabalhados em sala de aula, porém é necessário compreender que os saberes são a união producente de representações contextualizadas. O que gera uma crise de identidade do próprio saber, como exposto em Levy (2000), pois como estabelecer conceitos e técnicas para essa representação do saber e qual a identidade de cada um nesse espaço coletivo de produção, visto que sendo fruto das representações do meio estará condicionado a inteligência coletiva que virtualmente exprime uma comunidade histórica que co-produzem, administram e modificam o conhecimento, sendo assim aprendendo e recriando-o continuamente.
Sendo assim, as produções de escola não têm uma padronização, elas buscam, por meio de seu projeto político, equacionar as relações de poder, economia e conhecimento dentro de um contexto de cidadania, que atribuam uma finalidade inclusiva à escola  e aos seus participantes.
Porém, como citado no início do texto, pensar a escola é a união producente do projeto político e do projeto pedagógico. Pensando o pedagógico, tem-se o saber do professor, determinador de sua identidade, que parte da integração curricular, das disciplinas, da formação reflexiva profissional, suas experiências e sua cultura pessoal e a observação do contexto ao qual a escola se insere. Essa identidade deve estar de acordo com a função da escola, que seria selecionar, separar e incorporar certos saberes sociais, que serão transformados ou adaptados às formas e aos objetivos do ensino em conformidade com os agentes escolares (projeto político) e a clientela. O que será refletido nas representações do professor sobre o currículo.
Antônio Flávio Moreira, traz uma representação do currículo como sendo uma percepção do momento histórico, ao analisá-lo como concepções, conteúdos e conhecimentos que se ensinam e que se aprende; experiências de aprendizagem e como plano de aprendizagem para o qual o objetivo principal são as metas de ensino. O currículo vem a representar o projeto a ser desenvolvido pela prática, um instrumento sistematizador do processo educativo escolar. Seus componentes, ou conteúdos são reflexos de uma escolha cultural e temporal, mas, sobretudo contextualizada por ideologias, compreende-se contextualizar como sendo a forma como o mundo se organiza. O currículo por si só representa uma prática de relação de poder, produção, significação e porque não dizer de identidade social. Propiciando a prática pela práxis, não como jogo semântico, mas como ampliação do conceito de embasamento teórico e critico das ações educativas contextualizadas.
Esta representação também está delimitada nos saberes dos professores, que se caracterizam como profissionais, pois no mundo de hoje, sabemos que os processos interativos de comunicação, colaboração e criatividade são indispensáveis ao novo profissional desta sociedade chamada do “conhecimento”.
Em todos as áreas de trabalho a demanda é com base no trabalho coletivo, discussão em grupo, espírito de cooperação, contribuição, parcerias e representações. Em um processo contínuo em que o aluno constrói os significados por intermédio das experiências vivenciadas o que proporciona novos papéis para os profissionais ligados à educação.
Esses papéis se configuram principalmente em um professor como “distribuidor” do conhecimento, ele deve torna-se um articulador da aprendizagem dos alunos, um criador de experiências e de ambientes que promovam a aprendizagem. A partir do momento que o professor estiver “vinculando” estudantes à aprendizagem ativa e direcionada para a construção de um conhecimento profundo e de habilidades para solucionar problemas, irá exigir do professor uma postura voltada às ações educativas reflexivas e analíticas da sua prática dentro das especificidades do ensino tendo como foco o aprendiz.
As especificidades do ensino centrado no aluno/aprendiz obrigam o educador a tomar uma postura de mediador, deve-se propiciar ao sujeito da aprendizagem ferramentas possíveis para a construção contínua de seu conhecimento, de forma que o mesmo possa usufruir sua criatividade e imprevisibilidade para compreender a sua própria evolução dentro das características de um povo como nação. E que para ser parte integrante dessa busca saiba articular seu conhecimento, atualizando-se continuamente em busca do conhecimento relacionado como capital-saber.
Quando se utiliza a palavra capital para exemplificar a posse do conhecimento, quer-se ilustrar que o mesmo deve ser considerado como um bem financeiro, que caso não seja atualizado perde seu valor e é absorvido com o passar do tempo. Porém, não se nega a visão dada por Nilson José Machado , o conhecimento como dádiva e como um valor de laço de interligação. Voltando a concepção do conhecimento como um “capita-saber”,  faz-se importante discutir as diferenciações entre o valor desse capital e a sua diferenciação em uma evolução social de economia e de preço. Como citado por Machado, do poeta Antônio Machado: “ Todo necio/ Confunde valor y precio.” O valor de troca de conhecimento é ricamente ampliado pelas comunicações, porém o mesmo é dimensionado e dinamizado pelos interesses econômicos, contrário aos interesses educacionais, que articulam o conhecimento em busca de uma abstração que relacione varias argumentações em uma rede de proposições. Porém essa rede deve contemplar o caráter formativo e mercadológico do conhecimento, dentro de uma sociedade capitalista.
Para que isto aconteça, a prática dos professores deverá ser baseada em um “conjunto” de estratégias de ensino como grupos de trabalho, ensinamentos fornecidos pelos próprios estudantes, aprendizagem cooperativa e colaborativa, trabalho com projetos que envolvam situações reais, entre outras atividades.
O aluno, ao invés de ser passivo – só escutar e memorizar os conteúdos, passará a ser parte realmente integrante do processo – ele estará constantemente inventando, explicando elaborando, produzindo “estendendo” seus pensamentos e defendendo suas posições. Assim, a mudança de foco na prática pedagógica passa da ênfase do ensino para aprendizagem.
O professor que optar realmente por um paradigma emergente como base de sua prática diária deve considerar alguns aspectos: ter a visão do todo – de acordo com enfoque sistêmico em sua prática pedagógica; estabelecer com seu grupo – papel de parceiro e colaborador; estar constantemente destacando e incentivando a participação de todos nas atividades propostas; ser um educador que direciona e conduz, os alunos e o processo; perceber os alunos como sujeitos do processo; estar sempre buscando o diálogo; provocar uma “aproximação” e troca entre sujeito do conhecimento e o objeto, a ser conhecido; ter uma postura crítica e exigente, mas sempre – reflexiva e democrático e considerar muito a comunicação interativa entre as disciplinas ou áreas do conhecimento.
O aluno quando realmente envolvido em uma prática pedagógica baseada no paradigma emergente, deve ser levado a considerar: Buscar a visão do todo (não a fragmentação); buscar aprender a aprender – sempre com objetivo de melhoria de qualidade de vida para si mesmo e para os outros; ter acesso ao saber sistematizado; utilizar o raciocínio lógico, criatividade e espírito de investigação; dialogar sempre e construir textos próprios, com autonomia e visão da realidade que o cerca.
Os professores deverão redimensionar a metodologia oferecida dentro da sala de aula e contemplar atividades que ultrapassem as paredes das salas, os laboratórios e dos muros das escolas que configuraram o seu projeto pedagógico.
Cada nova abordagem (ou concepção) pedagógica – para que desencadeie a aprendizagem colaborativa não depende só dos professores e sua prática pedagógica, visão dos alunos e da avaliação, mas dos gestores da educação, que deverão tornar-se sensíveis aos projetos criados pelos docentes.
Cabe então aos gestores e professores derrubarem barreiras que segregam o espaço e a criatividade dos alunos e dos professores restritos à sala de aula, ao quadro de giz e ao livro texto. Necessita-se da construção de um PROJETO POLÍTICO E PEDAGÓGICO, que sintetize os anseios e os direcionamentos que propiciem a construção do conhecimento voltada para a emancipação do ser como cidadão.
Uma alternativa viável seria a construção de um Projeto Político e Pedagógico baseado em um Contrato Pedagógico, no qual gestores, professores e alunos possuam responsabilidades específicas, o autêntico professor deve se sentir responsável pelo compreender do estudante, preocupar-se com a orientação formadora, os gestores devem construir condições para que essa orientação se dê e os alunos devem perceber esse esforço conjunto somando-se a ele na responsabilidade frente a aprendizagem.
O “contrato pedagógico” deve existir baseado na confiança e na qualidade da organização. Em uma gestão democrática, participativa e comprometida com o conhecimento associada a uma prática pedagógica mediadora e promotora do desenvolvimento do conhecimento. O que não ocorre na existência de pseudo-educadores, sejam gestores ou professores, e com estudantes preocupados somente com a sua liberdade.
O que reflete o papel do aluno, aprendiz, autônomo nesse projeto Político e Pedagógico, que terá liberdade conquistada progressivamente. O aluno deve ser orientado à participação em aulas, que realmente interaja e compreenda, vendo respeitado seu próprio ritmo. O aluno deve aprender a se organizar, dirigir e exercer responsabilidades inseridas em uma participação ativa e colaborativa.
A liberdade do aluno não anula o professor, pois o aluno não deve enfrentar sozinho suas dificuldades sobre o pretexto de se emancipar. Para se formar bons estudantes é necessário dar-lhes uma base sólida, encaminhada pelo currículo representado pelo professor dentro do contexto social emergente, para que se tenha um aluno com autonomia deve-se apostar em uma emancipação progressiva.
A progressividade gerenciada permite a intervenção do “guia orientador/mediador”, somente quando a dificuldade bloquear totalmente o aprendiz. O professor deve determinar as aptidões dos alunos, aprimorando neles o desejo em trabalho em equipe, com o intuito de se acabar com o individualismo e a solidão ao aprender.
Esse incentivo ao trabalho em equipe não descarta a posição do professor/mediador, pois a ignorância não deixa de existir apesar da coletividade. O professor será um condutor e deixará a palavra nascer do aluno. Para que isso ocorra é necessário um programa e um planejamento das disciplinas nos estudos. E uma postura do professor como sendo um ator social, com base na filosofia de Paulo Freire, buscando os encaminhamentos de sua atuação pedagógica no contexto do aprendiz.
O objetivo dos programas delimitados em um projeto Político e Pedagógico é guiar os alunos através dos campos do conhecimento, deve ser planejamento racionalmente adaptando ao ritmo e à velocidade de assimilação. Obedecendo aos níveis, ciclos e o tipo de estudantes, evitando assim, um círculo de sobrecargas.
De acordo com os paradigmas emergentes, o desafio passa por criar e permitir uma nova ação docente na qual tanto professores quanto alunos participam de um processo para aprender de forma criativa, dinâmica encorajadora que tenha como base o diálogo e as descobertas. Este processo deve permitir ao professor e os alunos aprender a aprender num processo coletivo para produção do conhecimento.
Os professores ao mesmo tempo em que ensinam – aprendem e os alunos, ao aprenderem podem estar ensinando – eles são parceiros que devem estar buscando colaboração, cooperação e criatividade para tornar a aprendizagem mais significativa e crítica dentro de um contrato pedagógico democrático definindo uma identidade política e pedagógica emergente para a educação escolar, unindo políticas de gestão e articulações práticas pedagógicas.
O “contrato pedagógico” deve existir baseado na confiança e na qualidade da organização. O que não ocorre na existência de pseudo-educadores e com estudantes preocupados somente com a sua liberdade.
Na organização pedagógica devem existir algumas regras e um mínimo de disciplina que vise atenuar os problemas de assiduidade, na maioria gerados pela dispersão e pela necessidade de trabalho dos estudantes. Não podendo assim, dispensar o estudante de nenhuma disciplina que lhe será necessária na continuidade de seus estudos.
Que nos leva a “polarização” pelo controle dos conhecimentos. O estudante interessando somente na aprovação estuda o examinador para saber como burlar seus exames, revê a matéria somente no dia da avaliação e memoriza (decora) o máximo.
Mas, é o nosso ritmo de exames sérios ou provas que tiranizam o estudante que decora. Essas formas de avaliação levam o estudante a esquecer a especificidade do conhecimento como um “capital-saber”.
Professores e alunos possuem responsabilidades específicas, dentro de um “contrato pedagógico”, o autêntico professor deve se sentir responsável pelo compreender do estudante, preocupar-se com a orientação formadora. O estudante deve procurar uma educação formadora e que possibilite sua integração ativa na sociedade em que vive, já a instituição de organizar e otimizar os processos que favoreçam esses interesses conjuntos.

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* Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação - Mestrado em Educação da UTP
**  Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação - Mestrado em Educação da UTP


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O USO DAS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E DA COMUNICAÇÃO NA FORMAÇÃO INICIAL DO PEDAGOGO

Márcia Silva Di Palma *
Mestranda em Educação
Universidade Tuiuti do Paraná
O trabalho a respeito da Utilização das Tecnologias da Informação e da Comunicação na formação inicial do Pedagogo, relata o processo de investigação-ação que está sendo feita numa instituição de ensino privado na região metropolitana de Curitiba. Essa pesquisa tem por objetivos preparar os graduandos de Pedagogia para fazerem uso das TICs no desenvolvimento de suas atividades docentes, porém dando sentido ao uso de tais tecnologias nos processos de mediação pedagógica.  A matriz teórica está calcada na produção de Paulo Freire, Ubiratan D’Ambrósio, Pierre Lévy e Maria Candida Moraes, que entendem o processo educativo como uma prática dialógica, com vistas à libertação e emancipação dos educandos.  A metodologia da investigação-ação compreende quatro momentos sucessivos: planejamento, ação, observação e avaliação.  A avaliação do processo realizado norteia o replanejamento, ação, observação e reavaliação.  No caso da pesquisa em questão, o trabalho está sendo realizado com os alunos do sexto período da graduação de Pedagogia, na disciplina de Pesquisa da Prática Pedagógica.  Objetivando dar sentido a uma proposta de mediação pedagógica com uso de TICs, os alunos fizeram um levantamento em cinco escolas municipais da região metropolitana quanto aos principais problemas de aprendizagem por área de estudos e que estariam comprometendo o desenvolvimento e apreensão no próximo semestre.  Os problemas levantados foram identificados, organizados, categorizados e selecionados para que servissem de objetivos para o projeto de  intervenção com uso das TICs.  Os projetos de intervenção que estão sendo aplicados nas escolas municipais envolvidas, e com base nessas intervenções será realizado um seminário em dezembro para avaliação do projeto de intervenção.


Palavras-chave:  Tecnologias da Informação e da Comunicação, Mediação Pedagógica, Intervenção.


O objetivo do presente artigo é relatar a respeito de uma investigação-ação levada a efeito em uma Instituição Privada de Ensino Superior, com vinte e cinco alunos do sexto período da graduação em Pedagogia.  O tema da investigação é a utilização das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICS)  pedagogicamente.  A matriz teórica baseia-se nos estudos de Freire (1970, 1983), Moraes (1997), D’Ambrosio (1999), Behrens (2000), Cortelazzo (1991 2000), Sancho (1994), Litwin (1997) e Leite (2003), dentre outros.
A pesquisa busca uma reflexão a respeito da instituição escolar, que apesar de estar se atualizando, paradoxalmente se encontra cada vez mais defasada em relação aos avanços ocorridos na sociedade.  Embora SILVA (1969, p. 18) explique a sincronia absoluta entre sociedade e escola não seja possível - porque o processo de atualização cultural da sociedade se dá com maior agilidade do que as instituições escolares conseguem selecionar, organizar, adequar e implementar ao ambiente escolar – a partir das duas últimas décadas do século XX esse processo de afastamento entre sociedade e escola vem se agravando (MORAES, 1997; D’AMBRÓSIO, 1999; CORTELAZZO, 1991, 2000). 
Com o desenvolvimento das TICs, o ritmo de atualização vem se acelerando exponencialmente e as instituições escolares, apesar de estarem se atualizando, não estão conseguindo acompanhar a velocidade das inovações.  Se anteriormente a defasagem passava despercebida pela comunidade em geral, atualmente pela própria ação dos meios de comunicação, ela é desvelada repetida e sistematicamente fazendo com que mesmo os leigos ou menos instruídos critiquem ácida e ferozmente o trabalho da escola. 
Considerando que o fazer escolar está calcado na prática docente, percebe-se que o modelo de atuação profissional está em crise, desvelando-se dessa forma, a necessidade de se atualizar a formação dos professores, principalmente daqueles que já atuam na Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental.  Como a formação acadêmica desses profissionais se dá no curso de Pedagogia, os sujeitos são os alunos da graduação, que neste artigo denomino “parceiros” na mesma concepção que Behrens porque “(...) Como parceiros, professores e alunos desencadeiam um processo de aprendizagem cooperativa para buscar a produção do conhecimento (...)” (BEHRENS, 2000, p. 75).
A utilização de tecnologia no ambiente escolar constitui uma área de estudos surgida nos Estados Unidos na década de 40, denominada Tecnologia Educacional, que tem como foco desde a sua gênese, a busca de recursos que otimizem os processos de aprendizagem na escola (PONS, 1994), porque.
A falta de uma estratégia para o uso educativo de novos meios e tecnologias provoca a perda de seu potencial para os fins que se procuram pois o processo através do qual os educandos e os professores devem apropriar-se adequadamente dos novos meios e tecnologias não é um processo automático nem autodidata.  O trânsito de um determinado uso dos meios e tecnologias da diversão e entretenimento para um uso destinado a objetivos de aprendizado e análise também não é espontâneo.  Requer capacitação específica e especializada (GOMÉZ, 2002, p. 66). 
A pesquisa tem como corpus o processo de organização, implantação e avaliação do projeto de intervenção fazendo uso das TICs como mediadoras nos processos educativos.  Embora existam obstáculos, não existe a pretensão de eliminar os óbices identificados no campo, mas de discuti-los com os parceiros no projeto de modo a emancipá-los no trato dessas problemáticas encontrando soluções inéditas oriundas de suas próprias práticas, o que poderá servir de base à construção de uma nova teoria. (FREIRE, 1970; MION E BASTOS, 2001).
Apesar de se originar em uma Instituição de Ensino Privada, esta investigação ação se expande a seis Escolas públicas de Ensino Fundamental na região metropolitana de Curitiba, que na dissertação foram identificadas por cores (Amarela, Azul, Verde, Vermelha, Violeta e Turquesa).
O projeto foi desenvolvido na disciplina Pesquisa da Prática Pedagógica VI, no sexto período da graduação, em cuja ementa (2000, p.2) encontra-se expressa a preocupação em investigar a problemática e as práticas pedagógicas na primeira etapa do Ensino Fundamental. Com base na proposta da disciplina, elaboramos, os parceiros e eu, quatro projetos de intervenção fazendo uso das Tecnologias da Informação e da Comunicação como mediadoras da prática pedagógica . 
Como instrumentos para coleta de dados, fizemos uso do diálogo nos encontros com os grupos em separado e nos seminários; da observação, entrevistas semi-estruturadas, análise documental dos relatórios dos parceiros e vídeo-gravações de discussões em aula e dos projetos de intervenção (GAY, 1990, BORBA, 2001).
Os parceiros estão ligados à área da Educação, em seus diversos níveis e funções.  Existe uma concentração maior de idades entre vinte e um e trinta anos, o que caracteriza uma turma madura.  A opção pelo curso de Pedagogia está diretamente ligada às demandas da profissão, porém pela falta de outras licenciaturas oferecidas no município, existe uma migração dos professores do município para essa área de conhecimentos.

A ORGANIZAÇÃO DO PROCESSO

No início do segundo semestre de 2003, o grupo de 25 parceiros foi dividida em quatro grupos que receberam como identificadores o nome de quatro áreas do conhecimento no Ensino Fundamental, a saber: Língua Portuguesa, Matemática, Estudos Sociais e Ciências.  Cada grupo foi instruído a obter dados relativos a realidade de cada escola envolvida no projeto quanto ao número de alunos, de professores, qualificação desses docentes, recursos tecnológicos disponíveis nas escolas e seu uso, índices de fracasso e evasão escolar por série, bem como das principais dificuldades dos alunos por área de conhecimentos.  Como documento norteador fizemos uso dos conteúdos contidos nos Parâmetros Curriculares Nacionais para os dois primeiros ciclos do Ensino Fundamental.  A opção por esse documento se deveu ao fato de ter uma aplicação nacional; segundo de estar disponível em todas as unidades escolares; e por fim, de ter uma organização de conteúdos bem estruturada.
De posse dos dados obtidos os parceiros categorizaram as dificuldades por área de conhecimento, o que permitiu que identificassem âmbitos de situações problemáticas nas séries iniciais do Ensino Fundamental.  Com base nas problemáticas identificadas, cada equipe selecionou uma situação representativa, que serviu de mobilização para o projeto de intervenção, fazendo uso das TICs para lidar de maneira nova e diferente com os temas encontrados.
Para que as discussões não ficassem em nível de senso comum, selecionei e distribui textos compatíveis aos temas levantados durante os encontros para que fossem estudados, discutidos propiciando a elaboração de conceitos, produção de conhecimentos práticos e a construção de um referencial teórico a respeito do referido assunto.  Segundo Gramsci (1995), é importante para a formação de um novo grupo de intelectuais que refletindo a respeito de sua prática, possam organizar, construir e elevar o conhecimento da técnica, convertendo-a em teoria; deixando de ser especialistas para converter-se em dirigentes (GRAMSCI, 1995, p. 8-10).

CONSTATAÇÕES

    Com base nos dados obtidos pelos parceiros durante o segundo semestre de 2003, foi possível organizar as constatações em três níveis:  quanto aos parceiros, quanto às escolas envolvidas no projeto e quanto ao uso das TICS. 
No que se refere aos parceiros, foi possível perceber que a busca pela graduação em Pedagogia está diretamente ligada a uma consciência de que precisam se capacitar para desenvolver melhor seu trabalho.  Todavia, embora queiram essa capacitação apresentam uma considerável resistência ao processo dinâmico e processual da construção acadêmica alegando experiência.  A experiência dos parceiros foi construída pela imitação da prática de professoras mais antigas e que servem de modelo docente ás professoras mais jovens como foi claramente descortinado em duas escolas.
A atitude refratária ao uso de tecnologias como instrumentos de mediação pedagógica dos professores mais experientes se constituiu num dos obstáculos mais fortes ao processo de intervenção. 
Ainda em relação aos parceiros foi possível identificar uma grande preocupação com o sistema de avaliação que norteou o processo.  Essa preocupação se deve principalmente a formação básica lacunar e a falta de tempo para estudar.  Porém foi possível identificar uma amenização de várias lacunas em termos de conteúdo que os parceiros e eu, como docente em processo de capacitação permanente, apresentávamos.
Quanto às escolas envolvidas é possível afirmar que os membros das equipes das escolas pesquisadas ainda não têm o hábito de investigar mais profundamente os condicionantes ou determinantes que levam os alunos a se afastarem da escola, ou a prática pedagógica das professoras, principalmente das mais experientes.  A experiência é muito valorizada por membros da equipe da escola e da comunidade, o que influencia diretamente a prática pedagógica das professoras mais jovens.
Essa valorização pode ser uma das razões para o fato de ainda existir uma concentração significativa na metodologia expositiva como forma de mediação pedagógica e na repetição de tarefas determinadas pelo professor ou seus correspondentes tecnológicos, como Vasconcellos (1993) já havia apontado
Observando a estrutura de funcionamento da metodologia expositiva verificamos que o grande trabalho do professor se concentra na exposição, o mais clara e precisa possível, a respeito do objeto de estudos, onde procura trazer para os alunos os elementos mais importantes para a compreensão do mesmo, recuperando o conhecimento acumulado pela humanidade.  (...) Nem sempre, no entanto, a aula expositiva apresenta-se de forma tão clara, explícita.  Precisamos estar atentos para as pseudo-superações que têm surgido, como por exemplo: - Falas (substituição da fala do professor pela fala do aluno, do vídeo ou do programa de computador); - Aparências (cadeiras em circulo e manutenção do monopólio da palavra com o professor); e, Novidades (utiliza-se uma série de técnicas para “variar a aula”, aula muito “gostosa”, “descontraída”, “criativa”, mas onde não se aprende nada”) (VASCONCELLOS, 1993, p. 18-20).
Foi também possível perceber que as “aulas especiais” – música, artes e educação física – não são entendidas como áreas de conhecimento e sim como espaços lúdicos onde o domínio de conteúdo pode ser substituído pela beleza estética ou atividades recreativas sem maiores compromissos.  O aspecto visual é mais valorizado que os resultados práticos em termos de aprendizagem dos murais e posters afixados nas paredes das escolas.
No que tange ao uso prático dos equipamentos tecnológicos disponíveis na escola, foi possível identificar que ainda não existe uma infra-estrutura que garanta a plena utilização dos recursos garantindo a segurança das pessoas e dos equipamentos.   Na maioria das escolas pesquisadas os equipamentos são transportados pelos próprios membros da equipe da escola, e para facilitar o transporte sã
Quanto ao uso das TICs pelos parceiros, identifiquei três atitudes distintas.  Um pequeno grupo composto por três indivíduos, mostrou-se aberto e comprometido com o processo de buscar formas de “ensinar diferente”.  Outro grupo composto por dezesseis alunos, fizeram uso das tecnologias parcialmente e de maneira cuidadosa, de certa maneira mostrando-se céticos em relação às reais contribuições das TICs na escola e entendem que elas podem ser usadas mas que não trazem muitas mudanças ao cotidiano escolar.  Seis parceiros repudiaram o processo e preferiram manter suas posturas docentes já constituídas, alegando experiência já constituída para lidar com as questões escolares do Ensino Fundamental.
Atitudes como aquelas dos parceiros já havia sido identificada e fartamente relatada no relatório cumulativo de 10 anos de pesquisa da ACOT (2000).  Naquele documento os pesquisadores da empresa americana Apple Computers descrevem o processo de incorporação dos recursos tecnológicos à prática pedagógica de vários professores e concluem que são necessários pelo menos três anos de trabalho sistemático e permanente para que haja mudança significativa na prática pedagógica desses profissionais.
Embora o relatório a respeito da investigação-ação tenha se concluído as análises realizadas pelos aos profissionais das escolas envolvidas nos projetos ainda estão sendo organizadas e categorizadas para que sirvam de parâmetro às ações que serão realizadas junto aos alunos do sexto período de 2004. 
A conclusão do trabalho representa, na verdade, um recomeço, porque ao retomar o trabalho já é possível enxergá-lo de uma forma diferente e ao pensar sobre a minha própria prática também percebo que mudei. 
Penso que os caminhos para a formação do Pedagogo como articulador de práticas pedagógicas diferenciadas com uso de recursos tecnológicos começaram a ser abertos mas ainda é preciso ir muito além. 
 
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Mestre em Educação da UTP, Linha de Pesquisa “Práticas Pedagógicas, elementos articuladores" Especialização em Psicopedagogia pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa e Extensão. Pedagoga pelo Centro Universitário Positivo e docente do Curso de Pedagogia da Faculdade de Campina Grande do Sul e do IMEC – Instituto Martinus de Educação e Cultura.

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PEDAGOGIA E PESQUISA: EXPERIÊNCIAS E INQUIETAÇÕES


Maria Antônia de Souza   *
Universidade Tuiuti do Paraná

Neste texto é apresentado o resultado do trabalho com pesquisa e ensino, em cursos de graduação em Pedagogia, em duas universidades localizadas no estado do Paraná. O objetivo é mostrar como que o desenvolvimento de projetos de pesquisa pode auxiliar no processo de formação do professor. Parte-se da concepção de educação como prática social e como momento e espaço de transmissão, problematização e construção de conhecimentos. A pesquisa é entendida como atitude de busca de conhecimentos, não resumindo-se na busca mecânica, mas na problematização de um assunto, através da realização do projeto, coleta e análise de dados e posterior elaboração de um artigo ou relatório. Neste trabalho foram destacadas as experiências desenvolvidas na disciplina Métodos e Técnicas de Pesquisa em Educação e no Projeto de Ensino "universidade: que espaço é este?". Os procedimentos metodológicos resumiram-se na análise documental - os textos produzidos pelos alunos; e a participação efetiva tanto na disciplina quanto no projeto de ensino. Constata-se a necessidade do desenvolvimento de uma cultura da pesquisa, no curso de Pedagogia, pois as disciplinas isoladas não são suficientes para a formação de professores que inquietem-se com a prática docente. A indissociabilidade ensino e pesquisa começa com a mudança de hábito do professor e a sua organização curricular, no curso e na instituição. O incentivo institucional é necessário para que a pesquisa seja rotina no curso de Pedagogia.
 
Palavras-chave: Pedagogia, Pesquisa, Experiência.


“Não existem perguntas imbecis”.
(Sagan, 1996)

1- Apresentando o tema: fios teórico-práticos no debate sobre Pedagogia e Pesquisa.

O objetivo central deste trabalho é apresentar e comentar as experiências de pesquisa desenvolvidas junto a cursos de Pedagogia, numa universidade pública gratuita e numa universidade privada. As experiências têm sido marcadas pelo desenvolvimento de projetos de ensino e atividades organizadas na sala de aula, no contexto das disciplinas Métodos e Técnicas de Pesquisa em Educação e Metodologia Científica (Produção Científica).
Parte-se do entendimento que educação é uma prática social voltada para a transformação de aspectos de uma dada realidade, envolvendo a prática educativa como apropriação, problematização e construção de conhecimentos. Pedagogia é entendida como uma área do conhecimento cujas especificidades ocorrem na esfera da educação formal, embora, aspectos da educação não-formal tenham relevância e destaque nas últimas décadas. Entende-se a Pedagogia como espaço para a formação de professores, pesquisadores e “gestores da educação”. A formação não resume-se na transmissão de conteúdos, mas especialmente na formulação e problematização dos conhecimentos elaborados historicamente. Para que tais processos (apropriação, problematização e elaboração) ocorram, faz-se necessária a presença da pesquisa como atitude inerente ao ato educativo.
A pesquisa é entendida como atitude de “busca de conhecimentos”, não resumindo-se na “busca mecânica”, mas na elaboração via processo de pesquisa que, por sua vez, envolve a elaboração de projeto de pesquisa, coleta e análise de dados, elaboração de um relatório (texto, artigo, capítulo, livro) final. Também, como ato inerente à pesquisa tem-se a apresentação dos resultados obtidos, o que pode ser feito nos espaços de “trocas” de experiência de produção de conhecimento científico (congressos, seminários, colóquios etc).

A pesquisa tem início com o processo de problematização do tema a ser estudado, que envolve estudos exploratórios, levantamento bibliográfico, seleção e análise dos textos que versam sobre o tema escolhido. A partir daí, propõe-se a questão que se pretende responder.
Nos últimos anos, a pesquisa educacional vem sendo desenvolvida no interior dos espaços educativos formais e junto da comunidade onde a escola está inserida. As técnicas de pesquisa que fazem parte da abordagem qualitativa têm sido enfatizadas, dentre elas as entrevistas, observações, coleta de depoimentos orais e histórias de vida. Ainda é incipiente o número de pesquisas relacionadas aos espaços educativos não-formais e aos sujeitos que o compõem, tanto os educadores, quanto os participantes em geral.
Parte-se do pressuposto que o futuro educador necessita perceber as diferentes estratégias utilizadas no processo educativo, bem como identificar relações estabelecidas entre as pessoas de um determinado bairro (que participam de uma organização social) e a escola. Investigar quais saberes são produzidos em tais espaços e como eles podem contribuir para uma prática educativa menos distante dos sujeitos que dela participam, é uma das possibilidades oferecidas pelo ato da pesquisa.
Na experiência focalizada neste trabalho, destaca-se a presença da disciplina Métodos e Técnicas de Pesquisa ou Metodologia da Pesquisa Científica e Produção Científica. São disciplinas que objetivam focalizar o processo de pesquisa e incentivar o desenvolvimento do mesmo. Embora seja sabido que não é uma disciplina que desenvolverá a cultura da pesquisa, a experiência demonstra o conjunto de possibilidades presentes no processo pedagógico. 
É comum entre os acadêmicos de Pedagogia a atitude de descrição dos fatos observados no cotidiano escolar. A observação constitui-se num dos caminhos para a interpretação dos fenômenos que ocorrem no cotidiano e arredores da escola. No entanto, muitas vezes, o olhar do acadêmico está impregnado de preconceitos a respeito das relações que se passam no espaço escolar. Porém, não é somente o olhar do aluno que está impregnado de preconceitos, pois o próprio professor, muitas vezes não se aproxima do aluno para perceber as suas características e trajetórias, bem como aprofunda o uso de rótulos que identificam os alunos como “problemas” ou como “espertos e agéis”. Surgem comentários a respeito da indisciplina, sem de fato questionar o que seria a (in)disciplina; comentários sobre atuação autoritária de diretores e professores, sem no entanto, questionar os fundamentos da ação pedagógica, nem mesmo o processo de formação pelo qual tais profissionais passaram e o próprio contexto no qual estão atuando (quais relações de enfrentamento são postas no dia-a-dia). Tais situações demonstram o distanciamento entre professor e aluno na ação pedagógica e, por outro lado, demonstram a proximidade entre os discursos de um e de outro.
Através das atividades desenvolvidas junto à disciplina Métodos e Técnicas de Pesquisa em Educação, são privilegiadas as reflexões sobre temas ligados à ampla área educacional. Nos últimos anos têm predominado projetos de pesquisa que objetivam analisar a educação de jovens e adultos; Clube de Mães; Associação de Pais e Mestres; educação em assentamentos rurais; Hiperatividade; Transtorno de Déficit de Aprendizagem (TDA) dentre outros temas.
Anteriormente ao desenvolvimento do projeto de pesquisa, desenvolve-se um trabalho sobre os procedimentos inerentes ao processo de pesquisa, dentre eles: o ato de estudar; características do levantamento bibliográfico; a relevância do resumo e da resenha como fonte no processo de levantamento bibliográfico. Estas são dimensões técnicas da pesquisa, ao lado da normatização para a apresentação do texto acadêmico-científico. As dimensões teórico-metodológicas constituem o momento fundante do processo de pesquisa, pois implica no estudo e reflexão sobre os caminhos teórico-metodológicos que conduzem à construção de conhecimentos. A postura do pesquisador, frente aos sujeitos da pesquisa e à construção do conhecimento, é elemento analisado com os acadêmicos de Pedagogia.
Na abordagem qualitativa de pesquisa há preocupação com a “chegada” do pesquisador no espaço pesquisado, pois na maioria das vezes é um “estranho” que chega. Portanto, aproximação, respeito e conquista são elementos essenciais para iniciar a interação com o grupo da pesquisa.
No contexto escolar percebe-se, neste final de século, o convívio com “culturas híbridas”, ou seja, ao mesmo tempo que se presencia o conformismo e aceitação de decisões educacionais, convive-se com práticas que buscam inovar as atitudes pedagógicas e a gestão escolar, assim como a relação com a comunidade, desenvolvendo projetos alternativos de “escola democrática”. Por que salientar o aspecto cultural? Porque neste texto parte-se da hipótese que muitas das atitudes existentes na esfera escolar estão em processo de transformação, ainda que lenta. Dentre tais atitudes nota-se a idéia de disciplina (visto como um problema nas escolas); a idéia de que o aluno ou o professor deve ser culpado pelo fracasso escolar. Os professores se culpam, de um lado; alunos se culpam de outro, esquecendo-se de que a problemática extrapola as dimensões pessoais, pois são questões nacionais. Análises envolvendo elementos da Totalidade das relações sociais e educacionais no país, certamente contribuem para a compreensão da Parte que está sendo estudada e suas inter-relações com o Todo.
    Buscar elementos integradores na prática pedagógica e, portanto, no curso de formação de educadores é de fundamental importância, entendendo que tais elos podem ser construídos na prática, no processo de pesquisa, no coletivo de professores e alunos. Espaços tais como os denominados Projeto de Ensino; os Projetos de Extensão  e a prática da Pesquisa possibilitam uma revisão do nosso paradigma a respeito da “participação”. Torna-se um espaço no qual os acadêmicos, em menor número do que nas salas de aulas, sentem-se à vontade para desenvolver questionamentos e posicionamentos pessoais. Constitui-se um espaço público de debate e da existência do conflito construtivo.
Os professores pesquisadores têm se dedicado a análises que visam refletir a própria prática pedagógica. Em todos os campos de pesquisa, os atores da investigação não podem excluir a idéia de totalidade que permeia cada uma das relações focalizadas. A prática do professor pesquisador está inserida num TODO de relações nacionais e internacionais que perpassam o campo educacional. A particularidade de cada ação, seja do professor ou do aluno, ou ainda da comunidade, é composta de elementos culturais (que traduzem uma ideologia) construídos historicamente no país. Um dos desafios atuais está no campo do rompimento com laços culturais que colocam o aluno no lugar do “aprendiz” e o professor no lugar de “transmissor de conteúdos”. O professor necessita produzir conhecimentos, antes de transmiti-los; é por isto que se enfatiza a necessidade da pesquisa e dos espaços que a propiciam, nos cursos de graduação e no decorrer da formação continuada do profissional da educação.
Na seqüência, destaca-se uma experiência desenvolvida com os alunos do curso de Pedagogia, na modalidade Projeto de Ensino.

2- Projeto de Ensino “Universidade: que espaço é este?” : Um exemplo da experiência Ensino e Pesquisa.

O referido projeto teve como objetivos centrais analisar as características da pesquisa e da extensão na UEPG. No que se refere às características da pesquisa, o grupo realizou levantamento de dados acerca do número de pesquisas desenvolvidas, no período de 1990 a 2000, na instituição; o número de pesquisas existentes em cada um dos Setores da UEPG, bem como em cada um dos departamentos, por fim, analisou a titulação dos professores da UEPG. No que tange à extensão, foram identificados os projetos executados na década de 1990, bem como os temas, os Setores e os Departamentos nos quais são desenvolvidos.
O levantamento de dados foi realizado junto às Pró-Reitorias de Pesquisa e Pós-Graduação e de Extensão e Assuntos Culturais. A partir dos relatórios fornecidos por estas  instâncias, foram organizados gráficos e debates acerca do tema pesquisa e extensão na UEPG. Paralelo a esta atividade realizou-se estudos de textos que fundamentaram as análises dos dados obtidos. Dentre os autores estudados destacam-se Inácio Filho (1995), especificamente a discussão empreendida sobre pesquisa na universidade; Artigos presentes na Revista Participação, intitulada “Repensando a extensão”, publicada pelo Decanato de Extensão da Universidade de Brasília (2001), artigos de Ianni (2002) no qual discute as características atuais do Brasil, no que se refere à perda de soberania e, portanto, de poder do Estado. O texto de Costa (2000), que contribuiu com as reflexões acerca da Reforma do Estado e da repercussão desta no campo da educação. Também, Góes (1991), em sua dissertação de mestrado, analisou a representação social da UEPG nos aspectos do ensino, extensão e pesquisa.
Neste projeto de ensino foi focalizada a pesquisa sobre o tema Universidade, sendo estudada a origem do termo Universidade e características da Universidade Brasileira. Assim, é possível apontar alguns aspectos retomados pelo grupo: No Brasil, em diferentes épocas, a universidade sofreu influência tanto do modelo francês quanto do modelo norte-americano de Universidade.  Conforme afirma Inácio Filho (1995) “a universidade brasileira é muito jovem, tendo tornado-se realidade apenas no início do século XX (...) O Brasil, em 1940, possuía apenas 21.235 estudantes universitários e formaram-se seis universidades por aglutinação de cursos, sendo que dez anos depois tínhamos 600 cursos, 15 universidades e apenas 37.548 estudantes universitários” (p.33).
    Neste início de século XXI, conforme dados do MEC , o Brasil possui 10.585 cursos de graduação presenciais, oferecidos por 1.180 instituições de Ensino Superior, com um total de 2.694.245 alunos. Dessas instituições de ensino, 176 são públicas (61 federais, 61 estaduais e 54 municipais) e 1004 são privadas. Tais números são decorrentes da ampliação do ensino superior nas décadas de 1960 e 1970 e, por último, na década de 1990. Como afirma DURHAM (2000, p. 245) “a taxa bruta de matrículas no ensino superior, calculada em relação à faixa etária de 20 a 24 anos, que é de 12 %, não pode deixar de ser considerada extremamente baixa, não só em comparação com os países desenvolvidos, mas inclusive em relação a países de renda per capita bem menor do que a brasileira”.
    Com a ampliação dos níveis de Ensino Fundamental e Médio, a demanda pelo Ensino Superior tem aumentado. Diante da “crise de financiamento” que assola o setor estadual e federal, o setor privado encontra espaço para a sua expansão na década de 1990, principalmente nos últimos anos. Na região dos Campos Gerais, no estado do Paraná, por exemplo, é possível observar a expansão do ensino superior, centrado na criação de faculdades particulares, centros de ensino superior e universidades.
    No final da década de 1990 muitos dilemas permearam o debate acerca da universidade pública, dentre eles a idéia de privatização. No entanto, cabe salientar que o processo de privatização das universidades públicas está em curso, mas num formato diferenciado daquele presente no imaginário da sociedade. A face da privatização é visualizada na oferta de cursos “pagos” no interior das instituições “públicas e gratuitas” de ensino. Durham (2000) destaca que “não houve uma privatização do ensino superior federal durante o Governo Fernando Henrique Cardoso. O aumento da participação do setor privado nos últimos 5 anos é muito pequeno, passando de 60,1% em 1995 a 60,7% em 1998 ...” (p.246).
    É possível relacionar esta situação com a Reforma do Estado, que segundo Costa (2000) “... foi divulgada pelo governo FHC como condição para o ingresso do país na ‘modernidade globalizada’ (...) A reforma do Estado não foi colocada como um ponto necessário para uma reforma social, ou um ajuste no padrão perverso de desigualdades sociais do país, mas como um elemento de ampliação da lógica da economia para o conjunto da sociedade” (p.65). Assim, no contexto da reforma do Estado, as universidades não sofreram ampliação em termos de construção de novas unidades, o número de vagas foi ampliado em função da ampliação do número de alunos por sala de aula; as verbas para pesquisa, além de serem hierarquizadas (sendo as ciências exatas e biológicas priorizadas) foram reduzidas, tanto no âmbito da pós-graduação, quanto dos programas de iniciação científica.
    No campo educacional inúmeras transformações foram processadas nos últimos anos da década de 1990, dentre elas a introdução da mídia interativa no processo da formação de educadores. Também, o enfoque nas competências e habilidades dos alunos tem sido destacado como uma das centralidades da educação na atualidade. Fala-se muito na construção da cidadania, no entanto, a autonomia, que seria um dos pilares da cidadania, fica em segundo plano quando há a retomada da ênfase nos aspectos tecnicistas da educação.
    Ianni (2002) destaca que “independentemente das intenções dos governantes ou mesmo das intenções do pessoal técnico da área de educação, não há dúvida de que a reforma do sistema de ensino que se realiza no mundo, não só no Brasil, é induzida em grande parte pelo Banco Mundial (...) o Estado, o governo está muito comprometido com as diretrizes que essas organizações multilaterais e as corporações transnacionais definem e impõem” (p. 33).
    Diante disto, como pensar a universidade, a ciência e a sociedade? Como tem se manifestado a educação nos dias atuais? Qual tem sido o papel do educador? Estas foram reflexões empreendidas junto ao projeto de ensino “Universidade: que espaço é este?”. Durante os dois anos de atividade do projeto, foram realizadas palestras com profissionais que investigam a conjuntura nacional, a Reforma do Estado, a Universidade, portanto, destacou-se um conteúdo relacionado à totalidade das relações que perpassam o país e que influenciam direta ou indiretamente no processo de formação do educador. A atitude de pesquisa foi constante no projeto de ensino, uma vez que se trabalhou com levantamento de dados e pesquisa bibliográfica.
    O projeto de Ensino constituiu-se num espaço paralelo às aulas da graduação, possibilitando o estudo e elaboração de textos, dando continuidade à atitude investigativa defendida e motivada na disciplina Métodos e Técnicas de Pesquisa em Educação.

 3. Ensino: Experiência de Pesquisa no curso de Pedagogia via disciplina Metodologia da Pesquisa.

No curso de Pedagogia, a disciplina Metodologia da Pesquisa tem sido desenvolvida num único momento, primeiro ano do curso, sendo que ao final do curso os alunos fazem o Trabalho de Conclusão de Curso, centrado nas observações e análises que fazem durante os estágios, na universidade pública. Na universidade particular, a disciplina é desenvolvida em quatro momentos, finalizando com o Trabalho de Conclusão de Curso.
Na primeira situação, os alunos desenvolvem um breve processo de pesquisa, durante o primeiro ano da graduação. Na seqüência, os alunos desenvolvem projetos de estágio, com as observações e reflexões inerentes às atividades “formativas” da Educação Superior. No último ano há produção dos Trabalhos de Conclusão de Curso que são centrados na atividade de Estágio, cabendo a cada professor “supervisor” orientar o processo analítico dos temas estudados. Uma inquietação recorrente neste tipo de atividade está relacionada à atitude da pesquisa científica e à formação de grupos de estudos e pesquisa, ou seja, até o presente momento não tem sido efetivado grupos de pesquisa, efetivamente construindo conhecimentos que possam ser utilizados nas atividades pedagógicas dos futuros professores. Há uma reflexão sobre o que é visto e o que poderia ser feito nas funções desenvolvidas pelo Pedagogo, embora não haja elaboração de projetos para aprofundamento teórico e formação continuada destes professores.
Na segunda situação, há uma disciplina relacionada à pesquisa durante os quatro anos do cursos, numa expectativa de que o projeto do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) seja desenvolvido nestes espaços, para que ao iniciar o último ano, o acadêmico possa estar “mais preparado” para a pesquisa da qual originará o TCC. Nesta experiência, uma inquietação recorrente relaciona-se à cultura da pesquisa, pois entende-se que não é uma disciplina isoladamente que desenvolverá a atitude de pesquisa, mas a ação conjunta de todos os professores. Para tal, um requisito central é que o professor seja pesquisador (participando de grupos de trabalho ou individualmente). Com isto, afirma-se que a postura e atitude científica do corpo docente é que dará consistência a um projeto pedagógico no qual a pesquisa possa ser o norte do curso de Pedagogia.
Os acadêmicos de ambas universidades destacam a dificuldade com o trabalho de pesquisa, uma vez que sempre reproduziram conteúdos de livros (como atividade de pesquisa), ou então, reproduziam relatos e observações de determinadas realidades como pesquisa, sem a faceta analítica, requisito central da produção científica. Diante dos depoimentos dos acadêmicos, o desafio está lançado: como construir as bases da pesquisa científica? Como valorizar o aprendizado e atitudes anteriores dos acadêmicos de forma que rupturas possam ser provocadas durante o processo educativos? Tem-se a presença do humano em toda a ação pedagógica; este possui singularidades que exigem um planejamento de ensino que possibilite a indagação como atitude contínua do ato educativo. Para isto, o professor será o primeiro questionador de tudo o que vê e lê, como um sofista do século XXI.

4- Considerações finais: inquietações marcantes nas experiências apresentadas.

A principal inquietação relaciona-se com processos de transformação individual, coletivo e social, ou seja, tais experiências têm possibilitado uma ação diferenciada nos cursos de Pedagogia? A resposta a tal questão é negativa, quando pensa-se na cultura da pesquisa em construção nos referidos cursos, chegando a conclusão de que ainda há um processo de “engatinhamento” e que os sujeitos centrais desta mudança não serão apenas os professores, os discentes, os coordenadores de curso, mas as políticas públicas de educação. Portanto, a ação pedagógica, quando analisada, carrega o componente política pública, seja pelas Diretrizes Curriculares Nacionais, seja pela infra-estrutura possibilitada aos cursos de graduação. Especialmente nas universidades públicas gratuitas, tem-se assistido ao aumento do número de alunos nas salas de aulas, enquanto os professores carecem de incentivos para a produção científica e, consequentemente, para a própria ação docente. Há, portanto, uma rede que forma o tecido educacional no país, para o qual questiona-se o lugar ou o “nó” dado à pesquisa.
As experiências pontuais analisadas possuem um impacto individual, na ação de alguns alunos, no entanto não modifica a cultura do curso, resumida no conjunto de aulas, ainda no formato “gavetas”.
A atividade do Ensino e da Pesquisa tem possibilitado uma retomada dos conteúdos vivenciados em sala de aula, tanto no momento “formativo”, quanto no momento da “prática educativa” dos envolvidos. Tais experiências possibilitaram um repensar do tempo vivido na escola e uma reflexão sobre as características da concepção de educação que querem que fundamente a sua prática educativa. Possibilitaram a ampliação dos conhecimentos acerca dos conceitos pesquisa, ensino, universidade, inclusão, educação, participação e democracia, para citar alguns. Destaca-se o aspecto produtivo de tais atividades, especialmente na faceta formativa do futuro professor.
A indissociabilidade entre ensino e pesquisa é fundamental na formação do professor,  pois é o elo que possibilita a construção de novos conhecimentos, bem como o reconhecimento daqueles historicamente sistematizados. Foi possível observar, ao longo dos projetos, as inquietações e construção de conceitos elaborados pelos acadêmicos, que num primeiro momento teciam a seguinte indagação: “como analisar o que vemos?”.
Tanto nos Projetos de Ensino quanto nas disciplinas, a grande inquietação dos acadêmicos é “como escrever o que penso, sem cair em simplismos?”. A resposta a tal questão é “estudar”; desenvolver a postura de leitor sujeito, possibilitando práticas de letramento emancipatórias. Assim, acadêmicos e professores estarão fazendo a própria história, não sobre as circunstâncias dadas, mas sobre aquelas criadas pelo grupo, ou seja, pelos sujeitos históricos dos cursos de Pedagogia.

Bibliografia Consultada.
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CANDAU, Vera Maria F. Interculturalidade e educação escolar. In: Anais 2 do IX Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino. Volume 1/1, Águas de Lindóia, SP, 1998.
CHAUÍ, Marilena. Conformismo e resistência: aspectos da cultura popular no Brasil.. SP: Brasiliense, 1986.
COSTA, Lúcia Cortes. O governo FHC e a reforma do Estado brasileiro. In: Pesquisa e Debate, vol 11, nº 1(17). Revista do Programa de Estudos e Pós-graduados em Economia Política. PUC/SP, 2000.
DURHAM, Eunice Ribeiro. A educação no governo Fernando Henrique Cardoso. Tempo Social. Revista de Sociologia da USP. São Paulo, 11(2), outubro de 1999. Editado em 2000.
GÓES, G. T. A representação social da Universidade Estadual de Ponta Grossa. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 1991.
GÓMEZ, A. P. O pensamento prático do professor e a formação do professor como profissional reflexivo. In: NÓVOA, A. (coord.). Os professores e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992.
IANNI, Octavio. Esse governo fez do país uma província do capital mundial. Entrevista concedida à Revista Caros Amigos. São Paulo, janeiro de 2002. (p. 30-33)
INÁCIO FILHO, Geraldo. A monografia na universidade. Campinas, SP: Papirus, 1995.
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___. A crítica da razão indolente. Contra o desperdício da experiência. SP: Cortez, 2000.
TORRES, Carlos Alberto. A política da educação não-formal na América Latina. RJ: Paz e Terra, 1992.
VÁZQUEZ, Adolfo S. Filosofia da práxis. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1968.
VIEIRA PINTO, Álvaro. Ciência e existência: problemas filosóficos da
Pesquisa científica. Rio de Janeiro: paz e Terra, 1979.

* Geógrafa. Mestre e doutora em Educação, pela Universidade Estadual de Campinas. É professora junto ao Programa de Mestrado em Educação, da Universidade Tuiuti do Paraná. Possui capítulo de livro publicado pela editora Paz e Terra; pela editora da UFSC e pela editora da Universidade Estadual de Maringá/PR. Pesquisa educação do campo e prática educativa nas escolas localizadas nos assentamentos, organizados no movimento social.

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ALFABETIZAÇÃO: DA CARTILHA DE COMÉNIO AO LETRAMENTO


Maria Auxiliadora Cavazotti
 *
Universidade Tuiuti do Paraná

O trabalho objetiva refletir sobre o desenvolvimento histórico do processo de ensino e aprendizagem da leitura e da escrita, apontando-o como prática pedagógica essencial da escola moderna. Esta reflexão toma como marco inicial a organização do trabalho pedagógico proposto por Coménio, que oferece a sistematização da aprendizagem da leitura através da cartilha, método que perdurou no longo período de vigência do ensino tradicional. As mudanças tecnológicas dos meios e conteúdos da comunicação, produzidas no interior do processo de expansão e globalização das relações sociais capitalistas, exigem a inserção do alfabetizando nas práticas sociais de leitura e escrita, que chamamos de letramento, ultrapassando a mera aquisição da técnica do ler e escrever. A concepção de letramento como fundamento do ensino e da aprendizagem da leitura e da escrita demanda a adoção de novos conteúdos e da metodologia de seu ensino.

Palavras-chave:  ensino e aprendizagem da leitura e escrita  -  cartilha  -  letramento
A produção social da necessidade de universalização do domínio da leitura e da escrita pela via do ensino escolar tem suas raízes na modernidade. Sua emergência se realiza no contexto da expansão do comércio de mercadorias, produzidas na manufatura sob a forma do trabalho coletivo, e do desenvolvimento da nova ordem social burguesa, constituída pela classes em ascensão: a burguesia empreendedora e os trabalhadores manufatureiros.
Por seu turno, os reformadores protestantes, coerentemente com o espírito burguês, preconizavam, desde o século XVI, o aprendizado da leitura, ainda que elementar, com a finalidade de conhecer o texto bíblico.
Neste contexto de transformações sociais, coube a Coménio, pastor protestante, considerado o pai da Pedagogia moderna, lançar, no século XVII, os fundamentos da escola que perdura até nossos dias, definindo a organização do trabalho pedagógico a partir dos elementos constituintes da produção manufatureira, já presentes na sociedade de seu tempo.
Ao preconizar o princípio bem conhecido “ensinar tudo a todos”, Coménio define em primeiro lugar o papel do professor. Nesta escola não há mais lugar para o sábio, que inicia cada discípulo nas fontes do conhecimento aprofundado, mas o mestre capaz de promover a instrução sobre “tudo”, pelo uso do método que generaliza o conhecimento necessário ao cidadão comum.
Tal como a manufatura, que abandona o artesão, conhecedor da arte de elaborar seu produto com maestria, e o substitui pelo trabalhador, que realiza tarefas parceladas no processo coletivo de trabalho, Coménio concebe a simplificação do trabalho do professor pelo emprego do manual didático como instrumento do ensino. O livro didático difere dos livros científicos ao apresentar o conhecimento não com a profundidade das fontes originais, mas compendiado em fórmulas e definições, que introduzem o aprendiz nos primeiros passos da instrução científica.
Nesta perspectiva, Coménio propõe a cartilha de ensinar a ler, elaborada com a preocupação didática de iniciação à leitura, ilustrada com as figuras ao lado das palavras, da sílaba e da letra do alfabeto. Nada mais parecido com as cartilhas que perduraram ou ainda perduram até hoje na nossas escolas.
Um outro aspecto da escola de Coménio que cabe mencionar é a instrução simultânea, ou seja, a classe heterogênea, com os alunos realizando o aprendizado ao mesmo tempo, embora em graus e atividades diferenciadas. Trata-se da utilização do mesmo princípio do trabalho coletivo manufatureiro e sua concomitante divisão de tarefas, que viabiliza o aumento da produção. Na escola, o ensino simultâneo possibilita a realização do princípio “do ensinar a todos”, embora sua realização só tenha sido efetivamente alcançada através de difícil e lento esforço social, apresentando os primeiros resultados em meados do século XIX.
Consagrada a organização do trabalho pedagógico da escola moderna, que com o professor e o livro didático ensinam o conhecimento sistematizado para muitos aprendizes, o aprendizado da leitura e escrita ocupa um lugar de destaque no processo que chamamos de ensino-aprendizagem.

2. Letramento

A prática pedagógica do aprendizado da leitura e da escrita através da cartilha perdurou durante o longo período que chamamos de ensino tradicional. Este método, centrado no domínio do código, revelou-se suficiente dadas as condições históricas próprias do aprendizado da leitura, tais como o uso privilegiado da escrita (as cartas, os bilhetes, os registros de compras, etc.) como recurso de comunicação entre interlocutores distantes, em razão da ausência de outros meios técnicos.
Entretanto, o processo crescente de expansão e globalização do capital ao intensificar as relações sociais recíprocas de interdependência entre sujeitos de classes sociais, comunidades, regiões e países diversos, produziu também novos processos de comunicação quanto aos seus meios e conteúdos. Trata-se de um processo comunicacional dotado de tamanha rapidez, de tal simultaneidade entre a produção e a recepção de grande número de informações que passou a exigir novos patamares de leitura e da escrita, denominados pelos estudiosos de letramento. Segundo Soares (2003, p.20) “só recentemente passamos a enfrentar esta nova realidade social em que não basta apenas saber ler e escrever, é preciso também saber fazer uso do ler e escrever, saber responder às exigências de leitura e escrita que a sociedade faz continuamente”. Para ampliar a concepção de letramento, recorremos às reflexões de Klein que assim explica:
Não há dúvida que o letramento é, hoje, uma das condições necessárias para a realização do cidadão: ela o insere num círculo extremamente rico de informações, sem as quais ele, inclusive, nem poderia exercer livre e conscientemente sua vontade (…)o homem contemporâneo é afetado por outros homens, fatos e processos por vezes tão distantes de seu cotidiano, que somente uma rede muito complexa de informações podem dar conta de situá-lo, minimamente, na teia de relações em que se encontra inserido. Neste universo, tão mais vasto e complexo, a escrita assume relevante função, registrando e colocando ao seu alcance as informações que podem esclarecê-lo melhor (2000, p.11).
Assim, podemos compreender que o processo educacional de acesso à leitura e à escrita modifica-se, pois o educando é instado a inserir-se nas práticas sociais de leitura e escrita, ultrapassando a mera aquisição da “tecnologia do ler e escrever” (Soares, 2003, p. 21).
Em primeiro lugar, do ponto de vista da complexidade da interlocução, faz-se necessário um leitor capaz de apreender o significado dos discursos, interpretando os elementos histórico, científicos e ideológicos que o constituem. Para isso, precisa dominar os elementos de textualidade que constróem o âmbito discursivo oral e escrito, como também os elementos materiais de sua codificação (letras e sons). Por outro lado, cabe salientar que os meios tecnológicos, que viabilizam simultaneidade à comunicação, conferem menor função prática à escrita manual, dispensando o aprendizado de vários conteúdos relativos ao domínio específico do código, como se procedia no passado no ensino sistematizado através das cartilhas. Em resumo, as mudanças apontadas implicam na adoção de novos conteúdos do ensino da leitura e da escrita, pois, enquanto, os conteúdos relativos à textualidade se tornam cada vez mais relevantes, alguns aspectos pertinentes ao código perdem sua predominância ((Klein, 2000, p.14).
Entretanto, no que se refere à alfabetização, como momento inicial do processo educativos do ensino e da aprendizagem da leitura e da escrita, cabe enfatizar, ainda segundo Klein (2000, p.41), que esta etapa se caracteriza pelo fato de desenvolver juntamente com os conteúdos relativos à textualidade (coesão, coerência, unidade temática, clareza, concordância, etc) - que o modelo tradicional de alfabetização não levava em conta -, também os conteúdos pertinentes à codificação/decodificação (letras, sílabas, famílias silábicas, direção da escrita, segmentação, etc.) .
Por fim, como decorrência da adoção de novos conteúdos dos processos educativos do ensino da leitura e da escrita, pressupõe-se também novos processos, metodologias e estratégias de seu ensino-aprendizagem. Nos limites deste trabalho, vamos apontar apenas alguns elementos metodológicos do processos destinados especificamente à educação de jovens e adultos.

3.Alguns apontamentos sobre processo do ensino e da aprendizagem da leitura e da escrita para jovens e adultos

As reflexões sobre o processo metodológico do ensino e da aprendizagem da leitura e da escrita, desenvolvidas a seguir, tomam como referência o Projeto de Extensão do Curso de Pedagogia da UTP, intitulado “Alfabetização de Jovens e Adultos com ênfase nas questões socioculturais”, em realização na Comunidade Mont Moriá, da favela do Champagnat.
O primeiro princípio que levamos em conta para desenvolvermos nossa prática pedagógica junto aos alfabetizandos é que o aprendizado e, até mesmo, as vivências do jovem e adulto são marcadas pela experiência de muitas e extremas dificuldades. Por essa razão, buscamos garantir uma metodologia de ensino e de aprendizagem que leve esse aluno, desde o primeiro momento, a realizações de sucesso, a obtenção de algum resultado. Assim, iniciamos pela prática de leitura, que em virtude da relação que guarda com a oralidade da língua materna, da qual ele é falante, nosso aluno pode logo evidenciar algum acerto, alcançar algum sucesso. Como exemplo deste procedimento, utilizamos o reconhecimento da escrita de seu nome e dos colegas. O resultado se evidenciou no caso da Rosalina que, após freqüentar as primeiras aulas de alfabetização, fez questão de ir buscar pessoalmente seu crachá na reunião das mulheres que ela freqüenta na sua igreja. Entendemos que desta primeira aprendizagem outras derivarão em seguida.
Outro princípio metodológico, que levamos em conta no processo metodológico do ensino e da aprendizagem da leitura e da escrita, apoia-se no entendimento a memória é uma função intelectual muito própria do adulto, como indica Vigostsky. Assim, no processo de aprendizagem evocar aquilo que ele já conhece o ajudará a atualizar o conhecimento já dominado e ampliá-lo com novas aquisições. Verificamos esta questão nos exemplos de Maria Clara, Terezinha e a Marcionilha. Todas elas, senhoras já bem idosas, manifestaram algum domínio de leitura na medida em que vários momentos lemos pequenos textos, individualmente ou em conjunto com toda a turma de alfabetizandos. A Maria Clara relatou, não sem revolta, que esteve menos de um ano na escola, e apenas na primeira série da antiga escola primária e assim mesmo sabe ler . A partir do domínio da leitura, que cabe ainda desenvolver muito mais, pudemos desenvolver com as alunas a aquisição da escrita através da prática da produção de textos orais e escritos.
Por outro lado, a memorização, como fixação de toda e qualquer aprendizagem, exige ser insistentemente trabalhada com o alfabetizando jovem e adulto. Portanto, a repetição é a “alma do negócio”!! Entretanto, repetição não quer dizer exercícios mecânicos, que não demandem esforço de aprendizagem. A qualidade didática dos nossos procedimentos e do material utilizado propõem de forma lúdica, de maneiras diversificadas que despertem interesse e esforço, a repetição sistemática e exaustiva de tudo aquilo que é ensinado e precisa ser aprendido.
Nesta perspectiva de insistir sobre o ensino e a aprendizagem dos conteúdos da leitura e da escrita, temos compreendido ainda que nossa maior dificuldade didática é avaliar precisamente o que o aluno já aprendeu e o que ele não ainda sabe. Dito de outra forma, avaliar, o que está “errado”, em seu trabalho significa identificar em suas respostas: a) o que aponta para um aprendizado anterior; b) o que se trata da generalização de um princípio aprendido, ainda que a situação em pauta não comporte o mesmo princípio. Somente assim nossa interferência através do ensino pode redundar em aprendizado. Um exemplo que evidencia essa preocupação didática está no exemplo que ocorreu com uma de nossas alunas e que passamos a relatar. A Patrícia fez uma cópia do texto do “Terceiro Livro dos Nomes”, que tinha sido elaborado na sala de aula, em conjunto com os alunos, com o objetivo de realizar uma produção de texto oral e escrito. Fizemos a impressão de um exemplar para cada aluno com a ajuda do computador, para leitura em outras aulas. Pedimos à Patrícia que copiasse o texto, pois ela o leu com desenvoltura, enquanto fazíamos a leitura individual com os outros alunos. A tarefa consistia em transcrever da letra caixa alta (na qual o texto estava impresso) para a manuscrita, com o objetivo de observar as maísculas no início da frase e nos nomes próprios; a pontuação; o parágrafo no início de um período; o espaçamento no caderno. Verificamos que ela copiou “Meu nome é por causo que meu pai..”. Poderíamos ter nos perguntado se o “erro” revelava falta de atenção na cópia, mas de imediato concluímos que se tratava de um problema de oralidade, pois a variante popular utiliza a expressão por causo que. Assim, a tendência do aluno é ler aquilo que é conhecido na linguagem oral. Portanto, foi necessário explicar a ela que há uma outra forma na oralidade, cujo emprego é o correto na linguagem escrita. Assim, no caso dessa aluna, o avanço na aquisição da escrita é sistematizar a perda das marcas da oralidade. Embora o domínio das linguagem coloquial signifique um aprendizado anterior, muitas vezes são formas que não têm emprego na norma culta, que é a única que a escrita comporta. Se o “erro” da Patrícia fosse tomado apenas como falta de atenção, perderíamos uma preciosa oportunidade de mostrar a ela importantes princípios que regem a aquisição da escrita em língua materna: as variantes que a oralidade comporta; a relação da língua oral com a língua escrita; a norma culta como única forma que a escrita comporta.
Há muitas outras questões teórico-metodológicas relevantes com as quais temos nos ocupado no desenvolvimento do projeto de alfabetização de jovens e adultos referido, mas que merecem ser objeto de pesquisa para podermos orientar de forma consistente nossa ação pedagógica junto aos nossos alfabetizandos.

4. Considerações finais

Compreender o desenvolvimento e as mudanças do processo do ensino e da aprendizagem da leitura e da escrita pressupõem refletir sobre os determinantes histórico que produziram formas diferenciadas de organização do trabalho pedagógico em momentos distintos.
Também cabe examinar o processo social de comunicação cujos avanços tecnológicos criam necessidades próprias de produção de um leitor e de um escritor capaz de se apropriar e de interpretar as informações que circulam na intensa rede de relações que se estabelece na sociedade.
Como decorrência, cabe a escola considerar a importância e a necessidade de fundamentar sua prática pedagógica numa clara concepção desses fenômenos sociais e de suas diferenças e relações. Assim, o caráter histórico da comunicação e do papel que a leitura e a escrita desempenham neste contexto é o ponto de partida para a formação do educador-alfabetizador, que pretende desempenhar sua função docente no desenvolvimento de processos educativos de ensino e aprendizagem voltados seja para crianças, seja para jovens e adultos.

REFERÊNCIAS:
COMÉNIO, J.A.. Didacta Magna. Tratado da arte universal de ensinar tudo a todos. Introdução, Tradução e Notas de Joaquim Ferreira Gomes. 3 ed. Fundação Calouste Gulbenkian: Lisboa, 1985
KLEIN, L.R. Proposta Metodológica de Língua Portuguesa. 1 ed. Secretaria de Estado de Educação. Governo Popular de Mato Grosso do Sul. Série Fundamentos Político-Pedagógicos. Mato Grosso do Sul, 2000
SOARES, M. Letramento: um tema em três gêneros. 2 ed. 6 reimpr. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.

Doutora em Educação pela UFPR, Professora no Programa de Pós-Graduaçào em educação, Mestrado em Educação na Universidade Tuiuti do Paraná

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UNIVERSIDADE PUBLICA E INICIATIVA PRIVADA:
uma discussão para além do mercado


 Maria de Lourdes Pinto de Almeida *
Universidade Tuiuti do Paraná
A historiografia que trata da questão sobre a relação universidade- sociedade aponta para uma predominância do uso privado da universidade. Este uso privado teria dois sentidos: o sentido econômico e o sentido político-ideológico. O primeiro, é resultante de um processo de em processo de empresariamento da esfera social e cultural, envolvendo, principalmente, a educação e a saúde, no qual o Estado procura se desimcubir dessas responsabilidades dessas responsabilidades, repassando-as ao setor privado. Este, diante de uma crescente demanda por esses serviços no país, aliada a ineficiência do Estado em cumprir essas tarefas, enxerga um novo campo de produção e acumulação de capital.    A universidade, enquanto instituição produtiva de cultura não busca preparar uma força de trabalho qualificada, como tem também o reconhecimento do conjunto dos organismos da sociedade civil de sua mediação no interior da esfera da superestrutura, como entre esta e o setor produtivo. Essa função devia ser intensificada em favor dos interesses das classes dominantes e da elite no poder para consolidar o projeto hegemônico de sociedade e de Estado no Brasil
Apesar da resistência organizada no interior da universidade e de setores organizados da sociedade civil, parece consolidar gradualmente a sua dimensão privada, provocando com isso uma redefinição do trabalho intelectual nessa instituição cultural.     Quem são esses intelectuais ? São sujeitos forjados em cada época e em cada lugar que apropriando-se do conhecimento e detendo os instrumentais para produzi-lo e transmiti-lo contribuem para explicar e transformar a sociedade em que vivem.Se a sociedade capitalista se define pelas contradições que desenvolve isso significa que a sociedade é dinâmica e inacabada. A sociedade burguesa é, portanto, mais um estágio nesse processo histórico da constituição da sociedade e está sujeita a ser superada.
   

Palavras-chave:
universidade pública,  uso privado, sociedade civil
A historiografia que trata da questão sobre a relação universidade- sociedade aponta para uma predominância do uso privado da universidade. Este uso privado teria dois sentidos: o sentido econômico e o sentido político-ideológico. O primeiro, é resultante de um processo de em processo de empresariamento da esfera social e cultural, envolvendo, principalmente, a educação e a saúde, no qual o Estado procura se desincumbir dessas responsabilidades dessas responsabilidades, repassando-as ao setor privado. Este, diante de uma crescente demanda por esses serviços no país, aliada a ineficiência do Estado em cumprir essas tarefas, enxerga um novo campo de produção e acumulação de capital.
    A universidade, enquanto instituição produtiva de cultura não busca preparar uma força de trabalho qualificada, como tem também o reconhecimento do conjunto dos organismos da sociedade civil de sua mediação no interior da esfera da superestrutura, como entre esta e o setor produtivo. Essa função devia ser intensificada em favor dos interesses das classes dominantes e da elite no poder para consolidar o projeto hegemônico de sociedade e de Estado no Brasil
    Apesar da resistência organizada no interior da universidade e de setores organizados da sociedade civil, parece consolidar gradualmente a sua dimensão privada, provocando com isso uma redefinição do trabalho intelectual nessa instituição cultural.
    Quem são esses intelectuais ? São sujeitos forjados em cada época e em cada lugar que, apropriando-se do conhecimento e detendo os instrumentais para produzi-lo e transmiti-lo, contribuem para explicar e transformar a sociedade em que vivem.
Se a sociedade capitalista se define pelas contradições que desenvolve isso significa que a sociedade é dinâmica e inacabada. A sociedade burguesa é, portanto, mais um estágio nesse processo histórico da constituição da sociedade e está sujeita a ser superada.
    As classes dominantes monopolizam a ciência, a arte e a dimensão mais ampliada da cultura. A ciência passa a ser um instrumento de apropriação material e espiritual nas mãos da classe dominante que a usará como meio de extorsão de mais-valia. Separados dos meios de produção de vida material, produzem um saber descolado da realidade social. As instituições nas quais atuam- mormente as de caráter cultural, como a universidade, por exemplo- reproduzem as necessidades da sociedade que as engendrou.
    A produção científica e cultural se desenvolve nas esferas fora do setor produtivo, no âmbito da superestrutura. A divisão de trabalho na sociedade capitalista produz um resultado perverso, pois a separação da atividade intelectual- manual em práticas desconexas permite uma contínua reconstrução do  mundo burguês, dificultando o desenvolvimento da sociedade e a superação da ordem social vigente. É por isso que, a teoria materialista de que os homens são produto das circunstâncias e da educação e de que, portanto, homens modificados são produtos de circunstâncias diferentes e de educação modificada, esquece que as circunstâncias são modificadas precisamente pelos homens e que o próprio educador precisa ser educado.
A racionalidade dos indivíduos atomizados,  que agindo em vistas de seus fins egoístas, contribuiriam para o bem comum, conforme a teoria da mão invisível e da harmonia natural das forças agentes no mercado,   foi constatada pela histórica da crise do capitalismo. A racionalidade a qual seria a razão planejadora, capaz de estabelecer metas comuns, de criar novas fontes de emprego, e de alocar recursos que não poderiam mais ser distribuídos pelo mercado, como se acreditava os próprios capitalistas, na crise de 1929. No entanto os esforços e estratégias dos governos dos países capitalistas em crise acabaram por usar os aparatos do planejamento não em função da generalidade dos cidadãos, mas na defesa da propriedade e dos interesses do capital,  fato que não implicaria  em discutir os fundamentos do liberalismo, mas em esforçar-se por mantê-los. Isso mostra que os princípios aos quais se lançaram mão os “planificadores” capitalistas neste século não estavam voltados para problemas ‘éticos’ em torno dos valores humanos - vida, a liberdade, tolerância, que, verdade seriam antigos valores do liberalismo clássico -,  mas apenas com a salvaguarda da propriedade e dos lucros que dependiam da continuação das atividades econômicas.
    O desenvolvimento das forças produtivas gera a permanente negação da ordem burguesa pelo crescente movimento de reivindicações populares, principalmente nas esferas culturais e sociais, no âmbito do Estado. À medida que essa participação se amplia, se agudizam os conflitos de classes obrigando a ordem burguesa a permanentes reformulações de seu status-quo. Este processo traduz uma situação de crise. No decorrer do tempo, o processo revela que o espaço entre um re-ordenamento e outro é cada vez mais curto tornando, consequentemente, a crise , permanente.
    Sobre este tema, vale destacar o pensador italiano Antônio Gramsci, que amplia e enriquece a concepção de Estado, pois é neste que se travam novas batalhas da luta de classes. Para ele existem duas esferas no interior da superestrutura: a sociedade civil e sociedade política.
    Por sociedade política, Gramsci (1995), entende o conjunto de aparelhos com os quais a classe dominante detêm e exerce o monopólio legal ou de fato da violência.
O período de 1967/1974 constituiu-se num dos momentos de maior intensidade de crescimento econômico nacional, que se apresentou através de transformações nas estruturas produtivas, comerciais e financeiras. Verificou-se, por parte do poder público, uma política de incentivo à industrialização, o que beneficiou a instalação das multinacionais no território brasileiro.
As condições favoráveis da economia internacional (entre fins da década de 1960 e meados da seguinte), em termos de participação no comércio internacional, de acesso fácil ao crédito externo e de menores restrições à importação de tecnologia já amadurecida, permitiram, a princípio, um crescimento acelerado da economia brasileira.
O Estado brasileiro, fortemente estruturado, impôs as políticas econômicas necessárias ao avanço da industrialização e à modernização conservadora, tanto do setor industrial quanto da agricultura, visando ampliar o volume de comércio exterior, a fim de aproveitar o substancial aumento do comércio internacional, que ocorria no período.
As excepcionais taxas de crescimento da economia brasileira, verificadas durante o Regime Militar, entre 1967 e 1974, possibilitaram aos mandatários do país a formulação do projeto Brasil Potência, com o objetivo de se propagandear a suposta conversão do Brasil numa das maiores potências econômicas mundiais. Para a realização de tal projeto, o Governo Militar programou uma soma grande de investimentos em insumos básicos, bens de capital e infra - estrutura. Ao mesmo tempo, no plano ideológico, disseminou-se a idéia-força de Brasil Potência, com a divulgação de slogans como Brasil: ame-o ou deixe-o, ou este é um país que vai para frente. A mídia foi intensamente usada, manipulada e censurada.  A reforma da política educacional tornou-se também parte do programa hegemônico da Ditadura Militar. Propunha-se uma reforma que viesse ao encontro do ufanismo nacional, e que, ao mesmo tempo, garantisse a manutenção da supremacia do capital sobre o trabalho.
Esses elementos constituíam-se em catalisadores da obtenção do consenso nacional contra a ascensão do movimento operário e da emergência das idéias socialistas. Em função da consolidação do modelo econômico de desenvolvimento, baseado na internacionalização da economia brasileira, o Estado procura realizar a reordenação de suas políticas em todos os níveis.
Os acordos MEC - USAID, cujo objetivo principal era a adequação da educação brasileira ao interesse do desenvolvimento capitalista da época, lançaram as principais bases das reformas dos diversos níveis de ensino. A  característica principal desses acordos foi a tentativa de adequação dos sistemas sociais dos países periféricos ao processo de uniformização promovido pelo capitalismo internacional. Tratava-se da importação de técnicas de ensino modernizantes, que imprimissem um redirecionamento do ensino e da pesquisa.
Todos os fatos que mencionamos até aqui, os quais consideramos relevantes em relação à vida da universidade brasileira, constituíram parte de um processo que culminou com a Reforma Universitária de 1968, que foi, no período, o acontecimento de maior impacto na área educacional. Com essa reforma, pretendeu-se transformar a universidade, ajustando-a técnica, cultural e politicamente ao modelo de desenvolvimento imposto ao país  . Visou-se, então, transformar a universidade brasileira em uma universidade voltada para a produção de tecnologias, ajustada às exigências da modernização acelerada.
A base brasileira da economia da década de 70 foi o “tripé produtivo” formado pelas empresas estrangeiras, nacionais privadas e estatais. Trata-se de um período marcado pela atuação de grandes monopólios, que controlavam amplos setores da economia nacional. Acrescenta-se a esses traços, o processo de internacionalização da economia brasileira, decorrente do predomínio do capital, da indústria e da tecnologia estrangeira. O processo de transferência de tecnologia tornou-se um dos mais influentes fatores de caracterização das novas relações internacionais, marcadas pelo imperialismo dos países capitalistas centrais, detentores do poder econômico, tecnológico e empresarial.
Para Gramsci (1995), o Estado moderno teve que render-se às múltiplas exigências da sociedade capitalista porque esta ao desenvolver-se e desenvolver suas contradições provocou o desenvolvimento tanto nas esferas do capital e do trabalho como na relação entre ambos. A cumplicidade que se revela nesse processo de antagonismos exige que o Estado, enquanto instância de mediação entre os interesses de classes, antes entendido como representante ou cúpula da classe dominante, crie um espaço no qual os antagonismos se manifestem e se expressem. Neste sentido, a luta de classes deslocou sua estratégia de confronto com o estado para o confronto no Estado como uma forma de superação da sociedade capitalista.
Gramsci (1995) torna fecunda a sua concepção de sociedade civil, ou seja a sociedade civil tem como base material os aparelhos privados de hegemonia cuja função é exercer o poder hegemônico através do consenso e direção da classe social no poder.
    A sociedade civil e a sociedade política detém uma relativa autonomia, pois cada uma delas se caracteriza por uma materialidade própria (seus aparelhos) e por uma função correspondente que se manifesta na organização da vida social, na articulação e na reprodução  das relações de poder (ditadura e/ou hegemonia).
    Como se pode notar a função hegemônica é essencial na realização da sociedade civil. A busca do consenso é condição da dominação no estado por uma classe. Não basta que uma classe seja dirigente na sociedade, é preciso que seja também dominante no poder. A sociedade civil tornando-se uma esfera específica do Estado, mas mantendo certa autonomia vai funcionar como mediação necessária entre a base econômica e o Estado em sentido restrito.
    Desse modo, nas relações capital-trabalho, os sindicatos poderosos neutralizam o poder das grandes corporações, assim como as poderosas associações de consumidores neutralizam as forças monopolistas e oligopolistas dos grandes comerciantes. Instaura-se uma espécie de equilíbrio de mercado, como se uma mão invisível harmonizasse os interesses de todos. O todo harmonioso compõe-se, agora, de um pequeno número de gigantes neutralizados, e não mais de uma infinidade de pequenas empresas atomizadas, competindo umas com as outras.
    Sendo a supremacia um momento de síntese unificadora da hegemonia e da dominação não significa que estas se fundam, isto é, que se homogeneizem. O que ocorre é que na correlação de forças entre as classes um projeto político-cultural de uma classe, ou de vários fragmentos de classe, torna-se predominante sobre outros. Entretanto, as funções consensuais ou coercitivas existentes em qualquer Estado Moderno, em que uma ou outra esfera prevaleça, dependerão, naturalmente, da autonomia relativa da sociedade política e sociedade civil e dos aparelhos pertencentes a uma ou outra dessas esferas surgidos pelo maior ou menor grau de socialização da política.  A independência cada vez maior entre essas esferas cria o espaço democrático ou autoritário.
    O surgimento da “sociedade civil” nos termos colocados por Gramsci põe em questão o monopólio dos intelectuais da classe dominante na produção, difusão e apropriação da cultura, pois essa esfera permite novas objetivasses e relativa autonomia de seus aparelhos.
Inicia-se, portanto, a possibilidade do confronto ideológico e cultural no interior dos aparelhos privados de hegemonia como estratégia fundamental das classes dominadas para a criação e fundação de uma nova ordem social.
É por esse motivo que a Escola, como um todo, e a Universidade, em particular, tornam-se por excelência aparelhos privados de hegemonia. E, de aparelho privado de hegemonia, onde se difundiam as ideologias da classe dominante, passa gradativamente a se constituir no espaço privilegiado da produção da ciência e da difusão de pensamento de todos os matizes, ainda que conflitantes entre si.
O processo dinâmico que se dá no sistema educacional e na Universidade, em particular, ao modificar as suas atribuições para responder aos desafios da sociedade moderna, provoca uma transfiguração dos intelectuais que vão atuar dentro dessas instituições. Quem serão esses intelectuais, se  “todos os homens são intelectuais, poder-se-ia dizer então; mas nem todos os homens desempenham na sociedade a função de intelectual”. 
Neste caso, só é possível apanhar o intelectual na dinâmica societária. Na sociedade moderna, ele se constitui na relação Capital x Trabalho. Aqui se revela a existência e formação do intelectual a partir da ótica das classes sociais e, portanto, da divisão de trabalho capitalista.
A sociedade burguesa, para desenvolver o sistema econômico capitalista, precisa ampliar a produção da mais valia. Isso significa desenvolver as forças produtivas e para tanto se requer uma intensa qualificação da força de trabalho, desenvolvimento da ciência e da tecnologia. O trabalhador, expressão da força de trabalho, ao se qualificar para este fim, ou seja, para realizar o projeto burguês de sociedade, torna-se intelectual orgânico desta classe, pois,
os empresários- se não todos, pelo menos uma elite deles- devem possuir a capacidade de organizar a sociedade em geral, em todo o seu complexo organismo de serviços, inclusive de criar as condições mais favoráveis à expansão da própria classe; ou, pelo menos, devem possuir a capacidade de escolher os ‘prepostos’(empregados especializados) a quem confiar esta atividade organizativa das relações gerais exteriores à fábrica. 
Esse intelectual, entretanto, a rigor não se forma nas instituições de ensino. Forma-se no interior da luta de classes e por isso Gramsci afirma ser o partido, por excelência, o espaço onde se formará esse intelectual orgânico da classe operária.
Na concepção gramsciana, a superestrutura, formada pela sociedade politica e sociedade civil, faz com que esta última funcione como mediação entre a base econômica e a sociedade política que corresponde ao Estado no seu sentido restrito.A universidade apresenta-se como fator superestrutural, mas está intrinsecamente ligada ao setor produtivo. Tanto no sentido em que se constitui como empresa, como no de que produz saberes ligados ao incremento técnico diretamente relacionado com a produção científica e cultural.
À universidade cabe sempre o dizer de Marx (1972), segundo o qual “os homens são produto das circunstâncias e da educação e de que, portanto, homens modificados são produtos de circunstâncias diferentes e de educação modificada, esquece que as circunstâncias são modificadas precisamente pelos homens e que o próprio educador precisa ser educado”.  A questão da praxis, enquanto ação ética e política de persuasão e  influência que homens exercem sobre si, está  enraizada na atividade acadêmica. Neste aspecto, os acadêmicos circunscrevem-se na superestrutura, no campo da luta política.    
Nessa perspectiva, o pensamento de Gramsci (1995) é fundamental para se compreender o papel do intelectual. Inicialmente é destacável que ele amplia a concepção de Estado do “marxismo clássico”.  O pensador italiano mostra que a luta política nas sociedades atuais se dá menos “contra” o Estado do que no Estado. Este se apresenta como instância mediadora de interesses de classes, em vez de mero representante da classe dominante. Nele, portanto, os antagonismos se manifestam.
Ao lado dos aparelhos coercitivos do Estado (sociedade política), Gramsci (1995) destaca os aparelhos privados de luta ideológica. Ele destaca duas esferas no interior da superestrutura: a sociedade civil e sociedade política. Trata-se de esferas distintas, mas articuladas, do ponto de vista do domínio de classes. A sociedade política é o conjunto de aparelhos com os quais a classe dominante detêm e exerce o monopólio legal ou de fato da violência. Já a sociedade civil tem como base material os aparelhos privados de hegemonia cuja função é exercer o poder hegemônico através do consenso e direção da classe social no poder. Destaca-se a imprensa em geral, os sindicatos, igrejas, escolas e, sobretudo, os partidos políticos como fulcro da ação coletiva.
O papel do “intelectual orgânico”, engajado na luta política, torna-se fundamental na concepção de luta de classe gramsciana. Nesta perspectiva, a universidade pode ser pensada como um duplo e articulado campo de atuação. Tanto como incremento da força produtiva e do lucro, quanto de confronto político e ideológico, da busca da hegemonia e da supremacia. 
     Gramsci (1995) opera uma fusão prático-teórica (práxis) segundo a qual podemos compreender todos os homens como intelectuais. Nesse sentido, o empresário torna-se não só um acumulador ganancioso, mas, sobretudo um intelectual orgânico, articulador de interesses de classes.
Os empresários-se não todos, pelo menos uma elite deles-devem possuir a capacidade de organizar a sociedade em geral, em todo o seu complexo organismo de serviços, inclusive de criar as condições mais favoráveis à expansão da própria classe; ou, pelo menos, devem possuir a capacidade de escolher os ‘prepostos’(empregados especializados) a quem confiar esta atividade organizativa das relações gerais exteriores à fábrica (GRAMSCI, 1995: 04) ·.
Nesta perspectiva, as relações entre a universidade e a empresa podem ser pensadas, não apenas como relações de interesses de transferências de técnica (academia=balcão de tecnologia), mas, sobretudo, como relações políticas em que os “interesses econômicos” e os “fins públicos” encontram-se correlacionados na luta hegemônica.
    A ciência só pode ser pensada como atividade neutra desvinculada da política (valores e ideologia das tendências de classe) se concebida abstraída do contexto histórico, da práxis. Nesse sentido é que se pode falar da atividade acadêmica enquanto um contributo para o progresso do patrimônio comum do saber humano. Assim, ela se compreende como atividade desinteressada.  Essa ilusão já foi duramente denunciada, mesmo em seu nascedouro no século XVIII, mas coube as diversas correntes marxistas denunciarem o caracter ideológico e classista de tal atividade.
Gramsci (1995) denuncia o caráter encantado dessa concepção de progresso científico positivista, em que se vislumbra um sentido escatológico, uma salvação mecânica, em que se dispensa o esforço do homem, uma vez que se crê que tudo vai por si, conforme o avanço das “especializações dos novos ramos de investigação”.


REFERÊNCIAS


FRIEDMAN, M. Capitalismo e liberdade. Brasil. Ed. Artenova. 1977.
GRAMSCI, A. Concepção dialética da história, R.J., Ed.Civilização Brasileira,  1995,  trad. N. Coutinho, 10A edição.
HAYEK, F.A. O caminho da servidão, Porto Alegre. Ed. Globo, 1977. 2ª edição
HUNT & SHERMAN. História do pensamento econômico. R.J. Ed. Vozes. 1977
IANNI, O. Teorias da globalização. RJ. Ed. Civilizaçao Brasileira, 1996.
IANNI, O ,  A era do globalismo,  R.J. Ed.  Civ. Brasileira. 1996
MARX, K. I Teses sobre Feuerbach. In Marx, Karl e Engels, Friedrich.Obras escolhidas. SP.Alfa Omega, 1972,  v..03, p.208/209
OLIVEIRA, V.B. (Org.).  Informática em psicopedagogia, S.P. Editora Senac. 1996.
PIOZZI, P.,  Natureza e artefacto: a ordem anárquica. S.P. Tese de Doutoramento, USP, 1991.
POPPER, K. A sociedade aberta e seus inimigos. S.P. Liv. Itatiaia, 1977
ROQUEPLO, P. Penser la tecnique:Pour une démocratie ouvrière. Paris. Ed. Seuil, 1983
SAVIANI, D. Educação e questões da atualidade. S.P. Livros do Tatu, ed. Cortez, 1991.

* Pedagoga, Mestre e Doutora pela Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas. Professora do PPG em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná. Pós Doutoranda do Departamento de Politicas Publicas, Ciencia e Tecnologia da UNICAMP. Professora Pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Ensino Superior- GEPES- sede FE da Unicamp. Autora do livro ´Iniciativa Privada e Universidade Publica´- Editora Atomo e Alínea, 2003.

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INCLUSÃO/EXCLUSÃO E INFÂNCIA

Neste texto tem-se como objetivo inicial uma breve discussão conceptual a respeito do processo de exclusão social e dentro desta perspectiva, tem-se a pretensão de considerar o processo de inclusão/exclusão infantil (segunda infância), quando a criança geralmente é "incluída" no primeiro recurso da sua comunidade, a escola.
Adota-se como base referencial de análise a crise no mundo trabalho. Será considerado aqui a pessoa que ficou desempregada ou a que está empregada mas, com salários que a coloca a baixo do nível considerado de pobreza. A situação pode agravar-se a medida em que aumenta o tempo em que tal pessoa fica exposta a está situação, o que pode levá-la a trajetórias de perdas: perda do emprego, perda do poder de compra, perda das possibilidades de participação nos bens sociais, perdas de laços afetivos, perda da moradia, da dignidade, dentre outras. Neste sentido a exclusão/inclusão será abordada paralelamente a questão da cidadania.
Dito isto, considera-se a criança advinda de um contexto familiar marcado pelas trajetórias de perdas citadas anteriormente, e que por sua vez freqüenta a escola pública. A escola pública tem sido o principal contexto onde tem aflorado as contradições sociais com violência e ela acaba exercendo pelo menos duas categoria de exclusão: uma pela evasão escolar propriamente dita e outra por deixar claro à criança a sua diferença, reforçando, desta forma, um padrão já vivido por ela e sua família socialmente.
Palavras chave: Exclusão, inclusão e infância.
Neste texto, teremos como objetivo iniciar uma breve discussão a respeito do processo de exclusão social e dentro desta perspectiva  tenho a pretensão de considerar o processo de exclusão/inclusão infantil (segunda infância), quando a criança geralmente é "incluída" no segundo contexto social da sua comunidade, a escola, se considerarmos que o primeiro é a família.
Segundo podemos perceber, a exclusão tem sido tema de debates freqüentes na academia desde as duas últimas décadas. Supomos que a causa disso esteja no próprio processo histórico das sociedades enquanto tal e nas conseqüências sociais correlatas de tal processo.
Para introduzir a discussão, acreditamos que uma das análises que deve ser feita é com relação a utilização do próprio termo em si. Segundo o Novo dicionário Aurélio da língua Portuguesa, exclusão significa: "1. Ato de excluir (-se); exceção. (...) 2. Ato pelo qual alguém é privado ou excluído de determinadas funções"; E, por sua vez, excluir significa: "2. Afastar, desviar, eliminar (...). 3. Por de lado, abandonar, recusar. 4. Não admitir (...). 5. Pôr fora, expulsar. 6. Privar (...)". Seguindo a mesma linha de análise, concluímos que quando excluímos, excluímos alguém de algum lugar ou de alguma situação. O verbo excluir é um verbo transitivo direto-indireto que exige então um objeto direto e outro indireto. Com este raciocínio, apresentamos então duas questões: a quem excluímos? E da onde? Neste texto o foco da discussão estará centrado na segunda questão, ou seja, o lugar social da onde se exclui. O que certamente dará ao texto uma limitação, pois, não sendo o foco da discussão no momento, o sujeito desse processo aparecerá na sua forma acabada, não lhe sendo dado uma dimensão histórica de quem entra em processo de exclusão na nossa sociedade.
Com a pretensão de discutir o lugar social da onde se exclui, invocamos Castel que nos alerta para o fato de que "não se pode falar numa sociedade de situações fora do social", (1995: 23), o que nos leva a pensar que a exclusão ocorre dentro dos limites da própria sociedade. Ainda nesta perspectiva, a população de excluídos, portanto, "tem que ser vista como algo inerente e não à parte: ao invés de exclusão, seria preferível falar de formas de inserção marginal..." (Kowarick, 1999: 141)
Seguindo a mesma linha de raciocínio, e para um melhor entendimento do que queremos dizer, ou seja, para o entendimento de que toda situação de exclusão tem um "quem" e um "lugar" dentro do contexto social, quando nos referimos à exclusão de alguém de alguma situação, é porque existe, em contra partida, a inclusão de outro alguém na situação da qual o primeiro foi excluído. Essas duas situações, de exclusão/inclusão, caracterizam-se, pois, por condições de desigualdade entre as pessoas de uma mesma sociedade. Neste sentido, segundo Lindomar Boneti:
... o desigual seria o pobre e não o rico, o diferente seria o pobre e não o rico, mesmo que o pobre se apresente na maioria. (...) a igualdade não se estabelece pela maioria, mas a partir do conceito padrão, que, na nossa sociedade capitalista, é imposto pelas classes dominantes. O igual assume uma posição de comando ou, no mínimo de superioridade, perante o diferente. Trata-se de uma construção social originada de um processo histórico de dominaçã (2001: 118).
Visto isto, podemos concluir que,
... 'excluir' significa 'expulsar do mundo dominante', significa literalmente, 'pôr para fora dos parâmetros e das normas que regem as relações sociais', é não apenas 'marginalizar' e sim 'desconsiderar a existência humana'. 'Excluir' significa 'criar e perpetuar condições sociais que tornam permanente o ato de morrer' (Boneti, 1988: 15).
Sendo assim, podemos, neste momento, ensaiar uma maior aproximação do binômio exclusão/inclusão considerando que o incluído é o igual e, que, consequentemente, o excluído é o diferente, entendendo, portanto, que um não existe sem o outro. Assim, para um melhor entendimento, faz-se necessário compreender que há sempre aos dois lados da mesma moeda, para que possamos ter uma maior aproximação do significado do que se queira expressar.
Para o entendimento desse processo social, uma segunda análise que deve ser feita e esta tem como referência o trabalho, que é a base estrutural das relações das sociedades capitalistas contemporâneas. Castel, ao discutir a legitimidade do termo exclusão afirma que: "... a maior parte das situações assim qualificadas (...) Trata-se, na maioria das vezes, dessa vulnerabilidade criada pela degradação das relações de trabalho e das proteções correlatas (...), a crise da sociedade salarial." (1995: 40). Ao mesmo tempo, Castel define três subconjuntos de práticas diferentes de exclusão social: "a supressão completa da comunidade" (o extermínio de populações indígenas na América Latina no período Colonial); "a construção de espaços fechados e isolados dentro da comunidade" (a construção de escolas especializadas para pessoas com deficiência ou hospitais para doentes mentais); "e a determinação de um status especial a certos grupos populacionais que lhes permita coexistir na comunidade" (novamente a situação dos indígenas com o status de sub cidadãos) (1995: 36-7). No entanto, pela complexidade do próprio termo e para melhor entendimento das situações sociais de exclusão, Paugam sugere que se agreguem dimensões ao conceito, e "Uma delas refere-se a como o mercado de trabalho está organizado. Outra tem a ver como a maneira, segundo a qual, os vínculos sociais são construídos. E, por fim, há as diferenças que remetem ao sistema de proteção". (1999: 58).
Dizendo de uma outra maneira, tomando como base de discussão, a situação concreta da vida cotidiana relacionada a crise no mercado de trabalho, está sendo considerado aqui a pessoa que ficou desempregada ou aquela que está empregada mas com salários ínfimo que a coloca a baixo do nível considerado de pobreza. Tal a situação pode agravar-se a medida em que aumenta o tempo em que a pessoa fica exposta a está situação, o que pode levá-la a trajetórias de perdas: perda do emprego, perda do poder de compra, perda das possibilidades de participação nos bens sociais, perdas de laços afetivos, perda da moradia, da dignidade, dentre outras perdas. Paugam afirma que "trata-se de uma escala progressiva e isso não são simplesmente constatações feita pelas pessoas, mas são resultados de pesquisas. Por exemplo, as pesquisas mostram relação entre desemprego e a precariedade da relação conjugal". (1999: 56). No entanto, está situação de exclusão pode ser amainada ou agravada pela força ou labilidade dos vínculos sociais e/ou pela ausência ou presença de um sistema de proteção social. Embora alguns autores, como o último citado, afirmem, que "no Brasil os vínculos de solidariedade familiar e social são mais fortes" (1999: 55), essa solidariedade não é suficiente quando trata-se de estruturas familiares já em processo de empobrecimento de longa data. Assim, como nos denuncia Mariangela Wanderley, "a pobreza e a exclusão no Brasil são faces de uma mesma moeda. (...) Acresça-se a tudo isso, a tendência política Neoliberal de diminuição da ação social e do Estado" (1999: 25). No caso, quando nos referimos à diminuição da ação social, referimo-nos ao descaso com a saúde, educação de qualidade, acesso a sistemas habitacionais e de alimentação. O Estado Neoliberal (Mínimo), é um Estado desenvolvimentista, que investe minimamente na educação, nos sistemas de seguridade social (previdência, saúde e assistência) e nos sistemas de habitação e alimentação, o que agrava significativamente a crise do mercado de trabalho, ocasionando uma exclusão que não será socorrida e que por isso chega a extremos inimagináveis.
A situação é bastante grave aqui no Brasil. Segundo os dados que constam no Atlas de Exclusão Social no Brasil - 2, que revela o ranking dos Estados e a evolução da exclusão no país entre 1960 e 2000:
A exclusão social aumentou 11% no país entre 1980 e 2000. Nessas duas décadas, o número de excluídos passou de 51 milhões (42,6% da população de 120 milhões de habitantes) para 80 milhões (47,3% da população de 170 milhões). O aumento do desemprego e da violência são os principais fatores que contribuíram para o crescimento da exclusão social no país. Entre os dados pesquisados, a Educação foi o único setor a apresentar melhora  (                  ).
Hoje se usa o termo "nova pobreza para designar os desempregados de longa duração (...) assim os excluídos, não são residuais nem temporários, mas contingentes populacionais crescentes que não conseguem encontrar lugar no mercado." (Wanderley, 1999: 19) Embora pobreza não seja sinônimo de exclusão, num país como o Brasil, ambas caminham quase que lado a lado. Exclusão social aqui, significa perda de cidadania, ou seja, perda dos direitos, num contínuo que vai desde a perda ou falta de trabalho, ou baixos salários, durante um longo período de tempo, passando pelos afrouxamentos dos vínculos societais e chegando à perda da cidadania de um indivíduo e de um grupo.  Este grupo de pessoas encontra-se dentro do sistema, mas como "inúteis sociais", sem direitos e sem cidadania.
Podemos afirmar sem ressalvas, que uma grande maioria dos casos de exclusão social no Brasil tem como fundamento a explicação, como foi exposta acima, com base na questão da crise do mercado do trabalho. No entanto, não podemos esquecer de grupos que são excluídos, e que a base fundamental desta exclusão podem ser aspectos étnicos, de gênero, de religião, de raça, de doença, de idade, dentre outros. Claro está que, estas questões quando somadas as expostas acima, como o desemprego, os baixos salários, a perda de vínculos sociais e a falta de um sistema de proteção social adequado fica bastante agravada, entrando na trajetória de perdas, como já foi explicitado acima. Nesta perspectiva, a noção de cidadania transcende a noção de divisão de classes ou do simples acesso, "... o que está em jogo é o direito de participar na própria definição deste sistema (...), a invenção de uma nova sociedade". (Dagnino, 2000: 87), que requer um novo formato social e um processo de aprendizagem social, para que possamos aprender novas formas de relação com os diferentes, que têm direitos a terem direitos, e a lidar com as diversidades sociais tão presentes no nosso país pelo nosso próprio processo histórico. É desse processo democrático que pretendo discutir a seguir, para em seguida abordar a questão da infância excluída.

Inclusão/exclusão X democracia:

 Pelo que foi exposto acima, para uma maior aproximação do entendimento do processo exclusão/inclusão social a qual nos referimos, devemos contextualizar historicamente a situação na sua complexidade, para que possamos entendê-la com sua amplitude social e individual. Para tanto, faremos uma breve discussão a respeito do processo de democratização devido a sua relação direta com a participação ou não, dos indivíduos, nos bens produzidos socialmente.
A democracia foi uma das grandes aspirações do século XIX e uma das grandes conquistas do século XX, muito embora haja controvérsia quanto a sua qualidade e legitimidade.
Podemos afirmar que, a partir da 2ª Guerra Mundial, vários países conquistaram a democracia. O mundo, neste momento, está dividido em dois blocos: o socialista e o capitalista. A esquerda socialista estava composta, dos Marxistas ortodoxos, dos Sociais Democratas e dos Anarquistas. A Socialdemocracia foi a tendência política socialista que se propunha a disputar e assumir o poder dentro de uma sociedade capitalista. A medida em que se configura, no cenário mundial, alguns Estados sociais-democratas, segundo Boaventura S. Santos (2002), estabelece-se uma certa tenção entre capitalismo e democracia, pois está última sugere uma distribuição dos bens sociais, colocando, desta forma, certos limites à acumulação privada característica das sociedades capitalistas. No entanto, tal tensão não abala os princípios fundamentais da Revolução Francesa. Em contra partida para os socialistas ortodoxos, assumir o poder só seria possível através da revolução socialista, ou seja, democracia e capitalismo são incompatíveis devido a uma premissa básica: a relação entre a acumulação de capital e o trabalho, e consequentemente, a divisão de classes em burguesia e proletariado.
Faz-se importante esclarecer aqui, que para os intelectuais de esquerda deste momento histórico, metade do século passado, principalmente para os sociólogos e para os cientistas políticos, era teoricamente incoerente falar em "exclusão" e "cultura". O primeiro "pelo fato de se considerar que na sociedade não existe 'sobra', mas explorados." (Boneti, 2000: 14), e o segundo porque "a cultura, especialmente a popular, era o domínio da alienação, da falsa consciência e da mistificação; em suma, o reino da ideologia." (Dagnino, 2000: 63). Sendo, neste momento, deixado de lado a discussão destas duas categorias, que a meu ver, serão fundamentais no entendimento do processo de exclusão, no sentido referido acima, e conseqüentemente, no processo de exclusão escolar.
Por volta das décadas de 70 e 80, com o fim da Guerra Fria, com a globalização da economia, com o do desmonte gradativo dos Estados totalitários na América Latina e com o resgate do processo democrático, ainda que representativo, a sociedade civil ganhou um novo espaço de organização política. Surgem os movimentos sociais organizados que resgatam antigos movimentos e trazem novos elementos ao cenário das lutas sociais, que quando somando a toda a conjuntura, exigiu da esquerda uma nova leitura da realidade que não a determinada somente pela divisão de classes (burguesia e proletariado). Está mesma democracia representativa, que faz emergir a organização social, exclui, do processo político formal, os grupos culturais minoritários (mulheres, negros, homossexuais, dentre outros), que, por serem minoritários, não conseguem, pelo voto, representação política. Dizendo de outra forma, com este formato de democracia, estes grupos ficam excluídos da esfera política e consequentemente os direitos sociais acabam por não contemplar aspectos específicos de tais grupos. Para Boaventura de Souza Santos (2002), "os movimentos sociais estariam inseridos em movimentos pela ampliação do político, pelas transformações das práticas dominantes, pelo aumento da cidadania e pela inserção na política de atores sociais excluídos". Portanto, podemos concluir que, tais formas de organização social, somada a toda a conjuntura econômica, demandam a superação da democracia representativa, típica das sociedades democráticas capitalistas, assim como, do ortodoxismo da esquerda socialista na leitura da realidade, e sugere, desta forma, a tentativa de novas experiências democráticas.  Aqui no Brasil há algumas tentativas de ampliação da democracia com combinações entre elementos da democracia participativa e da democracia representativa como, por exemplo, as experiências do orçamento participativo em Porto Alegre e Belo Horizonte.
É neste sentido, dentro da discussão da legitimidade ou não das democracias dentro das sociedades capitalistas, que a noção de cidadania "emancipatória" transcende a noção de divisão de classes ou do simples acesso, "... o que está em jogo é o direito de participar na própria definição deste sistema (...), a invenção de uma nova sociedade". (Dagnino, 2000: 87), que requer um novo formato social e um processo de aprendizagem social, para que possamos apreender novas formas de relações com os "diferentes", que têm direitos a terem direitos, e a lidar com as diversidades sociais tão presentes no nosso país pela nossa própria história. Parafraseando Boaventura de S. Santos, esta noção sugere a mudança de uma gramática social excludente, para uma outra includente.
No entanto, estes ensaios democráticos emancipatórios, ainda que de fundamental importância para os processos de transformação das sociedades, são iniciativas que fazem parte de uma pequena parte e não do todo. O final dos anos 70 e início dos anos 80 é marcado pelo processo de redemocratização do nosso país, com a anistia dos refugiados políticos e o restabelecimento de eleições diretas para Presidente da República. Não obstante, neste mesmo período, mergulhamos no lodo de um liberalismo exacerbado caracterizado pela minimização do Estado e por uma extrema dependência econômica ao mercado financeiro internacional. O clima que impera neste momento histórico no Brasil é o de democracia, até pela proximidade de seu oposto vivido sofrivelmente, por toda sociedade brasileira, no momento próximo anterior.
Na visão bem humorada de Chico Alencar esse momento apresenta-se da seguinte forma na história do nosso país:
... veio a Nova República de Tancredo-Sarney, filha bastarda do Brasil bonito das Diretas Já. E a República 'moderna', da inserção globalizada e do ajuste neoliberal, fundada por Collor, o Breve, brecada no embate estratégico do jogo rápido apitado por Itamar, e retomada, com pompa e circunstância, por FHC (2003: 57).
Pela brevidade do artigo não me deterei a discussão da política Neoliberal propriamente dita, apenas cito-a e sua interferência na educação, que é o que nos interessa aqui. O Estado mínimo liberal vê nos serviços públicos como educação, saúde e previdência, um recurso a mais para o mercado de capitais, defendendo, pois, uma política de privatização desses serviços.
A educação, que vem num processo histórico, da nossa sociedade, como um dos responsáveis pela determinação e manutenção das desigualdades sociais e conseqüente exclusão da escola, neste momento de "redemocratização", sob as influências do liberalismo, assume também para o Estado o caráter mínimo, ou seja, as escolas são mantidas em condições de precariedade extrema e há o incentivo, direto ou indireto, à educação privada. Os educadores são mantidos com salários que os obrigam a um terceiro turno de trabalho. Os materiais didáticos são de má qualidade e em pouca quantidade. A estrutura física da escola degrada-se. As políticas públicas quando apresentam algum avanço em defesa da escola pública, de qualidade e para todos, não são cumpridas, em fim, há um total descaso com a educação pública de uma forma geral. Por outro lado, há um forte incentivo ao processo de privatização da educação, como já foi afirmado anteriormente, entendendo, desta forma, a educação como mais um recurso de capitalização para a economia capitalista. A escola pública vai adquirindo no senso comum um significado de má qualidade e todos almejam a escola particular.
É nesta perspectiva, que discutiremos a partir de agora, o processo de exclusão/inclusão na escola pública na infância, mais precisamente, na segunda infância, que é quando inicia formalmente a idade escolar.

Inclusão/exclusão na segunda infância:

A criança, na fase da segunda infância, que compreende aproximadamente dos 07 aos 11 anos de idade, entra no que se costuma chamar de idade escolar e ela, geralmente, começa a freqüentar a escola nesta fase. Até porque na legislação brasileira, nesta idade, é um direito, garantido por lei, da criança, freqüentar o contexto escolar com vistas à continuidade do seu desenvolvimento psicomotor e intelectivo e por conta da sua socialização. A escola é o segundo contexto social da qual a criança faz parte, se considerarmos que o primeiro é a família. A questão é de que forma a escola pública tem contribuído no processo de exclusão/inclusão da criança que a freqüenta?
Outro dia ao estar numa Escola Estadual; eu como psicóloga e uma colega como pedagoga, prestando um assessoramento à equipe da escola (diretora, pedagoga e professora) em virtude de um aluno com distúrbio de condutas; caiu um temporal de verão que durou não mais do que 15 min., mas, que foi o suficiente para inundar a sala da supervisão pedagógica, onde nos encontrávamos trabalhando, e a escola quase toda: os corredores, as salas de aula, o refeitório. As professoras nas salas de aula continuavam dando aula no meio das goteiras e nós continuamos nosso trabalho, como se nada estivesse acontecendo, a única modificação foi que se desfez aquela formação secular de uma carteira atrás da outra para que se desviassem das goteiras e havia baldes e panos por toda escola.
Esse exemplo serve para ilustrar as inúmeras situações de precariedade da escola pública e a capacidade da grande maioria das educadoras em normalizar umas situações absurdas, que reflete a falta de respeito, a falta seriedade e o descaso, consigo mesma, enquanto profissionais de educação, e com as crianças. Pablo Gentilli nos diz que:
A 'normalidade' torna os acontecimentos visíveis, ao mesmo tempo em que a 'normalidade' costuma ter a capacidade de ocultá-los. O normal torna-se cotidiano. E a visibilidade do cotidiano se desvanece (insensível e indiferente) como produto de sua tendencial naturalização (2003: 29).
Podemos concluir, portanto que, inundações, dentro desta escola, em dias de chuva, tornou-se um fato natural e cotidiano para as crianças e para as educadoras.
Ainda segundo o mesmo autor supra citado, há "escolas pobres para pobres e ricas para ricos." (2003: 37) Quando detenho-me a observar a estrutura física, os recursos pedagógicos e a remuneração das educadoras, fica bastante claro a lógica da pobreza para os pobre e da riqueza para os ricos. Contudo, quando me detenho a observar o conteúdo dos "conteúdos pedagógico" e a metodologia, não percebo grandes diferenciações entre as escolas dos pobres e as escolas dos ricos. Melhor dizendo, entre as escolas públicas e as privadas ensina-se os mesmos conteúdos com base na mesma realidade social, neste aspecto a escola é a mesma. Os livros didáticos muitas vezes são os mesmos, exceto no caso das escolas particulares que usam o sistema de apostilas, assim como a metodologia de ensino, em termos gerais, é a mesma. Segundo Boneti, "O procedimento didático na escola deixa claro que seu papel é fazer com que os sujeitos sociais tornem-se homogêneos em torno de um padrão referencial." O mesmo autor afirma ainda que "é necessário estudar um conteúdo básico" e que "em seguida aplica-se um teste para ver se os alunos conseguiram atingir esse padrão de referência." (1988: 41)
Pode-se concluir que, embora haja uma diferenciação entre uma escola e outra, ou seja, na escola privada (para ricos) não é normal goteiras por toda escola, por exemplo, como parece ser na escola pública, se adotarmos nosso exemplo como referência, há uma intencionalidade ideológica em igualar (homogeneizar), através dos conteúdos e dos procedimentos didáticos. Cabe recordar que o igual não é necessariamente a maioria, mas estará incluído. E o diferente, embora possa ser a maioria num determinado contexto, são os excluídos. Desta maneira fica subentendido o papel da escola, num Estado liberal mínimo, "onde cabe ao Estado apenas três funções: ação policial, justiça e defesa nacional". (Boneti, 1988: 28), ficando à assistência à população sujeita a iniciativa privada. O que é público é sucateado e as normas de prioridades são ditadas pelos agentes internacionais.
A criança brasileira, de família pobre, aos sete anos de idade aproximadamente, vai para a escola pública, e da sua construção do conhecimento faz parte por um lado, a normalização de situações de descaso com a educação pública e com ela própria, e por outro, a intencionalidade em torná-la um sujeito igual.
O que ela vai encontrar, portanto, é uma escola tão carente quanto ela, mas que contraditoriamente vai confirmar a sua desigualdade. Isso ocorre por que a escola não contempla a sua realidade subjetiva e não lhe contempla enquanto um sujeito em formação, com sua história, seus valores e crenças e com os seus significados de mundo. Esta escola refere-se a uma outra representação social do mundo que não a sua.
Segundo Angel Pino, "é a significação que tem o poder de converter o fato natural em fato cultural" (2002: 55) e mais adiante o mesmo autor vai afirmar que a "... educação não é um mero 'valor agregado' a pessoa em formação. Ela é constitutiva da pessoa. É o processo pelo qual, através da mediação, o indivíduo internaliza a cultura e se constitui em ser humano." (2002: 57). Falando de outra forma, a educação, nesta perspectiva, humaniza o ser humano, introduzindo-o na cultura e na história da sua comunidade.
Diante desta realidade escolar, fica difícil para a criança sentir-se identificada com os conteúdos pedagógicos apresentados, mas, por outro, lado pode identificar-se com o empobrecido contexto escolar. Certamente sua realidade, seus valores, suas crenças, seu cotidiano, em fim, sua cultura, não estão representados nos livros didáticos e nem são reconhecidos pelas educadoras, mas sua realidade concreta de carências muitas vezes é a realidade concreta da escola. O vínculo pedagógico que se estabelece com a professora e com a escola, nestas condições, está sob tais interferências. Desencadear, nela mesma, a construção de tais conhecimentos é quase uma violência a si própria. Com isso, embora se possa afirmar quantitativamente que o acesso à escola pública está facilitado, como nos confirma os dados do "Atlas da exclusão no Brasil - 2, isso não significa necessariamente que o simples acesso desencadeie um processo de inclusão escolar. Ao contrário, nestas condições a escola pública acaba realizando o que Gentilli chama de "inclusão excludente". Vemos tal fato no reflexo direto da violência na escola pública contra a escola e contra as educadoras quando, por exemplo, "E."; um menino de 11 anos, filhos de catadores de papel, residente numa favela urbana de Curitiba e que o seu cotidiano é, por exemplo, não ter o que comer em casa; cospe na cara da professora e a manda "tomar no cu". Não que eu seja a favor da forma inadequada como ele se expressa, absolutamente. Na verdade a sua ira, se bem encaminhada, poderia fazer dele um agente de transformação da sua realidade e da realidade da sua comunidade, mas, diante de tamanha agressão que ele sofre parece que ele mesmo fica sem opção. Este menino, por exemplo, está excluído da escola, freqüenta uma escola especializada para distúrbio de condutas.  Notamos que, para a vida infantil, a escola tem sido o principal contexto onde têm aflorado as contradições sociais com violência e a escola acaba exercendo pelo menas duas categoria de exclusão: uma pela evasão escolar propriamente dita e outra por deixar claro à criança a sua diferença, reforçando, desta forma um padrão já vivido por ela e sua família socialmente.
É esse padrão, familiar e social/escolar, que é então introjetado pela criança e que fará parte da formação da sua identidade enquanto ser adulto.

REFERÊNCIAS

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FERREIRA, A B. H. Novo dicionário da língua Portuguesa, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2ª ed, 1986.
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SANTOS, B.S. & AVRITZER, L. Introdução para ampliar o cânone democrático. In: SANTOS, B.S. Democratizar a democracia: os caminhos da democracia participativa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002
WANDERLEY, M.B. Refletindo sobre a noção de exclusão. In: SAWAIA, B. (org.), As armadilhas da exclusão: análise psicossocial e ética da desigualdade social. Petrópolis: Vozes, 1999, p. 16-26.

Psicóloga, graduada pela Universidade Federal do Paraná; Especialista em Educação Inclusiva pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná e Mestranda em Educação na Universidade Tuiuti do Paraná. O presente trabalho foi realizado com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq - Brasil.

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A REEDUCAÇÃO DO ADULTO NO TRABALHO


Precisamos urgentemente superar nossa crise de percepção. Nossa percepção da realidade é estabelecida de forma fragmentada, a partir da concepção de um mundo mecanicista, porque embasado em teorias científicas concebidas no século XVII que – se hoje não estão superadas – já foram reavaliadas e aprimoradas pela própria Ciência. Este trabalho constitui uma reflexão sobre a alienação generalizada existente nos dias de hoje, com foco sobretudo na alienação do ser humano em relação ao trabalho. Considerando que a principal causa desta alienação está na ênfase dada, em nossa cultura, ao pensamento racional – o qual, a  partir da divisão cartesiana entre mente e matéria, difundiu uma visão separatista da realidade, disseminando práticas e saberes fragmentados - desenvolve-se, neste estudo, uma análise crítica  dos sistemas de valores e crenças adotados e de suas conseqüências no cotidiano das pessoas e das organizações. Com base nessa análise, é apresentada uma proposta para fundamentar uma nova pedagogia, voltada para a reeducação de adultos no trabalho, a partir de conceitos oriundos de novas teorias científicas (teoria da relatividade, teoria quântica, teoria do caos e complexidade e teoria dos sistemas vivos) e de uma prática transdisciplinar (integração entre ciência, filosofia, artes e tradições). Através  do aprendizado coletivo e do compartilhamento de visão, e ainda da revisão de valores e crenças com vistas ao desenvolvimento de uma nova percepção da realidade, o trabalho adota um mesmo referencial – uma ética a ser esclarecida -, na indicação de um caminho para a reunião dos fragmentos e a criação de um mundo interdependente e orgânico.         

Palavras-chave: adulto, trabalho, reeducação,

Introdução
A condução de processos humanos se dá, às vezes, de forma consciente,  porém de forma inconsciente, na maioria das vezes. Uma visão compartilhada e o aprendizado coletivo ocorre, da mesma forma, consciente ou inconscientemente, durante a condução de um processo.
    Tendo em vista a inclinação do ser humano para a autoconsciência, desde sempre – ao menos desde que começou a ser denominado de humano – este começou a estabelecer suas associações em função de uma dada percepção da realidade. Ao ter as mãos livres, ao assumir a postura bípede e ao olhar à frente, utilizando-se de identificações visuo-motoras – imitando e criando a partir do que vê -, desenvolveu a sua compreensão do mundo.
Assim o ser humano  começa a desenvolver o pensamento  e enquadrar o seu em torno nesta nova forma  de processar suas sensações, intuições e sentimentos, e formata sua percepção e respectivos valores. O pensamento culmina em crenças que, ao serem adotadas, determinam uma visão de mundo, considerando-se o conhecimento possível em cada estágio da  evolução humana.
Dizendo de outra maneira, a sensação e a intuição de algo, que diz da sua existência e possibilidades, levam a uma percepção de como se dão as coisas. Em decorrência da emoção gerada resulta um sentimento que mostra o valor desse algo. A percepção e os valores levam a um pensamento, que revela o que é esse algo, determinando as crenças adotadas por uma cultura, as quais implicam uma visão de mundo, a partir da qual se desenvolvem ações sobre a realidade externa. A realidade externa transformada realimenta a percepção, estabelecendo um ciclo retroalimentado.

 
    Cada novo ciclo é dobrado sobre o ciclo anterior e assim, de dobramento em
dobramento, cumulativamente, constrói-se a cultura humana. Porém, cabe salientar que este processo se dá a partir do posicionamento de individualidades, de crenças individuais, nos seus diferentes graus de influência, na composição de condutas coletivas. Portanto a condução dos processos humanos é de responsabilidade do ser humano, na sua individualidade, de uma forma completamente singular, que de acordo com uma identidade/essência , quer seja (de novo)  consciente ou inconscientemente, determina uma direção para o processo.
Torna-se fundamentalmente importante ter consciência, a mais ampla possível, da posição que o indivíduo se encontra,  e a partir desta - um ponto totalmente singular - conceber os possíveis caminhos para a construção de uma totalidade, que, ao se dobrar sobre as individualidades, estabelece um outro ciclo retroalimentado, sintetizado pelo dito “o homem faz a história e a história faz o homem”.

Justificativa

    A série de crises com que nos defrontamos atualmente, tanto as pessoais,  as ambientais, assim como as sociais e as organizacionais, apontam para uma necessidade urgente de se trabalhar a educação de adultos, partindo do pressuposto que são estes os agentes responsáveis pela construção do processo social e pela preparação desta mesma sociedade para acolher as gerações futuras.
    A transformação social, almejada por muitos, em direção a uma sociedade mais harmoniosa, solidária e satisfatória, exige uma nova proposta educacional no sentido de ampliar a percepção da realidade e do desenvolvimento do “ser humano total”,  resgatando o seu compromisso com a ética e sua responsabilidade com a vida.
    Uma nova pedagogia, visando a reeducação de adultos, faz-se necessária, tendo em vista a alienação generalizada que se instaurou na sociedade moderna,  nas relações do homem com o trabalho, do homem com os outros homens e do homem consigo mesmo.
    O atual estado de alienação do homem em relação ao trabalho acentuou-se, no transcorrer da história ocidental, com a modificação do sistema de produção de bens que passou do artesanato para o sistema de manufaturas. Em meados do século XVIII, com uma série de inovações técnicas, sociais e econômicas, a ascensão da burguesia e o capitalismo são fortalecidos culminando na Revolução Industrial. No decorrer destas transformações o sistema produtivo passa a ser caracterizado em níveis crescentes pela divisão do trabalho, que se dá naturalmente pela expansão do mercado, o que fez com que   o homem começasse a trocar o excedente do seu trabalho pelo excedente do trabalho de outros homens, acabando por desenvolver tarefas e habilidades específicas.
    Com o surgimento das grandes fábricas, faz-se a passagem do artesão para o operário ; enquanto que o primeiro mantinha uma plena identificação com o seu trabalho, fazendo-o do inicio ao fim, o operário perde esta identificação; fazendo somente parte do trabalho submete-se aos desígnios  do empregador.    O detentor do capital, aliado à crescente utilização de tecnologia e máquinas, define as formas de organização do trabalho impondo uma heterogestão sobre o trabalhador que, com a divisão do trabalho, não percebe mais o alcance do mesmo. O trabalhador fica então alienado em relação ao seu trabalho, transferindo, basicamente, a sua motivação para a remuneração recebida, ficando alheio ao processo produtivo e às demais relações advindas do trabalho em si.
    O problema da alienação do homem em relação ao trabalho está inserido num contexto mais amplo, que leva a uma análise da alienação do homem em relação a si mesmo, com os outros e com o mundo como um todo. O início do movimento que nos traz este sentimento de alienação, dos dias de hoje, remonta aos primórdios da história das civilizações, a partir da distinção entre o plano das idéias e o mundo da experiência dos sentidos , na filosofia de Platão, e passando pelo cristianismo, que valorizou a alma em detrimento do corpo. Portanto, o entendimento que se estabelece é o da mente, entendida aqui como tudo aquilo que é imaterial, separado do corpo, ou seja, da matéria.   
    A separação entre mente e matéria é reforçada incisivamente no início da Era Científica, em função do racionalismo da filosofia de René Descartes (1637), sintetizada pela máxima “penso, logo existo”. Esta separação entre mente e matéria leva Descartes a ver a natureza como uma máquina de relógio, composta de peças isoladas, que juntas determinam o funcionamento do todo. Por sua vez, esta concepção mecanicista do mundo serve de base para o desenvolvimento da física de Isaac Newton (1687) que, através de uma completa formulação matemática, fundamenta o pensamento científico, passando a influenciar todas as demais ciências que começam a surgir.
O sistema de valores que se desenvolveu nos séculos XVII e XVIII, com as novas ciências, baseadas na física newtoniana, resulta no que se denominou de Iluminismo, tendo no filósofo John Locke (1690) um de seus maiores representantes. Fortemente influenciado por Descartes e Newton, Locke desenvolve estudo sobre a natureza do ser humano individual,  utilizando-se da concepção atomicista, extrapolando-a para as relações sociais, com o que vem a influenciar a forma do pensamento ocidental através dos ideais de individualismo, direito de propriedade, mercados livres e governo representativo.   
    A Revolução Científica e o Iluminismo levam a uma visão materialista e antropocêntrica do mundo que se contrapõe à visão espiritualista da Idade Média, fazendo com que a mente se concentre na matéria; aprisionada no corpo perde sua ligação com o divino. A mente passa a ser vista como totalmente dependente da matéria e isolada no corpo. Juntamente com esta visão materialista desenvolve-se a mentalidade capitalista moderna, baseada na propriedade privada e na acumulação de bens, de matéria. Como a mente só se reconhece na matéria, mas lhe é superior, resulta no domínio do ter - verbo representativo do capital -, sobre o fazer - verbo representativo do trabalho -, subjugando o ser – verbo representativo da ação do trabalhador. Sob estes pressupostos estabeleceu-se uma visão fragmentada da realidade determinando uma fragmentação do saber, assim a percepção humana passou a ser a das partes, todas isoladas umas das outras, refletindo na alienação do homem em relação a si mesmo, à sociedade e ao meio ambiente.
    A fragmentação, o individualismo e a valorização da propriedade privada, foram muito adequadas e úteis à revolução industrial e à ascensão do capitalismo. A propriedade privada passou a ser um direito do indivíduo ao invés de um bem de uso comum. Assim, o individualismo se tornou dominante na cultura ocidental, levando a uma busca incessante pela propriedade e pela acumulação de bens, de matéria, dando uma conotação imediatista ao conjunto da sociedade, na satisfação e atendimento aos direitos do indivíduo na sua busca obsessiva pelo crescimento econômico.
    Com a Revolução Industrial, na busca pelo crescimento econômico, desenvolveu-se a tecnologia que vem a reforçar o domínio do material sobre o humano. O homem passou a ser visto como uma máquina - devia estar bem ajustado ao sistema de produção industrial -, uma engrenagem a serviço do crescimento econômico e tecnológico, porém, pretensamente remunerado de forma que poderia almejar a acumulação de bens e a aquisição da casa própria, sendo levado a um consumismo exacerbado e perdulário, o que possibilitaria a manutenção do sistema produtivo.
    A tecnologia  tornou-se alvo tanto para o indivíduo como para o sistema econômico e mais ainda, passou a ser vista como determinante do sucesso das organizações humanas e da felicidade das pessoas.
    Uma ética capitalista estabeleceu-se, colocando o individual acima do social, utilizando-se do ambiente público para fins privados.
    As cercas colocadas nas terras de propriedade privada geraram cercas mentais que isolaram o hemisfério esquerdo do cérebro humano do hemisfério direito, impedindo o livre trânsito da percepção lógica em comunhão com a percepção intuitiva. Isolado, o hemisfério esquerdo assenhoreou-se da verdade e impôs as suas regras ao convívio social, o que levou a cultura ocidental a erigir alguns mitos: a propriedade privada, o consumo e a acumulação de bens materiais; endeusando o dinheiro privilegiou o ter em relação ao ser, e fomentou o separatismo entre mente e matéria, entre o eu e o outro, que se encontram apenas, na maioria das vezes, através de uma relação eminentemente material, uma relação entre coisas.
    As relações entre indivíduos, que se percebem isolados uns dos outros, levou  cada um a buscar ter poder sobre o outro, o que enfraquece a ambos, privilegiando uma relação de mercado  em detrimento das relações humanas - uma sociedade baseada em metas que nada têm a ver com a emancipação humana. Foram estabelecidas relações entre coisas, entre um, o sujeito, e o outro, o objeto. Assim a sociedade - o sujeito - trata o ambiente - o objeto -, do mesmo modo como trata o indivíduo, também como objeto, numa relação cíclica recorrente, ou seja, um ciclo de influências que se retroalimenta consecutivamente.
    O espaço que cerca ou envolve os seres vivos, no caso os seres humanos, implica num modo de agir e numa maneira de ser que acaba por desenvolver juízos de apreciação quanto à conduta humana, o que leva um conjunto de pessoas a seguirem normas comuns e unirem-se pelo sentimento de consciência do grupo. A sociedade formada atua no ambiente, transformando-o, o que por sua vez leva a alterações dos padrões éticos, os quais vêm a influenciar na estruturação da sociedade. Este desenvolvimento se dá em ambos os sentidos simultaneamente e traz consigo todos os movimentos anteriores, definindo as tendências a serem seguidas, porém incorpora possibilidades de descontinuidade, com saltos para novos patamares, caracterizando uma evolução como em espiral. Dizendo de outra maneira, na interação com o ambiente, o indivíduo se faz determinando o seu comportamento ético, retroagindo sobre o próprio ambiente e estabelecendo, simultaneamente, relações sociais, que por sua vez retroagem sobre os indivíduos e também simultaneamente transformam o ambiente. Uma ordem  é estabelecida nestas interações, as quais produzem organização, mas também produzem desordem, sendo esta última caracterizada pelas diversas doenças dos nossos dias, tanto humanas, como sociais e ambientais.
    Não seriam as doenças humanas, como o elevado índice de stress do cotidiano, o crescente consumo de drogas, a grande ocorrência de suicídios inclusive entre crianças (como pode uma espécie levar ao suicídio seus próprios descendentes?), uma pressão para romper o ciclo no atual patamar, promovendo condições que possam levar a um salto na espiral, possibilitando uma auto-reorganização das relações humanas? Também o elevado crescimento de doenças sociais, como o desemprego, a corrupção desenfreada, a criminalidade e a miséria apresentam-se como estados resultantes da entropia do sistema. Mas principalmente as doenças ambientais: elevação da temperatura média da terra pelo efeito estufa, materiais tóxicos descarregados no meio ambiente, buraco na camada de ozônio, poluição do ar e das águas, uso indiscriminado do solo, entre outros, que estão gerando uma grave deterioração do meio ambiente natural, poderão vir a ser o motivo para uma descontinuidade do atual ciclo.
    Todos estes fatores parecem estar predestinados a tornarem-se a gota d'água que levará à necessária tomada de consciência quanto à conduta predadora do homem; homem este que acabou por colocar todo o conhecimento adquirido nas mãos de entidades abstratas – o mercado e as tais sociedades anônimas -, delegando a sua autoridade às instituições, transferindo a sua responsabilidade para ninguém.
    O conhecimento e as relações humanas desenvolveram-se dentro dessa visão materialista separatista ocasionando uma total fragmentação do saber e um grande isolamento do viver.

Propósito


    Para superar a visão fragmentada que separa mente e matéria, faz-se necessária uma nova pedagogia, centrada nos conceitos do que se pode chamar hoje de nova ciência ( Teoria da Relatividade, Teoria Quântica, Teoria do Caos e Complexidade e Teoria dos Sistemas Vivos) e em uma prática transdisciplinar. O entendimento do que seja esta nova ciência é dado pela mudança que ocorre no início do século XX; em consonância com o jogo entre  ordem e  desordem, surge dentro da própria física, a mesma que promulgava a ordem absoluta na natureza e no universo, uma desordem que se contrapõe às verdades estabelecidas. A formulação da Teoria da Relatividade e da Teoria Quântica, promovendo uma descontinuidade e  auto-reorganização na sua área de abrangência, revogam princípios da visão de mundo da física newtoniana em aspectos tais como: noção de espaço e tempo absolutos, partículas sólidas como elementos mínimos da matéria, matéria como substância fundamental da realidade. Com isto se opõem à divisão cartesiana entre mente e matéria. A partir da   comprovação  da  inexistência   de objetos sólidos, isolados, no nível atômico e subatômico constata-se que as partículas não  têm  existência  independente das suas inter-relações - elas coexistem na dualidade onda-partícula, fazendo  prevalecer as relações sobre os objetos em si. A concepção newtoniana de matéria, constituída como por bolas de bilhar, isoladas e indivisíveis, passa na concepção quântica para a de relacionamentos sinérgicos onde o resultado do todo é maior do que a soma das partes isoladamente.
    Outra consideração importante a ser destacada, nesta nova concepção, é a de que o observador influencia o fato observado. Uma observação implica uma relação entre o fato observado e o observador em si; levando em consideração que são as relações que dão sustentação para a matéria, o observador estará influenciando diretamente na matéria, tendo em conta a dualidade mente-matéria, ou seja, onda-partícula.
    Até aqui, pode-se concluir que a realidade material, e também a social,  emerge  dos nossos relacionamentos, o que implica que a forma de uma pessoa  colocar-se frente a uma situação irá determinar os resultados desta situação.
    A evolução de uma sociedade, inclusive na sua vertente econômica, está ligada intrinsecamente às crenças e ao sistema de valores adotados, que irão nortear os relacionamentos de seus membros. As organizações, quaisquer que sejam, estão inseridas num contexto social e seus relacionamentos internos seguem os mesmos padrões da cultura predominante.
    Para alcançar a transformação desejada, faz-se necessária uma reversão dos valores, calcados na separação entre mente e corpo, para promover a junção quântica entre onda e partícula, mente e corpo. Assim, a ênfase passa para os relacionamentos entre as individualidades, valorizando o trabalho - o fazer -, promovendo o trabalhador - o ser -, resultando como valor de uso o capital - o ter.   
     Deixando os conceitos clássicos da física newtoniana, assumindo uma visão quântica, pode-se chegar a esta transformação, sendo, porém, necessária a capacitação e qualificação de seus atores, o que demanda todo um novo processo de aprendizagem. Aprendizagem esta que suscite a implosão do capitalismo/neoliberalismo, ao estabelecer os parâmetros para uma revolução existencial (de consciência), direcionada para a construção de uma sociedade de  relacionamentos quânticos.
    O caminho, pois, é o da educação através de uma pedagogia que se contraponha à ética capitalista, rumo ao verdadeiro socialismo, pelo questionamento não só da hegemonia capitalista, mas da própria visão materialista do mundo, que tem fomentado a adesão ao capitalismo. Esta nova pedagogia, baseada em valores e numa prática científica transdisciplinar - promovendo a reunificação dos fragmentos -, possibilita alterar a percepção da realidade pela integração entre ciência, filosofia, artes e tradições.
    A preparação dos atores para as novas relações sociais e de trabalho deve ser feita, necessariamente, através de um compartilhamento de visão e do aprendizado coletivo. Uma reflexão que, abrangendo os valores humanos, com a participação de todos os envolvidos, acabará por circunscrever a questão do amor, o que chamo de Administração pelo Afeto.
    A administração pelo afeto, tendo o caráter de uma filosofia afetiva, tem por objetivo eliminar a separação entre mente e matéria, razão e emoção, e promover a integração das potencialidades humanas, alinhando o pensamento, o sentimento, a sensação e a intuição, resgatando assim a espiritualidade esquecida - retirando da matéria a supremacia estabelecida retira-se a sustentação do capitalismo. Esta implementação  busca abrir caminhos para reverter a alienação do trabalhador em direção à motivação para o trabalho em si. Ao estabelecer o caminho do afeto para a administração visa dar uma cara humana às organizações e resgatar a autonomia dos indivíduos, devolvendo às pessoas o lugar de protagonistas da história, salientando a sua responsabilidade quanto a sua atuação local e diária dentro das organizações, conscientizando-as  de sua importância na reorientação dos rumos da humanidade.   
A conseqüência desta mudança de paradigma, da “realidade newtoniana” para a “realidade quântica” implica em um novo saber, novo saber este que se opõe à cultura do “eu” e do “meu”, à “ética” capitalista calcada no "ter". Propõe uma ruptura em relação ao individualismo, em direção a uma nova percepção do homem em permanente interação com o que o cerca (e não com as cercas da propriedade privada); o homem passa a ser os seus relacionamentos. O "eu" e o "outro", sujeito e objeto mantêm relações "íntimas", de interdependência, onde não existe separação, isolamento; um dando origem ao outro, formando uma totalidade indivisível.
    A Teoria dos Sistemas Vivos, implica em permanente troca entre individualidade e totalidade, constituindo um ciclo recorrente. O que separa o indivíduo do todo é também o que une o indivíduo ao todo. A pele é o que separa o corpo do ambiente externo, sendo ao mesmo tempo a união entre um e outro; é exatamente pela pele que acontece a permuta entre interior e exterior.
    Os estudos desenvolvidos sobre a Teoria do Caos e Complexidade estimulam a idéia de um sistema caórdico, onde, uma vez alcançado certo nível de desordem em uma dada organização, dentro de parâmetros admissíveis que ainda permitam uma auto-referência, o sistema busca a sua auto-reorganização, dando um salto na espiral evolutiva, estabelecendo, nesse novo patamar, uma nova ordem.
    Imanência e transcendência, paradoxalmente as duas faces de uma mesma moeda, são características complementares dos sistemas vivos, que abertos e complexos, estão em permanente troca com o ambiente, interagindo com novas informações, numa relação de dependência e autonomia (interdependência). A complexidade traz à tona um mundo de paradoxos: ordem e desordem, partícula e onda, mente e matéria, interior e exterior, subjetividade e objetividade, individualidade e totalidade; é um dizer não à tirania do ou e saudar a genialidade do e; é o indivíduo (a ética) e a sociedade e o ambiente; é mais que simplesmente uma visão ecológica, é uma visão da ecologia profunda, que segundo Fritjof Capra é vista como:
A ecologia profunda é apoiada pela ciência moderna e, em especial, pela nova abordagem sistêmica, mas tem suas raízes numa percepção da realidade que transcende a estrutura científica e atinge a consciência intuitiva da unicidade de toda a vida, a interdependência de suas múltiplas manifestações e seus ciclos de mudança e transformação. Quando o conceito de espírito humano é entendido nesse sentido, como o modo de consciência pelo qual o indivíduo se sente vinculado ao cosmo como um todo, torna-se claro que a consciência ecológica é verdadeiramente espiritual. De fato, a idéia do indivíduo vinculado ao cosmo expressa-se na raiz latina da palavra religião, religare (ligar fortemente), assim como no sânscrito yoga, que significa união ¹.
    A posição do indivíduo, do ser, nesta trama de relações é de vital importância, pois tudo parte de uma percepção de si, porém não fixa no individualismo, e sim na individuação, ou seja, no conhecimento de si, do indivíduo em ação - a individualidade em ação na totalidade e a totalidade expressa na individualidade.
    O modo de agir, a maneira de ser, depende da consciência do indivíduo, que determina a sua intenção, e por sua vez promove um julgamento, culminando na sua conduta, e assim construímos os nossos valores
Precisamos urgentemente superar a nossa crise de percepção; percebemos a realidade fragmentada, formada pela visão de um mundo mecanicista/materialista; agora podemos conectar estes fragmentos e criar um mundo interdependente/orgânico.
Talvez estejamos no limiar de uma nova revolução, prestes a dar um salto quântico, para um novo patamar da espiral evolutiva, nos mesmos moldes do que acontece com o elétron, quando de uma forma descontínua salta de uma órbita para outra. Assim como, em meados do milênio passado ocorreu a passagem do sistema Geocêntrico para o sistema Heliocêntrico, podemos prever agora, ao iniciar um novo  milênio, uma nova ruptura, passando de um sistema Egocêntrico para um sistema Holocêntrico ou Ecocêntrico, onde a ênfase deixa de ser o indivíduo e passa para a totalidade, valorizando as relações entre as partes e não as partes em si.
A complexidade, privilegiando a conjunção e, propõe uma junção entre o ocidente e o oriente, a lógica  e a intuição. Portanto, nas atuais circunstâncias, em função do predomínio do ocidente, emerge a necessidade de minimizar a supremacia da lógica, buscando um resgate da intuição; o ter é lógico, concreto e objetivo, enquanto o ser é intuitivo, abstrato e subjetivo. Ser fazendo e fazer sendo promove a circulação e não a acumulação, a ética do fazer a serviço do ser e apenas como conseqüência ter.
Afinal,  a  questão ética se coloca  com toda a sua  relevância.   Mas,   que ética é esta? Em suma, que valores estão em jogo? Seria uma nova ética, um novo conceito oriundo de uma nova forma de pensar? Ou seria um resgate de algo originário ? É nesta segunda condição que o psicanalista João Perci Schiavon situa a questão ética: “O enunciado de Heráclito - ethos  anthropo daimon [o ético é o deus no homem] – já evocava um lugar anterior a todos os lugares, o divino no homem, a altura ou plano de onde se avaliam todas as coisas, a importância de cada uma, a precedência de uma sobre as outras.”²
Assim se contrapõe à concepção racionalista socrática/platônica – distinção entre o ãmbito das idéias e o mundo da experiência dos sentidos –, que, com Aristóteles, vincula a ética estritamente ao conceito de finalidade e dever, a partir de uma dada razão. Citando Schiavon:
A grande reversão nietzscheana e psicanalítica reside nisto: é justamente da vida que procedem todos os valores. Lacan indicou com precisão esse lugar, esse ethos antigo e absolutamente atual, ao assinalar a autonomia do desejo frente a lei. Se o desejo cria a lei, é porque a vida diz o valor, a vida aprecia, avalia, considera, e dela decorrem tanto os valores que a afirmam como aqueles que, secundários, reativos, a negam; tanto as confirmações quanto as oposições e as inversões – tudo procede dela, para o pior e para o melhor.²
     A vida é anterior à razão, é sensível, intuitiva, sentida e pensada, por isso não se restringe à lógica, apesar de ter a sua lógica. E assim, ética e vida estão intrinsecamente ligadas – o divino no homem e o valor dos valores - ao ponto de poder ser dito que  ser ético é ser favorável à vida - uma ética vital.
Então a nova percepção, a partir da visão quântica, sistêmica e complexa, embasada na ética vital, poderá fazer da trilogia afetividade-criatividade-felicidade, um novo ciclo retroalimentado, onde a afetividade atua na criatividade e na felicidade simultaneamente, assim como a criatividade na felicidade e na afetividade, e a felicidade na afetividade e na criatividade; todas estas interações acontecendo ao mesmo tempo. Esta trilogia, naturalmente, esta correlacionada aos valores humanos – como aspectos aos quais os seres humanos (saudáveis) dão grande valor -,  assim como à questão do amor, visto como qualidade afetiva que promove a criatividade  e resulta em felicidade.
O amor, por outro lado, tido como força ativa (de atração) é a própria afirmação, que dobrada sobre si mesma – dupla-afirmação -, coincide com a virtude da existência, a quinta das sete virtudes vitais – da ação, de integração, da superação, do movimento, da existência, do singular e do sentido -, apresentadas por Schiavon como pulsionais por estarem relacionadas  à pulsão de vida, as quais de uma forma cumulativa compôem a ética vital , conforme explicitado pelo autor.
O exercício das seis virtudes mencionadas, sendo um único e mesmo exercício, traz à luz a sétima virtude, que é a do sentido. Que a ação seja integrativa, que a integração seja superativa, que a superação se expresse como movimento e desprendimento, e que a consistência do processo inteiro dependa de uma segunda afirmação enquanto posição ética e existencial, tanto mais acentuada quanto mais singular, eis o que finalmente se traduz como experiência de sentido – vivo, real, unívoco, pulsional. É assim que a linha de força e a linha de sentido se reúnem numa linha única de força e de luz.³
Este pode ser o novo patamar da espiral evolutiva, após o salto quântico, estabelecendo  uma   nova   ordem,  fundamentada  nesta  ética  vital, ou,  a  ética  do  fazer com amor, que pressupõe o amor, mas não um amor individualista - somente ao redor de si mesmo -, mas um amor onda, que se transforma em amorosidade, um estado de amor, um amar o amor (dupla- afirmação).
E esse amor onda propaga-se na sociedade, alterando a noção de propriedade, não aquela que aprisiona, tanto o capitalista que quer mantê-la como o trabalhador que quer tê-la, mas a de uma propriedade sobre o uso apenas.
E esse amor onda propaga-se no ambiente, alterando a própria relação homem-ambiente, fazendo do ambiente a morada do homem.
E esse amor onda retorna ao homem, e o homem retorna-se onda-partícula, e  propaga-se vivenciando em plenitude os seus relacionamentos.

Notas:

¹Capra, F. O Ponto de Mutação. São Paulo: Cultrix.1982. p.403
²Schiavon, J. P. O Caminho do Campo Analítico. Curitiba: Travessa dos Editores, 2002, p.117.
³Idem, p.130
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Associação Arayara de Educação e Cultura  Consultor voluntário

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APRENDER, ENSINAR SEGUNDO OS FUNDAMENTOS PEDAGÓGICOS DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS – UMA PROPOSTA APLICÁVEL?

Objetivo nessa pesquisa verificar a aplicabilidade dos PCNs, Fundamentos Pedagógicos, no Ensino Fundamental. Norteiam esse estudo algumas questões e inquietações: que opções teórico-metodológicas e filosófico-politicas sustentam a proposta pedagógica presente nos PCNs? Que concepções de educação, de escola, de processo ensino-aprendizagem norteiam esta proposta? O professor do Ensino Fundamental está preparado e tem a formação adequada para efetivar as propostas sugeridas? Efetivarei um levantamento bibliográfico sobre os pressupostos teórico-metodológicos que os embasam quanto aos procedimentos pedagógicos. Buscarei Identificar a função social atribuída à escola e ao Ensino Fundamental no contexto brasileiro, a concepção de ser humano, de qualidade de ensino, neles subjacentes. Efetivarei uma análise comparativa entre a Proposta Curricular para o Ensino de História elaborada pela Coordenadoria de Ensino e Normas Pedagógicas, da Secretaria Estadual Paulista de Educação, ainda em implementação, e os PCNs. Dado o caráter nacional da proposta do governo Federal a ser adequado às especificidades locais, esse caminho de investigação pode se revelar instigador para verificar essa possibilidades e seus limites. Para esta análise buscarei embasamento nos pressupostos teórico-metodológicos do aprender e ensinar presentes nos trabalhos de Enguita, Ezpeleta e Rockwell, Freinet, Freire, Piaget e Vygotsky, visando desvelar seu significado na formação e na atuação de professores e alunos no contexto da sala de aula.

Palavras-chave: processo ensino-aprendizagem, formação doprofessor, Ensino Fundamental, PCNs, fundamentos pedagógicos.

Introdução

A pesquisa, ora apresentada, acha-se intrinsecamente ligada às minhas preocupações com a formação do professor e o processo ensino-aprendizagem no Ensino Fundamental.
A análise da aplicabilidade dos Parâmetros Curriculares Nacionais, Fundamentos Pedagógicos, justifica-se uma vez que serão implantados em todo território nacional e, num momento, em que o sistema educacional brasileiro tem sido alvo de constates críticas de setores ligados à educação e de camadas da população, bem como da mídia televisiva e escrita, evidenciando deficiências no ensino, na infra-estrutura das escolas e na formação do professor.
Na década de 1980 vários Estados procuraram elaborar Propostas Curriculares enquanto alternativas para a superação de alguns problemas teórico-metodológicos enfrentados no cotidiano escolar. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) conflitam com estas propostas? Significam avanço relevante nas suas proposições? Levam, de fato, em conta as peculiaridades e as construções sociais da escola enquanto produto das ações dos agentes envolvidos?
Outras questões e inquietações movem-me nesta pesquisa: que opções teórico-metodológicas e filisófico-políticas embasam a proposta pedagógica presente nos Parâmetros Curriculares Nacionais? que concepções de educação, de escola, de ensino norteiam essa proposta? as escolas possuem infra-estrutura adequada para se apropriar de forma efetiva e conveniente das alterações pedagógicas sugeridas? que limites e possibilidades as propostas pedagógicas oferecem para a aquisição de conhecimentos, atitudes e habilidades, relevantes para a formação do aluno do Ensino Fundamental? o professor do Ensino Fundamental está preparado e tem a formação necessária para efetivar as alterações sugeridas?
Responder a estas questões torna-se necessário ao se considerar que: cabe à escola propiciar condições para a sistematização e apropriação do conhecimento, desenvolver e aplicar técnicas capazes de permitirem essa aquisição; o Ensino Fundamental tem deixado de cumprir satisfatoriamente esses papéis e precisa ser repensado; o ensino de História deve possibilitar o conhecimento da realidade e permitir ao educando condições de nela intervir enquanto agente social; os professores devem organizar e conduzir o ensino com vistas a aprendizagens significativas. É necessário, portanto, aprofundamento de estudos capazes de revelar os entraves a efetivação desse ensino e propor alternativas de superação dos mesmos.
Neste sentido busco identificar as abordagens pedagógicas presentes nos Parâmetros Curriculares Nacionais, identificar os pressupostos teórico-metodológicos que o embasam, identificar o sentido e a significação atribuídos ao ensino-aprendizagem a ser efetivado no contexto da sala de aula.
    Apresento, nesse trabalho, resultados parciais dessa pesquisa.

Fundamentos Pedagógicos dos PCNs

Os PCNs formam um conjunto de diretrizes norteadoras dos currículos e de seus conteúdos mínimos. Atendem, dessa forma, à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996, que propõe a necessidade de uma formação comum para os alunos do Ensino Fundamental capacitando-os para o exercício da cidadania, para progredir no trabalho e em futuros estudos.
Foram pensados tendo em vista a superação das altas taxas de evasão e repetência, o baixo desempenho dos alunos e a interligação entre o processo ensino-aprendizagem e as condições infra-estruturais da escola, o número de estabelecimentos e vagas desiguais dentro dos próprios Estados ou municípios, os níveis alarmantes de pobreza, a formação do professor.
 Assim, além de uma formação inicial consistente, é preciso considerar um investimento educativo contínuo e sistemático para que o professor se desenvolva como profissional da educação. O conteúdo e a metodologia para essa formação precisam ser revistos para que haja possibilidade de melhoria do ensino. A formação não pode ser tratada como um acúmulo de cursos e técnicas, mas sim, como um processo reflexivo e crítico sobre a prática educativa. Investir no desenvolvimento profissional dos professores é também intervir em suas reais condições de trabalho. (P.C.N., 1997, p. 30-31).
Essas proposições, entretanto, não são acompanhadas de reflexões mais maduras e nem faz propostas de como romper o círculo vicioso da má formação de professores e alunos a não ser uma proposta curricular. Penso que sua implantação em todo país exigirá um longo período de assimilação e medidas pontuais no sentido de contribuir para o desempenho dos professores que já estão atuando, como Cursos de Educação Continuada e alterações significativas nos Cursos de formação de professores atendendo às exigências da L.D.B./96 e às condições locais dos espaços escolares onde deverão ser aplicados. A garantia da boa qualidade na formação de crianças e jovens é essencial uma vez que dela se espera a instrumentalização para a participação no processo democrático através de uma prática educacional adequada às necessidades sociais, políticas, econômicas e culturais da nossa sociedade.
Garantir estas condições, necessárias, no plano pedagógico não significa alterar significativamente a educação brasileira que está atrelada à sociedade que lhe dá sentido e contorno, definida por um sistema capitalista de produção não comprometido com essas mudanças. Nesse sentido, é preciso superar proposições meramente pedagógicas e pensar em práticas educativas possíveis de se efetivar no contexto objetivo das escolas e apontar para as possibilidades de transformações rumo a um viver cada vez mais humano e humanizador.  
Um aspecto marcante dos PCNs, seu objetivos fundamental, é a conquista da cidadania que exige o acesso aos recursos culturais relevantes: domínio do saber tradicional presentes na escola, preocupações com o meio ambiente, saúde, sexualidade, questões éticas relacionadas à igualdade dos direitos humanos, à dignidade do ser humano, à solidariedade.
A partir dessa idéia central de cidadania são sugeridos outros objetivos a serem alcançados por professores e alunos: compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais; posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes situações sociais; conhecer características fundamentais do Brasil para a construção da noção de identidade nacional e pessoal e o sentimento de pertinência ao País; conhecer e valorizar a pluralidade do patrimônio sócio-cultural brasileiro e de outros povos evitando discriminações; perceber-se integrante, dependente e agente transformador do ambiente contribuindo ativamente para a melhoria do meio ambiente; desenvolver o conhecimento ajustado de si mesmo tendo em vista a inter-relação pessoal e a inserção social; conhecer e cuidar do próprio corpo; utilizar as diferentes linguagens – verbal, matemática, gráfica, plástica e corporal – como meio para produzir, expressar e comunicar suas idéias, interpretar e usufruir das produções culturais; saber utilizar diferentes fontes de informação e recursos tecnológicos para adquirir e construir conhecimentos; questionar a realidade formulando-se problemas e tratando de resolvê-los, utilizando para isso o pensamento lógico, a criatividade, a intuição, a capacidade de análise crítica, selecionando procedimentos e verificando sua adequação.
Esses objetivos devem se efetivar articulando-se às áreas de conhecimento: Língua Portuguesa, Matemática, Ciências Naturais, História, Geografia, Arte, Educação Física e, a partir da 5a. série, Língua Estrangeira. Estas áreas, por sua vez, precisam interligar-se aos temas transversais: ética, saúde, meio ambiente, orientação sexual, pluralidade cultural.
    O princípio essencial que permeia os PCNs é o acesso de toda população a uma educação qualitativamente melhor, é sua democratização enquanto condição básica para a construção da cidadania.
    O forte enfoque na cidadania torna, por sua vez, relevantes questões (fortemente enfatizadas no contexto educacional de muitos países) como: dignidade humana, igualdade dos direitos, abolição de qualquer tipo de discriminação, solidariedade e respeito. Cabe à escola, portanto, a construção da cidadania e dos valores éticos inerentes a ela, assim, como a introdução e estudos de temas extraídos do contexto atual, tais como: a inserção no mundo do trabalho e do consumo, o cuidado corporal e com a saúde, a educação sexual, a preservação do meio ambiente, a capacitação para a aquisição e o desenvolvimento de novas competências para lidar com novas tecnologias e linguagens.
    As relações entre conhecimento e trabalho exigem a preparação do aluno para um processo de educação permanente.
    Por pensar a aquisição do conhecimento historicamente produzido como essencial para o exercício da cidadania, os elaboradores dos PCNs, atrelam-no à necessidade de um referencial comum. Este deve possibilitar esta aquisição por uma população diversificada e heterogênea, de forma que resulte na valorização e na caracterização das peculiaridades culturais e regionais e não numa uniformização. Unem, assim, o referencial curricular comum ao fortalecimento da unidade nacional e ao respeito à diversidade.
    A ênfase dada nos PCNs é quanto a um conceito de cidadania mais ampliado entendida não apenas como participação política mas, também, como participação social em seus mais diversos aspectos e setores.
    Este conceito de cidadania embasa-se na noção do ser humano enquanto sujeito ativo do processo de conhecimento, de um mundo em constante mudança e do ensino enquanto possibilidade de construção-reconstrução do conhecimento por professores e alunos, tendo em vista sua inserção crítica na realidade para nela interferir e transformar.
    Nota-se uma preocupação em formar uma visão positiva da alteridade para compreender a pluralidade de povos, de costumes, de culturas, de espaços, de nacionalidades, formadas ao longo do tempo.
    Ressalte-se a preocupação com a utilização de diferentes linguagens e recursos tecnológicos facilitadores da expressão oral e escrita, da comunicação e da apropriação das produções culturais.
    Estes objetivos educacionais são, como devem mesmo ser ambiciosos: trata-se da formação de seres humanos no espaço específico da escola. Esbarram-se no meu entender na infra-estrutura das escolas, na ausência (apesar das exceções) de uma cultura escolar propiciadora de espaços para discussões, reflexões e análises sobre a própria prática pedagógica cotidiana, na formação do professor que não oportuniza condições para ser o construtor do seu próprio trabalho, juntamente com seus alunos.
    A escola é concebida como o espaço de acesso ao saber produzido socialmente, sistematizado e organizado de maneira a entrelaçar-se com as questões sociais de cada momento histórico, inclusive as atuais. Para tanto ela deve ser um espaço de informação capaz de permitir a compreensão da realidade para nela interferir, bem como, a possibilidade de usufruir das produções culturais nacionais e internacionais.
    A prática escolar deve possibilitar o desenvolvimento das capacidades do aluno, sua participação em relações sociais, políticas e culturas diversas e ampliadas, o exercício da cidadania em busca de uma sociedade mais democrática.
    A aquisição dessas formas de saber e fazer devem favorecer o desenvolvimento individual imbricado ao contexto sócio-cultural. Neste contexto encontram-se dados da cultura da comunidade do aluno, regionais, nacionais e mundiais. Essa valorização do aluno enquanto agente do seu saber-fazer mediante a construção-reconstrução do conhecimento, remete à necessidade de colocá-lo frente as questões relativas à globalização, às transformações científicas e tecnológicas, aos valores éticos da sociedade, às necessidades atuais impostas pelo trabalho.
    Enfim, o que se propõe é a formação de um aluno-cidadão em contato com os saberes selecionados como necessários para a construção desta cidadania a partir do espaço escolar, concebido como uma permanente construção.
    Com relação à construção social da escola Ezpeleta e Rockwell (1989), apresentam um estudo sobre a realidade escolar mexicana a partir da pesquisa etnográfica. Esta metodologia permitiu-lhes uma interpretação num contexto social mais amplo e a construção de um “presente histórico” ao invés de um “presente sistêmico”, o questionamento sobre a articulação Estado-sociedade civil e a percepção da coexistência na escola de outras instituições sociais.
    A observação do cotidiano escolar mostrou-se o espaço ideal para o estudo da relação Estado-classes subalternas, não só porque para ele convergem os interesses de ambas as partes, mas também, porque é aí que ocorre a apropriação dos conteúdos escolares, caminho para uma reelaboração, fora do seu âmbito, interligando-os ao movimento social rumo à formação histórica de classe. Não há, assim, duas escolas iguais, produtos que são de uma permanente construção social, na qual a relação Estado-Classes subalternas não é fixa, dada, “natural”.
    As autoras puderam perceber os processos de controle e apropriação na relação Estado-classes subalternas a partir do exame de três elementos: as instalações, os professores e os alunos.
    No estudo das instalações escolares encontraram um passado não-documentado, no qual a memória local desmente a História oficial. Nela, a escola não aparece como oferta do Estado, mas como obra coletiva, seja através do trabalho das famílias, das taxas cobradas ou das inúmeras intervenções dos habitantes ao longo do tempo. As lembranças não se reportam a uma “comunidade hegemônica e a-histórica” e sim a uma ação coletiva, às diferentes etapas, aos setores que as assumiram, às oposições e diferenciados interesses identificados nas negociações em torno da sua ampliação, ao sistema de cercamento introduzido deslocando os familiares que traziam almoço ou vendiam artigos nos seus pátios sem muros, a implantação de taxas para o estudo dos filhos, à imposição de uma nova organização e maior controle, ao distanciamento paulatino entre a direção das escolas e os pais dos alunos. Estas modificações quebraram a noção de pertença dos moradores: a presença do Estado tornou-se mais marcante e deslocou a sociedade civil à medida que a sociedade se industrializava, a relação de trabalho se tornava cada vez mais mediada pelo capital e a escola deixava de ser o centro da política estatal.
    Com relação aos professores, esta História não-documentada, revela o entrelaçamento de práticas e saberes derivados de outros campos de atuação: eles já foram camponeses, operários, exerceram e exercem outras atividades extra-escolares. A articulação e reelaboração dessas práticas e saberes manifestam-se no cotidiano escolar, impedindo definí-los, unilateralmente, como “agentes reprodutores da ideologia do Estado”. Esse saber especializado do professor, não necessariamente forjado pela preparação formal, suplanta qualquer perfil ou programa institucional.
    Particularmente significativa é a produção de conhecimento acerca do processo de controle e apropriação observada na relação entre os alunos e entre esses e os professores. São os alunos os agentes organizadores das condições de interpretação do discurso dos professores: mostram-se invulneráveis diante de temas alheios, distraem-se diante de coisas incompreensíveis, animam-se e participam das atividades reconhecidas como coerentes e significativas, questionam, indagam, reelaboram tarefas e conteúdos, confrontam e integram o conhecimento aprendido fora da escola com a versão escolar. No interior da sala de aula aparecem, então, conhecimentos jamais programados - a sabedoria popular enriquece os conteúdos e os professores introduzem formas próprias de ensino para aquelas crianças.
    Concluem, desta forma, que são os conhecimentos e as práticas concretas, produzidos e reproduzidos em cada escola, o conteúdo e o sentido específico, histórico, das relações entre Estado-classes subalternas e não um “suposto efeito geral da escolarização”. A análise do cotidiano incorporada à dimensão histórica, evidencia a não existência de uma identificação exclusiva das classes subalternas com o Estado ou com setores determinados, pois as práticas observadas são práticas de sujeitos individuais e não unicamente atribuíveis à classe.
    Estas constatações trazem implicações ao se pensar a proposição de um currículo mínimo a ser implantado nacionalmente. É necessário garantir a sua assimilação e a sua construção-reconstrução pela comunidade escolar local e não a sua mera reprodução, mecânica e, assim, a-histórica.
    A concepção de processo ensino-aprendizagem tem por base o interagir e o construir. Na introdução a esse tópico foi enfatizado a necessidade de “ressignificar a unidade entre aprendizagem e ensino” (P.C.N., 1997, p. 50). Esse ressignificado foi encontrado no marco explicativo do construtivismo configurado a partir da psicologia genética, da teoria sócio-interacionista e das explicações da atividade significativa.
    A concepção de ensino-aprendizagem extraída dessas teorias é coerente com as concepções de educação e de escola. É, portanto, estranhável que não apresente os elos de ligação entre cada marco explicativo e seus propositores. Ou seja, Jean Piaget e seus seguidores dentro da psicologia genética, Levi S. Vygotsky dentro do sócio-interacionismo e Lúria e Leontiev,  continuadores das suas propostas. Esta ligação deveria ter sido estabelecida pois as teorias, seus desdobramentos e conseqüências para a prática educativa são desconhecidas da maioria dos professores do Ensino Fundamental e, em especial, o das séries iniciais de escolarização.
    De Jean Piaget podemos ressaltar a possibilidade de interpretar a realidade, de construir significados e, ao mesmo tempo, permitir a construção de novas possibilidades de ação e de conhecimento. Ao interagir com o objeto constroem-se representações que funcionam como explicações segundo uma lógica interna pessoal e, assim, essa interação propicia sucessivas aproximações e transformações no conhecimento, que podem ser tomadas como erros construtivos. O desdobramento imediato para a educação dessa concepção é que o aluno é o agente do processo de aquisição do conhecimento, que é resultado de um complexo e intrincado processo de modificação, reorganização e construção, utilizado pelos alunos para assimilar e interpretar os conteúdos escolares. (P.C.N., 1997, p. 51).
    A inclusão do sócio-interacionismo se deu pela ênfase à construção social da escola e ao significado socialmente construído dos conteúdos escolares em diferentes momentos históricos. Ao explicitar a necessidade de significação no processo de construção do conhecimento foi reforçada a idéia de problematização do real, a elaboração de hipóteses e a experimentação, atividades que se interligam aos fatores afetivos, motivacionais e relacionais, como pretendido por Piaget. Buscou-se em Vygotsky a visão de que pensamento e linguagem imbricam-se com o desenvolvimento da criança e são construídos na sua história pessoal e coletiva.
    A contribuição maior, no meu entender, do sócio-interacionismo é exatamente esta concepção que faz o pêndulo se centrar não mais só no professor ou só no aluno mas, na atuação do professor enquanto mediador entre o conhecimento e seus alunos. É o professor quem deve perceber o nível de desenvolvimento real e proximal, com vistas a alavancar o desenvolvimento potencial dos alunos, objetivo da prática educativa no contexto da sala de aula.
    O processo ensino-aprendizagem é dinâmico, complexo e ocorre em situações concretas e tem múltiplas determinações, internas e externas à escola. A aprendizagem não ocorre apenas na sala de aula, mas nela o processo ensino-aprendizagem precisa ser organizado segundo finalidades, objetivos e atividades favorecedoras da construção-reconstrução do conhecimento e da busca de novas formas de aplicá-lo. O professor deve evitar um fazer pedagógico espontâneo, mecânico, repetitivo, entendendo que as situações de ensino são situações didáticas, determinadas e determinantes. Abrange o comprometimento da sala de aula com a escola, a comunidade, a sociedade e a cultura, numa prática comprometida e transformadora.

Algumas Considerações

As sugestões contidas nos PCNs quanto aos fundamentos pedagógicos do processo ensino-aprendizagem significam grande avanço e podem provocar um repensar a educação, a escola, o processo ensino-aprendizagem e possibilitar encaminhamentos significativos para o alcance da qualidade no Ensino Fundamental.
Dado que a escola não é uma redoma de vidro protegida e desvinculada do real é preciso articular as dimensões humana, técnica e política, como refletido por CANDAU (1989), para a obtenção da eficácia no ato de ensinar-aprender, tendo em vista aprendizagens significativas. A prática pedagógica, então, não se entende neutra mas ideologicamente definida pelo professor que faz, segundo LUCKESI (1989), opções teóricas na sua área de conhecimento, opções filosófico-políticas - pela repressão ou libertação, por uma teoria do conhecimento - pela reprodução ou construção do conhecimento, pelos fundamentos específicos da sua prática, pelos meios de processá-la em sintonia com as escolhas anteriores que, por sua vez, se articulam com suas concepções de mundo, de ser humano, de educação, de escola, propiciando a construção crítica do que fazer e do como fazer.
A sala de aula, no entanto, nem sempre foi percebida como um espaço de interação professor-aluno-conhecimento, favorecedora de sua construção e da busca de novas formas de aplicá-lo. Na visão tradicional de ensino, ao professor cabia transmitir conteúdos e informações aos alunos, ouvintes passivos e meros reprodutores.
Piaget (1977), desloca a ênfase dada aos conteúdos transmitidos pelo professor para as atividades desenvolvidas pelos alunos sob a orientação do professor. Prioriza a observação e a problematização da realidade por entender que o conhecimento é uma construção complexa que envolve os aspectos cognitivos, afetivos e morais em busca de autonomia do sujeito que conhece. É preciso então considerar o conhecimento como um processo aberto, sempre inacabado e provisório. A sala de aula deve propiciar o desenvolvimento da inteligência o que permite um processo de construção contínua colocando o pensamento a serviço da ação. Aprender significa assimilar o objeto a esquemas mentais, cada vez mais complexos. O ensino deve se basear no ensaio e no erro, na pesquisa, na investigação, na solução de problemas pelo aluno. O fundamental é o processo e não o produto final. A autonomia explicita-se pela participação e pela busca de novas formas de pensar e de conhecer em situações cooperativas e socializadoras.
Na proposta sócio-interacionista de Vygotsky (1988, 1991), cada ser humano é único e por meio de seus processos internos constrói seus significados e recria sua própria cultura. Neste processo o pensamento e a linguagem desenvolvem-se mutuamente a partir de inclinações, interesses, impulsos, afetos e emoções. A consciência se constitui por uma inter-relação dinâmica entre intelecto e afeto, as atividades no mundo e a sua representação: constituição da subjetividade a partir de situações de intersubjetividade (o “eu” particular no coletivo genérico).
A linguagem fornece os conceitos e as formas de organização do real que são a mediação entre o sujeito e o objeto de conhecimento, entre o sujeito que conhece e o mundo real.
Dessa maneira, Vygotsky (1988, 1991), interliga aprendizado e desenvolvimento o que traz implicação para a educação e o contexto da sala de aula. Para o autor o aprendizado começa com o nascimento de criança que constrói sua própria história pessoal numa história social já em desenvolvimento. Desta forma, qualquer situação de aprendizagem com o qual a criança se depara na escola tem uma história prévia (pré-história da aprendizagem). Ressalta, porém, que o aprendizado escolar produz algo fundamentalmente novo ao desenvolvimento, a zona de desenvolvimento proximal, que é a distância entre o desenvolvimento real (já completado) e o desenvolvimento potencial que é alcançado com a mediação de um adulto mais experiente ou dos companheiros mais capazes.
A zona de desenvolvimento proximal define as funções que ainda não amadureceram mas que estão em processo de maturação e devem ser potencializados. O “bom aprendizado”, o “bom ensino” é aquele, portanto, que se adianta ao desenvolvimento, que permite interligar mutuamente desenvolvimento e aprendizagem.
O aprendizado desperta vários processos internos de desenvolvimento, capazes de operar numa situação de cooperação com os outros (professor e companheiros). Internalizados, esses processos tornam-se parte das aquisições de desenvolvimento independente, responsável pela construção da subjetividade em meio às intersubjetividades.
No meu entender, a implicação mais importante das proposições de Vygotsky é o contexto da sala de aula, percebido como o da interação entre professores, alunos e o conhecimento, potencializadora do desenvolvimento de aprendizagens significativas de agentes sociais que se constroem no processo. Faz, dessa maneira, o pêndulo se equilibrar: o centro não é o professor-transmissor de conteúdos, não é, também, apenas as atividades dos alunos sob orientação do professor - no contexto de sala de aula ocorre a interação dos sujeitos, professores e alunos, com o conhecimento, tendo em vista aprendizagens significativas.
O trabalho pedagógico deve ser organizado para alcançar este objetivo e o planejamento de ensino articular objetivos, conteúdos, metodologia e sistemática de avaliação de maneira contínua, dinâmica, globalizante, voltada para a formação de seres humanos críticos, questionadores, atuantes. A postura comprometida com o fazer pedagógico e com o social é condição básica para superar um ensino paralizante, transmissor de verdades, conceitos e preconceitos cristalizados e para permitir uma prática pedagógica transformadora.
Tarefa complexa que exige do professor uma formação que leve em conta sua capacidade de desenvolver a pesquisa para a construção do seu saber-fazer em sala de aula. Este é um aspecto que os Parâmetros Curriculares Nacionais por si só, não dão conta, pois estrapola a simples proposição curricular e procedimentos de ensino . Há, acima de tudo, o risco dos PCNs se transformarem em manuais de instruções para a prática escolar, sem maiores reflexões, um arremedo do que está se propondo.
Não é possível deixar de trazer para o debate o pano de fundo onde se desenvolvem as propostas curriculares, o sistema capitalista de produção, no qual a escola está inserida, o que traz desdobramentos para o pensar a educação e o processo ensino-aprendizagem para além das propostas públicas para o currículo e sua implementação. Assim, cabe questionar e responder, nesse contexto, nossas concepções de mundo, de ser humano, de educação e de escola e o quanto elas conflitam ou se aproximam das colocadas pelo modo de viver capitalista.
    Estas questões serão aprofundadas e melhor elucidadas no decorrer deste trabalho, quando serão abordados os objetivos, conteúdos e os pressupostos teórico-metodológicos presentes nos PCNs para o ensino de História.

Referências

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LUDKE, M. e ANDRÉ, M. E. D. A.. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.
LUCKESI, Cipriano Carlos. A avaliação da aprendizagem escolar.  São Paulo: Cortez, 1995
PIAGET, Jean. O Julgamento Moral da Criança. Trad. Elzon Lenardon, São Paulo: Ed. Mestre Jou, 1977.
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Bibliografia Recomendada

BORDIEU, Pierre & PASSERON, Jean-Claude. A Reprodução: elementos para uma Teoria do Sistema de Ensino. (trad.), Rio Janeiro: Francisco Alves, (Educação em Questão), 1978.
ENGUITA, M. F.. A Face Oculta da Escola, Educação e Trabalho no Capitalismo. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.
GOODSON, Ivor F. Currículo: teoria e história. Trad. Attilio BRUNETTA. Petrópolis: Vozes, 1995.
GRAMSCI, Antonio. A Concepção dialética da História. Trad. Carlos N. Coutinho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966.
GUSDORF, Georges. Professores para quê?. Trad. João B. da Costa e Antonio R. Rosa, 2º Ed. , Lisboa: Moraes Ed. , 1970.
LEITE, Yoshie U. F. A Formação do Professor em Nível de 2º grau e a Melhoria do ensino na Escola Pública. Tese de Doutorado, Campinas, São Paulo: Faculdade de Educação/UNICAMP, 1994.
PICONEZ, Stela C. B. A prática de ensino e o estágio supervisionado: a aproximação da realidade escolar e a prática da reflexão. In: FAZENDA, I. A prática de ensino e o estágio supervisionado. Campinas: Papirus, 1991. p. 15-33.
PIMENTEL, Maria da Glória B. O Professor em Construção. Tese de Doutorado. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica, 1992.
SAVIANI, Dermeval. O Ensino Básico e o Processo de Democratização da Sociedade Brasileira. REVISTA ANDE, São Paulo: 4 (7): 9-13, 1984.
SILVA JUNIOR, Celestino Alves da. A Escola Pública como Local de Trabalho. São Paulo: Cortez/Autores Associados. 1990.

Doutora em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, UNESP .Mestre em História pela  Universidade Estadual Paulista, UNESP. Graduada em História pela Pontifícia Universidade Católica PUC -SP. Professora  do Programa de Pós-Graduação, Mestrado em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná. Professora aposentada da Universidade Estadual Paulista, UNESP. Pesquisa problemas relacionados à formação do professor e do processo ensino-aprendizagem.

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OS AUTORES

Carlos Alves Rocha Mestre em Tecnologia - Área: Educação Tecnológica. Especialista em Informática na Educação. Licenciado em Ciências e Biologia. Professor no ensino fundamental, médio e superior na área de ciências; professor e coordenador de cursos de Informática na Educação para alunos e professores no ensino fundamental, médio e superior, atendendo também a portadores de necessidades especiais usando a tecnologia.Professor nos cursos de Pedagogia, Letras e Administração/UTP
Daniella Lisboa
Graduanda do quarto ano de Pedagogia da Universidade Tuiuti do Paraná.  Pesquisadora Voluntária do Projeto ´Reconstrução Historica do Colegio Estadual do Paraná
Evelcy Monteiro Machado
Doutora em Filosofia e Ciências da Educação – Universidade Santiago de Compostela, Espanha. Mestre em Educação, área de concentração Currículo. Pedagoga, Especialista em Métodos e Técnicas de Ensino. Docente e pesquisadora de Programa de Pós-Graduação – Mestrado em Educação e do Curso de Pedagogia da Universidade Tuiuti do Paraná.
Fabiana Andrea Barbosa Graduada em Letras – Habilitação Português – Especialista  Mestranda do Programa de Pós-Graduação, Mestrado em Educação da UTP, Linha de Pesquisa “Políticas Públicas e Gestão da Educação".
Gilmar Dias Graduado em Pedagogia pela UFPR. Especialista em Administração Financeira e Informatização pela  FADEPS- Faculdade de Placido e Silva. Professor Assistente da Graduação e da Pós Graduação Lacto Sensu e Mestrando no Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná, na linha de Políticas Publicas e Gestão da Educação, sob a orientação do Prof Dr. Sidney Reinaldo Silva.
foto Iolanda B. C. Cortelazzo







Doutora em Educação pela USP. Professora no Programa de Pós-Graduação em EducaçãoMestrado em Educação
na Universidade Tuiuti do Paraná. Coordenadora do Núcleo de Pesquisa em Processos Educacionais Interativos.
Pesquisadora nas áreas de Educação a Distância ,
Ambientes de Aprendizagens Colaborativos e
Tecnologias de Informação e Comunicação em Educação.
Membro da ABED, sócia fundadora da ABED - Polo Paraná.

Joelma Zambão Estevam 
Coordenadora e professora do curso de Artes Visuais com Ênfase em Computação da Universidade Tuiuti do Paraná. Mestranda do Programa de Pós-Graduação , Mestrado em Educação da UTI, Linha de Pesquisa: "Políticas Públicas e Gestão da Educação
Josélia Schwanka Salomé
Professora dos cursos de Artes Visuais com Ênfase em Computação e Pedagogia
da Universidade Tuiuti do Paraná. Mestranda do Programa de Pós-Graduação , Mestrado em Educação da UTI, Linha de Pesquisa: "Políticas Públicas e Gestão da Educação
Josiane Gonçalves Santos Mestranda do Programa de Pós-Graduação, Mestrado em Educação da UTP, Linha de Pesquisa “Políticas Públicas e Gestão da Educação
Josimary Morastoni  Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação - Mestrado em Educação da UTP, Linha de Pesquisa “Políticas Públicas e Gestão da Educação
Larissa Monteiro Machado
Graduada em Administração com habilitação em Hotelaria e especialista em Metodologia do Ensino Superior. Mestranda em Administração com ênfase em Gestão de Negócios pela Universidade Estadual de Londrina.
Márcia Silva Di Palma Mestranda em Educação da UTP, Linha de Pesquisa “Práticas Pedagógicas, elementos articuladores".  Especialização em Psicopedagogia pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa e Extensão. Pedagoga pelo Centro Universitário Positivo e docente do Curso de Pedagogia da Faculdade de Campina Grande do Sul e do IMEC – Instituto Martinus de Educação e Cultura.
Maria Antonia de Souza Geógrafa. Mestre e doutora em Educação, pela Universidade Estadual de Campinas. É professora junto ao Programa de Mestrado em Educação, da Universidade Tuiuti do Paraná. Possui capítulo de livro publicado pela editora Paz e Terra; pela editora da UFSC e pela editora da Universidade Estadual de Maringá/PR. Pesquisa educação do campo e prática educativa nas escolas localizadas nos assentamentos, organizados no movimento social.
Maria Auxiliadora Cavazotti Doutora em Educação pela UFPR, Professora no Programa de Pós-Graduaçào em educação, Mestrado em Educação na Universidade Tuiuti do Paraná
Maria de Lourdes de Almeida Pedagoga, Mestre e Doutora pela Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas. Professora do PPG em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná. Pós Doutoranda do Departamento de Politicas Publicas, Ciencia e Tecnologia da UNICAMP. Professora Pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Ensino Superior- GEPES- sede FE da Unicamp. Autora do livro ´Iniciativa Privada e Universidade Publica´- Editora Atomo e Alínea, 2003.
Maria Leticia Vianna
Maristela Sobral Cortinhas
Psicóloga, graduada pela Universidade Federal do Paraná; Especialista em Educação Inclusiva pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná e Mestranda em Educação na Universidade Tuiuti do Paraná. O presente trabalho foi realizado com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq - Brasil.
Marlei G. da Silva Malinoski
Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação - Mestrado em Educação da UTP Linha de Pesquisa “Práticas Pedagógicas, elementos articuladores". 
Paulo Roberto Neves Pereira Consultor voluntário
Vilma Fernandes Neves Doutora em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, UNESP .Mestre em História pela  Universidade Estadual Paulista, UNESP.Graduada em História pela Pontifícia Universidade Católica PUC -SP. Professora  do Programa de Pós-Graduação, Mestrado em Educação da Universidade Tuiuti do Paraná. Professora aposentada da Universidade Estadual Paulista, UNESP. Pesquisa problemas relacionados à formação do professor e do processo ensino-aprendizagem .


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Organização: Evelcy Monteiro Machado e  Iolanda B. C. Cortelazzo
Editoração:  Iolanda B. C. Cortelazzo e Evelcy Monteiro Machado -  dezembro de 2003
Criação da Página: Iolanda B. C. Cortelazzo e Evelcy Monteiro Machado- outubro de 2003
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